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quarta-feira, 1 de abril de 2020

O verdadeiro espírita



O verdadeiro espirita
por Orville Derby A. Dutra
Reformador (FEB) Julho 1941
  
            O espírita ou espiritista sincero, de convicções enraizadas, não faz espiritismo por passatempo. Para ele, a doutrina é o que de mais sublime lhe foi dado conhecer, pois o consubstancia um ideal divino. Tem-na como um porto seguro, onde pode lançar tranquilo a âncora da sua fé, produtiva de bons atos. Sente-se feliz, reconhecendo nela uma obra que traz o selo da sabedoria do Senhor, porque doutrina que não vem de Deus não pode encarar de frente a razão em todas as épocas da humanidade, como o faz o Espiritismo que, portanto, não se pode confundir com essas árvores que o Pai não plantou e que, em consequência, serão, como o diz o Evangelho, arrancadas e lançadas ao fogo.

            Por isso mesmo, o espiritista convicto, compenetrado que se acha de seus deveres, consagra os maiores esforços a cumpri-los e trabalha com ardor e confiança pela doutrina que professa, certo de que, obedecendo aos preceitos do Evangelho, tudo mais lhe será dado de acréscimo e por misericórdia.

            Não se preocupa com o fazer, seja o que for, para ser visto por olhos humanos, nem para receber os galardões do mundo, cuidando unicamente de que os seus atos sejam dignos de patentear-se aos olhos de Deus, que tudo vê de quanto obramos e pensamos, e, para esse efeito, tudo o que pratica em silêncio, procurando que nem o seu nome jamais apareça.

            Desde que, porém, precise assumir ostensivamente a responsabilidade de suas ações, ele não se esconde, antes se apresenta leal e sinceramente a se mostrar responsável pelos atos de que se trate.

            Assim como pela sua vida pública, ele também se caracteriza e qualifica pela sua vida particular.

            São sempre calmas e ponderadas as suas resoluções e, acima de tudo, sinceras e francas.

            Como pregador, a sua atitude é nobre, embora modesta e a substância de suas alocuções tira-as dos ensinos contidos nos Evangelhos do Mestre. Jesus, não descurando jamais de realizar em si os ensinamentos que constituam objeto de suas pregações.

            Humano, como é, também tem direito e procura sem prejuízo das obrigações que lhe correm, divertimentos que lhe recreiem o espírito, repousando-o das cogitações sérias. De nenhum, porém, se torna escravo ou fanático e nenhum busca o que não condiga com a elevação de seus sentimentos ou da tarefa em que se considere investido.

            Encara tranquilamente a vida, com seus altos e baixos, sem se perturbar com as suas vicissitudes e sem se deixar tomar de desanimo ante as decepções e amarguras que ela lhe reserve, recebendo com paciência e submissão à justiça divina a dor e o sofrimento que o atinjam, pois que bem lhes conhece as causas e origens.

            Se se lhe impõe a necessidade de discutir em sustentação da doutrina, ou para retificar a interpretação de algum de seus pontos capitais, mantém o debate em terreno elevado, exemplificando serenidade e tolerância; em vez de humilhar, esforça-se por elevar o adversário.

            No centro ou agremiação a que pertença, quer como membro da sua diretoria, quer como simples associado, mostra-se solícito para com todos, respeitador de todas as normas e resoluções em vigor e cônscio de suas responsabilidades.

            Em nenhuma ocasião, nem mesmo em simples palestras, graves ou alegres, usa de palavras ou expressões pesadas ou, sequer, pouco delicadas.

            É sempre comedido e criterioso no falar, lembrado de que o Evangelho diz que a boca fala aquilo de que está cheio o coração.

            Enfim, soldado do Evangelho, sempre resoluto e firme no seu posto, luta de contínuo contra o mal, empunhando as únicas armas de que pode utilizar-se o verdadeiro cristão, revelando-se de bom ânimo em todas as circunstâncias e alegre, tomado dessa alegria sã, que lhe advém de estar conscientemente a serviço do Senhor dos senhores, dignificando-se para ser por ele qualificado de - amigo.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Palmas



Palmas
Orvile Derby A. Dutra
Reformador (FEB) Novembro 1940

            Deve constituir preocupação de todo espírita o aperfeiçoamento constante de si mesmo, do meio em que vive e, quiçá, do seu próximo.

            Tudo, portanto, em que haja ocasião de estudo e aperfeiçoamento deve merecer-lhe carinho, dedicação e respeito.
           
            Assim, um assunto que reclama estudo acurado de nossos irmãos em crença é o de aplaudirem-se com palmas os oradores, nas reuniões espíritas.

            Num ambiente neutro ou profano, onde as coisas materiais mais ou menos predominam no espírito dos assistentes, é natural que se preste aos oradores homenagem de cunho também mais ou menos material.

            Dentro, porém, de um Centro espírita, de uma casa de caridade, onde a espiritualidade deve preponderar, onde os assistentes se reúnem em nome do Senhor, para expansão de sentimentos elevados, não vemos tenham cabimento demonstrações de natureza material, para aplausos e palmas que, ao demais, oferecem o risco de inutilizar o orador, pelo fato muito simples de que nem sempre ele está preparado para receber homenagens tão diretas e pessoais.

            Nessas ocasiões, se um irmão nosso, num ambiente espírita, embora possuído de muito boa vontade, sobe à tribuna para uma palestra ou dissertação doutrinárias e, ao terminar, recebe uma salva de palmas, não raro acontece que esses aplausos se transformam em degraus para a sua ascensão ao trono da vaidade, filha primogênita do orgulho, e a consequência é necessariamente funesta, triste, dolorosa.

            Se o mesmo orador, numa tribuna idêntica, por qualquer circunstância, não agrada à assistência e esta lhe dá mostra do seu desagrado, dispensando-lhe fracos aplausos, algumas palmas apenas, isoladas e esparsas, recebe ele a pública e amarga demonstração do seu fracasso e, ferido no íntimo, em seu amor próprio, desgosta-se e se afasta. É um trabalhador perdido.

            O mesmo já não acontece com uma assistência compenetrada da possibilidade desse mal. Se a peça oratória lhe agrada, em vez de dar palmas, ela, vibrando intimamente, dirige o pensamento ao Criador, agradecendo-lhe a magnífica dádiva, e o orador sente o benefício grande desses aplausos de outra espécie e mais sinceros, partidos que são do fundo de corações bem formados. Experimentando íntimo júbilo, dispõe-se a aprofundar seus estudos da Verdade divina, para mais e melhor ainda produzir.

            Se, entretanto, a sua oratória não agradou, a assistência, sempre compenetrada do seu dever, se porta como se o orador lhe houvesse agradado: vibra do sentimento de piedade para com este e, como no outro caso, dirige o pensamento a Jesus, numa súplica pelo irmão mal sucedido, exemplificando assim um dos grandes ensinamentos evangélicos: o da tolerância. Suplica forças para o trabalhador de boa vontade que, então, sentindo o influxo daquelas vibrações generosas, longe de desanimar, cuida de orar com mais fervor, de estudar e meditar com mais afinco, certo de que, na próxima ocasião, produzirá mais e melhor.

            Poderíamos citar muitas consequências desastrosas desse gênero, decepções amargas e ilusões nefastas, devidas às palmas e aplausos. Mas, não entramos nesse terreno, por ser o da crítica. Por satisfeitos nos teremos, se os nossos irmãos quiserem dar-se o trabalho de observar e analisar o que se passa nesse terreno. Se o fizerem, não se deixarão arrastar para sendas que não são as do aperfeiçoamento por que todos devemos esforçar-nos.

            Nota da Redação - Irrestritos "aplausos" deferimos ao que se acaba de ler. Subscrevemos in totum os conceitos acima externados, pelo corresponderem integralmente à nossa maneira de ver e de entender a questão ventilada, correspondendo às boas normas da Doutrina Espirita e a uma elevada compreensão do espírito de seus ensinamentos.   


segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

A Prece


A Prece  
por Orvile Derby A. Dutra
Reformador (FEB) Novem 1941

            Uma vez sob o influxo dos sentimentos cristãos, esforça-se o espírita por seguir todos os ensinamentos do Evangelho, jamais perdendo qualquer oportunidade para aplica-los, quer sejam parabólicos, quer não, segundo o espírito, que não segundo a letra.

            Estuda constantemente esse código divino e procura exemplificar os seus sábios preceitos, sempre com o propósito firme de seguir as pegadas do Mestre excelso. Assim fazendo, logo de início se lhe evidencia que a prece, a prece íntima, sentida e fervorosa é meio seguro de pôr-se em ligação estreita com o seu Criador e Pai.

            De pronto reconhece que, se do Evangelho nem um só til ficará apagado ou será suprimido sem aplicação, não foi certamente para encher de vãs palavras tantos textos do livro da vida, que o divino Mestre tão multiplicadamente encareceu a necessidade da oração.

            Com efeito, pondo por obras a doutrina que pregava, Ele, o Cristo, além de recomendá-la, praticou a prece, ensinando como deve orar a criatura para entrar em comunhão com o céu.

            Ensinou-a mediante o “Pai Nosso”; exemplificou-a orando quando expelia dos possessos os Espíritos malfazejos; bem como quando aconselhou a seus discípulos que pedissem a seus discípulos que pedissem ao Pai trabalhadores para a sua Seara e quando operou a multiplicação dos cinco pães e dos dois peixes. Exemplificou-a, sobretudo, na hora suprema e angustiosa de Getsemani.

            Nunca, pois, deve, nem pode o espiritista esquecer-se da prece, a menos que resolva lançar fora a única chave que lhe permite encontrar solução para os problemas sérios com que à miúde se defronta e que, não raro, imensamente o angustia. Aliás, se assim fizer, já não será espírita, na verdadeira significação do termo.

            Em todas as suas reuniões, mesmo que se destinem a simples palestras ou conferências doutrinárias, ou ainda, a tratar que quaisquer assuntos sérios e elevados, a prece é de necessidade imperiosa, porque é ela que saneia o ambiente, tornando-o harmonioso e sereno, de maneira a não comportar dissídios ou dissenções graves.

            Da mesma forma, por ocasião de um nascimento ou de uma desencarnação, junto de um aflito ou desesperado, nas horas angustiosas da vida, nos momentos críticos ou difíceis, é na prece que se depara a fonte de energias de que ele necessita, ou de que precisa o seu irmão para vencer a prova, compreendendo-lhe a razão e capacitando-o para dizer, com sinceridade e humildade: cumpra-se no servo a vontade do Senhor, palavras que, ditas de coração, trazem inexprimível reconforto à alma atribulada.  

            Não é, porém, somente na prova, no sofrimento que o crente espírita deve lembrar-se do Pai Celestial, para lhe dirigir a sua prece. Também nas horas de alegria, de satisfação, de gozo interior, em que a alma lhe transborda de contentamento, deve ele orar com o mesmo fervor e a mesma humildade que revele noutras ocasiões, agradecendo a esmola de alguns momentos de alívio, para recobramento das energias que lhe são necessárias a transpor sem desfalecimentos este vale de lágrimas, que é a Terra.

            Ainda grandes oportunidades lhe oferecem, para bendizer de Deus numa prece sentida, as horas das refeições, em que lhe cumpre agradecer o “pão de cada dia”, que lhe é dado para sustento do corpo, suplicá-lo para todos os que, amigos ou inimigos, vivem mal podendo alimentar-se parcamente; e implorar, para si e para todos os seus irmãos, o pão espiritual, o pão do espírito, que alimenta a alma, dando-lhe força para, escalando a montanha da evolução, conquistar a vida eterna.

            Nesse ato, igualmente, o cristão imitará o seu glorioso Mestre, que jamais partia o pão para distribui-lo com os que o cercavam, sem primeiro elevar o pensamento aos céus, numa prece de ação de graças ao Pai de infinito amor.

            A oração, porém, cumpre não o esquecer, é sentimento, é um como perfume santificador que se evola do coração. Não necessita, portanto, de fórmulas, de ritos, nem de exterioridades, como não reclama tal ou qual atitude, desde que o Espírito, dentro da sua prisão carnal, se encontre em atitude respeitosa, consciente da sublimidade do ato de orar, e isso quer em reuniões públicas quer na intimidade da criatura consigo mesma.

            O Cristo, que de contínuo preceituava a oração e a vigilância, nunca nenhuma forma de orar prescreveu, Antes, proscrevendo toda ritualística para esse ato de comunhão com os mais elevados planos da espiritualidade e com o Criador, recomendou aos seus discípulos: “quando orardes não useis de repetições desnecessárias, como fazem os gentios, que pensam que pelo muito falarem é que serão ouvidos.” (Mateus, 6: 7)

            A prece, não o esqueçamos, para que com efeito o seja, tem que ser, acima de tudo, uma demonstração de humildade real, virtude que resume toda a grandeza espiritual. Sejamos, pois, verdadeiramente humildes, ao menos quando orarmos, para que, perdoados da falta dessa virtude em quase todas as outras circunstâncias da nossa vida, possamos, como discípulos do seu Evangelho, aproximar-nos cada vez mais do meigo Rabi da Galileia.

Nem ritos, nem dogmas



Nem ritos, nem dogmas  
por Orvile Derby A. Dutra
Reformador (FEB) Maio 1941

            0 Espiritismo, cuja base inamovível é o Evangelho do divino Mestre, explicado e entendido segundo o espírito que vivifica e não segundo a letra que mata, não tem chefe entre os homens, não havendo, portanto, entre os espiritistas, superiores e inferiores, nem qualquer espécie de hierarquia.

            Seu chefe único é o Cristo, em face de cuja doutrina todos são iguais, como filhos de um mesmo Pai - Deus, o Criador do Universo. Uma só hierarquia se pode admitir entre eles: a que decorre do grau de progresso realizado, da maior ou menor soma de virtudes adquiridas. Hierarquia, pois, toda de ordem moral.

            Definindo, aliás, com precisão essa hierarquia, lá está no Evangelho: “Não queirais vós ser chamados mestres, porquanto um único mestre tendes e todos sois irmãos; um só doutor e um só mestre tendes: o Cristo”; e “aquele que for o maior entre vós será o vosso servo, porquanto o que se exaltar será humilhado e o que se humilhar será exaltado”. (Mateus, 23: 8-12) .

            Não admite ritos, nem dogmas, pois prescreve que seus adeptos se interessem pelo aperfeiçoamento de tudo, a todos assegurando ampla liberdade de pensar, de sorte que todos podem agir como melhor lhes pareça, guiados pela sua fé, pela sua convicção, pela sua consciência, certo, porém, cada um de que lhe cabe inteira a responsabilidade dos atos que praticar e das obras que realizar.

            Não prescreve juramentos, fiel ao ensino do Evangelho, onde se leem estas palavras de Jesus: “Eu, porém, vos digo que absolutamente não jureis; que o vosso falar seja: sim, sim; não, não". (Mateus, 23: 34 e 37).      

            Não autoriza, em absoluto, que, do que entenda com a sua doutrina, alguém se utilize por interesse, ou para auferir lucros pecuniários. Ao contrário, preceitua: “Dai de graça o que de graça recebestes”. Por mais pobre que seja o espírita, ainda que viva em extrema penúria, não lhe assiste o direito de envolver a doutrina nos seus interesses de ordem material. Cumpra ele os preceitos do Evangelho e tudo mais lhe será dado “por misericórdia e de acréscimo”.

            Para o espírita, não há céu, nem inferno, como determinados lugares de gozo e de sofrimento pois ele sabe, sem sombra de dúvida, que, se tais lugares existissem, Deus careceria de perfeição, de sabedoria, de Justiça e de misericórdia, uma vez que, em tal caso, reservaria os manjares celestiais para os fatos e potentados da Terra, privando de todo alimento espiritual, por toda a eternidade, os fracos e desgraçados de toda espécie, não lhes concedendo nenhum meio de melhorar-se, para também serem felizes um dia, quando estes últimos são precisamente os que mais necessitam do amparo da sua misericórdia, porquanto, conforme diz o Evangelho, “o médico não é para os que se acham sãos, mas para os doentes, que precisam de remédio”.

            Em vez do céu e do inferno das religiões dogmáticas, o Espiritismo proclama e demonstra a realidade da lei justa e misericordiosa da reencarnação, segundo a qual cada um é filho de suas próprias obras, cada um edifica o seu futuro e constrói a sua felicidade espiritual, pelos seus próprios esforços, mediante a purificação de seus sentimentos, a depuração de sua alma, para o que volta a tomar um corpo de carne na terra, quantas vezes forem necessárias, até que pague o último ceitil das suas dívidas, que são as transgressões da lei divina. (Mateus, 5. 26).

            Não legitima hinos, cânticos, músicas, nas reuniões dos crentes, porque não admite exterioridades ritualísticas, devendo a pompa de tais reuniões consistir na vibração viva dos pensamentos, a benefício de todas as criaturas, amigos ou inimigos, em obediência à lei suprema do amor a Deus e ao próximo. A única música para ele admissível é a que as preces fazem ressoar no infinito, de harmonia com as notas altas ou baixas do coro de gemidos e ais dos que sofrem mais ou menos angustiados, música essa cujo acorde mais vibrante é o da compaixão pelos que se comprazem na treva da ignorância de Deus e do seu amor, de um e outro divorciados. Como cântico, um só devem os crentes entoar, no recesso de seus corações, o de “Glória a Deus nas alturas e paz na Terra aos homens de boa vontade”.

            Por flores, só quer as que desabrocham na alma, com o perfume da gratidão de cada uma pelo bem recebido, ou pelo mal a que foi poupada. Por ornamentos, reclama apenas o das virtudes, a se exteriorizarem no trabalho edificante, na solidariedade a todos os seres, assim nas boas como nas más horas, na tolerância para com os que, à falta de virtudes, alimentam em seus espíritos vícios e paixões más, que geram os ódios e os desejos de vindita; aos quais manda o Evangelho se retribua com o – “Perdoa-lhes, Pai, que eles não sabem o que fazem”.

            Não legitima hinos, cânticos, músicas, nas res de pedra, porque só reconhece um templo digno do Criador: o universo por Ele criado, e por altar só um se compadece com os ensinamentos do seu Cristo: o do coração das suas criaturas, quando votado ao bem e ao progresso de tudo quanto naquele universo se contém e, particularmente, do que concerne ao orbe terráqueo, sem cabimento para distinção de raça, cor, credo, ou posição social. Nesse altar é que pontifica a consciência, esclarecida pela razão, que se curva reverente ao – “a cada um segundo as suas obras”.

            Também não autoriza existência de imagens, porquanto uma só imagem deve ter a criatura sempre presente à sua visão espiritual: a de um Deus onipotente, bom, justo e misericordioso, princípio e fim de todas as coisas, ponto culminante de toda a perfeição, ao qual chegarão um dia todos os seus filhos e que promulgou como lei suprema a do amor, cuja execução se afirma pela prática da caridade em todos os sentidos, sob todas as modalidades, em todos os terrenos, de todas as formas, sem que jamais “a mão direita saiba o que faz a esquerda”, o que quer dizer: sem eiva de vaidade, sem exibição, sem objetivar os aplausos ou louvores do mundo, pois a que assim é praticada tem nesses louvores e aplausos a sua recompensa, nenhuma outra podendo, nem devendo, além dessas, esperar os que só assim são caridosos.

            Tudo quanto deixamos dito ressalta das lições de N. S. Jesus Cristo, constantes do Evangelho em espírito e verdade. Uma só coisa, portanto, nos cabe a nós que desejamos ser espíritas, espíritas-cristãos: tudo envidarmos por cumprir o Evangelho segundo o espírito que vivifica, visto que só assim poderemos reconhecer em consciência que o Espiritismo nos tem sido útil e proveitoso, por nos haver aproximado do caminho que leva à perfeição moral.

domingo, 27 de agosto de 2017

Homenagens


Homenagens
Orvile Derby A. Dutra
Reformador (FEB) Janeiro 1941

 Desde sempre, a humanidade, por demonstrar sua gratidão, presta homenagens às criaturas, vivas ou mortas, que ela considera heroicas, altruísticas, abnegadas, eminentes pelo saber ou pela virtude.
É uma tradição que, passando de geração em geração, chegou até nós, continuando tais homenagens a ser tributadas quase diariamente.
Não somos radicalmente contrários a que também nós, os espíritas, rendamos homenagem aos que se distinguiram como trabalhadores no campo do Espiritismo. Precisamos, porém, ter muito em vista o modo por que as prestemos. Esse ponto reclama o máximo cuidado.
Gozando da felicidade de conhecer e professar a Doutrina do Cristo, a quem procuramos seguir pela prática do Evangelho segundo o espírito que vivifica e não segundo a letra que mata, esforçando-nos por espiritualizar tudo o que esteja ao nossa alcance, para que em tudo o espírito exerça predomínio sobre a matéria, devemos evitar, no máximo possível, as homenagens de cunho puramente terreno e material.
Muitas vezes, conhecendo de perto o esforço, o devotamente, a abnegação, o altruísmo, a renúncia, mesmo o espírito de sacrifício com que um irmão nosso há trabalhado, ou trabalha em prol da doutrina e, quiçá, a bem de seu próximo, sentimo-nos impelidos a dar-lhe um testemunho do nosso reconhecimento à maneira por que se consagrou à realização do ideal que a mesma doutrina consubstancia, mediante a exemplificação dos ensinamentos do nosso divino Mestre Jesus.
É natural que isso aconteça e não há como fugir a esse impulso de nossa alma, por quanto o reconhecimento, a gratidão são virtudes que devemos cultivar e demonstrar, sempre que for oportuno. Cumpre, no entanto, o façamos de modo todo espiritual, elevado, pois que as homenagens que dediquemos a um Espírito que, por exemplo, foi bondoso, dócil, caridoso e puro, ele só as poderá acolher de boamente, como um tributo de gratidão, se, além de sincero, esse tributo for puro, o que só acontecerá se se revestir de pura espiritualidade, sem o que quer que lhe imprima cunho de mundanismo, ou de simples exterioridade, capaz de gerar a suspeita de corresponder apenas à vaidade dos respectivos promotores.
É ainda comum darem-se a agremiações espíritas e a instituições de caridade nomes de pessoas que se impuseram pelo seu proceder e pelas suas obras a essa distinção. Já devíamos estar mais adiantados; mas, até certo ponto, essa maneira de agir se justifica, porque, mediante a exaltação do nome, se defere justa honra aos merecimentos daquele que o usou entre nós. Em se tratando, porém, de pessoa ainda viva, nenhum cabimento tem semelhante prática, nem de nenhuma forma pode justificar-se.
Vamos mais longe. Não nos parece justificável, absolutamente, que, numa agremiação espírita ou instituição de caridade, haja, no salão onde os crentes se reúnem tão só para cuidar de coisas exclusivamente espirituais, para orar, para estudar e meditar o Evangelho, ou para explanar os ensinamentos do Espiritismo; onde, pois, o ambiente material deve exprimir a máxima singeleza, a maior humildade, haja mais do que aquilo que seja estritamente indispensável à sua finalidade, como mesa, cadeiras ou bancos, estantes com livros, por serem estes veículos de instrução, elementos, portanto, de evolução e progresso.
As paredes, essas devem apresentar-se nuas, limpas, despidas de quaisquer ornatos, bem como de quadros, retratos e dizeres. Uma vez que os que ali vão levam apenas o intuito de entrar no conhecimento da Verdade, não se pode prescindir dessa singeleza, por isso mesmo que a Verdade, quando o é, de fato, sempre se mostra balda de ornamentos quaisquer.
Pode-se, de algum modo, aquilatar do progresso espiritual dos dirigentes e componentes de um núcleo de crentes, até mesmo de uma religião, pelo aspecto do recinto onde celebram suas reuniões. Quanto mais enfeitado, cheio de retratos ou imagens, de estatuetas e adornos se mostre esse recinto, tanto, mais longe da verdade e do Evangelho se revelam os seus frequentadores, pois que só os que ainda não puderam penetrar-se do espírito dos ensinos evangélicos procuram suprir-lhe a falta com exterioridades e coisas materiais.

Cumpre-nos, portanto, a nós espiritistas, envidar de continuo os maiores esforços por nos espiritualizarmos, dado que somente quando nos acharmos espiritualizados em tudo é que nos demonstraremos aptos para a compreensão e a prática do Evangelho, em o qual nada há que não seja essencialmente espiritual. É só assim poderemos ter a consciência de estarmos a caminho da perfeição.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

Sessões 'particulares'

Sessões ‘particulares”
Orvile Derby A. Dutra
Reformador (FEB) Fevereiro 1942

Dado que a doutrina espírita por ser a própria doutrina cristã, concede inteira liberdade aos seus adeptos, não tem ela hierarquia, nem ritos, nem dogmas.

Pela mesma razão, nenhum núcleo espírita que se preze de bem orientado impõe obrigação alguma a seus sócios e frequentadores, nada lhes exige com referência à doutrina, contando apenas com os esforços e a boa vontade e todos, de modo que, educando-se a si mesmos espontaneamente, trabalhem com denodo, levando seu apostolado tão alto, que chegue a abnegação. Oferece tudo   o que lhe está ao alcance, na convicção de que, cumprindo o Evangelho, tudo o mais virá de acréscimo e por misericórdia.

Os núcleos espíritas são de modo geral, bem orientados, têm à sua responsabilidade definida perante as leis do país e, ainda mais, perante as leis divinas, oficinas, que são, de trabalho constante, produzem sempre efeitos benéficos, quer na parte espiritual, quer a parte material. Seus guias, reconhecendo-lhes as responsabilidades, estão sempre vigilantes sobre labores, contribuindo poderosamente para que progridam. Neles, os estudos se fazem sempre luz dos Evangelhos, oferecendo, além do amparo do Alto, a vantagem de ser feitos em conjunto o que dá melhores resultados, do que estudos feitos isoladamente, sem o necessário ambiente espiritual. Dando de graça tudo o que de graça recebem, suas sessões se realizam à hora certa, porque, sendo uma coletividade de trabalhadores esforçados, quando falta o que costumeiramente dirige os trabalhos, outros, à altura de substitui-lo, acorrem, sem constrangimento e, colocando-se sob o mesmo amparo, colhem os mesmos resultados. Nos seus recintos só se trata de coisas de elevada moral, só interessando aquilo que pode beneficiar a outrem. Tanto assim que, dentro dessas instituições espíritas e do meio em que convivem os seus frequentadores a que saem e nascem essas obras de assistência social, espalhadas por todos os recantos do nosso grande Brasil, como frutos valiosos dos ensinamentos do Evangelho do Mestre Jesus.
           
Além disso, é dentro dos meios espíritas que se vem operando lenta, porém seguramente, transformação radical do homem velho em homem novo, a do materialista em espiritualista, bem como a reedificação de lares desmoronados, a conversão de muitas criaturas em benefício próprio e de outros.
           
Ao contrário, os que, por conveniência individual, isoladamente estudam e praticam a doutrina, não podem contar com tudo aquilo que oferecem os Centros e o êxito de suas sessões chamadas íntimas ou particulares, fica à mercê de múltiplas vicissitudes.  

Acreditamos que os que assim praticam fazem-no de boa fé, ou por ignorância e, também, que os Espíritos que se comunicam nesses meios são bem intencionados; acreditamos, ainda, que, a princípio, tais trabalhos produzem boas consequências porém, dada a familiaridade do meio e o não terem as pessoas que os frequentam conhecimento seguro da doutrina e fugirem outros, por conveniência e vergonha, de ir aos núcleos mais frequentados, logo surgem as perguntas pouco discretas, as consultas sobre questões materiais e assuntos de interesse secundário, que não de caridade e espiritualidade, perguntas que, atendendo às conveniências dos que as formulam e não da doutrina, nem dos Espíritos, versando quase sempre sobre coisas fúteis e banais, de engrandecimento pessoal, acabam todos desviando-se bom caminho.

Sendo raro que tenham horário certo para se iniciarem e encerrarem essas sessões, conquanto possa acontecer que as frequentem médiuns com bons serviços à Doutrina, portadores de apreciáveis dons mediúnicos e excelentes intenções, os guias, verificando pouco a pouco a inutilidade de seus esforços, se vão afastando e os Espíritos zombeteiros os vão substituindo dando comunicações que, aceitas sem análise, conduzem a um final desastroso, a um desfecho lamentável. A obsessão muitas vezes se apodera dos componentes e as consequências são tão dolorosas, que muito nos alongaríamos, se aqui houvéramos de apreciá-las.

É exato que os que revelam tais tendências demonstram precário conhecimento. da Doutrina codificada por Allan Kardec e, por isso, nada influem nas já densas fileiras formadas pelos núcleos espíritas, pois sabemos que a cada um é dado segundo suas obras. Entretanto, necessário se faz atraí-los e esclarece-los, para que, cada vez mais e mais depressa, todas as ovelhas formem um só rebanho, em torno do cajado do Pastor divino.