Sobre os Animais
Com o advento das ideias
espiritistas no mundo, torna-se um estudo obrigatório e para
todos os dias o grande problema que implica o drama da evolução anímica.
Será a alma criada no momento da concepção na mulher, segundo as teorias
anti-reencarnacionistas? O Espirito já é criado, pela Potencia Suprema do
Universo, apto a ingressar nas fileiras humanas? E os pensadores se voltam para
os vultos eminentes do passado. As autoridades católicas valem-se de Thomaz de
Aquino que acreditava na criação da alma no período de tempo que precede ao
nascimento de um novo ser, esquecendo-se dos grandes padres da antiguidade,
como Orígenes, cuja obra é um atestado eterno, em favor da verdade da pre-existência.
Outras doutrinas, religiosas buscam
a opinião falível da sua ortodoxia e dos seus teólogos,
relutando em aceitar as realidades luminosas da reencarnação.
Pascal, escrevendo em tenra idade o seu
tratado sobre os cones, e inúmeros Espíritos de escol, laborando com a sua genialidade
precoce nas grandes tarefas para que foram chamados à Terra, constituem uma prova
eloquente, aos olhos dos menos perspicazes e ao estudo de mentalidades tardas no
raciocínio, a prol da verdade reencarnacionista.
O homem atual recorda instintivamente
os seus labores e as suas observações do passado. A sua existência de hoje é a continuação
de quanto efetuou nos dias do pretérito. As conquistas de agora representam a
soma dos seus esforços de antanho. E a
civilização é a grande oficina onde cada um deixa estereotipada a sua própria
obra. Contempla-se, porém, até hoje, a sombra dos princípios, como noite insondável
sobre abismos. Os desencarnados da minha esfera não se acham, por enquanto,
indenes do socorro das hipóteses. A única certeza obtida é a da imortalidade da
vida e, como não nos é possível absorver a essência da sabedoria sem
iniciativas individuais e sem ardorosos trabalhos, discutimos e estudamos as
nobres questões que, na Terra, escaldaram o nosso pensamento. Um desses
problemas, que mais assombram pela sua singular transcendência, é o das
origens. Se, na terra, o progresso humano
vem através de dois caminhos: o da ciência e o da revelação espiritual, ainda
não encontramos,
em nossa evolução relativa, nenhuma estrada estritamente cientifica para determinar
o Alpha do Universo, senão dentro das hipóteses plausíveis. Contudo, saturados da
mais profunda compreensão moral, copiosa é a nossa fonte de revelações, a qual
representa para nós um elemento granítico, servindo de base à sabedoria de
amanhã.
Se bem haja, no próprio círculo dos
estudiosos do espaço, o grupo dos opositores das grandes ideias do evolucionismo
do princípio espiritual, através das espécies, sou dos que o estudam carinhosa
e atentamente. Eminentes naturalistas do mundo, como Charles Darwin,
vislumbraram grandiosas verdades, levando a efeito preciosos estudos que,
aliás, se prejudicaram pelo excessivo apego à ciência terrena, que se modifica
e transforma como os próprios homens.
Mas, posso afirmar, sem laivos de
dogmatismo, que, oriundos da flora microbiana, em
séculos remotíssimos, não poderemos precisar onde se encontra o cume das
espécies ou
da escala dos seres, no pentagrama universal. E, como o objetivo desta palestra
é o
estudo dos animais, nossos irmãos inferiores, sinto-me à vontade para declarar
que todos nós já nos debatemos no seu acanha do
circulo evolutivo.
Eles são nossos parentes próximos, apesar
da teimosia de quantos persistem em não
os reconhecer como tais. Considera-se, às vezes, uma afronta ao gênero humano a aceitação
dessa verdade. E pergunta-se: poderíamos admitir um princípio espiritual nas arremetidas
furiosas das feras indomesticadas? Poderia haver um raio da luz de Deus, na
serpente venenosa, ou na astúcia traiçoeira dos carnívoros? Semelhantes
inquirições, contudo, são filhas de um entendimento pouco atilado. Atualmente,
precisamos modificar todos
os conceitos acerca de Deus, porquanto nos falece autoridade para defini-Lo ou individualiza-Lo.
Deus existe. Eis a nossa luminosa afirmação, sem podermos, todavia, classificá-Lo
em sua essência. Os que nos interpelam dessa forma olvidam as histórias das calúnias,
dos homicídios, das perversidades humanas. Para que o homem se conservasse nessa
posição especial de perfectibilidade única, deveria representar a entidade
irrepreensível dentro do orbe, onde foi chamado a viver. Tal não se verifica e,
diariamente, comentais os dramas dolorosos da humanidade, os assassínios, os
nefandos infanticídios, efetuados em circunstâncias nas quais, muitas vezes, as
faculdades irracionais operariam com maior benignidade, clemência e
conhecimento das leis que regem o mundo.
Os animais tem a sua linguagem, os seus
afetos, a sua inteligência rudimentar, com atributos inumeráveis. São os irmãos
mais próximos do homem, merecendo por isso a sua proteção e o seu amparo.
Seria difícil ao medico legista
determinar, nas manchas de sangue, qual o que pertenceu
ao homem ou ao animal, tal a identidade dos elementos que o compõem. A organização
óssea de ambos é quase a mesma, variando apenas na sua conformação e observando-se
diminuta diferença nas vértebras.
O
homem está para os irracionais simplesmente como um superior hierárquico.
Nos animais, desenvolvem-se igualmente
as faculdades intelectuais. O sentimento de
curiosidade é, na maioria deles, altamente avançado e muitas espécies nos
demonstram as suas elevadas qualidades, exemplificando o amor conjugal, o
sentimento de paternidade, o amparo ao próximo, as faculdades de imitação, o
gosto da beleza. Basta que se possua um sentimento acurado de observação e de
analise.
Eminentes Espíritos trouxeram à luz
o fruto de suas interessantes pesquisas, que para
vós todos são de inigualável valor. Entre muitos, citaremos Darwin, Gratiolet e inúmeros
outros estudiosos, dedicados a esses notáveis problemas. Os animais, mesmo os mais
ferozes, tem para com a sua prole ilimitada ternura. Aves existem que se deixam matar,
quando não se lhes permite a defesa das suas famílias. Os cães, os cavalos, os macacos,
os elefantes deixam entrever apreciáveis qualidades de inteligência. É conhecido
o caso dos cavalos de um regimento que mastigaram o feno para um dos seus companheiros
inutilizado e enfermo. Conta-se que uma fêmea de cinocéfalo, muito conhecida
peja sua mansidão, gostava de recolher macaquinhos, gatos e cães, dos quais cuidava
com admirável carinho. Certo dia, um gato revoltou-se contra a sua benfeitora, arranhando-lhe
o rosto; mãe adotiva, revelando a mais refletida inteligência, examinou-lhe as
patas e lhe cortou com os dentes as unhas pontiagudas. Constitui um fato observável
a sensibilidade dos cães e dos cavalos ao elogio e às reprimendas.
Longe iriamos com as citações.
O que podemos assegurar é que sobre os
mundos, laboratórios da vida no universo, todas as forças naturais contribuem
para o nascimento do ser. De milênios remotos viemos todos nós, em pesados
avatares.
Da noite, ainda para nós insondável,
dos grandes princípios, emergimos para o concerto
da Vida. A origem constitui para nós um mistério cuja solução nos é, por enquanto,
inacessível, mas sabemos que todos os seres inferiores e superiores participam
do patrimônio da Luz universal.
Em que esfera estivemos um dia esperando
o desabrochamento de nossa racionalidade? Desconheceis ainda os processos, os
modismos dessas transições, dessas passagens
pelas espécies, evoluindo sempre, buscando a perfeição suprema e absoluta; mas,
um laço de amor nos reúne a todos diante da Entidade Suprema do Universo. É
certo que o Espirito jamais retrograda, constituindo uma infantilidade as
teorias da metempsicose dos Egípcios, na antiguidade.
Porém, se é impossível o regresso da
alma humana ao circulo da irracionalidade, recebei como obrigação sagrada, como
alto dever amparar os animais, não obstante a sua posição inferior no planeta.
Estendei até eles a vossa concepção de
solidariedade e o vosso coração compreenderá, mais profundamente, os grandes segredos
da evolução, entendendo os maravilhosos e doces mistérios da Vida.
Emmanuel
recebido
por Chico Xavier
em 2 de Outubro de 1936
Fonte: “Reformador” (FEB) 16 Jan 1937
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