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terça-feira, 4 de agosto de 2015

Kardec e Roustaing


              Estudiosos há do Espiritismo que relutam em aceitar, ou não aceitam mesmo, a revelação do corpo fluídico de Jesus, sob a alegação de não haver ela merecido a aprovação de Kardec e, por isso, desprezam, sem maiores considerações, toda a obra magistral publicada por Roustaing, contendo a explicação dos Evangelhos, capítulo por capítulo, versículo por versículo.

            Embora transmitido do Alto, mercê da extraordinária mediunidade da Senhora Collignon, compreenderíamos fossem os ensinamentos rejeitados, mas por quem, após leitura atenta, e sem ideia preconcebida, de “Espiritismo Cristão ou Revelação da Revelação”, houvesse meditado e concluído, por si mesmo, que eram inadmissíveis as teses ali expostas.

            Pretender-se, porém, que os conceitos divulgados por J. B. Roustaing devem ser condenados porque Kardec não os sancionou é algo tão diferente que permite supor não haja sido a questão convenientemente estudada pelos que assim argumentam. De início, não esqueçamos que se o Codificador não aprovou a obra, muito menos a reprovou e já agora, pouco mais de um século decorrido, seria tempo de se por fim a mal entendidos e a uma diferença mantida, sobretudo, por quem parece se mostrar mais “kardecista” do que Kardec!

            São conhecidas as circunstâncias excepcionais, dignas de reflexão, em que Jean-Baptiste Roustaing, homem de grande projeção - bastonário que era da Corte Imperial de Bordeaux ao tempo de Napoleão III - veio a conhecer a Senhora Collignon, em dezembro de 1861, e receber, oito dias depois, a mensagem por ela psicografada, e assinada por “Mateus, Marcos, Lucas e João, assistidos pelos Apóstolos”, incitando-os a empreender a explicação dos Evangelhos “em espírito e verdade”, explicação que, dizia-o a mensagem, “preparará a unificação das crenças entre os homens”.

            E por que essas crenças, pelo menos no meio espírita, não se unificaram até hoje, como seria lícito esperar? Talvez um dos motivos provenha do fato de não haverem muitos dos que combatem Roustaing lido a obra, inteira, atenta e imparcialmente, limitando-se a folheá-Ia sem passarem, quiçá, dos capítulos iniciais do primeiro tomo!

            Kardec, todavia, sempre advertiu que nada devemos aceitar ou rejeitar senão depois de bem conhecermos e de bem havermos estudado aquilo que estivermos aceitando ou rejeitando.

            Outro motivo, em muitos casos, terá sido o desconhecimento do verdadeiro juízo do Codificador a respeito dessa extraordinária obra mediúnica. E qual foi esse juízo? Publicada em 1866, Roustaing dela ofereceu um exemplar a Allan Kardec que, em junho de 1867, na “Revue Spirite”, disse entre outras coisas:

            "Esta obra compreende a explicação e a interpretação dos Evangelhos, artigo por artigo, com o auxilio de comunicações ditadas pelos Espíritos. É um trabalho considerável e que tem para os espíritas o mérito de não estar em contradição, por qualquer de suas partes, com a doutrina ensinada no Livro dos Espíritos e no dos Médiuns.” (Os grifos são nossos).

            Portanto, é Kardec quem o afirma com a sua autoridade: a obra é meritória e em nada contradiz a doutrina por ele codificada! Pouco adiante, aludindo ao fato de haver a obra tratado de questões que ele não havia ainda julgado oportuno abordar, diz Kardec:

            "O autor desta nova obra julgou dever seguir outra orientação: em lugar de proceder gradativamente, quis de um salto atingir o fim. Assim é que tratou de certas questões que ainda não julgáramos oportuno abordar e a respeito das quais, portanto, lhe deixamos a responsabilidade, assim como aos Espíritos que as comentaram. Consequente com o nosso princípio, que consiste em regular a nossa marcha pelo desenvolvimento da opinião, não daremos, até nova ordem, a essas teorias, nem aprovação, nem desaprovação, confiando ao tempo o encargo de as sancionar ou contraditar. Convém, pois, considerar tais explicações como opiniões pessoais dos Espíritos que as formularam, opiniões que podem ser justas ou falsas, que, em todo caso, precisam da sanção, da apreciação universal e, até confirmação mais ampla, não devem ser tidas como parte integrante da doutrina espírita.” (Os grifos são nossos).

            Eis aí o juízo do Codificador do Espiritismo sobre a obra publicada por Roustaing, juizo que, infelizmente, tem sido muito esquecido! Ainda uma vez, Allan Kardec, chamado por Camille Flammarion “o bom senso encarnado”, dá prova de sua prudência. A Doutrina estava incipiente e tenazmente combatida, especialmente na França, onde o Clero sempre exerceu considerável influência. Necessário era, portanto, agir com cautela, nada afirmando, nada avançando que não pudesse resistir aos ataques bem urdidos que logo surgiriam. Ele próprio o disse, ao explicar porque, em “O Evangelho segundo o Espiritismo”, circunscreveu-se “às máximas morais que, com raras exceções, são geralmente claras” e não poderiam, por isso, ser interpretadas de maneiras diversas:

            "Essa a razão que nos levou a começar por aí, a fim de sermos aceito sem contestação, aguardando, relativamente ao "mais, que a opinião geral se encontrasse familiarizada com a ideia espírita." (O grifo é nosso).

            Eis por que, sem dúvida, Allan Kardec, precisando agir cuidadosa e gradativamente, pensava não haver ainda chegado o momento de abordar certas questões divulgadas por Roustaing, o qual, segundo ele, “quis de um salto atingir o fim”. Pela forma por que se expressou, Kardec deixa supor que estava reservando “para o fim” o estudo de certos  princípios tratados em “Espiritismo Cristão ou Revelação da Revelação”, entre eles o do corpo fluídico de Jesus, e, em nota ao item 65 do Capítulo XV de “A Gênese”, último livro que publicou, reforça essa suposição.

            Ora, deve ter sido, precisamente, esse “salto” que levou Bezerra de Menezes, então Presidente da Federação Espírita Brasileira, a escrever, após haver durante 14 anos estudado a obra publicada por Roustaing:

            "Roustaing confirma o que ensina AIlan Kardec, porém adianta mais que este, pela razão que já foi exposta acima. É, pois, um livro precioso e sagrado o de Roustaing", e a fazer publicar em “Reformador”, a partir de 15 de janeiro de 1898, a sua primeira tradução para o nosso idioma, de autoria do Marechal Francisco Raimundo Ewerton Quadros, que foi também o primeiro Presidente da Federação.

            Em verdade, qual a responsabilidade de Roustaing em querer de um salto atingir o fim? Nenhuma, pois agiu sempre e em tudo de acordo com as instruções dos Espíritos que ditaram a obra! Pode-se duvidar, do caráter mediúnico dessa obra? Kardec jamais teve dúvidas a respeito, pois, nos, trechos retro transcritos, por três vezes ele sanciona esse caráter: a primeira, quando diz que ela foi escrita “com o auxílio de comunicações ditadas pelos Espíritos”; a segunda, quando deixa a responsabilidade das questões abordadas a Roustaing, “assim como aos Espíritos que as comentaram”; a terceira, e de forma irretorquível, quando considera as explicações “como opiniões pessoais dos Espíritos que as formularam”.

            E pode-se, de outro modo, duvidar da autenticidade desses Espíritos? Tampouco, tal a sublimidade de sua linguagem, a manifestação inequívoca de seu total conhecimento dos textos evangélicos, dos acontecimentos, dos lugares, dos personagens, de tudo, enfim, relacionado com a passagem do Mestre pelo nosso planeta e, sobretudo, a excelsitude dos ensinamentos ministrados e o incomensurável conteúdo moral das revelações.

            De duas, uma: ou a obra é mediúnica ou não o é! Acreditamos que a segunda hipótese é por todos repelida, pois ninguém, em sã consciência, poderá admitir que um homem da estatura moral de Jean-Baptiste Roustaing se houvesse prestado a farsa tão grosseira ou que a Senhora Collignon fosse capaz, anos a fio, de iludir a boa fé de um dos mais ilustres advogados da Corte Imperial de Bordeaux, escrevendo diante dele vastíssimo trabalho de sabedoria imensa, muitas vezes superior aos seus conhecimentos e de conceitos morais tão elevados que conflitam com qualquer ideia de fraude! E, certamente, por isso mesmo, Kardec nem de leve admitiu a hipótese, logo sancionando o caráter mediúnico da obra.

            Assim sendo, poder-se-á admitir que espíritos galhofeiros, a ponto de se fazerem passar pelos quatro Evangelistas, houvessem tido elevação bastante para ditar páginas e páginas das mais belas, das mais puras, de maior conteúdo moral que se possam ler? Não! Evidentemente não!

            Ora, diziam, por vezes, os Evangelistas, que agiam em nome e de acordo com as ordens de Jesus e, portanto, a ninguém melhor do que a eles poderia, realmente, ser atribuída, como a atribuiu Kardec, a responsabilidade, não só das revelações, como da oportunidade de sua divulgação.

            Kardec, o grande missionário, o sublime Codificador da Doutrina Espírita, ensinou-nos muitas vezes que os Espíritos se identificam pela linguagem de que fazem uso. No Capítulo XXIV de “O Livro dos Médiuns” estão magnificamente resumidos em 26 princípios os meios de se conhecer a qualidade dos Espíritos; basta relê-los para que se não possa duvidar da autenticidade das comunicações recebidas pela Senhora Collignon e, após a necessária coordenação, publicadas por Roustaing.

            Seja isso motivo de reflexão e reflitamos também sobre o seguinte fato, que parece, outrossim, revelar claramente os desígnios do Alto.

            Em 1861, quando ao final do ano, em dezembro, Jean-Baptiste Roustaing foi escolhido, em condições singulares, para desempenhar tão bela quão importante incumbência, Allan Kardec, que já havia publicado em 1857 “O Livro dos Espíritos” e em 1859 “O Que é o Espiritismo”, dava a público, pouco antes, “O Livro dos Médiuns”, que Roustaing tivera tempo de ler. Ora, a obra impropriamente chamada “Os Quatro Evangelhos de Roustaing” não é de Roustaing: é mediúnica! (1)

            (1) - Dizemos "impropriamente" porque do insigne advogado da Corte Imperial de Bordeaux a obra não contém, além do Prefácio, senão perguntas formuladas, de quando em vez, aos Espíritos, com o propósito evidente de ver reforçado este ou aquele conceito ou de tornar, se possível, mais claros certos ensinamentos por eles ministrados, sendo, portanto, também, uma impropriedade falar-se em "roustainistas", pois Roustaing, de si mesmo, nada ensinou, nem foi autor de qualquer doutrina.

            Atentemos para as circunstâncias: tão logo o Codificador, em livro magistral, cumpre a tarefa de revelar ao mundo os segredos da mediunidade, o Alto atribui igualmente a Roustaing o encargo de utilizar a mediunidade da Senhora Collignon para coordenar e divulgar as explicações dos textos evangélicos, ditadas pelos próprios autores.

            Quanta harmonia nas missões confiadas a um e outro! Enquanto o primeiro, em Paris, a Cidade-Luz, entregava-se, com extremada prudência e admirável lucidez, ao trabalho sublime de codificar e difundir a Doutrina Espírita, o segundo, em Bordeaux, nessa mesma França de tantas tradições espirituais, entregava-se a outro trabalho sublime também: o de propagar a verdadeira interpretação dos Evangelhos de Jesus, nos quais, em última análise, aquela Doutrina se fundamenta!

            Oxalá possa a reflexão sobre fatos tais contribuir, senão para “unificar” as crenças entre os homens, pelo menos para dirimir, entre os espíritas, controvérsias e incompreensões oriundas, queremos crer, de ideias preconcebidas ou de estudo incompleto dos diferentes aspectos da questão.

Kardec e Roustaing
Ivo de Magalhães

Reformador (FEB) Julho 1971

sexta-feira, 26 de julho de 2013

O Filho do Homem



O Filho do Homem
Ivo de Magalhães
Reformador (FEB) Julho 1972

            Em artigo anterior (Reformador - Março, 1970), (*) salientamos a constante
preocupação de Jesus, bem sublinhada pelos Evangelistas, de mostrar que os fatos ligados à sua passagem pelo nosso planeta, os atos que praticou, os ensinamentos que ministrou e as palavras que proferiu em nada transgrediam a lei moisaica, mas, pelo contrário, confirmavam as Escrituras, a fim de que, revestidos de autenticidade, pudessem os acontecimentos ser aceitos pelo povo judaico, tão apegado às suas, tradições.

            Assim, aludindo a um argumento muito invocado por quem não aceitava a revelação do corpo fluídico de Jesus, lembramos que, à cruz, ao exclamar “Tenho sede” estava o Mestre simplesmente dando cumprimento à profecia de David, referida em um de seus salmos (o de nº 68, v. 22, de certas edições, ou de nº 69, v. 21 ou 22, de outras):

            “e na minha sede me propinaram “vinagre”.

            Efetivamente, conforme assinalou João, no Capítulo XIX, versículo 28 de seu Evangelho, sabendo Jesus que tudo estava cumprido,

            “para se cumprir uma palavra que ainda restava da escritura, disse: “Tenho sede”.

            Outro argumento análogo tem sido também apresentado: o de se haver o Mestre denominado “Filho do Homem” para, segundo dizem, bem marcar os laços que o prendiam à espécie humana. Ora, se assim fosse, estaria o Cristo, evidentemente, se considerando filho de José - o homem - e de Maria, mas, neste caso, se ele houvesse nascido de mulher, não poderia ter afirmado, como afirmou, que
              nenhum dentre quantos hão nascido de mulheres foi maior do que “João Batista”” (Mateus – Cap. II, v. 11), visto como jamais foi posta em dúvida a sua superioridade sobre a do profeta, superioridade a que o Mestre aludiu, veladamente embora, quando, logo após o haver exaltado, advertiu:

            “mas aquele que for o menor no reino dos céus é maior do que ele”. (Mateus Cap. II, v. 11),

            porém já havia tornado patente quando, sem contestar João Batista, que lhe dizia: Eu é que devo ser batizado por ti, e tu vens a mim?” (Mateus - Capítulo III, v. 14), respondeu-lhe:

            “Deixa-me fazer assim por esta hora, porquanto é necessário que cumpramos toda a justiça.” (Mateus Cap. III, v. 15).

            Parece-nos, pois, evidenciado que, ao se denominar “Filho do Homem”, não pretendia Jesus marcar laços que o prendessem à espécie humana, mas sim visava a dar a essa expressão um sentido messiânico para, ainda uma vez, confirmar as Escrituras! Com efeito, intitulando-se “Filho do Homem” não estava ele senão fazendo uso das palavras de que se servira Daniel na célebre passagem da Visão dos Quatro Animais Simbólicos:

            “Eu considerava pois estas coisas numa visão de noite, e eis que vi um como o filho do homem, que vinha com as nuvens do céu, e que chegou até o antigo dos dias; e eles o apresentaram diante dele.

            E ele lhe deu todo o poder, e a honra, e o reino; e todos os povos, todas as tribos, e todas as línguas o servirão; o seu poder é um poder eterno que lhe não será tirado, e o seu reino tal, que não será jamais corrompido» (Daniel - Capítulo VII, vv, 13 e 14).

            Não estará, assim, invalidado mais um frágil argumento com que se procura negar a revelação do corpo fluídico de Jesus? Pensamos que sim e nem se alegue que, de tal forma, estaríamos insensatamente pondo em dúvida as profecias de Daniel, que teria visto em Jesus o filho de um homem e não o Cristo, portador de um corpo fluídico! A conclusão a que se deve chegar é exatamente a oposta, porquanto o grande profeta, cujas extraordinárias faculdades os tempos se encarregaram de comprovar, não disse ter visto o filho de um homem, mas sim “um como (o grifo é nosso) o filho do homem”, isto é, um ser parecido, semelhante ao filho de um homem!

            A versão francesa é ainda mais concludente: “quelqu'un de semblable à un fils de “l'homme”.

            E o corpo de Jesus era realmente, em tudo, “semelhante” ao corpo humano, pois o Mestre assim plasmara o seu perispírito e lhe dera tangibilidade, para o cumprimento de sua missão terrena. Apenas, não se tratava de um corpo carnal, mas de um corpo fluídico, como tão claramente nos revelaram os Evangelistas, mercê da extraordinária mediunidade da Senhora Collignon, na obra magistral tão bem coordenada e divulgada por Jean-Baptiste
Roustaing.


(*) Já blogado.

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

O Perispírito dos Espíritos Puros


O Perispírito
dos   Espíritos Puros

por Ivo de Magalhães

Reformador (FEB)                Fevereiro 1975      

            Ensinaram-nos os Evangelistas, por intermédio da extraordinária mediunidade da Senhora Collignon, que até mesmo os puros Espíritos são dotados de perispírito, porém de natureza bem diversa daquele que reveste o Espírito dos materialmente encarnados.

            Lemos, com efeito, na obra comumente denominada "Os Quatro Evangelhos", publicada por Jean-Baptiste Roustaing, a seguinte revelação:

            "O perispírito dos Espíritos puros (o grifo é nosso) é, por sua sutileza, de natureza muito diversa, pelo que toca à atração, da do perispírito dos materialmente encarnados, o que lhes torna impossível aderirem à matéria do corpo humano.[1]"

            Já antes, era-nos dito[2]:

            "O aparecimento de Jesus na terra foi uma aparição espírita tangível. O Espírito tomou - segundo as leis naturais que vos acabamos de explicar - todas as aparências do corpo. O perispírito que o envolvia (o grifo é nosso) foi feito mais tangível ..."

            Portanto, Jesus, Espírito puro, para o cumprimento de sua missão terrena, dera mais tangibilidade ao seu perispírito, bastando-lhe, para tanto, atrair a si os fluidos ambientes necessários, conforme adiante se verá.

            Esse ensinamento trouxe, bem o sabemos, alguma preocupação a estudiosos da Doutrina Espírita, pelo fato de haver Bezerra de Menezes, ao tempo em que entre nós ainda se encontrava, declarado:

            "Os anjos, porém, que já não têm perispírito, porque são puros Espíritos, precisam tomar, na ocasião, no infinito seio do fluido universal, o que os revista e os torne visíveis. "

            Na verdade, porém, não há contradição alguma - nem seria lícito admitir que houvesse - entre o que, nos revelaram os Evangelistas, na obra publicada por Roustaing, e o que, para o matutino "O -Paiz", escreveu Bezerra de Menezes, sob o pseudônimo Max, em magnífico artigo reproduzido no "Reformador" de Março do ano passado.

            O grande apóstolo do Espiritismo no Brasil estava justamente aludindo a inúmeros casos, registrados pela História Sagrada, de anjos (Espíritos puros) baixados à Terra em missão, para tanto retirando do fluido universal o que os revestisse e os tornasse visíveis, como bem explicado está em "Os Quatro Evangelhos", onde nos é revelado ainda[3]:  

            "O perispírito pode, com propriedade, ser qualificado de semi material em razão de que, de si mesmo fluídico, pode materializar-se à vontade. É, com relação à vossa matéria, o que é o vapor com relação à água: matéria tênue, porém matéria, capaz de, em dada ocasião, tomar a aparência de matéria compacta. Não lograreis, repetimos, compreender a natureza dessa parte do vosso ser, senão quando a vossa inteligência se houver desenvolvido bastante para sondar as profundezas do éter que vos cerca."

            Que lição sublime! E com que sabedoria nos é ela ministrada! Aprendemos, assim, que o perispírito é "de si mesmo" fluídico, mas pode ser qualificado de semi material pela propriedade que possui de se materializar à vontade. Compreendemos, então, que, não necessitando de contatos materiais, como no caso dos puros Espíritos (quando não baixados em missão, evidentemente), o perispírito, perdendo tudo quanto de material nele se pode conter, torna-se de tal forma espiritualizado, digamos assim, que passa a se confundir, digamos assim também, com o próprio Espírito.

            E é precisamente isso que se depreende das seguintes explicações:

            "Somente o Espírito puro, não mais sujeito a encarnação alguma em qualquer planeta que seja, por já haver atingido a perfeição sideral, dispõe de todos os fluidos, como possuidor que é de uma ciência completa, goza de inteira liberdade e independência e tem a consciência exata da sua origem, seja qual for o perispírito ou corpo fluídico que tome e assimile às regiões que percorra.[4]"  

            "Jesus houvera podido, unicamente por ato exclusivo da sua vontade, atraindo a si os fluidos ambientes necessários, constituir o perispírito ou corpo fluídico tangível que vestiu para surgir no vosso mundo sob o aspecto de uma criancinha.[5]"  

            Destarte, não nos é difícil compreender que Bezerra de Menezes, quando disse não mais terem perispírito os anjos (puros Espíritos), queria, evidentemente, aludir - encarnado que ainda se achava entre nós - ao mediador plástico tal como o possuímos, isto é, semi material, enquanto - os Evangelistas, dizendo-nos que os Espíritos puros também são dotados de perispírito, aludiam, é igualmente evidente, a um envoltório etéreo, composto unicamente de fluidos espirituais, que não perde, contudo, a propriedade de se materializar mais ou menos intensamente quando necessário, para tanto tomando esses Espíritos, "na ocasião, no infinito seio do fluido universal, o que os revista e os torne visíveis", como Bezerra de Menezes bem salientou.

            Estabelecida está, portanto, segundo nos parece, não uma discordância, mas sim uma perfeita identidade entre os ensinamentos contidos em "Os Quatro Evangelhos" e a explicação de Bezerra de Menezes acerca do perispírito dos Espíritos puros. E nem poderia ser de outra maneira, sabido como é haver sido precisamente o "Kardec brasileiro" quem considerou "preciosa e sagrada" a obra publicada por Roustaing [6]  e fê-Ia, quando Presidente da FEB, reproduzir integralmente no "Reformador".

            Essa identidade, aliás, está plenamente sancionada pelo Codificador. De fato, em "O Livro dos Espíritos", faz Allan Kardec a seguinte pergunta, de nº 186:

            "Haverá mundos onde o Espírito, deixando de revestir corpos materiais, só tenha por envoltório "o perispírito?"

            E logo, do Alto, vem a magistral resposta:

            "Há e mesmo esse envoltório se torna tão etéreo que para vós é como se não existisse. Esse o estado dos Espíritos puros." (o grifo é nosso).

            Aí está, dada por quem pode, a explicação clara, cabal, lógica: o envoltório dos Espíritos puros existe - é o que está dito na obra publicada por Roustaing -, mas se torna tão etéreo que, para nós, é como se não existisse. É o que disseram a Kardec os Espíritos superiores!

            Mais uma vez somos levados a considerar o quanto Kardec e Roustaing se completam e a bendizer a sabedoria do Alto, fazendo baixar à Terra, na mesma época e no mesmo país - a França de tantas tradições espirituais -, muito perto um do outro, Kardec em Paris e Roustaing em Bordéus, esses dois excelsos missionários, o primeiro para codificar a Doutrina Espírita e o segundo para divulgar, em espírito e verdade, os ensinamentos contidos nos Evangelhos de Jesus, nos quais, em última análise, está fundamentada essa Doutrina!


[1] Pág. 372 - Vol I da última edição da FEB.
[2] Idem - pág. 167.
[3] Idem - pág. 331.
[4] Idem - pág. 160.
[5] Idem - pág. 161.
[6] “Vida e Obra de Bezerra de Menezes”, de Sylvio Brito Soares – edição da FEB, pág. 99.

domingo, 12 de junho de 2011

A propósito, ainda, do corpo fluídico de Jesus




‘A propósito, ainda,
do corpo fluídico de Jesus’

por  Ivo de Magalhães
em Reformador (FEB) Março 1970
           
Depois de tudo quanto tem sido escrito por ilustres autores sobre o corpo fluídico de Jesus, tais como Antônio Luiz Sayão, Leopoldo Cirne, Manuel Quintão, Guillon Ribeiro e Ismael Gomes Braga, em notáveis trabalhos intitulados, respectivamente, ‘Elucidações Evangélicas”, “A Personalidade de Jesus”, “O Cristo de Deus”, “Jesus nem Deus nem homem” e “Elos Doutrinários” – sem esquecer esse magnífico estudo que é “O Livro de Tobias”, em boa hora editado pela Federação Espírita Brasileira – pode parecer supérfluo que ainda se pretenda dizer algo a respeito dos excelsos ensinamentos transmitidos pelo Alto a Jean-Baptiste Roustaing, mercê da extraordinária mediunidade da Senhora Collignon.
Temos, porém, ouvido vez por outra, de alguns estudiosos do Espiritismo, a declaração de que não podem aceitar essa revelação por haver o Mestre exclamado na Cruz: “Tenho sede.”; se o seu corpo fosse realmente fluídico, dizem eles, não poderia estra sujeito às necessidades da matéria e encontrar-nos-íamos em presença de uma farsa de todo incompatível com a superioridade moral do Cristo.
O argumento poderia ser válido se se não atentasse para um pormenor que o destrói inteiramente:
O único evangelista que atribui a Jesus aquelas palavras foi João (Cap. 19, versículo 8), talvez pela boa razão de que somente ele, dos quatro, assistiu à Crucificação. O que, todavia, está dito no Evangelho de João é o seguinte:

Depois, sabendo Jesus que tudo estava cumprido, para se cumprir uma palavra que ainda restava da Escritura, disse: Tenho sede.”

Jesus, portanto, disse que tinha sede ‘para se cumprir uma palavra que ainda restava da Escritura”, porque, quanto ao mais, “tudo estava cumprido”. João teve o cuidado de não deixar dúvidas a respeito e, se se quer argumentar com a citação evangélica, deve-se enuncia-la por inteiro, não se tomando dela apenas duas palavras que, isoladas, impedem a compreensão correta do texto.
A leitura atenta dos Evangelhos revela a constante preocupação dos autores de ressaltar que os fatos ligados à passagem do Mestre pelo nosso Planeta, os atos que praticou, os ensinamentos que ministrou e as palavras que proferiu, em tudo e por tudo confirmavam as Escrituras e em nada transgrediam a lei mosaica.
Mateus, com efeito, logo no primeiro capítulo do seu Evangelho, referindo-se ao nascimento de Jesus (tal como aos olhos dos homens teria ocorrido), diz, no versículo 22:

“Mas tudo isso aconteceu para que se cumprisse o que falou o Senhor pelo Profeta”.

Marcos, por sua vez, inicia o seu Evangelho assim:

“ Princípios do Evangelho de Jesus-Cristo, Filho de Deus, conforme está escrito no Profeta Isaías”.

Também Lucas, igualmente no capítulo primeiro de seu Evangelho, relatando o cântico de Zacarias, escreve no ver. 70:

“Segundo o que Ele tinha prometido por boca dos seus profetas”.

Finalmente João, demonstrando o mesmo cuidado, também no capítulo inicial do seu Evangelho, referindo-se aos primeiros apóstolos de Jesus, diz, no versículo 45:
“Encontrando Natanael, disse-lhe Filipe: Achamos aquele a cerca de quem Moises escreveu na lei e os profetas falaram, Jesus de Nazaré, filho de José”.

Não é menor a preocupação do Mestre:

“Não penseis que eu tenha vindo destruir a lei ou os profetas; não os vim destruir, mas cumprir. Porque em verdade vos digo que, enquanto o Céu e a Terra não passarem, nem um só iota, nem um só ápice da lei passarão, sem que tudo esteja cumprido” (Mateus, Cap. 5 vv. 17 e 18)

Nós, os espíritas, sabemos que o Alto tudo dispôs para que, na passagem de Jesus pela Terra, nada se processasse senão de conformidade com a lei e as Escrituras, a fim de que os acontecimentos, revestidos de autenticidade, pudessem ser aceitos por um povo tão apegado às suas tradições.
Não deve, assim, causar surpresa o fato de haver o Mestre, portador embora de um corpo fluídico, exclamado: “Tenho sede”, se o fazia “para cumprir uma palavra que ainda restava da Escritura” (a palavra “sede”, predita por David no Salmo 68, versículo 22[1]). Pelos mesmos motivos, não nos esqueçamos, quando João Batista, a quem Jesus se apresentara para ser por ele batizado, Lhe perguntou: “Eu sou o que deve ser batizado por ti, e tu vens a mim?” (Mateus, Cap. III, v.14), recebeu essa pronta, clara e incisiva resposta que jamais, ao que saibamos, alguém ousou considerar uma farsa:

“Deixa por ora; porque assim nos convém cumprir toda a Justiça” (Mateus, Cap. III, v. 15.)

É esse, portanto, mais um frágil argumento com que procuram negar os sublimes ensinamentos contidos nessa incomparável obra mediúnica – “Espiritismo Cristão ou Revelação da Revelação” – ou seja, “Os quatro evangelhos explicados em Espírito e Verdade pelos evangelistas assistidos pelos apóstolos e por Moisés – recebidos e coordenados por J. B. Roustaing”.


[1]  Noutras traduções: Salmo 69, v. 21