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quinta-feira, 4 de abril de 2019

Gabriel Delanne - A arte de escrever em contraponto




Gabriel Delanne: A arte de escrever em contraponto (1)
Cinquentenário de Desencarnação
Gilberto Campista Guarino
Reformador (FEB) Fevereiro 1976

            (1) Contraponto - diz-se, em música, da arte de combinar melodia com melodia,
fazendo com que uma penetre a outra. Exige grande conhecimento técnico,
uma vez que se desenvolve na base de nota contra nota, sem que seja a harmonia abalada.
A característica básica da escola polifônica, e desafia o gênio musical, porque limita,
de um certo modo, as harmonias que comporão o corpo musical.
Na música, seu mais extremado gênio foi o maior dentre os maiores:
Johann Sebastian Bach.

A comparação da escrita musical contrapontistica com Gabriel Delanne
foi aventada por questões de método. O contraponto, na música,
e se bem empregado, traz diversas vozes dentro de um conjunto harmônico,
de forma que se tem a nítida impressão de um diálogo imenso,
organizado e propositado; que irá desembocar num fim especifico, após um stretto,
que é o surgimento de todas as vozes, a um só tempo.
Gabriel Delanne adquiriu, em vivências passadas, por certo,
a propriedade de escrever assunto por assunto, colocando-os um em frente do outro,
numa espécie de desafio, a fim de que eles mesmos se burilassem a si próprios,
e apresentassem a solução, num só contexto harmônico.
As restrições que esse método impõe,
só as vence quem tenha a inata propriedade de construir, para o alto.
Assim como Sebastian Bach foi o arquiteto do teclado,
Delanne bem pode ser classificado, dentro dessa ordem de ideias,
como arquiteto do Espiritismo Científico,
concomitantemente desenvolvido por William Crookes.

            15 de fevereiro de 1926. Em plena maturidade, a mente ordenada de Gabriel Delanne ainda cogita de mais um livro a ser passado para o papel. "A Exteriorização do Pensamento", artigo de sua prodigiosa lavra, já fora entregue à redação da "Revue Spirite", por essa época sob a direção de Jean Meyer, criador do "Instituto Metapsíquico Internacional" e da "União Espírita Francesa". Não o veria publicado, senão da grande nação dos Espíritos. Não materializaria no papel de redação, que tantas vezes lhe fora repositório das ideias com que, por assim dizer, fundara o Espiritismo Científico, a saudação a todos os espíritas franceses, a qual seria publicada no "Bulletin" da aludida "Union".

            O filho do comerciante Alexandre Delanne e da Sra Alexandrine Delanne, menino esse que, mais tarde, em plena virilidade, se consorciaria com Suzanne Rabotin, que lhe sobreviveu o trespasse, já havia partido, quando a "Revue" - desde 1913, "La Revue" - circulou.

            O berço nitidamente espírita (não nos esqueçamos que que Mme. Delanne, sua mãe, era médium de fortes recursos, e de que seu pai era amigo de Allan Kardec, ambos, Alexandrine e Alexandre, aceitando plenamente os princípios sobre os quais se embasa a Doutrina Espírita, consubstanciou-lhe a fé imorredoura, que o preservou das exagerações frequentemente ocorridas no terreno da investigação fenomênica, em especial numa época em que a qualificação de espírita valia por um verdadeiro desafio e um acinte à moral dita superior da sociedade. Não tracejemos a biografia de Gabriel Delanne. Tarefa que demanda tempo e muitas laudas de papel, deve permanecer para oportunidade futura. Observemos, isto sim, por agora, aspectos pouco considerados da mentalidade delaneana, como sejam, suas ideias, seus métodos, sua visão praticamente futurista do Espiritismo, que nunca alienou de seus propósitos a maturação dos conceitos evangélicos que lhe salvaguardam a integridade entre os homens

            Um dos temas que sempre preocuparam vivamente o nosso personagem, engenheiro de sólida formação, foi o perispírito, que sabemos ser base de todo o fenômeno mediúnico, assim como de todo o fenômeno anímico; o perispírito, sem o qual nada se explica, em  termos de psiquismo, e cuja não assimilação e internalização por parte da Ciência vem a ser a causa da ignorância em que ela permanece, no campo da alma.

            Definiu-o de modos diversíssimos, um dos quais, entretanto, nos parece tão preciso e tão seguro que não nos furtamos a transcrevê-lo: "estatuto das leis que regem a evolução orgânica". O perispírito é um gigantesco livro, um notável arquivo, no qual se contêm todas as peripécias que nos sejam peculiares, em descrição viva, sem fantasias, exatas, e que hoje podem ser evocadas, até certo ponto, pelo fenômeno da chamada regressão de memória, na qual, em determinado grau, o Espírito desprendido alcança a fonte das reminiscências de etapas pregressas de nossa vida como Espírito Imortal.

            O emprego do adjetivo ‘orgânica’ mostra o quão ampla era a mente de Delanne, porque o entendimento de organismo, já naqueles tempos, dentro dos estudos espíritas, implicava o que hoje se apelidou de corpo somático (o corpo físico) e corpo psicossomático (que sabemos ser o perispírito, pelos gregos chamado eidolon). Assim, já encarava Delanne a evolução, embora única, sob um aspecto nitidamente duplo, no qual, todavia, o norte era dado pelo perispírito, síntese, por assim dizer, das aptidões e das perspectivas do ser-espírito. Não o diferençou, propriamente, no animal irracional e no homem, mas o detectou, inegavelmente, em ambos, evidenciando-lhe o mesmo papel de bússola evolutiva, e vinculando-o à célebre ideia diretriz, que Claude Bernard estabelecera, num passo gigantesco para as concepções de então.

            Assim define o grande fisiologista essa ideia norteadora da própria vida, em sua própria opinião, alheia - no que de mais transcendental envergue - à física ou à química, como as entendem os homens (por exemplo, o caso da memória, que se tenta reduzir aos limites somáticos, encarcerada em reações químicas):

            "0 que diz essencialmente com o domínio da vida e não pertence à química, nem à física, nem ao que mais possamos imaginar, é a ideia diretriz dessa atuação vital. Em todo o germe vivo há uma ideia dirigente, a manifestar-se e a desenvolver-se na sua organização. Depois, no curso de toda a sua vida, o ser permanece sob a influência dessa força criadora, até que morre quando ela não mais se pode efetivar. É sempre o mesmo principio de conservação do ser, que lhe reconstitui as partes vivas, desorganizadas pelo exercício, por acidentes ou enfermidades." (Claude Bernard: "Introduction à Ia Médecine")

            Adequadíssima a ideia de Claude Bernard às assertivas dos pesquisadores espíritas, e que, hoje, dia após dia, vêm sendo comprovadas. Disse, intuitivamente, o notável fisiologista que o ser permanece sob a influência dessa força criadora, o que, à primeira vista, poderia parecer um engano, uma vez que o perispírito é a própria criatura em si, é inalienável, acompanha-a por toda a sua marcha evolutiva, transformando-se, a pouco e pouco, em substância translúcida, invisível, nos Espíritos assaz superiores, aos nossos sentidos grosseiros. Se assim compreendêssemos a força criadora, de Bernard, estaríamos incursos em contra senso. Acontece que Delanne diferençou, nitidamente, aliás, perispírito de força vital. Esta seria o elemento através do qual o perispírito gera o modelo condensado de nosso corpo, faz com que ele se desenvolva, influencia-o e repara-o nos danos que venha a sofrer. Dentro desse esquema, Gabriel Delanne classifica a força vital (que bem poderia identificar-se com o fluido universal, que, hoje, conhecemos por energia) como substância organizadora, mantenedora e reparadora, segundo o molde em si, que a dirige. A própria composição do perispírito, na linguagem da época, faz-se com base em fluido magnético, eletricidade e demais modificações do fluido universal, ou energia. E é o próprio Delanne quem tudo enfeixa, nos seguintes termos:

            "Estabelecemos de princípio, por experimentações espiríticas, que os Espíritos conservavam a força humana e isto não só por se apresentarem tipicamente assim, como também porque o perispírito encerra todo um organismo fluídico-modelo, pelo qual a matéria se há de organizar, no condicionamento do corpo físico."

            Quer isso dizer que o próprio psicossoma guarda em si um organismo fluídico-modelo, que é X em cada etapa evolutiva, podendo ser Xl, X2, X3, in fine, em séries determinadas, ao fim das quais o automatismo se garanta através da aquisição de valores inderrogáveis em nossa constituição mais íntima. E, ainda, para que bem firme permaneça em nossa inteligência, destacado ficou que a matéria se organiza segundo esse modelo, exteriorizado na própria força vital. GabrieI Delanne, portanto, fala em perispírito como agente em relação aos desígnios do Eu; em força vital como paciente, em relação ao perispírito, e, agente, para o corpo físico.

            De tudo o que ficou dito, se vimos o papel fisiológico do corpo espiritual, depreendemos que há de verificar-se um papel psicológico em relação a esse mesmo corpo, uma vez que, comprovadamente, o corpo padece mutações violentas, no transcurso da vida, para, em seguida, extinguir-se, e qualquer sujet de experimentações em regressão de memória pode constatar, anteriormente à vida fetal, a vida do Espírito em erraticidade; pode mergulhar em ‘n’ ciclos vividos, sob sua vontade aliada à do experimentador.

            Psicologicamente, parece-nos que seria impossível o reconhecimento da criatura como criatura se as fibras perispirituais não estivessem previamente condicionadas à noção de uma continuidade, e se o homem não detivesse, intimamente, a certeza de que a vida, como a vemos, não passa de uma etapa. Psique é alma, e alma não sofre soluções de continuidade. Aberra do sentimento inato da própria deidade a vontade, por exemplo, condicionada à extinção; o raciocínio vinculado à diluição, e assim por diante. O papel psicológico do perispírito é radicalmente oposto às noções invertidas da psicologia sem alma. A própria memória, no que fuja aos condicionamentos cerebrais, como tudo o que se afaste dos componentes hereditários (que respondem por necessidades do Espírito, não nos esqueçamos), embora as teorias do metaeterismo e do meio ambiente, permanecem no domínio da alma, porque mesmo essas correntes estão invariavelmente condicionadas à existência de personalidades, as quais nada mais são que manifestações da individualidade. É nesse sentido que Gabriel Delanne definiu o perispírito como fonógrafo natural, que registra sensações e as reproduz, retirando-as do próprio arquivo, e ordenando-as de forma a que os acidentes e incidentes de nossa caminhada não nos apanhem sem um paradigma em que, nos apoiemos e em que nos identifiquemos.

            O ato inteligente do homem, ato programado, deliberado, consciente, e o ato instintivo, condicionado, disparado por mecanismo automatizado, ambos só se desenrolam segundo as características da série em que respondam, e não existiriam, caso não existisse a coordenação perispiritual, responsável, em todos os níveis, pelas manifestações da vida. Comparemos, finalmente, o perispírito a um gravador. Os aparelhos que nossa eletrônica vem inventando possuem, em geral, três ou quatro velocidades. Cada rolo de fita vem codificado numa forma X ou Y, de modo que deve ser reproduzida na velocidade correspondente à velocidade de codificação: o que se contenha na fita será descodificado e retransportado ao código em que exista na natureza. Mais ou menos o mesmo é o mecanismo da memória, em termos de reconhecimento, ou seja, filosoficamente falando. A forma de código natural se imprime na fita que o perispírito representa, numa velocidade determinada (a velocidade de gravação pode variar ao infinito, e é determinada pelo teor emocional de que venha o fato investido), de modo que somente será recordada quando se alcance a rotação primitiva, idêntica, portanto. Mas, assim como as velocidades aproximativas dos gravadores que conhecemos produzem feitos aproximativos, em fidelidade, ao feito natural, também as associações mentais podem levar a reminiscências aproximativas ou a rotações idênticas no gravador perispiritual, de modo a que reviva sem erros o fato lembrado. Esse o mecanismo da memória: se a vibração é acelerada num dado estado, este não será percebido quando vibremos em estado diverso, numa velocidade mais lenta, senão, e quando muito, aproximativamente. Já em termos de aceleração da velocidade - e porque os funcionamentos perispirituais são muito mais complexos que os do gravador comum -, o que se deve considerar é que - dentro dos limites possíveis, e fiéis à noção de que o mais pode perceber o menos (estamos no terreno da alma, não nos esqueçamos...) -, um nível vibratório mais acelerado possibilite a apreensão de níveis vibratórios inferiores, assim como os Espíritos superiores percebem os Espíritos que lhes são inferiores, sem que estes percebam aqueles, desde que haja considerável diferença evolutiva. Assim, o ser em píncaros de caminhada tem acesso a inúmeras vidas anteriores, patrimônio exclusivo da memória profunda. E compreendamos, aqui, essas inúmeras vidas abarcando um acervo de informações que somente o estado de grande elevação da criatura pode autorizar, sem prejuízo para a sua integridade psicológica, com todas as suas repercussões.

            Assim nos leva a compreender o tema perispírito a firme e lúcida inteligência de Gabriel Delanne. Que a Ciência o desconheça, ou que faça por desconhecê-lo, não importa!.. É compreensível.

            "Nada obstante, a verdade acabará por sair da toca. Assim como o magnetismo acabou, mascarado, forçando a porta das Academias, assim também o Espiritismo acabará recebendo, com um pseudônimo arrevesado, a consagração oficial. E nós veremos, então, a turba dos imitadores atirar-se aos fenômenos, a qualificarem-nos como novidades; veremos inúmeros pseudo sábios vangloriarem-se de redescobrir o que já sabemos há mais de 50 anos." ("A Evolução Anímica" - Edição de 1976, FEB, pág, 170. A 1ª edição dessa obra foi lançada na França, em 1895, há, portanto, 81 anos.)

            Cabe-nos uma pergunta: - Profecia?..

*

            Em termos de ciência, de ciência dita profana, Delanne viveu no século XIX, e é óbvio que só poderia ater-se às descobertas de seu século. Não nos esqueçamos, porém, de que tudo o que o Espiritismo admitiu e provou, já no século XIX, começa, começa apenas, a ser entrevisto pela ciência oficial de nossos dias. Logo, ultrapassados estão, talvez, os exemplos de Delanne, além de uma ou outra teoria, comprovadamente superada. Nada, contudo, está derrubado, em termos de Revelação Espírita.

            A efluviografia, hoje consagrada pela máquina Kirlian, com maior perfeição, é certo, já não é novidade. Sabemos perfeitamente que o Dr. Paul Joire, no século passado, criou máquina semelhante. O próprio Delanne inventou diversos dispositivos para eliminar a influência calorífica na obtenção de fotografias da auréola vital (termo empregado por René Sudre, ferrenho adversário das afirmações do Espiritismo). Tais fotos são encontráveis na monumental obra em dois volumes "Les Apparitions Materialisées des Vivants et des Morts", não traduzida para o português, e que contém outras fotos, revelando presenças astrais tanto de "mortos" como de "vivos", ao lado de entes queridos.

            Outra preocupação constante de Gabriel Delanne (e muito justa, aliás) foi a concernente à diferenciação entre o fenômeno anímico e o fenômeno mediúnico
propriamente dito. Se lhe faltaram alguns outros elementos para enxergar em alguns dos fatos anímicos a mescla da origem mediúnica (é o caso da histeria), nada se escreveu, até a presente data, que fosse superior, em qualidade, ao que disse Delanne. É preciso, a par disso, compreender que, na época da Codificação, e na imediata, o cuidado dos sábios que se dedicavam ao estudo dos fenômenos espíritas devia ser multiplicado por 100. Era necessário que fossem estabelecidas fronteiras que impedissem as falsas interpretações, que haveriam prejudicado o estabelecimento da Doutrina Espírita entre nós. Sem a prudência, que lhe era característica, Kardec não teria sido o Codificador. A prudência de Delanne foi a responsável pela alcunha que se lhe atribuiu de gigante do Espiritismo cientifico.

            Por exemplo, ensaiou e publicou uma lista de distinções entre os fenômenos ditos de histeria e os do médium, propriamente dito. Mas, não nos parece, a nós, ao menos, que em qualquer momento tenha Gabriel Delanne admitido que o histérico não fosse um médium de possibilidades arruinadas para o bom desempenho da faculdade. Não o disse nem o deixou de dizer: há conclusões a que nós devemos chegar, por esforço próprio. Salientou, entretanto, que a faculdade mediúnica (e já o dissera Kardec, que lhe foi, indefectivelmente, o mestre) é uma predisposição orgânica; e que raramente se exerce quando o médium se encontra doente. Neste ponto, o de que se pode discordar é que o histérico pode ser (e geralmente o é) um doente psíquico, sem que o seja físico; ou melhor, que os males físicos que apresente sejam originários do estado de desorganização mental em que se acha imerso. Certo; correto: o médium obsidiado apresenta sinais que a psiquiatria pode classificar como histeria ou até como loucura. Mas, a loucura essencial permanece sem explicação, para a ciência que põe de lado a existência da alma, com todas as suas repercussões.

            De qualquer modo, se não é exata a diferenciação proposta por Delanne, neste particular, ela serviu a que inúmeros histéricos e médiuns obsidiados fossem afastados do exercício de uma faculdade que, a eles, apenas levava consequências funestas. Aliás, só como lembrete, continua a ser o melhor método de combate às obsessões e aos fenômenos histéricos que não tenham por base a atuação espiritual o afastamento do passivo onde este esteja a exercer ou a desenvolver a faculdade, exista ela, no primeiro caso, ou não exista, no segundo. Será bom recordar, também, que o fenômeno mediúnico autêntico vem investido de um brilhantismo inconfundível, quer se trate da doutrinação de um obsessor, quer se trate da comunicação de um mentor espiritual, quer se trate de uma poesia, ou seja o caso de página psicográfica de caráter moral, filosófico, científico ou literário. Nunca será demais a tomada em consideração de alguns cuidados, que - se não mais autorizam sejam os médiuns submetidos a verdadeiros vexames -, não dispensa o critério da análise, nos padrões da caridade, no tocante ao material que nos seja apresentado.

            Não nos furtaremos a transcrever a série de diferenças apontadas por Delanne entre os histéricos e os médiuns, com as ressalvas que já apresentamos, material esse que se encontra na opulenta obra, não traduzida para o português, "Recherches sur Ia Mediumnité". Ei-Ia:

            Nos HISTÉRICOS:

1º) A saúde geral encontre-se gravemente perturbada, e as anestesias profundas, que alcançam um ou vários sentidos, determinam lacunas na vida mental, perda completa de certas recordações e grande redução no campo da consciência;

2º) Os fenômenos subconscientes não se desenvolvem sob a forma da escrita, senão após uma educação bastante prolongada (Delanne refere-se ao surgimento da faculdade, e não à imposição da disciplina do sujet);

3º) Só se obtêm esses fenômenos sob a influência de sugestões tácteis ou verbais, efetuada durante o estado de um certo alheamento, que é contínuo;

4º) A escrita automática não pode ser sugerida por qualquer pessoa. Só se produz no estado de relacionamento ou afinidade, e se é o 'magnetizador habitual quem comanda a sugestão;

5º) A escrita nada relata além de fatos conhecidos pelo sujet, e seu conteúdo não é sensivelmente superior à sua capacidade intelectual (isso não é absolutamente necessário para que se caracterize o fenômeno mediúnico. O brilhantismo a que nos referimos mais acima não é de teor intelectual, mas de impregnação vibratória sensível, que trai, realmente, a presença de um desencarnado junto ao médium. Se a manifestação através de médium positivo é inegável, inegáveis são também, forçoso será se conclua, as características do Espírito comunicante. Se não se trata de entidade intelectualmente superior, como se poderá exigir comunicações assim elaboradas? Quanto aos fatos conhecidos, é sabido que os Espíritos nos acompanham, e, durante as manifestações, podem, perfeitamente, fazer alusão ao que se passa conosco, fora do estado de transe).

6º) Jamais sabe o histérico o que escreveu. É uma operação involuntária e inconsciente. (Convém recordar que, se a psicografia for mecânica, o médium não saberá o que escreveu, embora mantenha a consciência de que escreveu algo. Na psicofonia sonambúlica, raramente o médium se recorda da comunicação, embora saibamos que a inconsciência é posterior ao fato, e não concomitante, mesmo porque o médium sonambúlico encontra-se desdobrado, ao lado do veículo físico, e até muito mais consciente do que os médiuns intuitivos.)

7º) Finalmente, jamais se conseguiu obter esses fenômenos com os homens (sinceramente, não entendemos integralmente a observação. Aludirá Delanne à teoria de que a histeria só paira sobre os elementos do sexo feminino?)

Nos Médiuns:

1º) A saúde é normal. Geralmente não se constata qualquer anestesia ou perda da memória; a inteligência não é alcançada sob qualquer forma e a faculdade cessa durante a enfermidade, exatamente o contrário do que se verifica com os histéricos; (consultem-se às observações anteriores. O próprio Delanne cita, em rodapé, que nem a Sra. Piper, nem Stainton Moses, nem Mme. D'Espérance, Slade ou Home obtém qualquer fenômeno durante os períodos de enfermidade).

2º) e 3º) Os fenômenos da escrita produzem-se espontaneamente e sem sugestões verbais ou tácteis (Esse é um argumento irrespondível. A verdadeira mediunidade manifesta-se sem que haja necessidade das afamadas sessões de desenvolvimento; a intromissão da mente do médium, se bem sempre ocorra, não pode suplantar a interferência alienígena, que é a verdadeira característica da mediunidade. Em recente e primoroso livro de Chico Xavier, publicado pelo GEEM, de São Bernardo do Campo, São Paulo, colhe-se da terceira mensagem, da série de 5, ditada por Jair Presente, esta notável consideração que, cremos, resume o problema:

            - "A gente aproxima do médium e quer falar, e aí temos de guentar (sic) o assunto, porque só falamos em dupla; o médium quando não tem muito exercício nos passa pra trás e fala na frente.")

4º) Não existe, de um modo geral, qualquer influência eletiva de parte dos assistentes, nem qualquer necessidade de uma relação ou afinidade magnética de qualquer natureza (Delanne está certo: o feito mediúnico, a rigor, prescinde de tudo isso. Há que considerar, todavia, que, como humano, o médium posto em prova agressivamente poderá sofrer - e, com certeza, sofrerá -- os prejuízos da inibição).

5º) O médium sabe que escreve, seu movimento é involuntário, mas consciente;

6º) Obtêm-se,. indiferentemente, mensagens através de elementos do sexo masculino ou feminino (...). (Consulte-se a nota ao 7º parágrafo, atinente às características dos histéricos. A se levar em consideração o conteúdo do item 6º da listagem referente aos médiuns, dever-se-á concluir que o fenômeno mediúnico é, no homem, mais seguro? A prática parece desmentir essa possibilidade.)

7º) Os médiuns dão, por meio da escrita, e frequentemente, notícias que lhes são desconhecidas, tanto quanto dos assistentes, e que, depois, se verificam exatas. (Indiscutível. A série de identificações que os médiuns positivos podem trazer, e que desafiam qualquer argúcia de pesquisador, não mais nos deixam quaisquer dúvidas.)

            Em adição, repetiríamos que se trata - o que ficou acima - de mero esquema, em nada definitivo, e que só pode ser interpretado à maneira de um eletrocardiograma, ou de um eletroencefalograma, em cujos traçados as anomalias apresentadas nem sempre são indicadoras de grave moléstia. O espírito de análise do leitor atento saberá considerar prós e contras. Em momento algum, no entanto, poderemos dizer que Delanne foi rigorista, pois que era esta uma das características visceralmente contrárias a seu poder de observação.

*

            Passando de um polo a outro, após breve análise de alguns aspectos do pensamento delaneano, geralmente esquecido, onde podemos sentir-lhe a exposição precisa e profunda, levando-nos a um universo de considerações, dentro dos parâmetros doutrinários, voltemo-nos para "flashes" do Delanne preocupado com o movimento espírita, com o desenvolvimento das atividades espíritas que, em sua abalizada e correta opinião, dever-se-iam pautar pelos conceitos genéricos emitidos pelo excelente Codificador, de cuja linha de pensamento não se afastou um minuto que fosse (Delanne é daqueles nitidamente engajados na equipe de Kardec).

            Seu artigo de estreia, conforme o definiu Sylvio Brito Soares, data de 1883, passando, desde então, a colaborar constante e ininterruptamente com a difusão dos princípios contidos em "O Livro dos Espíritos" e "O Livro dos Médiuns", conforme faz prova o prefácio da "História das Aparições de Katie King". Fundou, em 1897, a "Revue Scientifique et Morale du Spiritisme", que desempenhou um papel de baluarte na divulgação doutrinária.

            A preocupação de seu diretor com o Espiritismo no mundo tocava as raias da concessão, no bom sentido. Jamais se negou a permitir a transcrição e tradução de seus artigos ou livros, mas sempre foi um apologista por excelência dos direitos de todos e de cada um. Fotoreproduzimos, traduzimos e transcrevemos, a seguir, para o espírito fino do leitor, a carta-resposta de Delanne à "Revista Internacional do Espiritismo", nos tempos de Caírbar Schutel. Data de 20 de janeiro de 1925, da capital francesa:

            "Sr. e estimado Confrade,

            Acuso a recepção de vossa missiva, datada de 28 de dezembro p.p., do mesmo modo que a assinatura de minha Revue. Sinto-me feliz em tomar conhecimento de que o Brasil conta, agora, com mais um defensor de nossa cara doutrina. Fico muito satisfeito de verificar que o Espiritismo, no Brasil, desenvolve-se consideravelmente, e quero alimentar esperanças de que, graças a vós, sua ação moralizadora disseminar-se-á mais e mais, para maior bem-estar vossa respeitável nação. Quer isso dizer que vos autorizo, de modo pleno, a reprodução de todos os artigos de minha Revue que vos pareçam de utilidade ao conhecimento de vossos compatriotas.
            Que vos assistam os caros Espíritos que dirigem vosso movimento, a fim de que a Revista Internacional do Espiritismo tenha uma vida longa e uma carreira brilhante!
            Aceitai, meu caro confrade, a certeza de toda a minha fraternal simpatia.

                                                                                                                                 G. Delanne"

            O testemunho da alma boníssima de Delanne, além da visão a distância que possuía, e que lhe dava a certeza de que o Espiritismo somente sobreviveria se estribado em Kardec, naturalmente não o abandonou à beira da sepultura. A 20 de agosto de 1965, André Luiz formulou 20 questões a Gabriel Delanne (ambos Espíritos), "um dos mais destacados continuadores de Allan Kardec", na opinião do próprio entrevistador. Reproduzimos seis perguntas, como fecho deste trabalho, as quais nos parecem mais expressivas:

            1) Admite que os princípios espíritas estão caminhando lentamente no mundo?
            R - Não penso assim... As atividades espíritas contam  pouco mais de um século e um século é período demasiado curto em assuntos do espírito.

            2) Muitos amigos na Terra são de parecer que os Mensageiros da Espiritualidade Superior deveriam patrocinar mais amplas manifestações da mediunidade de efeitos físicos para benefício dos homens, como sejam materializações e vozes diretas. Que pensa a respeito?
            R - Creio que a mediunidade de efeitos físicos serve à convicção mas não adianta ao serviço indispensável da renovação espiritual. Os Espíritos Superiores agem acertadamente em lhe podando os surtos e as motivações, para que os homens, nossos irmãos, despertem à luz da Doutrina Espírita, entregando a consciência ao esforço do aprimoramento moral.
           
            3) Conquanto tenha essa opinião, julga que o Espiritismo precisa atender ao incremento e melhoria da mediunidade?
            R - Não teríamos o Evangelho sem Jesus-Cristo e não teríamos Jesus-Cristo sem o socorro aos sofredores pelos processos medi únicos que lhe caracterizaram a presença na Terra.

            4) Para que região devemos nós, a seu ver, conduzir a pesquisa científica na Terra, de vez que a conquista da paisagem material de outros planetas não adiantará muito ao progresso moral das criaturas?
            R - Devemos estimular os estudos em torno da matéria e da reencarnação, analisar o reino maravilhoso da mente e situar no exercício da mediunidade as obras da fraternidade, da orientação, do consolo e do alívio às múltiplas enfermidades das criaturas terrestres...     .

            5) Onde os percalços maiores para a expansão da Doutrina Espírita?
            R - Em nossa opinião, os maiores embaraços para o Espiritismo procedem da atuação daqueles que reencarnam, prometendo servi-lo, seja através da mediunidade direta ou da mediunidade indireta, no campo da inspiração e da inteligência, e se transviam nas seduções da esfera física, convertendo-se em médiuns autênticos das regiões inferiores, de vez que não negam as verdades do Espiritismo, mas estão prontos a ridicularizá-las, através de escritos sarcásticos ou da arte histriônica, junto dos quais encontramos as demonstrações fenomênicas improdutivas, as histórias fantásticas, o anedotário deprimente e os filmes de terror.

            6) Como vê semelhantes deformações?
            R - Os milhões de Espíritos inferiores que cercam a Humanidade possuem seus médiuns. Impossível negar isso. (Perguntas inseridas na obra "Entre Irmãos de Outras Terras", psicografia de Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira," 2ª ed. FEB, 1967)

*

            Não se trata de mera entrevista, onde um Espírito tão conhecido, como André Luiz, apresenta-nos, com espetaculosidade, um dos fundadores, por assim dizer, da filosofia que abraçamos. A palavra de Gabriel Delanne (Espírito) é, nitidamente, a continuação de um modus vivendi equilibrado e nivelado pelo bom senso sem pedantismo, sem imposições de caráter medíocre e mesquinho: convém que o vejamos, e, de resto, a todos os demais trabalhadores junto a Kardec, diretamente, como Espíritos, tão-somente, esquecendo os enganos porventura cometidos, inerentes à condição de humanidade terrena.

            Das faixas espirituais em que habita, e que, obviamente, não se confundem com as grutas onde escondemos nosso profundo acabrunhamento, porque estamos conscientes de nossos enganos, possa Gabriel Delanne inspirar-nos que "...esperança é sinônimo de paciência, estudando e servindo sempre, na certeza de que, se a eternidade é a nossa divina herança, cada dia é um tesouro de recursos infinitos que não podemos desprezar." (Obra citada) 


quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Gabriel Delanne: Ciência e Espiritismo



Gabriel Delanne, Ciência e Espiritismo 
por Sylvio Brito Soares
Reformador (FEB)  Dezembro 1977


            Na velha e lendária cidade de Paris, palco de tantos acontecimentos notórios de repercussão mundial, então a Capital do mundo civilizado, pela luz que espargia através da literatura, da arte, da filosofia e da ciência positiva, nessa velha metrópole, dizíamos, vivia, lá pelo ano de 1851, um casal de vida simples e honesta, o Sr. AIexandre Delanne, comerciante, e sua esposa D. Alexandrina Delanne.

             No dia 23 de Março desse ano, seu lar se engalanou com o nascimento de um filho a quem deram o nome de Gabriel. Nas fisionomias de ambos se comtemplava a grande alegria que lhes ia n’alma.

            Devemos esclarecer que os genitores desse menino eram espíritas convictos e
praticantes, bem compenetrados de seus deveres espirituais. O Sr. Alexandre, um dos  seis fundadores da "Liga Parisiense de Ensino", foi afeiçoado amigo e colaborador de Allan Kardec, tanto assim que fazia parte da direção da Sociedade Espírita por ambos criada.

            Quando do sepultamento do inolvidável Mestre, no Cemitério de Montmartre, o Sr. Alexandre Delanne foi também um dos oradores que se fizeram ouvir no momento de baixar ao túmulo o corpo físico de Kardec. E ao inaugurar-se, em 1870, o “dólmen” do Codificador, construído no cemitério de Père-Lachaise, A. Delanne, impedido, por motivo de saúde, de comparecer àquela solenidade, escreveu uma carta, na qual, dando o seu próprio testemunho, fez sobressair as qualidades de Allan Kardec.
                                                                                                                                                             Allan Kardec


            A Sra. Alexandrina Delanne possuía excelentes dotes mediúnicos, tendo sido mesmo um dos médiuns que, com suas comunicações, muito auxiliaram Allan Kardec no trabalho hercúleo da Codificação do Espiritismo.

            Fácil será concluir que o nosso Gabriel Delanne, ao reingressar na Terra, encontrou um ambiente espiritual propício à sua preparação, a fim de bem desempenhar, posteriormente, a tarefa que a seu Espírito fora confiada pelos Irmãos maiores da pátria do Além.

            Ele próprio afirmava, sem rebuços, que a sua crença inabalável era a espírita, coisa aliás digna de ser assinalada, porque bem demonstra a fortaleza de seu caráter. Confessar publicamente a qualidade de espírita, naqueles tempos já tão distanciados, era demonstrar nenhum temor às chacotas populares e às críticas desabonadoras que costumam fazer os homens enfatuados de seu saber terreno.

            Ouçamos as suas próprias palavras:

            “Minhas reminiscências remontam ao ano de 1860. Meu pai era espírita, tanto que aprendi o francês, escutando as suas conversas sobre Espiritismo, e mais ainda, ouvindo as suas explicações os seus raciocínios em torno do mesmo assunto. Assim é que formei minha consciência acerca do Mundo e da criatura pela prática diuturna desses argumentos paternos. 

            O articulista de “La Revue Spirite”, ao escrever, em o número de Março de 1926. o artigo de fundo referente à desencarnação de Gabriel Delanne, teve ensejo de frisar:

            “...Gabriel Delanne jamais poderia supor, quando adolescente, que mais tarde se tornaria um do primeiro líderes do Espiritismo Kardequiano. A impressão que se tinha era que o destino o faria perlustrar outros caminhos. Cursava, então, a Escola Central de Artes e Ofícios: seria engenheiro eletricista. Com isso, desde cedo orientaria seu pensamento pelos moldes rigorosos da Ciência, e pode-se dizer que essa sua formação intelectual serviu-lhe poderosamente e dela sempre se utilizou na elaboração de suas obras de proselitismo.”

            De fato, as obras de Delanne, para quem as lê sem ideias preconcebidas, influem de maneira decisiva no espírito do homem culto que sabe raciocinar e ver as coisas como realmente elas são;  sim, porque muitos as leem colocando antes um par de óculos, cujas lentes do fanatismo científico ou religioso deturpam e obscurecem completamente até a luz do próprio Sol que nos aquece e ilumina.

            Verifica-se, em todas as páginas das obras delanneanas surgir, palpitante, a precisão científica de sua argumentação, o respeito da verdade demonstrada. E não se diga que essa
leitura, devido ao seu caráter científico, seja enfadonha, cansativa, monótona. Absolutamente; muito pelo contrário, seu estilo simples e sugestivo prende a atenção dos leitores que lhe acompanham, cheios de interesse e entusiasmo o raciocínio vazado numa lógica perfeita e calcado nos mais sadios princípios científicos.

            Delanne sofria de profunda alergia por tudo que transpira erro e fraude. Seu interesse pelo estudo e propagação das obras de Allan Kardec, através da faceta científica., levou-o, quando contava tão somente 26 anos de idade, a abandonar a profissão de engenheiro.

            Há no Brasil um culto conterrâneo nosso que teve a ventura de conhecer pessoalmente Gabriel Delanne, aliás no último quartel de sua vida terrena, e é com prazer que transcrevemos da revista “O Revelador”, de Março de 1948, alguns trechos de uma sua entrevista. Trata-se do nosso confrade Dr. Canuto Abreu que disse:

            “Frequentei sua casa, que era sede também de uma sociedade espirítica. Assisti a trabalhos por ele presididos. Ouvi suas lições práticas. Suas longas e cintilantes narrativas. Suas discussões, em que às veze erguia a voz, exaltado pela convicção posta em dúvida e logo a abaixava, sorridente, ao perceber a porta do misticismo, que detestava como cientista.
            “Gabriel Delanne era a meu olhos como um herdeiro da missão em que seus pais haviam eficientemente colaborado. Era, naquele instante de minha vida, o maior e o mais velho da Segunda geração do ESpiritismo.

            Ainda o Dr. Canuto Abreu, através do primeiro número da revista que publicara com o titulo “Metapsíquica”, conta-nos que ao perguntar a Delanne se conhecera Allan Kardec. obtivera a resposta seguinte:

            “Perfeitamente. Acariciava-me e, duma feita, pondo-me ao joelho e abraçando-me pela cintura, profetizou que eu seria um sacerdote do Espiritismo. Não fui bem um “sacerdote” mas tenho a presunção de que fiz o possível em minhas forças para bem servir à Doutrina, no setor que me coube.”

            Adiante, a nova pergunta, respondia ele com humildade:

            “Nada tenho dilatado. Tudo que há é de Kardec. Apenas tenho feito constatações. Mostrei-as em meus livros e demonstro-as na prática diária. Nada acrescento.”

            Modéstia do grande escritor, pois quem lê suas obras verifica desde logo a larga contribuição que ele trouxe ao Espiritismo, acendendo novas luzes na obscuridade de muitos problemas concernentes à comunicação dos “mortos” com os “vivos”.

            Desde os 13 anos de idade se sentiu atraído pelas pesquisas em torno do Espiritismo experimental, e desde essa época se aplicou à observação continuada dos fenômenos que lhe era dado testemunhar no seu próprio lar.

            Gabriel Delanne, em palestra com Henri Regnaut, disse que quando resolvera consagrar-se resolutameente à propaganda espírita, foi-lhe transmitida uma mensagem do seguinte teor:

            -“Nada temas. Tem confiança. Jamais serás rico sob o ponto de vista material; coisa alguma, porém, te faltará na vida.”

            Era com indizível prazer que Delanne contava a seus íntimos o seguinte episódio de sua vida:

            “Em certo dia do ano de 1883, recebi uma carta em que a missivista, residente em Versalhes, encarecia a minha visita, a fim de inteirar-me sobre assunto concernente ao Espiritismo.
            A impressão que tive ao receber essa carta foi péssima, não apenas porque o papel era de inferior qualidade, mas sobretudo porque os termos em que estava vazada eram um tanto quanto obscuros, além dos muitíssimos erros ortográficos e sintáticos.
            Refletindo melhor, resolvi atender a essa solicitação. Em chegando à residência da missivista, veio abrir a porta uma senhora já idosa. Ao saber que se tratava da minha pessoa, fez-me entrar imediatamente, conduzindo-me a uma sala bastante ampla e modestamente mobiliada. A um canto dessa sala havia uma grande mala toda forrada de couro amarelo-escuro, a qual, desde logo, despertou minha atenção. Com uma terrível acentuação inglesa, a senhora, sem se preocupar com o exame a que lhe estava submetendo, repetia-me, já um tanto enfarada, ser pensamento seu fundar um jornal para difundir o Espiritismo.
            Mas, minha senhora, respondi-lhe, para tal cometimento torna-se necessário dinheiro, mesmo porque um jornal, para que se mantenha, exige muito dinheiro.
            Nesta altura a idosa senhora dirigiu-se, em passos pesados, em direção à mala. Abrindo-a, dela tirou um maço de velhos papéis e do meio deles uma grande carteira de couro, da qual retirou cinco cédulas de mil francos cada uma, entregando-mas tranquilamente. Diga-se de passagem que, nessa época – 1883-, cinco mil francos representavam uma soma muito elevada. E ao entregar-me essa importância disse: Eis o necessário para as primeiras despesas. Estou pronta a fornecer-lhe daqui por diante o que se tornar preciso. Estará disposto a aceitar o encargo de dirigir esse jornal? Surpreso, diante do inesperado, emudeci. Ela então repetiu com firmeza, aceita? Sim, articulei, e agradeço. Senhora, o interesse demonstrado em torno da difusão do Espiritismo.
            Para que agradecer? Retrucou-me, acrescentando: logo que saia o primeiro número peço-lhe procurar-me para juntos prosseguirmos na propaganda do Espiritismo. E, levantando-se e de modo um tanto brusco, deu-me a entender que a visita estava terminada.
            Foi assim que, graças à generosidade de uma inglesa, e que outra não era senão a Senhora Elisabeth d’Esperance – ainda desconhecida em França ,nessa época – que surgiu a revista “O Espiritismo”.”
           
            Realizou experiências com médiuns de grande fama. Em 1904, juntamente com- Charles Richet e outros estudiosos, presenciou os prodigiosos fenômenos de materialização da Vila Carmen, em Argel.

            Destarte, a produção literária de Delanne não se a apoia em especulacões imaginárias, mas em fatos por ele mesmo investigados e confirmados. Dedicando-se, de maneira especial, ao labor de demonstrar que o Espiritismo assenta sobre bases científicas, escreveu essas principais obras, que hoje correm mundo: “Recherches sur Ia Médiumnité”, “L’Âme est Immortelle”; “Le Spiritisme devant Ia Science”, ”Le Phénomène Spirite”, “L’Évolution Animique”, Les apparitions matérialisées de vivants et des mortes”, em dois volumes e com mais de 1300 páginas (primeiro tomo: “Les Fantômes des Vivants”; segundo tomo: Les Apparitions des Morts”, “Documents pour servir à l'étude de ta réincarnation” (Paris. 1924), e finalmente “La Réincarnation”.

            Em O Espiritismo perante a Ciência traça ele, com rara mestria, um quadro completo dos dados que o Psiquismo pode apresentar para merecer o respeito dos cientistas. E para darmos uma prova da admirável segurança, de sua argumentação basta que lancemos os olhos sobre suas páginas e verificaremos, então, que desde a época, já longínqua, em que apareceu a lª edição dessa obra - 1883 - o seu autor teve a satisfação de verificar que algumas das mais importantes teorias expostas tiveram a consagração da Ciência.. Isto ele próprio confessa na parte final da referida obra, em edições subsequentes.

            Delanne sabia muito bem quão poderosa é a força da intolerância, do fanatismo e da paixão, por isso na Introdução do seu livro “Pesquisa sobre a Mediunidade”, datada de 25 de Fevereiro de 1900, escreveu:

            “A luta é inflamada e, provavelmente, será longa, de vez que os prejuízos religiosos e científicos se mostram obstinados. Insensivelmente, porém, a evidência acaba impondo-se. Temos agora a convicção de que a grandiosa certeza da imortalidade se tornará uma verdade científica, cujas consequências benfazejas, fazendo-se sentir no mundo inteiro, mudarão os destinos da Humanidade.” 

            Noutro ponto dessa Introdução, salientava, bem inspirado, que a Física moderna, o magnetismo, o hipnotismo, a sugestão verbal ou mental, a clarividência, a telepatia e o Espiritismo, todos esses conhecimentos novos conduzem irresistivelmente o homem para o invisível e para o Além.

            Do Apêndice dessa mesma obra selecionamos o tópico seguinte:

            “As provas das comunicações do Espíritos, em cada ordem de fenômeno, são tão numerosas quão variadas: não é de se duvidar que o futuro ainda proporcionará novas provas de tal sorte que. diante do número e da esmagadora evidência dessas manifestações, o Espiritismo se apresentará como ele é realmente, isto é, a demonstração científica da Imortalidade.”

            O surto evolutivo, em geral, no século XX, tem sido espantoso, especialmente no que se relaciona com a Ciência, que nestes últimos anos atingiu uma proporção verdadeiramente geométrica. A Física e a Química, a partir da desintegração atômica, passaram a liderar as grandes conquistas do saber humano. Por isso não será fora de propósito dizer que a obra “A Evolução Anímica”, publicada em 1895, é mais um atestado eloquente das verdades do Espiritismo, e coloca a personalidade de seu autor num pedestal que bastante o dignifica.

            Muito conhecimentos científicos, expostos pelo autor, sofreram, no correr dos anos. uma natural transformação e progresso, o que, entretanto, não invalidou o vigor e a firmeza dos conceitos espiritistas emitidos por Delanne, mas, antes, vieram afirmá-los cada vez mais.

            Julgamos interessante trasladar, para estas colunas, dois tópicos da Introdução de “A Alma Imortal”:

            “O Espiritismo projeta luz nova sobre o problema da natureza da alma. Fazendo que a
experimentação interviesse na Filosofia, isto é, numa ciência que, como instrumento de pesquisa, apenas empregava o senso íntimo, ele facultou que o Espírito seja visto de maneira efetiva e que todos se certifiquem de que até então o mesmo Espirito estivera muito mal conhecido." “O problema da imortalidade da alma, que outrora pertencia à alçada da Filosofia, pode, nos dias atuais, ser atacado pelo método positivo. Já observamos uma orientação nova, criada pela pesquisa experimental.”

            O mundo tem sofrido muito em virtude das concepções materialistas que avassalaram, por assim dizer, quase que todos os ramos da atividade humana. Um dos maiores responsáveis por esse surto desagregador é justamente o clericalismo, com seus abusões e absurdos clamorosos, verdadeiras fábricas de descrentes e desiludidos. De maneira que são merecedoras de destaque estas palavras do autor de “O Fenômeno Espiríta”, contidas em seu Prefácio datado de 1893:

            “O materialismo triunfa por toda a parte mas já se pressente ser de pouca duração o seu reinado; basta servirmo-nos de suas próprias armas e combatê-lo em seu próprio terreno.”

            “A escola positivista encerra-se na experimentação; Imitemo-la: nenhuma necessidade temos de apelar para outros métodos, porque os fatos são obstinados, como diz o sábio Alfred Russel Wallace, e deles não é fácil desembaraçar-se.
            “Em vez de apresentar aos incrédulos toda a doutrina formulada pelos Espíritos e codificada por Allan Kardec, demos-lhes simplesmente a ler o trabalhos de mestres, como Robert Hare, Crookes, Wallace, Oxon, Zöelner, Aksakof, pois que não poderão recusar os testemunhos desses grandes homens, que são, por títulos diversos, sumidades intelectuais no vasto domínio das ciências.”

            No ano de 1925. Delanne, com cerca de 68 anos de idade, deu à luz da publicidade uma obra de incomparável valor, intitulada “A Reencarnação”, última, aliás, saída de sua maravilhosa pena. Embora a última, como dissemos, na ordem cronológica, não nos arreceamos em dizer que, pelo rigor de sua lógica, pelo valor de sua argumentação, pela escolha de suas provas, pela superioridade de sua tese, pela imparcialidade com que apresenta os fatos, essa obra é a primeira da coleção delanneana.

            A sua Introdução é uma peça notável e que bem merecia fosse integralmente incorporada a este artigo, não fora a angustiante exiguidade de espaço.

            Dessa forma, apresentemos apenas o trecho final:

            “A doutrina da reencarnação tem um alcance filosófico e social de considerável importância para o futuro da Humanidade, porque estabelece as bases de uma psicologia integral, que maravilhosamente se adapta a todas as ciências contemporâneas, em suas mais altas concepções. Estudemo-la, pois, com imparcialidade, e veremos que é ela mais que uma teoria científica, porque uma verdade imponente, irrecusável.”

            A idade avançada, a paralisia e a cegueira não conseguiram diminuir o potencial de sua atividade e a pujança da sua inteligência e nem arrefecer lhe o entusiasmo, sempre vivo em defesa dos postulado espíritas à luz da Ciência.

            Em toda as publicações espíritas apareciam seus escritos, com o deliberado propósito de esclarecer e firmar a convicção das verdades kardequianas, tendo o seu artigo de estreia aparecido em 1897. Fundou, em 1897, a “Revue Scientifique et Morale du Spiritisme”, na qual ficaram registrados preciosos trabalhos de sua autoria e de outros estudiosos do Espiritismo experimental.

            É bem certo que ele, absolutamente, não ignorava ser precaríssimo seu estado de saúde nos últimos anos de vida, o que todavia não o induzia a cruzar os braços à espera que soasse a hora da libertação de seu Espírito. Basta dizer que cogitava escrever mais um livro, cujo conteúdo já estava espiritualmente delineado. Não o escreveu, porém, porque no dia 15 de Fevereiro de 1926, na mesma Paris que o viu nascer, seu Espírito se desprendia da matéria, rumo à Espiritualidade.

            Seu último trabalho jornalístico, intitulado “A Exteriorização do Pensamento”, saiu publicado em “La Revue Spirite” de Fevereiro de 1926, quando então ele não mais se encontrava entre nós.

            Por esse artigo bem se pode avaliar a lucidez e a pujança de seu Espírito de escol. Demonstrando, além da genialidade e exatidão dos ensinos legados pelo Codificador lionês em suas obra fundamentais, no que concerne ao assunto em pauta, Delanne assim iniciava o aludido artigo:
           
            “Foram os espíritas censurados algumas vezes por haverem aceito AIlan Kardec como mestre, mas, a nosso ver, essa censura quase não se justifica, porque, estudando-se atentamente as suas obras, somos levados a reconhecer que desde meados do século passado Kardec possuía conhecimentos que ultrapassavam, de muito, não somente os dos psicólogos, mas até mesmo os dos espiritualistas das outras escolas.”

            Gabriel Delanne, ao prefaciar a obra “Katie King, histoire de ses apparitions, em 1899, entre outras coisas, escreveu uma passagem que bem define o seu propósito de mostrar, de maneira exuberante, que os postulados da Codificação Kardequiana são de tal ordem que a Ciência, com todo o seu poder e autoridade, jamais lhe conseguirá abalar os alicerces, mesmo porque os processos científicos, quando aplicados com honestidade, só levam a concluir pela veracidade da Doutrina Espírita.

            Bem sabemos que isso não pode agradar aos homens que só veem diante de seus olhos matéria, sempre matéria e nada mais que matéria! e aos teólogos que sabem que a implantação dos ensinos dos Espíritos importa na erradicação formal dos dogmas que sustentam suas religiões, inconsistentes às mais simples análises científicas.

            Ora, como Gabriel Delanne, cujo nome imprime autoridade, situou o Espiritismo em bases científicas, era natural que sofresse também a ira dos que se sentiram prejudicados e ameaçados em seus interesses personalistas e de castas.

            Ele soube, pela sua formação espiritual, pela sua sólida cultura e também pela fina educação que recebera no lar, bafejado pelas luzes do Espiritismo, ele soube, repetimos, enfrentar todas as situações, delas saindo cada vez mais respeitado e admirado.

            Mas voltemos ao prefácio a que aludimos e do qual selecionamos esta passagem:

             “O Espiritismo foi muito escarnecido pelos ignorantes e pelas pessoas interessadas em destrui-lo, mas, como ele se apoia em fatos naturais, fácil lhe foi vencer seus detratores e, mais forte, como nunca esteve, marcha para a conquista do mundo intelectual. Como explicar seus continuados progressos? É que ele tem como método a pesquisa científica, a que emprega a observação e a experiência e que recruta seus adeptos entre as pessoas positivas, ávidas de conhecimentos precisos sobre o dia que sucedem ao da morte.
            “A filosofia é impotente para nos informar a respeito da natureza do princípio pensante e respectivo futuro; seus mais célebres representantes chegaram a conclusões diametralmente opostas sobre esta questão fundamental. O espírito que investiga com imparcialidade erra, desorientado, no inextricável dédalo das afirmações contraditórias e cai finalmente no ceticismo, ao verificar a incapacidade daqueles que tentaram decifrar o enigma de nossos destinos. As religiões apelam para a fé, no propósito de sustentarem seus ensinos dogmáticos, mas como diferem entre si e como todas pretendem ser as únicas portageiras da verdade absoluta, elas deixam o pesquisador na indecisão. Quem, pois, nos dará a certeza da realidade da alma e nos dirá se ela é imortal?
            “Não hesitamos em responder que o Espiritismo resolve completamente estes problemas. Ele se utiliza da observação e da experiência para estabelecer que a alma existe durante a vida e que sobrevive à destruição do corpo físico. Foi empregando este método positivo que o Espiritismo criou a verdadeira psicologia experimental, aquela que se baseia em fatos sempre controláveis, quando as circunstâncias permanecem as mesmas.

            E mais além, nesse mesmo Prefácio, afirmava aos negativistas por sistema:

            “Não é mais à meia-noite, no matagal deserto ou nos castelos em ruínas, que os fantasmas se mostram; é no laboratório do sábio que eles aparecem para se submeterem a todas as condições do mais rigoroso exame.”

         Gabriel Delanne (jovem) 
Já no remate de sua peregrinação terrena, Gabriel Delanne, como sabemos, perdeu a visão para as coisas físicas, ficou cego! Incapaz, portanto, para continuar nas suas pesquisas científicas. Acontece, porém, que um novo campo de observações se lhe abriu, e ele passou a descortinar coisas maravilhosas que jamais supusera pudessem existir além das verdades espíritas encaradas pelo único ângulo que ele as admitia - o ângulo da ciência positiva!


            Naturalmente, para que seu trabalho não fosse acoimado de fé subjetiva, de misticismo, ou de ideias filosóficas, o Espírito de Delanne, nessa encarnação, veio com a missão específica de realçar os fenômenos espíritas, expondo a verdade exuberante da Codificação Kardequiana, tudo em perfeita consonância com os preceitos e postulados da ciência humana.

            Por isso o Dr. Canuto Abreu, em seu citado artigo na revista “Metapsíquica”, disse aludindo a Gabriel Delanne:

            “Mentalidade politécnica, afeiçoada desde cedo aos estudos exatos, às pesquisas científicas, às observações frias, às deduções rigorosas, ao horror do erro, da ilusão e da fraude - foi o chefe supremo da parte experimental do Espiritismo, à qual deu o maior desenvolvimento, ainda não suplantado.

            Cumprida a tarefa que lhe fora confiada e da qual tão magnificamente se desincumbiu, recebeu, como prêmio, a cegueira física para que os olhos do Espírito pudessem então maravilhar-se com a verdade integral do Espiritismo!

            Sim, porque Espiritismo não é ciência, Espiritismo não é filosofia. Espiritismo não é religião! Espiritismo é um todo indecomponível, formado destas três facetas. E Gabriel Delanne durante sua longa peregrinação foi privado das consoladoras bênçãos do Espiritismo total, não porque seu Espírito não sentisse ânsias de algo que só a filosofia concede e que o Evangelho faculta, dentro desse organismo para onde convergem as três forças propulsoras do verdadeiro progresso espiritual, na sua mais lata e ampla acepção . Mas era preciso que ele sofresse e ficasse assim privado desses sublimes refrigérios da alma, a fim de que a Doutrina Espírita penetrasse nas altas esferas do conhecimento humano, para que despertasse os homens de pensamento, de maneira a que vissem
no Espiritismo uma fonte inexaurível de estudos da mais alta transcendência. E essa cegueira e mais a paralisia que lhe dificultava os movimentos, fechando-lhe definitivamente o mundo dos efeitos, transportou-o para o das causas, pouco penetrável pela ciência dos homens. E é ainda Canuto Abreu quem nos pinta, com tintas muito delicadas, o quadro da nova fase do extraordinário Gabriel Delanne dizendo:

            “Então, num plenilúnio de recompensa dada ainda em vida terrena, ele foi encontrar o redil dos cordeiros cristãos. Aproximou-se como peregrino cansado. Tateou a cerca até a porta. Bateu. A porta era Jesus, e abriu-se. Ele entrou emocionado. Aquele rebanho, que nunca o havia interessado quando gozava a visão da  carne, era agora o seu rebanho.”

            Grande, pois, foi a surpresa para os circunspectos psiquistas de todas as partes do mundo, que haviam acorrido ao Congresso Espírita Internacional, em 1925, quando, na sessão de abertura dos trabalhos, a 7 de Setembro, se fez ler o discurso de Delanne, e que assim principiava:

            “Roguemos para os nossos trabalhos a bênção divina, pois que é nela que reside todo o poder, toda a ciência, toda a justiça, toda a bondade e todo o amor.”

            Noutra parte dessa mensagem ao Congresso, lembrava ele aos estudiosos presentes:

            “Para todas as nossas investigações, não receemos pedir ao mundo invisível as instruções necessárias. Não nos esqueçamos de que uma falange de grandes sábios continua no Além a se interessar pelos nossos trabalhos. Eles se acham associados aos Espíritos de Luz Incumbidos de dirigir o grande movimento de renovação moral e intelectual tão necessária na hora presente! Com toda as nossas forças, apelemos para eles. Que esse amigos nos inspirem!”

            Como se vê, Delanne revelava-se agora um espírita completo.

            Desencarnou, como dissemos, em 15 de Fevereiro de 1926, justamente quando ia escrever, para o “Bulletin” da União Espírita Francesa (Union Spirite Française) , mais uma das suas eloquentes páginas de saudação a todos os espíritas franceses, de maneira que esse periódico, em vez do seu costumeiro artigo, trouxe, nesse mês de Fevereiro, em sua primeira página, o necrológio do gigante do Espiritismo científico, que também foi membro do Comité do célebre “Instituto Metapsiquico Internacional” e apreciado conferencista.

           Jean Meyer
Para finalizarmos, ouçamos o depoimento de Jean Meyer (o grande amigo de Allan Kardec, o homem que em 1919 criou, em Paris, o Instituto Metapsíquico Internacional e a União Espírita Francesa) no seguinte trecho do discurso que então pronunciou em Londres, quando do Congresso Espírita Internacional de 1928:

            “Relembrando a memória de Léon Denis, não poderei olvidar a de Gabriel Delanne, Presidente da União Espírita Francesa e da Sociedade Francesa de Estudos dos Fenômenos Psíquicos. Ele era, como Léon Denis, membro de honra da Federação Espírita Internacional. Até o último alento, foi um trabalhador incansável, sendo muito importante para o Espiritismo a sua contribuição, pois seus escritos, e, com justiça, são considerados com os de Allan Kardec, Léon Denis e Bozzano, clássicos do Espiritualismo moderno. “
                                                                                                                                      Leon Denis

            Todos os anos, no domingo mais próximo do dia 31 de Março, data da desencarnação de Allan Kardec, os espiritistas franceses prestam ao mesmo, diante de seu túmulo, no Père-Lachaise, sentidas homenagens, fazendo-se então ouvir os mais destacados representantes do movimento espírita de França.

            E sempre após esta cerimônia simples e toda espiritual, os presentes, conforme é de tradição, se encaminham para um outro sepulcro, situado pouco adiante: é onde jazem os despojos do grande admirador de Kardec, - Gabriel Delanne. Aí, um que outro orador dirige a esse Espírito palavras de reconhecimento, exaltando lhe a relevante obra e os incontestáveis méritos.

            Gabriel DeIanne dedicou toda a sua vida à propagação do Espiritismo, pelo qual e sacrificou inutilmente aos olhos daqueles que só veem no imediatismo a verdadeira razão do viver humano e por isso, não podem compreender que, por força desse desprezo pelas vaidades e ambições terrenas, ele se cobriu com o louro espiritual de um trabalho bem conduzido, sem vacilação e fielmente executado até seu derradeiro instante da vida corpórea.

            Saudamo-lo, em nome desta revista e através desse modesto trabalho, ao ensejo do Primeiro Centenário de sua vinda à Terra, com o nome de Gabriel Delanne.