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sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Pedro Richard - peregrino do Evangelho - parte 3


Pedro Richard e sua esposa Dna. Mariana


Pedro Richard  – Peregrino do Evangelho
3
por  Indalício Mendes
Reformador (FEB) Julho 1977

Discípulo de Max

            Adolfo Bezerra de Menezes, exemplo de simplicidade e amor ao próximo, deixou na Terra extenso rastro de luz, com o seu sincero comportamento cristão. Até hoje esse rastro de luz serve de orientação para os que buscam o Cristianismo puro, sem atavios e exterioridades mundanas. O Bem é eterno, porque é fruto do amor. Um obreiro como Bezerra de Menezes, considerado, como justa homenagem à sua personalidade moral e à sua incomparável fidelidade aos deveres doutrinários - o Kardec Brasileiro, foi a bússola de Pedro Richard nos difíceis caminhos da peregrinação terrena.

            Sua admiração por Bezerra de Menezes transformou-o num fervoroso adepto dos Evangelhos, pois era neles que Pedro Richard buscava e encontrava os rumos que deveriam levá-lo à condição de discípulo humílimo, sim, mas consciente de suas responsabilidades perante Jesus. E por isso, sem a mais mínima intenção de vaidade ou orgulho, que nunca lhe entraram no coração, assinava seus escritos como "Discípulo de Max", pois Max era o pseudônimo de Bezerra de Menezes em "O Paiz", jornal austero, que desfrutava de enorme prestígio em sua época, onde colaborou intensamente, defendendo o Espiritismo e pregando a Doutrina espírita cristã. E esse "Discípulo de Max" foi, efetivamente, discípulo de Bezerra de Menezes, pois seguiu-lhe a trilha de humildade, amor ao próximo, caridade e de disseminador da paz.

            Ele, que tinha na prece o seu maior ponto de apoio, viu a mediunidade de cura desenvolver-se bastante em si mesmo, e isto a lhe permitir ser eficaz instrumento dos Espíritos que laboram incansavelmente na seara de Jesus, para aliviar os sofrimentos da humanidade.

Palavra mansa e firme

            Conhecedor, como poucos, dos Evangelhos e da Doutrina, Pedro Richard se impusera uma rigorosa disciplina de trabalho. Amigo da pontualidade, cioso dos deveres que lhe cabiam, estava sempre a postos, quer para colaborar voluntariamente na cura de um enfermo do corpo quer, pela palavra mansa e persuasiva, sempre firme, para socorrer os doentes da alma, os fracos de vontade, os tíbios e os tímidos.

            Muitas curas puderam ser alcançadas pelo Alto, através da sua mediunidade. Ao orar, sua voz assumia tonalidade comovente, principalmente quando se dirigia a Jesus e a Maria Santíssima. Quantas vezes, no curso da prece, as lágrimas lhe traíram a emoção e lhe percorreram as faces marcadas pelo tempo, mas assinaladas pela fé indestrutível. Sua força não era sua, dava a entender sempre, porque promanava da Espiritualidade. Por si só, não faria quanto fez, no apostolado mediúnico. Não era médium de se envaidecer com os resultados do seu trabalho. A humildade natural era-lhe barreira a qualquer sentimento que pudesse, ao de leve, ferir os princípios que recomendam aos médiuns a compreensão de que a mediunidade não é mais do que uma oportunidade para o trabalho de resgate que devem executar, por imposição de graves compromissos não satisfeitos no passado.

                                                                       Luz perene

            É necessário, de quando em quando, reviver os exemplos de espíritas que corresponderam à expectativa de Mais Alto. Há tantos nomes a reverenciar, não por mero culto ao personalismo, que isto não seria incumbência aceitável por quem pretende seguir a Doutrina, mas para a edificação e o escarmento das novas gerações de espíritas que devem louvar-se nos testemunhos incontestáveis desses humílimos e eficientes servidores de Jesus, a fim de não se desviarem da trilha certa que a luz dos Evangelhos aclara.

            Pedro Richard foi digno integrante da falange admirável que Jesus permitiu viesse à Terra, tendo luminares como Bezerra de Menezes, Bittencourt Sampaio, os irmãos Sayão, Fernandes Figueira, Romualdo Seixas, Geminiano Brazil, Maia de Lacerda, e tantos, tantos trabalhadores que fizeram jus ao salário divino, para assentarem os alicerces sólidos do Espiritismo Cristão. Não são as nossas palavras encomiásticas que vão valorizar a superioridade moral que esses homens eminentes construíram à custa de trabalho contínuo, sob a influência do Alto, dentro das normas dos Evangelhos e dos preceitos da Doutrina. Não. Eles estão muito acima do que possamos dizer para enaltecer-lhes o mérito. Todavia, não temos outro meio de destacar-lhes a obra, senão expandindo o sentimento de admiração e amor fraterno por tão ilustres predecessores, tão grandes perante nós, que nos confundimos com a poeira da estrada. Mas é imprescindível se diga algo do que eles fizeram, para que a conduta terrena que adotaram encoraje os que ainda não puderam experimentar o arrepio da emoção que causa a só referência a esses nomes dignos do nosso respeito e da nossa admiração, pelo que realizaram, pelo que foram e pelo que são, sem dúvida, nos iluminados caminhos do Além.

            Bittencourt Sampaio tem razão. Disse ele, numa das muitas mensagens que costuma dar no "Grupo Ismael":

            "O homem moralizado pelo Evangelho irradia de si mesmo o respeito que contém a distância a maldade humana e toda obra espírita que não tenda para essa finalidade não é obra espírita, uma vez que o Consolador não veio para ensinar somente ciência, mas ciência e moral" (sessão de 28-5-1941, médium J. Celani).

            No seu caminhar pelas sendas deste planeta, foi diuturna a semeadura que fez. Pode-se dizer que somente cessou quando a enfermidade o atingiu com a parada compulsória, determinante do retorno ao Além.

Obreiro de muitas obras

            Já dissemos que ele seguia um regime muito severo para consigo mesmo, pois porfiava no viver o Evangelho. Reconhecia as limitações humanas, sabia que a vigilância tem de ser de segundo a segundo, sem solução de continuidade, e que mesmo assim surgem hiatos traiçoeiros, perigosos como a ação do cupim, que silenciosamente realiza sua obra daninha.

            Companheiro de Bezerra, dos dois irmãos Sayão, de Maia de Lacerda, etc., primava por não ser jamais, em concerto de tamanha magnitude, nota dissonante. Substituiu o velho Sayão na direção do "Grupo Ismael". Alma mística, voltada para Deus, Jesus e Maria, transformava em ânimo e força de vontade a modéstia do seu comportamento. Não queria ser melhor do que ninguém, porém se esforçou a vida inteira para não estar entre os piores, escorado na fé e levando sempre consigo a lanterna cuja luz abençoada jamais se apaga: o Evangelho. Quando falava, parecia por nos lábios o coração. Sua palavra doutrinária tinha o poder de ficar na lembrança dos que o ouviam. Era a palavra simples do pregador que dá um recado, mas não se considera senão o transmissor da mensagem encorajadora. Nas reuniões públicas da Federação, ouvia-se lhe o verbo com a seiva da  verdade cristã. Recebera do Cristo a incumbência, dada a tantos, de ser um dos semeadores. Fazia-o sem nenhuma pretensão, mas com humildade, porque estava a serviço do Mestre, o que dava era d’Ele e os resultados que permitiriam a futura colheita também a Ele deveriam ser creditados.

            Passava horas e horas, na sede da FEB, atendendo aos que o procuravam, solicitando um auxílio, um conselho, um passe, uma prece ou uma receita. Problemas, os graves problemas de todos os dias da vida humana, eram-lhe levados diariamente, na esperança de uma solução salvadora, Pedro Richard , paciente e bondoso, vertia ternura, sempre reiterando serem devidos à misericórdia divina os benefícios que pudessem colher. Era apenas, dizia, como uma ponte, com a mediunidade que lhe fora concedida. Mas, do outro lado dessa ponte, estava Jesus, e d’Ele emanavam todas as bênçãos, todos os alívios, todos os esclarecimentos. Seu trabalho era intenso e excessivamente fatigante, mas sentia-se feliz. Mesmo em sua residência, na Rua Santa Alexandrina, 39, no Rio Comprido, dedicava todas as manhãs ao atendimento de necessitados da caridade do Mestre, dando receitas mediúnicas e até remédios, já dinamizados, tal como outrora se fazia na Federação. Auxiliava sua filha Felismina, preparando as doses medicamentosas.

            Richard tinha grande veneração por Maria Santíssima - como, aliás, Bezerra, Bittencourt Sampaio, Antônio Luiz Sayão, Guillon Ribeiro, Manuel Quintão, Wantuil de Freitas, etc. Ficava extasiado ao orar ao Espírito excelso, a quem se dirigia nas situações de maior gravidade, penetrado de contagiante e robusta fé e acendrado amor.

O testemunho de Quintão

            Em "Cinzas do meu cinzeiro", livro delicioso, escrito por Manuel Quintão, naquele seu estilo inimitável, dá ele comovente testemunho de dor, ao saber achar-se agonizante o grande amigo Pedro Richard:

            "Quando, à tarde desse 23 de outubro de 1918, regressamos exausto ao lar também improvisado em hospital familiar, disseram-me que alguém viera prevenir que o velho Richard estava agonizante, não passaria daquela noite. O conselheiro e melhor companheiro que já encontramos na vida, o maior amigo de Jesus Cristo que já se nos deparou na exemplificação evangélica - Pedro de nome e na fé - estava, efetivamente, a termo de peregrinação, longa e edificante. Não era a pandemia que o levava, era a enfermidade natural, que de há muito o vinha minando e lhe servira de pretexto a magníficas lições de humildade cristã.
            Assim o defrontamos, varonil e arquejante na sua cadeira de braços, pernas inchadas, inertes sobre almofadas e envolto num grosso xale escuro, que mais lhe destacava o semblante macilento.
            Ao avistar-me, sorriu, num sorriso luminoso de lábios contraídos... Mais que os lábios, contudo, falava-lhe o olhar translúcido. E logo nós:
            - Amigo, não viemos aqui orar por ti, mas contigo, a recordar o dia longínquo em que o fizeste pela primeira vez em nossa casa, e com lágrimas, por aquela filhinha que partia...
            E oramos, então, os dois, àquela Virgem que, dizia ele, nunca o deixara de mãos vazias e se lhe fizera, por isso, fanal único no tormentoso roteiro da vida de relação.
            Quando terminávamos a súplica, ó maravilha! - o companheiro com voz sumida e entrecortada pedia por nós, pelos que ficavam, bracejando nas trevas do mundo!
            E aquelas palavras, como que vindas de outro mundo, para vivificação deste mundo, ainda as oiço repetidamente: - obrigado... vai cumprir o teu dever...

*

            No dia seguinte, olhos enxutos e coração magoado, beijei-lhe no esquife enflorado as mãos frias e generosas... Sim, mãos que só se estendiam para suplicar, dar, abençoar..."

            Que belíssimo exemplo da alta evangelização que havia atingido Pedro Richard! As portas da passagem para o Além, ele orava, pedia, não para ele, mas pelos que ficavam na Terra, "bracejando nas trevas do mundo! Assim foi, realmente, Pedro Richard. Testemunha ocular de tantos fatos com ele relacionados, Manuel Quintão também deixou enorme bagagem de serviços ao Cristo, no campo do Espiritismo evangélico. O episódio a que Quintão se referiu acima, a respeito de sua filhinha Chicha, merece mais clara explanação. Nas páginas 372 e 373, do "Reformador" de 1.0 de dezembro de 1918, no artigo "In Memoriam", Manuel Quintão descreveu a angústia vivida ante a agonia de Maria das Dores (Chicha) , a quem amava profundamente. O estado da menina era gravíssimo, mas ele ainda alimentava a esperança de uma "ressurreição", de um "milagre". Mas nada mais seria possível, a não ser mesmo o "milagre". 

            Relembrando aquelas horas de aflição, diz ele, no artigo, ao amigo que partira:

            "O milagre, como o entendia eu no meu egoísmo cego, evaporou-se. A fé que abala montanhas não derroga leis de Soberana Justiça... Entretanto, o milagre qual o entendias se fez. Levaste ao lar aflito em alvorada de lágrimas um culto novo, e no afervoramento desse culto as nossas almas se compreenderam para sempre." Depreende-se dessas palavras do amoroso amigo Quintão que, graças a isso, o Espiritismo ficou no seu lar para sempre. Ele compreendera que as leis de Deus são inderrogáveis, razão pela qual o milagre só é possível quando não fere nem tenta ultrapassar essas leis. A quem conhece a Doutrina Espírita e já perlustrou as páginas luzentes do Evangelho, a justiça de Deus está presente em todos os instantes do viver humano. A desencarnação é um processo liberatório, porque restitui a alma ao meio de onde proviera, por imposição cármica. E Quintão, que de tudo isso já sabia, envolvera-se num imenso amor paternal. Mais tarde, em caso semelhante a que atendera, como médium, percebeu que a doente não sobreviveria à agonia cruciante, que representa o processo de desligamento moroso do Espírito: "Eu nunca vira uma agonia assim. Lembrei-me, porém, do velho Richard quando dizia: a prece é a alavanca da Fé, com que se escava a mina do céu"...

            Aí está a palavra de respeitável testemunha ocular do comportamento irrepreensível de Pedro Richard, testemunha que também deixou enorme bagagem de serviços ao Cristo, no campo do Espiritismo evangélico.

Trabalhadores da vinha...

            Foi com enorme emoção que nos dispusemos a escrever estas linhas sobre a personalidade cristã de Pedro Richard. Foi um exemplo. Justiça se faça, no entanto: ele acatava os demais trabalhadores da vinha do Senhor. Reconhecia que, fazendo cada qual sua tarefa, para um fim predeterminado; a obra progride mais depressa e com maior solidez. Todos cumpriam seu dever, porque todos sabiam que, embora na Terra, estavam empenhados numa obra de procedência divina. Companheiro de Bezerra de Menezes, que foi o seu paradigma, na marcha que encetara no Espiritismo, sempre timbrou de fazer o melhor que pudesse. Entretanto, boníssimo e tolerante, condescendente e compreensivo, era também enérgico quando necessário se tornava manifestar-se para conter um erro, sanar uma omissão ou impedir deficiências e excessos que pudessem de qualquer modo afetar a diretriz ou os créditos da Casa de Ismael. Era pronto no dizer "sim", mas era preciso e justo ao exclamar "não". Solidário e fraterno, não somente acudia aos seus compromissos, como ajudava, solicitado ou não, o companheiro que, por qualquer motivo, revelasse dificuldades. Tinha forte autoridade moral.

            Todos o queriam muito bem e nele confiavam, conhecedores da sua integridade de caráter e da sua firmeza de ação. A claridade de sua alma se refletia no brilho do seu olhar sereno.

Confraternização

            Por ocasião do Centenário do nascimento de Allan Kardec, em outubro de 1904, os espíritas não ocultavam a alegria de seus corações, pelo muito que todos deviam ao ilustre Codificador. Pedro Richard ofereceu em sua residência um jantar de confraternização, ao qual compareceram todos os representantes de entidades espíritas estaduais, além dos integrantes da Federação Espírita Brasileira. Foi um acontecimento de grande significação, de um lado porque exaltava a união dos espíritas, e, do outro, porque permitia que, em seu lar pleno de paz, pudessem os presentes expandir-se melhor em manifestações de regozijo porque, então, apesar das dificuldades, permutavam com o Alto as mais confortadoras vibrações de afeto e gratidão, não só a Deus e Jesus, como ao "primus inter pares" dos trabalhadores, que foi Allan Kardec.

A grande oficina

            Indiscutivelmente, a grande oficina de trabalho de Pedro Richard foi a Assistência aos Necessitados, sua "menina dos olhos", à qual dedicou por inteiro o seu amor. Foi ele o consolidador desse utilíssimo departamento da Casa de Ismael, quando se operou, a 25 de maio de 1902, num domingo, sua reorganização. Ali, defrontando obstáculos não pequenos, realizou ele uma das mais santificantes tarefas de sua existência.

            Embora o ano de 1904 fosse um dos mais fecundos que até então tivera a Federação, não lhe faltaram problemas criados à atividade no setor dos tratamentos mediúnicos. A repressão às práticas espíritas acossava a FEB, atendendo a dispositivos incompatíveis com o pensamento evangélico da caridade. Para se ter uma ideia ligeira do interesse popular pelos serviços gratuitos oferecidos pela FEB, basta rememorar que, em 1902, 20.549 pessoas procuraram a Assistência aos Necessitados e foram atendidas, enquanto que, em 1904, foram satisfeitas mais do dobro.

            Mesmo depois que passou a exercer outros cargos na FEB, como o de Tesoureiro, Pedro Richard não deixava de fortalecer a Assistência aos Necessitados com o seu apoio incondicional.





quarta-feira, 2 de novembro de 2011

73 (e final) Trabalhos do Grupo Ismael




73


SESSÃO DE 18 DE DEZEMBRO DE 1940


Terceira manifestação sonambúlica do mesmo Espírito que fora o visitante nas duas sessões procedentes.


Médium:    J. CELANI


            Espírito: - Que situação a minha! Nem lá, nem cá! Extraordinário!

            (Depois de longo silêncio)

            Bem extraordinário é o que se passa comigo! Quero volver ao seio dos meus e não os encontro; quero transpor a linha divisória  que separa os nossos campos para penetrar no vosso e não consigo!

            Reconhecer, sim, reconhecer o poder supremo situado fora do mundo terreno! Séculos e séculos perdidos, de tantas lutas, de tantas vigílias e elucubrações agora atiradas ao vento! O caos!... O nada!...

            (Dirigindo-se ao diretor dos trabalhos):

            Dizem-me uma coisa: qual base da tua fé?

            D. - O Evangelho, onde se acham consubstanciados os ensinos de Nosso Senhor Jesus Cristo, ensinos que constituíram objeto da gloriosa missão que Ele, o Messias prometido, desempenhou no seio da humanidade, para lhe servir perenemente de roteiro à salvação.

            E. - Sim. É’ um ponto de partida. O Evangelho, pelo vosso prisma, contém uma sabedoria diferente daquela que nós, em nosso Colégio, lhe reconhecíamos, noutros tempos.

            D. - É simples a razão da diferença: no teu colégio, a interpretação era segundo a letra que mata, enquanto que no nosso é segundo o espírito que vivifica, feita à luz de uma nova revelação, complementar da revelação cristã.

            E. - E segundo também o grau de inteligência. Mas, o que não compreendo é que não se permita, àquele que está prestes a entregar as armas, a volta à plenitude da sua mentalidade, para que possa coordenar, do seu ponto de vista, as ideias, a fim de chegar ao “eureca” que o oriente para o novo caminho a seguir. Essa a dúvida em que me debato.

            D. - Mas, depende unicamente de ti a sua dissipação. É preciso que te voltes para esse poder superior de que falavas há pouco, poder que exerce a sua ação incontrastável dentro e fora do mundo, no universo inteiro. Que poder será este, senão o de Deus, do Deus que Jesus Cristo revelou ao mundo como sendo o amor sem limites e a misericórdia infinita? Dirige-lhe súplice o teu pensamento e a treva da dúvida se dissipará e a tua inteligência culta se sentirá apta a reconhecer a sabedoria e a justiça que a tudo presidem e, consequentemente, a razão de ser lógica de todas as coisas, quer as que nos digam respeito individualmente, quer as que entendam com o todo, onde tudo é ordem e harmonia perfeitas. 

            E. - (Depois de algum tempo de silêncio): - O Evangelho do Cristo com o seu sermão da montanha é incompatível com a degradação da humanidade.

            D. - Não, tal incompatibilidade não existe e não pode existir, porquanto só no Evangelho encontrará a humanidade os meios de sair da degradação em que caiu e de elevar-se à meta de seus destinos. Tanto é assim, que lá estão no mesmo Evangelho estas palavras do Senhor: ‘’Das ovelhas que o Pai me confiou, nenhuma se perderá’’. Todas, portanto, qualquer que seja a degradação a que tenham descido, mais cedo ou mais tarde, despertarão, tocadas pelo amor potente do Pastor, e encetarão a obra da sua regeneração, que é a da evolução, do progresso que conduz a Deus.

            E. - Até mesmo os que chafurdaram nos mais hediondos crimes, rebelados contra as leis divinas?

            D. – Certamente, até esses. A afirmativa, que acabamos de lembrar, do divino Mestre é categórica, absoluta. A nenhuma exceção abre lugar.

            (Breve silêncio).

            E. - Para fazer-te compreender o meu estado, servir-me-ei de uma expressão corrente na linguagem do vosso mundo: Estou na terra de ninguém. A minha situação é esta: não consigo nem avançar para vós nem retroceder para os meus.

            D. - Insistimos em dizer-te: dirige ao Pai celestial o teu pensamento em prece. Abre-lhe o teu coração; manifesta-lhe com sinceridade o desejo de senti-lo; exprime-lhe, também com sinceridade, o teu pesar profundo de lhe haveres até hoje voltado costas e deixa que do teu íntimo se evole uma súplica de misericórdia. Ela virá, afirmo-te, porque Deus, para derrama-la em abundância sobre qualquer de seus filhos, só aguarda que este a implora com humilde e fé.

            E. - Sabes qual o meu erro?
           
            D. - O teu erro, de certo, foi e é o de todos nós pecadores: o darmos guarida em nossa alma ao orgulho e deixarmo-nos em seguida, escravizar por esse funestíssimo tirano.

            E. - Sim, é essa realmente a origem de todas as culpas em que incidem as criaturas... É o orgulho que leva o espírito ao nefasto erro de pretender criar alguma coisa e sobrepô-la, pelo seu poder, pela sua força, às leis que dominam, porque não universais e soberanas... Idealizei, na minha loucura, a criação de uma igreja dominadora, tendo sob o guante do seu poder todas as consciências. Imaginava que, assim, faria uma obra rápida de regeneração, embora empregando para isso todos os meios, quaisquer que fossem. Claro que, assim sendo, uma das armas principais de que nos utilizamos, eu e meus companheiros, era a violência sob todas as formas. Veio, afinal, a derrocada. Tudo orgulho, só orgulho.

            D. - De fato, meu amigo, o orgulho vai ao extremo de cegar completamente o Espírito. Se assim não fosse, tu, que conhecias o Evangelho do Cristo, terias ponderado que aquele jamais empregara a violência, que, ao contrário, a condenara sempre, como, aliás, não podia deixar de acontecer, visto que era portador de uma doutrina toda de amor, perdão, abnegação e renúncia, em cuja base se encontra a lei de liberdade em respeito ao livre arbítrio que Deus outorgou a todas as suas criaturas, para que elas tenham a responsabilidade e, portanto, o mérito ou o demérito de suas ações e obras. Terias refletido e reconhecido que nenhuma obra de regeneração poderias realizar, por processos opostos aos de que se serviu, exclusivamente, Aquele que é o Regenerador por excelência, uma vez que é o Salvador  da humanidade. Nem mesmo, porém, para a salvação, Ele violenta a quem quer que seja, como podes verificar, atentando no que ora se passa contigo.

            E. - Se soubéssemos, se conhecêssemos e pudéssemos manejar a força cujo domínio nesse momento sinto, então, sim, alguma coisa útil teríamos feito. Mas, para a conhecer e utilizar, faz-se mister uma base de que só um já dispôs neste mundo e na atmosfera espiritual que o circunda.

            (Breve silencio).

            É extraordinário! A minha punição consiste em manter-se entre vós e os meus. Ouço-lhes os apodos e as injúrias e nada posso fazer. Desejo buscar um pouco de paz no convívio destes outros que me cercam e não consigo. Se quisesse praticar nesse instante o mal, não o poderia. Igualmente não posso praticar o bem, porque não sei. Extraordinário tudo isto! Revela se me uma sabedoria superior a tudo o que eu cogitava. Convencido, de certo, estou agora de que essa força conduzirá o mundo à realização dos anelos dos corações bem formados! Pouco importa que essa obra seja da Igreja. Desde que a Igreja desvairadamente se submeteu ao império das paixões humanas, que outras mãos, outros convidados executem a obra! Mas, eu e meus companheiros, que será feito de nós?

            D. - Também sois, como o são todas as criaturas de Deus, convidados para o festim a que preside Jesus Cristo e no qual a iguaria incomparável é o pão da vida eterna, que Ele definiu e mostrou em que consiste, ensinando e exemplificando o amor ao Pai acima de tudo e ao próximo, e nesse festim, a que até agora não quisestes comparecer, tomareis parte, desde que vos dispuserdes a aceitar o convite e a revestir-vos dos trajes exigidos.

            E. – Mas, como, se nada sabemos fazer?

            D. - Procurando cumprir aquele mandamento, o mandamento do amor, que é a Lei suprema, aprendereis a fazer tudo o que agrada a Deus.

            E. – Essa força, a força inerente a essa Lei, quem lhe sente os efeitos, não há dúvida, em sendo sincero, não pode deixar de reconhece-la imanente, porque provém de um poder superior a todos os poderes, do poder de Deus. Mas, entende-lo, é o que é difícil.

            D. – Meu irmão, vê que não se trata de entender; trata-se de sentir. Pelo sentimento é que se chega ao conhecimento do que é essencialmente divino.

            E. – De fato, lá sua na Escritura, que só os limpos de coração verão a Deus! Extraordinário! Impossível vencer o cerco! Sois tenazes, devo confessa-lo... Loyola era um sábio portentoso. Sua escola produziu obras edificantes no mundo. Perdeu-o, porém a sua disciplina férrea, ocasionando fosse desvirtuada a finalidade do seu esforço.

            A renovação é um fato e, se a evolução é lei, a ação do homem deve ser maleável e acompanhar o progresso da inteligência. O que servia a Moisés não serviu para o Cristo e o que serviu ao Cristo tem que ser ampliado pelo Consolador. Sopram-me estas ideias e mais:

            O erro da Igreja está unicamente no seu conservantismo religioso, incompatível com o Cristianismo, que é evolução e progresso. Como se processará essa evolução? Pela ciência? Não. Faz-se necessária a preparação dos ensinamentos da cristandade, para que os cérebros se adaptem ao momento, à ciência, ao que é da vida, ao que o homem tem de adquirir pelo trabalho penoso da sua existência.

            (Dirigindo-se a um dos Guias do Grupo): - É belíssima a exposição que fazes dessas histórias. Então... Teremos que recomeçar do ponto em que a Igreja encostou os bordões dos peregrinos de antanho, para se aboletar nos carros dos falsos progressos mundanos! Teremos que volver à época dos Francisco de Assis, para restabelecer no mundo o espírito cristão, desvirtuados pelos falsos cristos e falsos profetas?

            Vou pensar em tudo isto. Seguirei o teu conselho de alertar a minha inteligência, para o exame e confronto das tuas e das minhas ideias.

            Da próxima vez, eu cantarei porventura, como queres, o hino de louvores ao Cristianismo redivivo. Não posso fazê-lo sem um cunho de sinceridade. Quero deixar aqui as armas da iniquidade para tomar nas lanças dos Anjos que proclamam a Verdade sem véus. Não estou certo?

            Então, meus... meus... irmãos condescendentes, até a vista.

            D. - Que Deus te ampare e N. S. Jesus Cristo te ilumine.

            E. - Obrigado.

*

Comunicação final, sonambúlica

            Prece de agradecimento à Virgem e súplica de proteção e iluminação aos que se sentam em torno da mesa de trabalho na oficina de Ismael. - Necessidade de melhorar sempre o labor. - Como consegui-lo . - A conquista de adeptos para o Espiritismo. - Pouquíssimos são, contudo, dentre eles os que o consideram pelo verdadeiro prisma. - Como procedem os que o encaram pelo prisma do sentimento e da renúncia. - O porquê da precariedade de obras espíritas duradouras. - O que são árvores que dão bons frutos. - Porque hão sido de lutas os anos de existência da Federação. - Como se tem ela saído dessa luta. - Roteiro que lhe é traçado: respeito a César e fidelidade de consciência às leis divinas. - Renovação da promessa de manifestar-se em breve no Grupo o seu glorioso patrono - Ismael.


Médium: J. CELANI


            Ave Maria cheia de graças! O Senhor é contigo, bendita és entre os Anjos, como bendito é Jesus, nosso Mestre e senhor.

            Senhora, quantas esmolas, quantas misericórdias descem sobre os coxos, por tua interseção! Vela por eles, Senhora, e dá-lhes a compreensão nítida de suas responsabilidades em torno desta mesa e perante a sociedade em cujo seio vivem.

            Que eles se compenetrem, Maria, de que são pregoeiros desse Evangelho de amor e de espiritualização, desse Evangelho regenerador, que faz ascendam as criaturas à salvação, pela renúncia, pela  caridade e pela humildade.

            Defende-os, Mãe piedosa, dos ódios do mundo material e do mundo espiritual. Livra-os dos inimigos da Luz e planta em seus corações uma semente pequenina daqueles sentimentos com que edificaste os discípulos de teu Filho, na hora  do Calvário.

            Dá aos pecadores do passado, aos apedrejadores do Salvador do mundo, as forças de que eles precisam  para lançarem fora de seus corações as pedras da iniquidade e para se redimirem pelo Evangelho do teu divino Jesus.

            Meus queridos companheiros, estou satisfeito e satisfeito estão todos os que constituem este Colégio de educação moral.

            Atentai, contudo, em que é necessário melhorar sempre o labor, redobrar de esforços, de vigilância e de cuidados. Não agasalheis todas as sugestões do Alto, repeli as que possam prejudicar a vossa tarefa. Atraí e guardai as que procedem do vosso Patrono, vindo de mais alto.

            Não é difícil, meus caros companheiros, fazer-se Espiritismo e conquistarem-se-lhe prosélitos. Há, entre seus adeptos, os que o abraçaram por entusiasmo, deslumbrados com a sua fenomenologia. Há outros que o aceitam empolgados pela beleza da sua filosofia. Pouquíssimos são, entretanto, os que o consideram  pelo verdadeiro prisma, sobe que ele deve ser visto: o do sentimento e da renúncia.

            Aquele porém, que o encara por essa face e se lhe filia, essa será fiel até o fim, porque segue a exemplificação do Mestre, que não hesitou ante o maior dos sacrifícios, para implantar no mundo o Cristianismo em espírito e verdade.

            Em testemunho do que afirmo, fala a própria historia, embora curta, da doutrina em vosso país. Quantas as obras duradouras por ela inspiradas? São raríssimas.

            Os centros se organizam e desorganizam. Porque? Por que, em sua grande maioria, eles se constituem, como já tive ocasião de dizer, em torno de pessoas, donde decorre serem trabalhados e desmantelados pelo que denominais ‘’política pessoal’’.

            Os que, no entanto, se constituam procurando vivificar-se no espírito do Cristo de Deus, moldados pelo seu código de amor os respectivos Estatutos, esses serão arvores de bons frutos, que não se verão cortados e levadas ao fogo.

            Eis porque a Federação conta os anos de sua existência por anos de lutas, das quais, entretanto, há saído sempre mais respeitada e conceituada. Esse conceito, porém, meus companheiros, deve ser zelosamente mantido e, se possível, valorizado, para que ela encontre cada vez mais facilidade no desempenho da sua tarefa. Nada de antecipar-se à evolução natural das coisas. Vigilância sobre as medidas a serem tomadas, as quais precisam passar todas pelo cadinho da razão esclarecida pela doutrina.

            Respeito a César, nas relações como o mundo profano; fidelidade de consciência às leis divinas codificadas no Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo: eis o roteiro seguro para levar a bom porto a barca de Ismael.

            Creio poder em breve cumprir a minha promessa, feita, aliás, com a sua autorização:  a da vinda desse Anjo glorioso até vós, como estimulo para os vossos trabalhos e conforto para os vossos Espíritos.

            Paz fique convosco, em nome do Mestre divino. – Bittencourt.



Fim


domingo, 26 de junho de 2011

48 Trabalhos do Grupo Ismael



48

SESSÃO DE 8 DE MAIO DE 1940

Manifestação sonambúlica

             Primeiro de um Espírito de pujante inteligência e vasta cultura, ex sacerdote da Igreja de Roma, em cujo seio fora como ele próprio o declarou, um dos maiorais da Inquisição e que conservando-se fiel à sua organização político-religiosa, trabalhou, durante séculos, pelo seu crescente poderio, à frente de falanges numerosíssimas de outros Espíritos. Desde o advento da Terceira Revelação, tornando-se, por isso mesmo, perseguidor tenaz e implacável da Doutrina Espírita a e de todos os seus profitentes, dos médiuns, sobretudo, que vinham a encontrar-se no âmbito da ação maléfica  que desenvolvia contra todos os que ele arrolava como hereges por insubmissos ao catolicismo romano. Para se fazer ideia da sua pertinácia na perseguição aos que se forravam ao jugo romanista, bastará dizer que, como se verá da comunicação final dada na mesma sessão, há vinte anos ele se manifestou diversas vezes no “ Ismael”’, como um dos mais terríveis perseguidores do médium Ulysses, ali se empunhando em debates doutrinários com Pedro Richard, que presidia ao Grupo e que, persistindo no espaço em seus propósitos caridosos, conseguiu afinal modificar-lhe as ideias e os sentimentos, conforme adiante se verificará. Esta sua primeira manifestação agora ocorreu depois de haver-se estudado, pelo Evangelho de João, a ‘’ressurreição de Lazaro’’, tendo alguns dos membros do Grupo explanado o texto evangélico, no sentido de demonstrarem que deste se evidência que não houve, no episódio em apreço, o a que vulgarmente se chama ‘’ressurreição’’, conforme o ensina a Igreja, nem, portanto, ‘’milagre’’, que, de fato não pode existir, porque as leis divinas são imutáveis e eternas, como o próprio Deus, que nelas está.
                Concluindo o estudo, eis se manifesta o Espírito a que nos referimos, dizendo:


            Espírito. -  Vocês não perdem vasa para demolir a Igreja, para lhe menoscabar a ação, sem compreenderem os fins dessa ação. Podeis afirmar que as massas ignorantes compreenderiam a ressurreição de Lazaro sem a interferência do milagre, tal como os vossos livros ensinam e vós aceitais,conforme estivestes comentando?
            Há, na Igreja de Roma, sacerdotes que compreendem o alcance e a sutileza das lições do Cristo; entretanto, como Ele o fez na sua missão evangelizadora, a Igreja projeta sobre a inteligência das massas a luz, mas graduando-a, para que elas não se deslumbrem e descreiam das afirmações religiosas e salvadoras.
            De fato como afirmais, as leis divinas não são arbitrárias. O sacerdote esclarecido não desmente esta verdade, porque negaria a sua própria evolução intelectual. Se as leis fossem arbitrárias, o mundo seria um caos inabitável.
            Faz-se necessário, pois, compreender a obra da Igreja e distinguir o mau sacerdote do sacerdote consciente, que apenas cala suas ideias em respeito à disciplina a que se submeteu.
            Sem ser um adepto da vossa crença, sem ser um combatente pela implantação de quaisquer ideias na consciência dos meus irmãos, aqui compareço assiduamente  para ouvir os vossos debates e as instruções dos vossos mentores. Contudo, sem ser um sectarista, no verdadeiro sentido da palavra,ainda permaneço mais nos arraiais do Catolicismo do que nos vossos, porque muitas coisas ainda são para mim obscuras no contexto da vossa doutrina.
            Não compreendo, por exemplo, a limitação do poder de Deus. Ouvi, há pouco, de um de vós, uma explicação que produziu dúvida no meu entendimento, sendo essa a razão por que venho tomar o vosso tempo precioso, quando aguardáveis palavra mais autorizada do que a de um simples ex clérigo. Deus é a lei em si mesma, dissestes. Se Deus é a lei, quem fez a lei? Poderei merecer a esmola de uma explicação vossa?

            (O diretor dos trabalhos tece breves considerações, mostrando ao visitante que os espíritas não cogitam de demolir coisa alguma, porquanto o Espiritismo, em o qual ressurge o Cristianismo do Cristo, é essencial e exclusivamente construtivo; que perguntar quem fez a lei, por ter ouvido que Deus é a própria lei, equivale a perguntar quem fez ou criou Deus; que, sendo Deus o absoluto e existindo desde toda a eternidade, uma vez Ele é o legislador, a lei evidentemente existe de toda eternidade: que, por outro lado, sendo Deus infinito em si mesmo e em todos os seus atributos,  não pode ser compreendido, nem, ainda menos, definido por inteligências finitas e ainda limitadíssimas como as nossas; que só podemos  compreender Deus sentindo-o, conforme melhor lhe explicariam aqueles mentores a quem o visitante pouco antes se referira. Quando á graduação da luz para massas ignorantes, pondera, porque há de a Igreja pretender sobrepor-se ao Cristo, que é a fonte mesma donde jorra a luz que ilumina as almas? Quem, melhor do que Ele, que preside á marcha  evolutiva da humanidade terrena, pode saber quando devem ser intensificadas  as irradiações da luz dos seus ensinos para aclaração do entendimento e da consciência humana?  Menos ainda se pode compreender que aqueles que o tem como sendo o próprio Deus e que não compreendem quaisquer limitações ao poder de Deus, entendam de limitar esse poder, no que concerne à ampliação das Verdades que as criaturas precisam conhecer e sentir, segundo as necessidades do seu progresso, da sua evolução, necessidades da qual somente Ele pode ser juiz).

            Espírito . – O erro da Igreja não está propriamente na sua doutrina, mas no afastar-se ela dessa doutrina. A Igreja devera ser espiritual, para atuar espiritualmente na consciência das criaturas, tanto das paupérrimas, como das opulentas.
          Mas, a sua disciplina é necessária, tão necessária que a cada passo tropeçais na vossa obra
pela indisciplina dos vossos núcleos.
           
            Diretor. – Sim, a disciplina é necessária e nós a queremos; porém, não a disciplina compulsória, imposta pela violência. Queremo-la espontânea, para ser consciente, como a queria o Cristo, que nada impunha a ninguém; que apenas disciplinava pela exemplificação dos seus ensinos.

            Espírito .- Saberás que alguns dos que por aqui têm passado  e assistido aos vossos trabalhos se esforçam pela unificação do Catolicismo com o Espiritismo? E sabeis qual o maior campeão dessa obra?

            Diretor. – Penso saber, bem como os meus companheiros.

            Espírito . – Como quer que seja,  não estou autorizado a revelar-lhe o nome. A obra, entretanto, não é fácil. Eu aqui venho de há muito; mas apesar de haver modificado os meus sentimentos e ideias, ainda não comungo perfeitamente convosco. Compreendo que é necessária a reforma da igreja, porém não a sua derrocada.

            (O diretor observa que assim também o entendem todos os que se reúnem na Oficina de Ismael,certos de que a reforma da Igreja virá como efeito de evolução natural, porque assim é que ela se operará na conformidade das leis divinas.)

            Espírito. – Não é, contudo, geral esse modo de pensar entre os vossos companheiros e colaboradores. Tendes razão quando lembrais que o Cristo disse: quem não é contra mim é por mim. Mas, por isso mesmo, precisais distinguir o mau do verdadeiro sacerdote, assim como eu comparo, analiso e separo. Enquanto falavas e eu recolhido te escutava, ouvi do Alto, esta advertência: Se Deus é amor, contenta-te com essa explicação, porquanto, para a compreensão maior, é necessária a evolução,sem a qual nem o homens, nem os Espíritos adiantados jamais a teriam alcançado.
            A compreensão se vai dilatando e acelerando. À medida que o ser atinge um mais alto grau de moral,mais domina os conhecimentos científicos. Diz ainda o amigo que tenho a meu lado: não te apresses, não podes ir além do ponto, que os teus merecimentos te assinaram. Tem confiança e espera. Estas coisas,que são bens do Espírito, nenhum as pode adquirir de improviso, pois que, segundo a palavra evangélica,não se dão perolas a porcos.
            Estou satisfeito e confortado.

            (Breve silêncio)

            Aqui vim pela primeira vez e falei, há mais de 20 anos. Sentava-se ai onde estás o velhinho
cujas lágrimas muito concorreram para beneficiar o meu Espírito.
            Temos trocado ideias muitas vezes. E’ um campeão do Evangelho. Seu coração é um sacrário de sentimentos e é o seu coração que tem modificado o meu estado de alma. A par do ensino cristão, ele distribui o alimento do espírito. E’ um verdadeiro sacerdote.
            Agora me vou, porque ele vos quer dizer duas palavras.

*

Comunicação final,  sonambúlica


            Quem era o espírito que acabava de manifestar –se.- Debates com ele travados há vinte anos.- Disposições que inspiraram ao médium, mas que este não pode por em execução. - Abstração dos cuidados da vida material nos trabalhos do grupo.

Médium: J. CELANI


            Meus companheiros, paz e bendito seja o Cordeiro de Deus.
            Podeis dizer que ganhastes o vosso dia, não pelas palavras que ouvistes, mas pelos efeitos produzidos deste lado.
            E’ um velho combatente da Igreja, este que acaba de visitar-vos. Por muitos anos aqui esteve na estacada.
            O nosso Ulysses foi uma vitima sua, mas muito concorreu, pela mediunidade que possui, para o estado em que ele ora se encontra.
            Durante muitas sessões, aqui nos debatemos, ele arrimado nos seus conhecimentos, eu nas asas do meu Matias[1], graças a quem consegui tocar-lhe o coração. O merecimento, no entanto, se houve, foi coletivo.
Ainda aqui comparecem muitos dos que dessas sessões participaram.
            Quero, porém, fazer ressaltar, para vossa meditação, um fato que esta manifestação sugere: é que o médium vinha com o propósito de falar-te (ao diretor) sobre a disposição em que estava de abster-se desta tarefa, para a qual se julga incapaz. Mas, não teve ânimo, ou não pode.
            Meus companheiros, abstraí-vos de tudo o que pertence à vossa vida material, quando aqui penetrardes. Tornai de todo cristãos os vossos pensamentos e sentimentos, para  que os servos de Deus possam ressuscitar os lázaros morais do vosso ambiente, de modo que entre vós se faça o que fazia  o Cristo entre as multidões.
            É preciso compreendais a necessidade de separar completamente o que é do mundo exterior
 do que toca à vossa tarefa, quando aqui vos reunirdes.
            Eis o que tinha para dizer-vos hoje e permita o Criador que eu possa levar por diante o meu desejo,que é de produzir alguma coisa neste Grupo, do qual o meu Espírito recebeu muitas das graças que hoje o felicitam.
            Que a Virgem, a consoladora dos aflitos, não se esqueça do servo que se esforça por lhe reverenciar o Espírito excelso. Permita Ela que eu complete a educação do instrumento de que me sirvo, para que dado me seja cumprir a minha promessa. Que Ela vos acompanhe aos vossos lares e vos fortaleça o espírito para a continuação da nossa tarefa. São estes os meus votos. Deus vos abençoe. – Pedro. (Richard)




47 Trabalhos do Grupo Ismael


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SESSÃO DE 24 DE ABRIL DE 1940

Comunicação final, sonambúlica


Evidenciação das infrações praticadas pelas gerações através dos tempos.– A cegueira do homem e obscuridade do seu roteiro. – Quanto mais ódio, mais sofrimento.  – Nadas que os pequeninos percebem e que os que se jactam de muito saber não vêem. – Falta de assimilação da parábola do homem rico.– Identidade da luta nos dois planos.
– Recíproca repercussão das paixões.– Os mais atingidos pelos golpes da treva. – Porque assim acontece.
– Suposição espantosa dos inimigos do Cristo.– Os que se acoitam nos desvãos do infinito.- Súplica pelos que mais provados são nesta hora.


Médium: J. CELANI



            Meus companheiros, Paz.
            À medida que os acontecimentos se desenvolvem no cenário do vosso mundo, mais nítidas se apresentam, aos olhos dos estudiosos do Evangelho de Jesus Cristo em espírito e verdade, as infrações praticadas pelas gerações através dos tempos.
            E a cegueira é tanta, tão obscuro o roteiro para o homem envolvido na materialidade, que ele não vê  que o crime não pode remover as causas de outros crimes. Não vê que quanto mais o ódio se lhe acumula no íntimo maiores dores o atormentam.
            Parece incrível, é incompreensível que criaturas que se jactam de haver atingido alto grau de evolução cientifica não percebam os pequeninos nadas que estão ao alcance dos pobres de espírito, daqueles que ocupam o seu tempo em interpretar as sutilizas das palavras do Cristo de Deus, as suas exortações às criaturas que o buscavam e àquelas que no transcurso dos tempos haviam de busca-lo, ansiosas de conforto e esperança.
            Parece incrível que essas inteligências não percebam a necessidade de abolir as fronteiras, derribando os marcos separatistas que dividem o universo criado para a humanidade, para os filhos de Deus, a fim de que realizarem seu progresso e a conquista da felicidade.
            Parece incrível que não assimilem a parábola do homem rico e não sintam a necessidade de tomar cada um a sua cruz e procurar seguir o caminho do Cristo, para que possam todos entender a maneira de encontrar a paz, o conforto material e o conforto espiritual.
            Essas mesmas lutas de que tendes noticia e que ai se desenrolam também aqui se travam.  As paixões dos homens repercutem aqui e as dos Espíritos libertos da carne ai repercutem, porque há perfeita comunhão entre os homens e os Espíritos.
            Os que servem à treva empolgam os homens que se comprazem na cegueira e no cultivo das paixões; os que servem ao Cristo procuram os despertos, os que já compreendem a necessidade de renunciar às mazelas do mundo, a fim de conseguirem colaborar verdadeiramente para o progresso da humanidade terrena.
            E essa luta, meus companheiros, não tem tréguas: é de todas as horas, de todos os momentos.
            Aqueles dentre vós que mais se esforcem por viver uma nova vida  são os mais atingidos, os mais duramente atingidos. Eis porque a família espírita é agitada de quando em quando por acontecimentos que vos entristecem. São os açoites dos contrários, que não escolhem armas, nem meios para conseguir seus fins.
            Eles sabem que é certa a derrota, porque contemplam estarrecidos a deserção dos seus companheiros, os esculcas que são mandados para o trabalho de sondagem, poderei mesmo dizer: de colheita de elementos sobre labores das hostes do Cristo, e que não lhes voltam às fileiras. Mau presságio para eles, pois sentem que esses tais encontraram  do lado de cá melhor aconchego para sua almas aflitas e sofredoras. Daí a compreenderem o que virá não é problema difícil  às suas inteligências aquinhoadas com cabedais de saber acumulado em muitos séculos.
            Pressentem, portanto, a derrocada e redobram de energias para ferir em cheio os que eles supõem ser os esteios do Cristo na Terra. Quanta cegueira! Acharem que homens pecadores possam servir de fundamento à edificação do templo da luz e do amor!
            Mas, chegar-lhes-á  também a vez. Preparemos os instrumentos, a fim de que possamos trazer os que se acoitam nos desvãos do Infinito, para não se traírem, manifestando-se ostensivamente entre os homens.
            Para esses, fazem-se mister médiuns preparados, de moral segura e com os cabedais necessários ao desenvolvimento de um trabalho útil e proveitoso a eles e a vós.
            Quando alcançarmos esse ponto, virá o Cristo tira-los do túmulo da cegueira e da miséria a redimi-los para glória do nosso Criador e pai.
            Meus companheiros, cumprimos o nosso dever. Guardemos a nossa esmola de hoje. Elevemos os nossos corações ao sólio sacratíssimo do Divino Mestre, numa prece pela humanidade, pelos que sofrem os horrores da maldade humana.
            Que Ele suavize estas horas reparadoras e se compadeça dessas criaturas que já não têm lágrimas para chorar as suas dores e nem sabem o que seja uma alegria, ou um sorriso, despreocupado. Peçamos pelas criancinhas abandonadas, pelos velhos sem abrigo e sem esperanças, porque no íntimo lhes morreu a crença de sua religiões. Peçamos por todos e pela família espírita, para que se unifique em torno de N. S. Jesus Cristo, pois que grande é a tarefa, vasto o campo, mas poucos  os trabalhadores. Por último, roguemos à Virgem que purifique com a sua caridade a nossa prece a Jesus, a fim de que possa subir até ao trono de sua gloria.
            Paz, meus caros companheiros. Que o amor da Virgem vos acompanhe aos vossos lares e vos abençoe. – Richard.