Bilhetes
por G. MIRIM (Antonio Wantuil) Reformador
(FEB) Janeiro 1944
O Catolicismo, na época em que realmente era orientado
evangélica e cristãmente, de acordo com as interpretações e usos dos que
privaram com o Senhor, quando não se havia constantinizado através da mediunidade
doentia do imperador romano, aliando-se aos césares e alimentando as fogueiras
humanas, o Catolicismo, dizíamos, era o puro Cristianismo, ou, seja, o
Espiritismo dos nossos dias, na sua mais alta expressão de amor, de caridade,
de sublimação.
As reuniões daquela época eram
perfeitamente iguais às do Espiritismo moderno, quer pela simplicidade, quer
pela humildade dos seus membros e quer, principalmente, pela completa abnegação
dos que dirigiam o movimento, cheios de entusiasmo, de fé e de absoluto desapego
pelos bens materiais que lhes pudessem oferecer o exercício dos seus cargos nos
templos.
A Igreja era então iluminada pelos Espíritos santos,
através de médiuns (profetas) inspirados, qual acontece hoje com o Espiritismo;
e os seus adeptos, cheios de sinceridade, eram consolados e protegidos pelas
mensagens e conselhos que lhes transmitiam os Espíritos familiares.
Há mil e novecentos anos, já existia
a obra - Livro do Pastor - escrita por Hermas, discípulo dos Apóstolos, a quem
S. Paulo mandou saudar em sua Epístola aos Romanos (XVI, 14). Essa tão notável
obra, publicada no ano 220, por ordem de Caio, era lida nas igrejas até o
século V e respeitosamente foi citada por S. Clemente de Alexandria e por
Orígenes, tendo mesmo figurado no antigo catálogo dos livros canônicos; era o
livro de orientação para os primeiros cristãos, recomendado aos crentes que se
reuniam para receber as comunicações dos chamados mortos. Assim escreveu
Hermas:
“O Espírito que vem da
parte de Deus é pacífico e humilde; afasta-se de toda malicia e de todo desejo
deste mundo e paira acima de todos os homens. Não responde a todos os que o
interrogam, nem às pessoas em particular, porque o Espírito que vem de Deus não
fala ao homem quando o homem quer, mas quando Deus o permite. Quando, pois, um
homem que tem um Espirito de Deus vem à assembleia dos fiéis, desde que se fez
a prece, o Espirito toma lugar nesse homem, que fala na assembleia como Deus o
quer."
“Reconhece-se,
ao contrário, o Espírito terrestre, frívolo, sem sabedoria e sem força, no que
se agita, se levanta e toma o primeiro lugar. É importuno, tagarela e não
profetiza sem remuneração. Um profeta de Deus não procede assim.”
Mais tarde, no começo do século V,
Santo Agostinho, bispo de Hipona, o mais célebre dos padres da Igreja latina,
autor de Cidade de Deus, Confissões e de outras obras
religiosas, prevendo, por intuição, que os seus sucessores proibiriam mais
tarde as comunicações com os mortos e que propalariam serem os demônios os comunicantes,
deixou registadas, em seu tratado De
cura pro mortuis, edição beneditina, tomo VI, col . 527, as seguintes
palavras:
“Os Espíritos dos
mortos podem ser enviados aos vivos; podem desvendar-lhes o futuro, cujo
conhecimento adquiriram, quer por outros Espíritos, quer pelos anjos, quer por
uma revelação divina.”
Mais recentemente, no século XVII, o cardeal Bona,
sábio prelado cognominado - o Fenelon da Itália, autor de inúmeras obras, entre
as quais - De principiis vitae christianae
e Da distinção dos Espíritos, assim
se declarou francamente, nesta última, quando o clero já iniciava o seu plano
de combate às comunicações com os mortos:
“Motivo
de estranheza é que se pudessem encontrar homens de bom senso que tenham ousado
negar em absoluto as aparições e comunicações das almas com os vivos, ou
atribuí-las a extravio da imaginação, ou, ainda, a artifícios dos demônios.”
Inúmeros seriam os autores e vultos que poderiam ser
citados como documentação não só da possibilidade, senão também do uso entre os
primeiros cristãos de se comunicarem com os chamados mortos, classificados de
anjos, quando superiores, e simplesmente de Espíritos, quando de criaturas
ainda apegadas à Terra.
O plano concebido pelos padres, para
acabarem com esse intercâmbio, nasceu do receio do que lhes poderia advir,
diante da preferência dos bons Espíritos pelas reuniões frequentadas por
pessoas de coração simples e completo afastamento daquelas que se realizavam
nas suntuosas sacristias das catedrais, onde certamente se apresentavam os
Espíritos das vítimas da santíssima Inquisição.
Como não lhes seria possível, porém,
negar a possibilidade das comunicações, porque elas sempre se deram e até
originaram canonizações; como não as podem negar atualmente, porquanto elas se
repetem hoje e cada vez em maior número e em todos os países e meios sociais,
lembraram-se do estratagema infantil, ridículo, contraproducente e ilógico, de
só aceitar as que se dão nos conventos, condenando todas as demais como
demoníacas e excomungando a quantos a elas se dediquem.
Felizmente, porém, os tempos são
chegados. No Brasil, país que eles apresentam ao mundo como sendo inteiramente
católico, setenta por cento da população já admite e recorre a essas
comunicações, utilizando-se dos milhares de centros espíritas existentes na
Terra de Santa-Cruz. Católicos e até padres recebem os nossos passes. Em nossos
hospitais para tratamento de obsessões, temos internado até clérigos
completamente loucos, atacados dessa loucura que os médicos materialistas não
conseguem debelar.
Alguns anos mais e o Brasil será
recristianizado (1), voltará a compreender o Cristo
como o faziam
seus primeiros seguidores.
Esperemos.
(1)
Do blog: A afirmação do Dr. Wantuil teria sido otimista? Ou referia-se ele a diferentes
contagens do tempo?