Pesquisar este blog

Mostrando postagens com marcador Pedro Richard. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Pedro Richard. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 29 de junho de 2021

Teosofia e Espiritismo - Parte 3 e final

 


Teosofia e Espiritism- Parte 3 e final

por Pedro Richard
Reformador (FEB) 16 Fevereiro 1916 

        Meu caro amigo:
           Nessa terceira e última carta, cabe-me transcrever mais alguns trechos do Evangelho, referentes aos pseudos cristos. Comparando estas passagens com outras dos folhetos da Teosofia, que me ofereces-te gentilmente, fui levado a crer que esta doutrina era a fonte dos falsos profetas anunciados pelo Senhor. Se não, vejamos:
           Mar. Cap. XII.
           21. E se então vos disser alguém: reparai, aqui está o Cristo; ei-lo, acolá está; não lhe deis crédito.
           22. Porque se levantarão falsos cristos e falsos profetas que farão prodígios e portentos para enganarem, se possível fora, até aos mesmos escolhidos. 
           25.E cairão as estrelas do céu (1) e se comoverão as virtudes que estão no céu.
           (1) Descerão os espíritos.

           26. E então verão o Filho do homem, que virá sobre as nuvens (2) com grande poder e magnitude.
           (2) Não por ventre de mulher.

           32. A respeito, porém, deste dia ou desta hora, ninguém sabe quando há de ser, nem os anjos do céu, nem o Filho, só o Pai.
           Mat. Cap. XXIV (Vê os vs. 4,5,11, 23, 24, que são iguais aos transcritos acima).
           27. Porque, como um relâmpago que sai do oriente e se mostra até ao ocidente, assim também há de ser a vinda do Filho do homem.
           Luc. Cap. XXI, vs. 5 a 19; XVII, vs. 22, 23, 24. 
                                                                                     *
           Pelas transcrições que aqui ficam, o Cristo, na sua alta pré ciência, nos avisou do que se está passando e de que só voltaria à Terra sobre nuvens. E virá para o que é seu, quando este mundo for o seu reino. Isto acontecerá apenas numa época apenas conhecida do Pai... e dos profetas teósofos que, mais do que Jesus e os anjos do céu, o sabem. 
           O Cristo voltará ao planeta, é verdade, mas em espírito, quando o nosso mundo estiver purificado e em condições morais de ser habitação dos bons, dos espíritos sem pecados. Seus corpos não serão grosseiros como o nosso, mas corpos fluídicos, compatíveis relativamente com a pureza do Cristo.
           No entanto, a Teosofia anuncia e espera para já um cristo; é claro que este pode ser senão o falso cristo.
           Será crível que para os teósofos o nosso tenebroso planeta já se encontre em condições morais de receber o Cristo em toda a sua pureza?
           Neste mundo, então, não impera mais o crime e só o habitam os bons e os puros?
           Não, os teosofistas não esperam o Cristo que vem para o seu reino, viver com os seus: os teosofistas esperam um instrutor. Cristo, porém, não prometeu voltar como instrutor. A sua doutrina aí está para todos os que desejem sinceramente ser os seus discípulos; a mesa do banquete do Senhor está posta e todos são convidados, até mesmo os coxos e os estropiados.
           O cristo, já esperado pelos nossos irmãos teósofos, não é o que virá - segundo a frase evangélica - em todo o seu esplendor, sobre nuvens, do mesmo modo que um relâmpago, que sai do oriente e se mostra até o ocidente, porque, como é  óbvio, o nosso planeta desgraçadamente ainda está muito longe de ter conseguido os requisitos morais necessários para receber o Cristo autêntico, o mesmo Cristo de Nazaré.
           Em verdade, Ele virá, mas quando houver na Terra elementos compatíveis com o seu adiantamento e a sua natureza espiritual. 
           O que é lógico e o bom senso nos aconselha, meu bom amigo, é que de acordo com os ensinamentos evangélicos e os conhecimentos dados pelo espiritismo sobre o sentido das palavras do divino Mestre, nós nos acautelemos contra os falsos cristos. Perdoa-me se te magoo com a rudeza da minha expressão, chamando falso ao cristo que tu esperas como legítimo. Lembra-te de que sou espírita cristão e falo deste ponto de vista. Tu consideras o Cristo como um missionário qualquer, como o instrutor de uma raça; eu o tenho em conta de Chefe deste planeta, a cuja formação Ele presidiu, o Senhor desta humanidade, rebanho de que Ele é o único Pastor.  
           Dirás que o advento esperado não é o do Cristo. Mas os teosofistas estão convencidíssimos dessa - para ti e os teus confrades - auspiciosa visita. O ilustrado representante em nosso país da "Ordem da Estrela do Oriente", espírito que por muitas formas se tem manifestado altruísta e superior, e cujo nome tenho a honra de citar nesta obscura e despretenciosa missiva - o Dr. Raymundo Seidl, assim se exprime no 'Teosofista' de 7 de abril de 1915, pág. 190: 
           "Como sabem os leitores, o fim da "Ordem da Estrela do Oriente" é reunir aqueles que acreditam que um grande Instrutor espiritual virá proximamente ajudar a evolução da humanidade. Para conseguir tão alto "desideratum" os membros da Ordem devem fazer a seguinte evocação à hora certa: para o Rio de Janeiro e Bahia às 6 horas. "Eis a evocação: "O Mestre de Grande Loja Branca, Senhor das religiões do mundo! Volta!  Volta de novo ao mundo! Volta! Volta de novo à Terra, que por ti anseia! Volta e vem ajudar as nações que aspiram pela tua presença! Dize a palavra de fraternidade que unirá numa só família as classes e as castas que entre si lutam! Vem! Vem com o esplendor de todo o teu poder e salva o mundo que aspira pela tua volta! Tu, que és o Instrutor dos anjos e dos homens! Que assim seja!"
           Mestre da Grande Loja Branca, Senhor das religiões do mundo, Grande Instrutor dos anjos e dos homens - nem se duvide que não seja o Cristo, mesmo porque não é necessário inferir das expressões do preclaro representante da Ordem - respeitável e erudita teosofista senhora Anne Besant, positivamente anuncia num artigo traduzido para a simpática revista Amor, da Bahia (edição de 11 de abril de 1913). O Grande Instrutor esperado e desejado é o Cristo. 
           Aludindo à invocação transcrita eu te digo: A palavra da paz que fará cessar as lutas, já foi pronunciada por Jesus quando disse: "Ama teu inimigo".
           Estas três palavras, que encerram uma epopéia e que constituem a pedra angular sobre a qual repousa todo o monumento da paz universal, foram desenvolvidas e profundamente explicadas pelos espíritos na Revelação da Revelação dada ao Sr. Roustaing.
           A palavra de fraternidade também já foi dita e ensinada por Jesus no seu Evangelho (João, cap. X, vers. 1 a 10).
           A fraternidade, meu amigo, é condição indispensável, sine qua non, para só aspirar a ser discípulo de Jesus, que quer que todos, toda a humanidade, constituam uma só família. "Um só rebanho com um só pastor" na frase do Evangelho de João.
             Enfim, meu Rodrigues, que viria fazer aqui o Cristo em pessoa, quando Ele já está conosco representado pelo Consolador, que é o Espírito Santo, o Espírito de Verdade, "que nos ensinará todas as coisas?" (João, Cap. XIV, vers. 13 a 31).
           Se o próprio Cristo nos anunciou que o Consolador (que é o Espiritismo) nos ensinaria todas as coisas, para que teria Ele de vir novamente para nos ensinar o que já nos ensinou, isto é, dizer-nos as palavras de paz e fraternidade?
           O que é lógico e concludente, meu preclaro Rodrigues, é que a seita ou religião que tem no seu programa e como um de seus principais objetivos provocar a vinda de Jesus Cristo para nos ensinar a adquirir virtudes e, do mesmo passo, nos liberar dos erros e crimes, desprezando assim os ensinamentos do próprio Jesus contidos nos Evangelhos - é anti evangélica, é numa expressão sintética, o Falso Profeta.  
           Tal seita ou religião será tudo quanto quiserem, menos espírita.
           Assim sendo, eu, espírita cristão, não posso caminhar contigo. Estarei laborando em erro? É possível, mas eu prefiro errar com Jesus. Que - eu te imploro - não me arranques do coração! 
           Que Ele nos ilumine, é o voto que de coração faz o dedicado amigo.






segunda-feira, 28 de junho de 2021

Teosofia e Espiritismo - Parte 2

            

Teosofia e Espiritism- Parte 2

por Pedro Richard
Reformador (FEB) 1º Fevereiro 1916

 Ao bom Rodrigues,


           Meu amigo,
           Na primeira missiva, afirmei que a Teosofia é anti-espírita, porque a nossa doutrina foi revelada pelos espíritos  com o fim de provar que se comunicam conosco, dando-nos a conhecer as leis que presidem a esse fenômeno, instruindo-nos na maneira de bem fazermos esse comércio com eles, quer estejam livres e desembaraçados no Espaço, quer, mesmo, encarnados, contanto que se ache o corpo adormecido - caso este em que o espírito de certa forma também está livre. Destarte nos dão a conhecer o aparelho mediúnico em todas as suas modalidades e grandezas.
           Em uma palavra, a doutrina espírita foi e vai sendo dada aos homens pelos espíritos, - prepostos de N. S. Jesus Cristo para essa alta e nobre missão - e nos vem provar que os espíritos atrasados e infelizes se manifestam, tentando, por todos os meios ao seu alcance, dar batalha ao Evangelho, lançando para esse fim mão de embustes, mistificações, etc.. Para conseguir o seu "desideratum" esses infelizes promovem contra os seus irmãos todo o mal possível, dentro dos limites da lei das provas, dando com semelhante procedimento lugar à enfermidade moral que denominamos obsessão. É então quando devemos intervir no intuito caridoso de esclarecê-los e procurar modificar os seus sentimentos perniciosos. Isto devemos fazer principalmente com as nossas preces ungidas de fé, amor, caridade e humildade.
           O que acabo de dizer tenho para mim como verdade indiscutível, porque há anos venho com assiduidade investigando essa ordem de trabalhos, assistindo a muitas dezenas de curas de obsessão, havendo tido a ventura de ter para diretores de semelhante trabalhos os saudosos companheiros, hoje no Espaço, doutores A. Bezerra de Menezes,   Bittencourt Sampaio e A. Luiz Sayão, que foram e continuam a ser meus mestres.
           Para os espíritas, meu caro Rodrigues, toda a Criação é dirigida e governada pelos espíritos, sendo que o mundo espiritual é o mundo das causas e o material o dos efeitos. Tudo, pois, é dirigido pelos espíritos, que executam o plano arquitetado por Deus.
           A Teosofia, meu caro amigo, é a negação de tudo isso; não admite a comunicação entre encarnados e desencarnados, senão quando aqueles estiverem dormindo, visto como os espíritos desprendidos da matéria não nos escutam, não percebem as nossas ações físicas, de que se conclui que não podemos ser tentados nem dirigidos por eles.
           Não invento; relê um pouco do que diz o grande e conceituado teósofo Sr. C. W. Leadbeater no seu folheto: Aos que choram os mortos (1)

            (1) Diz a loja Teosófica 'Perseverança' nesse folheto: "O Sr. Leadbeater é diretor e instrutor no plano físico; foi protestante e estudou fenômenos mediúnicos e há mais de 30 anos vive uma vida de abstração, como viviam os eremitas da Idade Média".

           "Os mortos então nos enxergarão? podem perguntar; escutarão o que dizemos? Indubitavelmente podemos  dizer que nos veem, pois estão sempre conscientes da nossa presença; sabem se estamos felizes ou se nos sentimos mal; mas não escutam as nossas palavras e não tem consciência das nossas ações físicas. (pág.30). Desenvolvendo a questão termina dizendo: "O que, portanto, o homem morto pode ver de nós é somente o corpo espiritual" (pág. 31). "Até agora só tratamos da possibilidade de alcançar os mortos, elevando-nos ao seu plano durante o sono, que é o caminho normal e natural. Há também, evidentemente, o método anormal e antinatural das evocações em que, momentaneamente, os mortos se revestem outra vez de seu véu carnal e se tornam assim mais uma vez visíveis aos nossos olhos físicos. Os investigadores do Oculto não recomendam esse método; em parte porque muitas vezes atrasa o morto na sua evolução e, em parte, porque há grande incerteza a esse respeito e muita possibilidade de ilusão e exibicionismo (pg.49).
           Entendeste, Rodrigues? Onde uma doutrina mais anti-espírita e mais contrária à nossa ordem de investigações do ue a Teosofia apregoada pelo Sr. Leadbeater?
           Eu te poderia citar milhares de fatos que atestam que os espíritos nos veem, nos escutam, nos respondem e muitas vezes sustentam longos diálogos conosco, o que prova que o Sr. Leadbeater não tem razão.
           Apenas para assentar ideias, vou citar-te um fato passado há trinta e tantos anos com o meu inolvidável mestre Dr. Bezerra de Menezes:
           Ei-la:
           Havendo, duma feita, o Dr. Adolpho Bezerra de Menezes, pelo médium Nascimento, pedido ao espírito do Dr. Dias da Cruz (que na Terra fora seu íntimo amigo, ao ponto de chamá-lo por Chico), umas consultas médicas para amigos seus, deixou, no entanto, de solicitar para si remédios - porque, tendo estado doente, se julgava já curado. O espírito do Dr. Dias da Cruz respondeu ao Dr. Bezerra: "O meu caro adolpho se esquece dum quisto que tem embaixo de sua espessa barba, que é uma manifestação do estado mórbido de seu baço."
           Disse-nos o Dr. Bezerra que nem a sua própria esposa sabia da existência desse quisto e que ele próprio tinha se esquecido de semelhante coisa.
           Percebeste? O espírito do Dr. Dias da Cruz viu o quisto e acusou positivamente a sua existência. Bezerra aceitou a receita, tratou-se e o quisto desapareceu. O que é verdade é que o espírito viu o quisto e, no entanto, a Teosofia prega que o espírito desprendido da matéria não nos vê o corpo!
           São fatos, meu Rodrigues, e estes falam com muito mais eloquência do que as teorias. Teorias destroem teorias; mas os fatos não: "contra eles não há argumentos". As teorias são abatidas e desaparecem: os fatos focam, são inexpugnáveis, indestrutíveis. Por isso é que sou espírita: porque sei por provas provadas que as teorias espíritas são confirmadas pela observação dos fatos, pelo melhor método da ciência - a experimentação. Na minha longa vida de espírita, observando os fatos, tenho verificado a exatidão de todas as teorias do Espiritismo.

                                                                                  *     
           A Teosofia é também anti-evangélica.
           Vejamos o que dizem os Evangelistas:
           Lucas - (C. I., vs. 1 a 25) - O Espírito Gabriel se manifestou no templo a Zacarias, fala-lhe, responde às suas objeções e anuncia-lhe a mudez. (idem, vs. 26 a 80) - O anjo Gabriel aparece à Virgem, sauda-a, previne-a da bendita concepção, responde-lhe às suas perguntas. - Mateus (C. XVI, vs. 13 a 20) - Jesus confirma  a revelação mediúnica  feita a Simão Pedro. (Idem C. XVII, vs. 1 a 19) - Jesus transfigura-se no monte Tabor aos olhos de seus discípulos Pedro, João e Tiago, os quais ouviam vozes.
           Poderia eu citar inúmeras passagens se não bastassem as que acabo de mencionar para provar-te que o Evangelho é oposto à Teosofia, a qual afirma - segundo declara o Sr. C. W. Leadbeater, nos transcritos que fizemos linhas atrás - que os espíritos desencarnados (mortos na linguagem teosófica) não nos escutam.
           Prossigamos:
           Jesus disse: Um só é vosso Mestre, o Cristo, vós todos sois irmãos. Não vos intituleis mestres. O que dentre vós é o maior, será vosso servo. (Mateus, C. XXIII, vs. 8 a 12) 
           Ao passo que assim se exprime Jesus, a Teosofia tem mestres, instrutores. Há membros de sociedades teosóficas e há teósofos, o que vale dizer que na Teosofia há 1º e 2º.
           Jesus também disse: "Quem não é por mim é contra mim. Quem não ajunta comigo, desperdiça". Estas dua frases são bem eloquentes e querem dizer que quem não representa a verdade é instrumento do erro e da mentira e retarda o progresso. Quem não ama a luz, vive nas trevas. Esses tais arrastam os seus irmãos ao vício, ao ódio e à vingança. 
            No entanto, o esquema circular organizado pela Sociedade Teosófica, mostra-nos que por todos os caminhos se vai ao centro do mesmo esquema, onde em círculo concêntrico  se encontram as palavras Teosofia - Fraternidade Universal como que ocupando a circunferência e no centro Deus - Amor - Verdade. Debalde aí procurei o Cristo: não O encontrei.
           Até o ateu vai ter à Teosofia e por intermédio da Teosofia a Deus. O caminho, pois, para se ir a Deus é para ti e teus confrades, a Teosofia. Todavia, no Evangelho por João (c. XIV, vs. 1 a 12) diz categoricamente Jesus: Eu sou o caminho, a verdade, a vida ; ninguém vem ao Pai senão por mim. 
           Já vês, meu caro amigo, que o esquema da Tua Teosofia é profundamente anti evangélico. Não traduz, portanto, nem o pensamento cristão, nem tampouco os ensinamentos deixados pelo Divino Mestre.
           Não me surpreende, fica certo, a doutrina teosófica, pois, para mim tenho que ela é o porta voz  do falo profeta tantas vezes aludido por N. S. Jesus Cristo.
           Dir-te-ei porque na terceira missiva. 
           Até.      

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Teosofia e Espiritismo - Parte 1

 


Teosofia e Espiritismo - Parte 1

por Pedro Richard
Reformador (FEB) Janeiro 1916

Ao bom amigo Rodrigues,

          Agradeço muito a fineza de teres mandado para mim alguns livros e folhetos de Teosofia, na louvável atitude de orientares o meu pobre espírito e me provares que os pontos de contato que, dizem os teósofos; há entre a Teosofia e a Revelação dada pelos Espíritos a Allan Kardec e a Roustaing são tais e tantos, que bem se pode considerar a Teosofia como sendo o Espiritismo evolvido.
            Pelo muito que te quero e pela pureza de tua intenção, pretendendo melhor nortear o meu espírito ávido de luz e de verdade, fiz meditada leitura de semelhantes livros com o fito de conhecer a verdade e até onde a verdade estava com o meu Rodrigues.
           Cheguei à conclusão de que estás elaborando em erro. E sabes porque andas em erro? Simplesmente pelo pouco conhecimento que tens das obras de Allan Kardec e do Evangelho em espírito e verdade. 
           Sendo o Espiritismo, como é, uma revelação dada pelos Espíritos, é óbvio que não consiste ele tão somente na crença no Deus uno, na manifestação dos espíritos ou, mesmo, nas reencarnações, pois, como sabes, tudo isso há de muito é conhecido e sustentado por escolas e seitas que já eram cultivadas antes do Cristo, inclusive o velho Testamento; nem mesmo é a "fraternidade" o seu alicerce, pois que a fraternidade é também apregoada e pregada por escolas que não cogitam de Deus nem de espíritos, como por exemplo a positivista, a evolucionista, etc.. Tudo isto já estava desde muito revelado.
           O Espiritismo, meu bom Rodrigues, é certo que sanciona todas estas verdades, mas ele não para onde as outras religiões estacionam. Não, ele trás para a arena da discussão todos os fatos, e estuda com profundeza e à luz da razão e da ciência as leis que os regem, as causas que os determinam. Ele nos fornece os meios seguros para as investigações de ordem moral ou científica.
          O Espiritismo, meu amigo, nos veio proporcionar as provas provadas de que as boas condições morais são indispensáveis a toda ordem de trabalhos que visam a regeneração dos espíritos encarnados ou desencarnados, o que o cultivo das virtudes lhes é sobretudo imprescindível. E isso porque só a nossa relativa pureza dalma e as virtudes podem atrair para junto de nós os espíritos de luz, os únicos capazes de ensinar-nos a verdade, (que é representada pelo Evangelho), isto é, a palavra santa de Jesus compreendida em espírito e vida. É nisso querido irmão, que consiste a nova revelação trazida à Terra pelos Espíritos, prepostos de Jesus para o desempenho dessa alta e santa missão; porque ele é o Consolador prometido por Jesus, que nos ensinará as coisas (João, Cap. XIV, núm. 26).
           Assim sendo, o Espiritismo é a chave que abre à nossa inteligência a compreensão progressiva do Evangelho, a fim de acelerar o nosso progresso nos tempos que são chegados, tornando-os destarte felizes e libertos do erro e da mentira. Ao mesmo tempo, ele destrói a imagem desse deus mau e rancoroso que só existe no cérebro daqueles entre nossos irmãos que o criaram para fins inconfessáveis.     
           O Espiritismo, enfim, nos veio fazer compreender o verdadeiro Deus - o Deus de amor e caridade - e provar-nos que só se vai ao Pai pelo cultivo da fé, do amor, da humildade e da caridade, notadamente pelo destas duas últimas virtudes, que limpam os nossos espíritos da lepra peçonhenta do egoísmo e do orgulho.
           Caro Rodrigues: a humildade, que é o nosso remédio máximo, só a encontramos no Evangelho de N. S. Jesus Cristo.
           Ah! meu Rodrigues, como se nos apresenta grandioso o Presépio de Belém! Aquelas palhas, que serviram de cama ao gado, como as vemos agora transformadas em leito de arminho para receber e nele repousar o Menino Jesus, o maior dos Espíritos baixados à Terra, o Enviado de Deus, o Seu Ministro, em suma! E, no entanto, Ele não teve uma casa, um casebre mesmo, para nascer! Como é nobre esse exemplo de humildade da família do simples e pobre carpinteiro que se chama José! Como é grandioso e sublime ver-se o Rabi da Galiléia recrutar seus discípulos entre os humildes pescadores e até mesmo entre os cobradores de impostos, os mal quistos e desprezados do povo! É que eles eram pobres de bens materiais e ricos de virtudes. Que sublimidade e que grandeza, meu amigo, vê-lo entre os publicanos e gente de má vida e repartir com eles a caridade e afastando esses espíritos do erro para os acomodar no seio bendito de Deus! É que eles eram pobres de bens materiais e ricos de virtudes. Que sublimidade e que grandeza, meu amigo, vê-lo entre os publicanos e gente de má vida a repartir com eles a caridade e afastando  esses espíritos do erro para os acomodar no seio bendito de Deus! Como é majestoso ver-se este Jesus sentado à mesa com os seus discípulos, associando-se a eles na ceia pascoal e com eles repartindo o vinho que simbolizava o Seu sangue, que deveria derramar em holocausto à humanidade escravizada ao erro, aos vícios e paixões! Que magnitude, caro Rodrigues, ver-se este Homem quase Deus tomar de uma bacia e toalha e lavar os pés aos Seus discípulos, inclusive do próprio Judas - o espírito fraco e desgraçado que, dali há pouco, teria de cometer o maior, o mais ignóbil dos crimes, a traição! Mas é que ninguém, absolutamente ninguém, estava excluído do seio amoroso de Jesus, nem mesmo os Seus mais encarniçados inimigos!
           E Jesus, o Mestre divino, assim procedendo disse aos seus discípulos, que representavam a humanidade: "Vós me chamais Mestre e Senhor, vos laveis os pés, deveis o mesmo fazer uns aos outros.(João, Cap. XIII, vs. 1 a 15).
           Ouviste, Rodrigues, o que disse o Mestre?
           Pois lava os pés dos teus inimigos, mas lava-os com tuas lágrimas e as enxuga ao calor de teu seio amoroso, porquanto, bem sabes que é preciso que faças do teu inimigo um amigo teu, e nem basta que fique sendo um amigo somente, senão que seja também amigo de Jesus, o Pastor bendito que recebe de braços abertos a ovelha tresmalhada que queira voltar ao aprisco.
           Meu caro Rodrigues, faze-te humilde e será discípulo de Jesus, o nosso divino Mestre e Senhor.
           Por caridade eu te peço: não me tires das mãos o Evangelho em espírito e verdade. Ele tem feito a minha felicidade de homem e, certo, far-me-á do espírito. Nele, somente nele, tenho encontrado o único remédio que cura a enfermidade geratriz de todos os males da alma: o orgulho que, semelhante ao cancro, me corrói o espírito.
           Se tu não sofres desse hediondo mal, que me chumba à Terra  me faz escravo do erro e das paixões; se pela educação primorosa da tua vontade tudo concedes e com tudo condescendes - feliz que és! - infelizmente eu não posso fazer o mesmo. Eu sou coxo e estropiado e só mantenho-me de pé amparado e defendido por meio anjo de guarda e protetores espirituais.
           Segue a tua Teosofia e com ela caminha. Sê feliz mas deixa-me agarrado ao meu Jesus, ao meu divino Mestre e Senhor, a meu Salvador, haurindo de Seu santo e divino seio a humildade de que tanto preciso para curar-me.
           Não me arranques do coração a imagem incomparável e santa de Maria,a Mãe santíssima, Espírito sublime a quem tanto devo e que é o enlevo de minha crença e o carinho dos meus afetos.
           Não posso seguir a tua Teosofia porque não posso servir a dois senhores.
           A tua Teosofia - perdoa-me, releva-me a franqueza - é anti espírita e não está de acordo com os ensinamentos do Evangelho; é o Falso Profeta. Não te molestes comigo. Não sou eu quem o diz, é o Evangelho, é o próprio Espiritismo codificado por Alan Kardec, como te provarei no meu próximo escrito.

sábado, 22 de maio de 2021

O Espiritismo sem o Evangelho


 O Espiritismo sem o Evangelho

Pedro Richard (Espírito)    Reformador (FEB) Março 1924

(Mensagem recebida mecanicamente no ‘Grupo Ismael’)


             Meus amigos e companheiros, paz em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo,

            A pedra fundamental do grande edifício que há de abrigar toda a humanidade terrena está lançada. Sucessivas levas de obreiros hão de trabalhar para erguer esse imenso Templo, a fim de que nele possa vir a ter morada o Cordeiro Imaculado, que é o Mestre dos mestres e o Senhor de todo gênero humano.

            Em cada posto está colocada uma sentinela a vigiar os obreiros e a encaminhar o trabalho, de acordo com as aptidões dos que se acham sob a sua direção. A Ismael coube dirigir, neste rincão do planeta, os obreiros na execução da parte que lhes cabe no conjunto da obra.

            Nada preciso dizer aos soldados que vem servindo nestas fileiras acerca do modo como esse guia orientou a sua tarefa. A história da doutrina espírita nas terras de Santa Cruz é conhecida de todos vós. O que preciso dizer-vos é que, fora do Evangelho, nada se fará de proveitoso e duradouro nesta parte do planeta.

            Meus caros companheiros, será para vos mostrarem as maravilhas do Infinito que o Senhor vos manda seus mensageiros? Não, não e não. Para isso tendes os órgãos visuais: podeis observar a obra da Criação e ver quão grandiosa é a ação do Sumo Artífice do Universo. Bem outra é a tarefa de seus servos invisíveis. Eles sondam as almas enfermas, para lhes ministrar o único remédio que as tornará sãs: a reforma moral. Cuidam da reforma dos homens, para em seguida atacarem a da sociedade. Tudo mais é deslumbramento, é fogo de artifício, que não toca o sentimento de quem o observa.

            Fiquemos, pois, na retaguarda, tratando de fazer o nosso Espiritismo atrasado, como por aí além se diz, mas procurado edificar-nos a nós mesmos e bendizendo do Senhor pela esmola que nos concede de podermos reconhecer que para alguma coisa nos serviu a consoladora doutrina que professamos, verificando que somos hoje melhores do que ontem.

            Meus queridos amigos, a confusão aí está. Guardemo-nos dela e sigamos a risca a palavra do Cristo, quando nos adverte do surto dos falsos obreiros e falsos profetas.

            Estudai em paz, sob a bênçãos de Maria. Richard




quinta-feira, 20 de maio de 2021

Sobre o perispírito

 

Sobre o perispírito

por Pedro Richard    Reformador (FEB) Agosto 1917

                  Alocução proferida perante a Comissão de Assistência aos Necessitados, pelo seu Diretor, Pedro Richard:


                 Nesta cadeira, onde a vossa bondade me colocou, procedo com o máximo cuidado para que eu seja apenas um fiel expositor da doutrina que, por misericórdia, nos foi revelada pelos espíritos a serviço de Nosso Senhor Jesus Cristo.

                Como sabeis, a primeira fase da revelação, que trata da parte filosófica e doutrinária, os espíritos deram a Kardec por diversos médiuns, sendo que o seu complemento que diz com a parte científica e evangélica, foi confiada a Roustaing, que a recebeu pelo médium Mme. Collignon.

                Tratando-se, pois, do perispírito, que é o agente intermediário entre o espírito e o corpo material, isto é, o veículo pelo qual o espírito pode agir sobre a matéria, dizem-nos os espíritos que esse agente participa das duas naturezas: do espírito e da matéria. Assim, somos levados a procurar -  o quanto estiver ao nosso alcance - compreender a natureza do espírito e da matéria.

                Por isso aconselhei, na sessão passada, o estudo dos pontos da nossa doutrina, que tratam dessa transcendental questão.

                Como vistes, a revelação dada no “Livro dos Espíritos” e no ‘Gênese” está de acordo com a ampla revelação dada a Roustaing, no volume 1, págs. 258 a 315.

                Na monumental revelação da origem da criação, os espíritos, por ordem de Jesus, nos deram o máximo que podemos comportar.

                Vamos procurar fazer a sua síntese, e para desempenhar-me de tão alto encargo, ergo os olhos para Jesus, pedindo-lhe que supra as minhas deficiências, permitindo que a minha exposição seja clara e compreendida por vós outros.

                Diz a Revelação (Roustaing): Tudo na criação tem uma origem comum: tudo procede do infinitamente pequeno para o infinitamente grande, até Deus, que é o ponto de partida e reunião. Tudo vem de Deus e volta para Deus” (1)

                 (1) As citações de Roustaing são, algumas textuais e outras em resumo.

                 O fluido universal, que parte de Deus e que é dirigido pela sua inteligência e vontade suprema, é o elemento produtor de todas as criações, quer espirituais quer e fluídicas, quer materiais, enfim de tudo quanto se move, vive e existe.

                A vontade do Senhor Deus Onipotente, que a tudo preside, anima esse fluido em todas as suas variedades e com ele produz as mais sutis combinações, até as essências espirituais, os princípios primitivos de espíritos em gérmen. 

                Nos mundos primitivos, o Criador coloca os princípios constitutivos, na ordem espiritual, fluídica e material, dos diversos reinos que os séculos hão de elaborar.

                Ao mesmo tempo, o principio inteligente desenvolve-se com a matéria que com ele progride, passando destarte de essência à vida e cujo progresso se faz sob a vigilância de espíritos prepostos. 

                E assim ele passa. “sucessivamente pelos reinos mineral, vegetal e animal e pelas formas e espécies intermediárias desses três reinos.”

                Nas primeiras fases a essência espiritual, absolutamente sem consciência do seu ser, se manifesta pela essência da vida.

                Percorrendo todos os degraus da escala e chegando ao desenvolvimento máximo nesses reinos, das suas formas intermediárias, o espírito em estado de formação e continuamente sob a vigilância dos espíritos propostos, é conduzido para mundos ad hoc, isto é, mundos apropriados ao fim colimado, para dele ser expurgada toda a materialidade que o contato da matéria grosseira lhe imprimiu.

                Aí, ele se prepara para entrar propriamente na vida espiritual, chegando por tal processo ao verdadeiro estado de espírito formado, consciente e responsável. 

                E, então, quando ele se apossa do livre arbítrio, isto é, da faculdade de pensar e de agir por sua vontade.

                De posse dose dom (o livre arbítrio) ele opera, preparando a constituição fluídica que se chama períspiríto, a fim de poder agir sobre a matéria.

                Donde se vê que o espírito não pode agir sobre a matéria, a qual não é possível ligar-se sem esse agente intermediário. O perispírito, pois, é bem o veículo pelo qual o espírito se pode ligar e agir na matéria.

                Do que temos dito se conclui que o espírito em formação, durante todo esse tempo em que esteve ligado intimamente à matéria, faz o seu progresso relativo e proporcional. Indo para o mundo ad hoc, sofre todo o expurgo da materialidade que lhe imprimiu o contato íntimo da matéria. É então quando ele tem entrando na vida de livre pensador. Nessa estação de chegada, o espírito fica plenamente constituído com todas as suas faculdades, tornando-se, por isso, incompatível com a ligação direta à matéria; daí a necessidade de um agente intermediário, de um veículo que lhe permita entrar com relações e ter contato, mais ou menos íntimo, com a matéria grosseira.

                Peço, com muito empenho, a vossa atenção para este ponto primordial.

                Tudo está ligado por atos contínuos e indestrutíveis, no universo.

                Não há solução de continuidade.

                Essa mesma cadeia, que de Deus parte e que a Ele volta contém em si tudo quanto é necessário para a execução do Seu plano divino: a Criação.

                Os seus elos estão ligados pelos reinos intermediários (permitam a expressão) e participam das espécies relativas.

                Assim sendo, o elo final não podia dispensar essa ligação, e, daí, a formação natural e lógica do perispírito, que, necessariamente, tem de participar das duas naturezas, a espiritual e a material. 

                Vede como é profunda e grandiosa essa cadeia infinita, que liga todas as coisas e tudo na ordem universal e que conduz o amor do homem ao amor infinito e puríssimo do seu Criador, do seu Deus!

                O espírito depois de plenamente constituído, de posse do livre arbítrio, consciente, dotado do inteligência e vontade com todos os seus predicados, forma, como vimos, o seu perispírito, para poder movimentar esses dotes e ser com eles o próprio artífice do seu progresso.

                Agora vejamos como o próprio espírito colabora na confecção do seu perispírito.

                Constituído o espírito do modo como vimos ele expor, ele, com o concurso e direção de espíritos propostos e por intermédio do magnetismo, atrai da atmosfera do mundo ad hoc, onde ele então se acha, o fluido necessário que, combinado com os elementos do seu próprio ser espiritual, forma em torno de si o envoltório que se denomina perispírito.  Dizemos e empregamos o termo elementos, porque nos falta um termo apropriado que defina coisas que não estão sujeitas à análise dos nossos sentidos de homens.

                Pois que o espírito é alguma coisa de real, é óbvio que tem uma origem preparada.

                Tudo na natureza é sabiamente preparado e previsto. 

                Tomai de uma semente e analisai-a. Os nossos instrumentos, imperfeitos que são, pouco nos dizem da sua essência. 

                E, no entanto, lá está a vida, o espírito em formação; o tipo da espécie, o gérmen da procriação, enfim, tudo quanto se faz necessário ao fim para que foi criado.

                Da pequenina semente iremos até aos mundos em formação. Sempre a mesma ordem presidindo a tudo. Tudo está, maravilhosamente, atendido e organizado.

                Prossigamos: 

                O Espírito combina esses dois elementos, um tirado do seu próprio ser, o outro extraído da atmosfera em que ele se acha envolvido, e forma o seu envoltório, no princípio tão sutil que dificilmente é percebido pelos próprios espíritos prepostos, segundo eles mesmos nos dizem.

                À proporção que o espírito vai agindo, mais visível se vai tornando o seu envoltório.

                A- parte espiritual do perispírito é o receptáculo das impressões do espírito.

                Ela participa das suas condições morais. A material participa das condições do elemento atmosférico.

                Assim sendo, é claro que é o espírito quem modifica as condições do períspirito, tornando-o mais ou menos grosseiro, pesado e materializado, de acordo com os seus sentimentos.

                Quando o espírito muda de planeta, reforma o seu perispírito quanto à parte material, deixando-a na atmosfera do planeta de onde saiu, porque agora essa parte tem de ser tirada da atmosfera do novo planeta em que vai o espírito habitar.

                A parte espiritual conserva-se até que se modifiquem as condições morais do espírito.

                Como vedes, o assunto é complexo e profundo e o expositor é baldo de recursos.

                Perdoai-me se não satisfiz às vossas exigências.

                Uma coisa vos pede o vosso companheiro, é que estudeis a Revelação da Revelação dada a Roustaing e muito melhor do que eu compreendereis o ponto em questão.


sábado, 8 de maio de 2021

O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade

 


O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade 
parte 1

por Pedro Richard

Reformador (FEB) 1º Abril 1914



             Venho hoje dar cumprimento à promessa que fiz ao meu companheiro e amigo L. Cirne quando ultimamente lhe enderecei uma carta aberta.

            Primeiro que tudo devo dizer de que modo entendo esse sentimento puramente divino - a caridade, que o apóstolo Paulo classificou como a primeira das virtudes, capaz só por si de levar o espírito culpado à salvação, redimindo-o de toda a culpa, porque, diz o convertido da entrada de Damasco: a caridade lava toda mancha.

            Isto disse ele referindo- se ao planeta Terra, onde os espíritos em prova estão manchados, em consequência do mal emprego que fizeram de seu livre arbítrio.

            Deus, que é o amor por excelência, só criou para o amor; isto quer dizer que a sua criação só se destina a um fim: o cumprimento e a execução das leis do amor.

            Tudo que existe que vive e que palpita, existe, vive e palpita para cumprir e executar as leis grandiosas e santas dessa emanação divina - o amor.

            A criatura, espírito, portadora desses predicados, que conhecemos com as denominações de inteligência e vontade, por conseguinte, com responsabilidade, é a pequena partícula que Ele destinou para colaborar na sua grandiosa obra - o amor.

            O espírito, pois, existe para amar e ser amado.

            Amar ao seu Criador com toda a energia de seu ser, com todas as forças de que é dotado; amar as suas criaturas como a si mesmo, desde a mais humilde à mais elevada; só assim é que só o espírito dará provas e manifestará o amor a Deus, porque não se pode amar ao Criador sem que se ame às suas criaturas. Não se pode dar provas de que se ama ao Criador senão integralizando-se na sua obra, pois que é esse o fim para o qual Deus concretizou a sua criatura. Eis a razão da lei ditada por Jesus: “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”.

            A caridade, pois, é a manifestação do amor ao próximo, sob qualquer aspecto. Amar ao próximo é identificar-se com ele, isto é tornar suas as necessidades dele e ser um agente caridoso do seu progresso, fazendo-se dessarte um auxiliar de Deus na obra grandiosa do Bem, que nada mais é do que a direção dos espíritos no rigoroso cumprimento do dever.

            Em suma, a boa prática da caridade consiste no dever, que cumpre a cada um, de repartir com seus irmãos tudo quanto lhe foi dado pela misericórdia divina, quer se trate de haveres materiais, quer de benefícios morais de toda a ordem. A criatura deve ter sempre em vista que nada possui por si; tudo lhe é dado pelo seu Criador e Pai, que, na manifestação sublime de seu amor, vai distribuindo a cada um proporcionalmente a seus méritos, isto é, à medida que seu espírito vai se pondo em condições de poder comportar as graças celestiais, que em síntese são Justiça e Misericórdia.

            São chegados os tempos preditos e prometidos por Jesus; os tempos em que o nosso Criador e Pai mandaria à Terra o Consolador para na Terra ficar. Para isso Ele fez baixar o seu Espírito sobre toda a carne, dando às mulheres, velhos e crianças, visões, sonhos, etc. Isto quer dizer que o Pai deu às suas criaturas aqui encarnadas atualmente o dom grandioso da mediunidade, como sendo a moeda majestosa capaz de resgatar numa só existência um conjunto de crimes e faltas contraídos numa série de existências pretéritas, pois, na frase evangélica, os campos estão branqueados e a colheita se aproxima. 

            Os nossos espíritos, trabalhados pela dor, evoluídos pelos conhecimentos científicos adquiridos e asfixiados pelo sentimento religioso materializado e seus derivados - isso que chamam de escola materialista - não possuem, por isso mesmo, nenhuma crença verdadeiramente religiosa e estável. E isto porque a escola materialista, pretendendo destruir a concepção errônea de céu e inferno, ou o prêmio e castigo, ao invés de trazer ao espírito um conforto duradouro e uma esperança eterna, dá-lhe um outro inferno não menos temido e aterrorizador - o nada.

            Para os grandes males grandes remédios. Para destruir o vício encarnado na divindade de César, a divindade de Jesus encarnada nas virtudes.

            Para destruir de uma vez para sempre a dúvida concretizada nas escolas materialistas e nas religiões materializadas a Revelação Espírita, que nos vem trazer pelo fato, pela razão e pela prova experimental a certeza da imortalidade do espírito e sua consequente responsabilidade, dando-nos, enfim, os Evangelhos, em espírito e verdade, que tudo explicam e que vieram extirpar, de vez, a dúvida que nos tornava escravos dos erros e das paixões.

            Desta forma o Espiritismo nos abre a porta larga e franca da caridade.

            Desfeita a dúvida, surge a fé, e a fé com obras, porquanto a fé sem obras é morta, na frase do apóstolo dos gentios, Paulo.

            Vamos nos deter por aqui; prosseguiremos no próximo número se o Senhor nos permitir.

 

O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade 

parte 2

por Pedro Richard       Reformador (FEB) 16 Abril 1914

 

            No meu escrito passado falei na fé sem obras. A verdadeira obra da fé é a caridade.

            Baixando à Terra a Revelação Espírita, baixou com ele uma falange de espíritos prepostos e encarregados de sua propaganda.

            Todos quantos tem tido a ventura de receber a Revelação tomaram encargos mais ou menos importantes para com Jesus, a fim desobrigarem de compromissos sérios de existências que se foram.

            A cada colônia de espíritos ou, melhor, a cada povo foi confiada uma missão para, de acordo com as suas necessidades e tendências, ser desenvolvida e propagada a Revelação Divina.

            Jesus, que é o sumo e divino diretor dessa propaganda e que tudo prevê em beneficio da própria propaganda e para facilita-la, dotou cada povo ou colônia de espíritos com os elementos precisos e indispensáveis à perfeita execução de seu plano grandioso.

            Assim é que nos povos da culta Europa, onde o cérebro domina o coração, ali, o Divino Mestre, o Encarregado por Deus dessa gloriosa missão, faz que apareçam os médiuns de efeitos físicos, transportes etc., porque lá a luz vai se fazendo e continuará a ser feita pelo entendimento. É o cérebro que domina, é a ciência que tudo devassa e que tudo pretende explicar.

            Na terra de Sta. Cruz, neste pequeno torrão onde o coração domina o cérebro, ao contrário, a partilha é consideradamente maior. Para este recanto majestoso do planeta envia o Divino Missionário os médiuns de efeitos morais; pois, meus amigos, o nosso encargo no Brasil é muito mais grandioso e, por isso mesmo, de muito maior responsabilidade. A nossa missão nesta parte da América é estudar e praticar os Evangelhos de N. S. J. Cristo; é sermos os continuadores dos apóstolos e os disseminadores dos ensinos do Mestre pela prática da caridade. É para isto, para estes efeitos da caridade que o Mestre Celestial dotou os filhos da terra de Sta. Cruz de uma mediunidade quase desconhecida no resto do mundo, a receitista, que me ufano de dizer, há trinta e tantos anos se propaga entre nós de uma forma assombrosa.

            Um dos primeiros médiuns receitistas nesta capital foi o taverneiro Abrante que era estabelecido na cidade nova.

            Foi ele o escolhido por Jesus para despertar a crença espírita no médium Nascimento, que, por sua vez e convenientemente aparelhado, foi o efeito do Pai para levar a crença a centenas de médiuns receitistas.

            De momento lembro-me de Maia de Lacerda e Filgueiras, além de muitos mais, cujos nomes não me ocorrem agora mas que, médiuns receitistas de fama, foram para muitos outros o veículo providencial da santa doutrina.

            E de tal maneira se tem propagado esta classe de mediunidade, que, pode-se afirmar positivamente, não há uma rua desta cidade onde não se encontre hodiernamente, pelo menos um médium receitista. Tal é a abundância de médiuns receitistas nesta capital.

            Essa providencial abundância de médiuns receitistas trouxe para o nosso país, particularmente para esta cidade de São Sebastião, o mais salutar resultado no ponto de vista moral, qual o de existir aqui um número considerável de espíritas em todas a classes sociais. Talvez, mesmo, seja o Brasil o país que goze da ventura sem par de possuir em seu seio amoroso o maior número de espíritas, malgrado o seu pequeno número de habitantes em relação às nações densamente populosas.

            Será isto obra do acaso, ou tudo isto é superiormente dirigido por Jesus, que dispõe de inúmeros espíritos prepostos obedientes às suas ordens de amor e caridade? O acaso - todos nós sabemos - é uma palavra que o espírito humano inventou para ocultar o que não podemos explicar pela ignorância em que atualmente nos achamos mergulhados, ignorância que, por orgulho não queremos confessar; no entanto, o nosso espírito sente-se, por isso mesmo, amesquinhado e envergonhado. O acaso, pois, nada é. Não pode, conseguintemente ser causa de fenômeno, fato ou manifestação de qualquer ordem quer no domínio da ciência, quer nas concepções morais e religiosas.  

            Fica, logicamente, o fenômeno dependendo de uma casa real e positiva, que é causa divina servida pelos espíritos prepostos e obedientes ao mando amoroso de Jesus.

            Esses médiuns receitistas o são por efeito do acaso ou semelhante mediunidade lhe foi conferida quando tomaram corpos e baixaram á Terra, a fim de resgatarem o seu passado culposo?

            Já deixamos dito que o acaso não existe; é simples fantasia criada pelo orgulho do espírito humano. Para nós espíritas, pois, está positivamente provado que o acaso não existe. Tudo, portanto, obedece a leis ainda que desconhecidas para nós. O surto de uma tal mediunidade obedece, por consequência, ao plano divino. É que semelhantes médiuns tomaram, quando ainda no espaço, o compromisso formal de ser para os seus irmãos os intermediários da caridade de Jesus.

            E de tal maneira se vai executando o plano divino que, dia a dia, outros médiuns surgirão, talvez melhor aparelhados para a realização da grandiosa missão evangélica: - as curas.

            Mas, curar o que? O corpo?

            Não; curar o espírito, eis tudo. O corpo para nada vale. É preciso que a enfermidade no paciente seja substituída pelo sentimento de gratidão e reconhecimento, e destarte possa o enfermo aproximar-se do médium, que, na qualidade de intermediário que é, deve fazer desaparecer a sua individualidade ínfima para que reconhecido e grato, o curado se volte para Jesus, o sacrário da caridade e compreenda que a cura foi obra exclusivamente do Bom Pai.

            Assim é que procediam os apóstolos de Jesus; assim é que devem proceder seus continuadores.

            Nesse trabalho santo o médium encaminhará os espíritos em demanda do amor de Deus e procurará afastar e, mesmo, destruir o que de mais perigoso e daninho se vai aninhando no coração do reconhecido, que é o culto à individualidade, culto consideravelmente mais pernicioso que o das imagens no rito católico.

            Esse fermento que leveda toda a massa, na frase de Paulo, tem sido mais pernicioso para a propaganda do Espiritismo do que o infeliz médium mercador o faz.

            Esse sentimento subalterno é tão daninho que não só afasta do seio de Jesus o neófito, senão também, e principalmente, pontua inçando o médium de vaidade e orgulho, o esfacela moralmente.

            O culto à individualidade nada mais é do que a confissão de um sentimento ridículo, oriundo da ignorância de quem o pratica e a manifestação criminosa do orgulho e vaidade elevados ao mais alto expoente por parte do cultuado, porque, presumindo-se loucamente o produtor dos benefícios que do Pai vieram por seu intermédio, rebaixa e anula a Divindade - fonte de todo o bem - pretendendo desse modo constituir-se um deus, ou, pelo menos, um predestinado com virtude rara e excepcionais.  

            O médium que assim procede age criminosamente porque faz do paciente um fanático e este envenena-lhe a alma pretendendo endeusa-lo, ainda que, muitas vezes, de boa fé e na maioria dos casos, como já disse, por ignorância.

            É esse o veneno peçonhento que muito foi combatido e verberado sempre pelos apóstolos Pedro e Paulo.

            E querem um exemplo do que acabo de dizer? Leiam os Atos dos Apóstolos e apreciem a passagem ali citada a respeito do entusiasmo de que o povo se possuía, quando os dois apóstolos produziam os assombros que naquele tempo eram denominados milagres, mas que hodiernamente são naturais e plenamente explicados e compreendidos, à luz da ciência positiva.

            Rezam os Atos que, tendo o povo se assombrado com os grandes milagres produzidos pelos apóstolos pretendeu arrebata-los para deles fazer deuses.

            Foi então quando os apóstolos, rasgando as túnicas, - o que naquele tempo era o sinal positivamente significativo de reprovação formal. - fizeram aquela turba compreender que eles, os apóstolos, eram pecadores como toda gente e que em tudo quanto acabavam de praticar tinham agido tão somente como mero instrumentos da vontade do Pai.

            Tenham sempre em mente esta passagem, nela refletindo incessantemente os médiuns, para acertadamente seguirem a trilha exemplificadora dos apóstolos, é o que ardentemente lhes imploro.

            Façam desaparecer a sua individualidade e ergam bem alto Jesus, o Salvador.

 

O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade 

parte 3

por Pedro Richardº

Reformador (FEB) 1º Maio 1914

            No meu último escrito iniciei o traçado da linha de conduta do médium no cumprimento da sua missão na Terra. Neste e noutros pretendo continuar a expor as minhas idéias na mesma ordem doutrinária que venho sustentando.

            O médium, que verdadeiramente compreende a sua missão, é aquele que exercita a mediunidade com inteiro desprendimento pessoal, não esperando nem mesmo de Deus recompensa de sua ação, visto que, tudo devendo ao seu Criador e Pai, assiste-lhe a restrita obrigação de tudo praticar no intuito de desobrigar-se dos compromissos que contraiu em existências passadas.

            O médium, que conhece os Evangelhos, em espírito e verdade, não pode se recusar à prática de tão precioso dom: não pode, nem deve, sequer de leve, duvidar da assistência e auxílio dos bons espíritos na prática do bem por amor do bem.

            Neste particular não entra, nem pode entrar em linha de conta o adiantamento do seu espírito, mas tão somente a firme e decisiva resolução de cumprir o seu dever na estrada que vai trilhando.

            Saulo fanatizado tinha as mãos tintas do sangue daqueles cujo crime era amar a Jesus. E, no entanto, Paulo, o cristão resoluto e abnegado, faz prodígios pela sua fé vigorosa e, recebendo todo o auxílio do Alto, caminha desembaraçadamente para o seio de Jesus sem mesmo lhe servirem de empecilho os desvarios de Saulo.

            Que importa o que fomos ontem...; o que nos convém saber é o que somos hoje.

            A história dos cristãos está repleta de exemplos semelhantes, como sejam o de Francisco de Assis, Santo Agostinho e muitos outros.

            Duvidar do auxílio divino é um crime.

            Se Deus nos dotou com o dom precioso da mediunidade é para produzirmos o bem em maior profusão do que os que não foram contemplados com essa graça divina.

            Bem aplicada é aqui a parábola do talento enterrado.

            O médium que não der expansões caridosas a esse dom celestial é réu de lesa caridade, pelo que será severamente punido pois deixa enterrado o talento, que lhe foi doado pelo seu Senhor para fazer produzir em benefício de seus semelhantes.

            Não quero, porém, dizer com isto que todo o mundo que se sinta médium vá exercendo a mediunidade em uma conduta sensata e criteriosa. Não absolutamente não. O critério é qualidade indispensável em todas as ações humanas, sobretudo no exercício das funções inerentes às coisas sérias e santas.

            O que não sofre dúvida é que o médium, que conhece a doutrina e pratica os Evangelhos na medida de suas forças tem o dever de trabalhar e de exercitar a caridade - que é o amor ao próximo – a fim de se de obrigar dos compromissos que tomou ao encarnar-se, pois não se é médium por acaso, mas para dar cumprimento ao compromisso contraído pelo próprio espirito.

            Fugir à prática da mediunidade não se preparando convenientemente para exerce-la é falir e não raro, caminhar em demanda da obsessão.

            Sem dúvida, quem assim procede não pode deixar de ser vítima de obsessão, porque, não cultivando a mediunidade que, por misericórdia lhe foi dada, e não exercendo, portanto, a caridade, como lhe compete, vem a ser vitimado pelos espíritos inferiores, que não respeitam a bondade de outrem e, aproveitando-se do desequilíbrio orgânico provocado por um excesso qualquer, atuam sobre o organismo do infeliz médium, exercendo a sua influência deletéria particularmente no baço do paciente, por isso que é o baço a sede do aparelho nervoso, conforme me têm dito os espíritos.

            Dessarte, o médium provoca voluntariamente nele a atuação dos espíritos inferiores, que têm ingresso pela porta ampla da sua própria desídia. Desde então começa a punição do médium que abandonou o cumprimento do dever moral.

            Os trabalhos de caridade impõem-se, pois, como medida de sanidade moral para os que sofrem na Terra como no espaço.

            Não existe médium receitista que não tenha sentido a necessidade imprescindível dos trabalhos práticos de caridade como meio eficaz de cura moral e física.

            Relevem que narre, a propósito, o último caso que comigo se passou há pouco tempo.

            Em minha clínica de médium receitista apareceu-me um enfermo que desde muito me conhecia. É parente de uma senhora que por muitos anos foi nossa auxiliar nos serviços domésticos de nossa casa.

            O rapaz queixava-se de perturbações nervosas, que não o deixavam dormir nem exercer as funções de seu ofício de bombeiro, pois era vítima de constantes e violentos movimentos bruscos e independentes de sua vontade. Além disso, tinha manifestações auditivas que impiedosamente o perturbavam.

            O pobre operário medicou-se durante longos meses, sem nenhum resultado satisfatório.

            Frequentava assiduamente as sessões da Federação e foi durante algum tempo ouvinte da escola de médiuns.

            Foi senão quando desapareceu-me e não mais o vi.

            Passado tempo deparei com o nosso homem na rua da Uruguaiana e veio pressuroso ao meu encontro; estava fardado de guarda-fiscal, alegre, bem disposto e prazenteiro (espirituoso).     

            Apressei-me então, a perguntar-lhe: Como vais, rapaz. Já ficaste bom?

            Já estou bom, graças a Deus, diz-me ele.

            Mas de que modo? Interroguei-lhe.

            Aconselhado por um nosso irmão desenvolvi a mediunidade e tudo passou como por encanto, respondeu-me.

            Presentemente estou trabalhando no grupo A. Acha que estou procedendo bem?

            Filho, disse-lhe, mais alto e eloquente que os argumentos que eu te poderia aduzir fala o fato. Mas, devo dizer-te, com a liberdade de irmão, que não estou de acordo com a orientação do grupo A. Penso que, se ali continuares, poderás te prejudicar.

            Para onde devo ir então, Sr. Richard? Para a Federação? Mas, na Federação, não há semelhante ordem de trabalhos.

            É verdade, meu amigo, repliquei-lhe compungido. - O que lá temos é incompleto. Já se tem feito alguma coisa; mas ainda há muito por fazer. Pede a Jesus que nos ajude.

            Continuei o meu caminho orando e mais uma vez rogando a Jesus que fizesse da Federação uma casa verdadeiramente de caridade, onde o foragido de toda a sorte possa encontrar abrigo.

            Agora pergunto: Em face de fatos dessa ordem devemos aconselhar os médiuns que não trabalhem? Não, não temos este direito. O que devemos fazer é aconselha-los a que se preparem o mais urgentemente possível para o exercício de semelhante mister, não esperando que se façam puros, porquanto para isso precisariam de uma série de existências, e a verdade é que a mediunidade lhes foi dada para ser exercida na atual existência planetária.

            O que se faz preciso é que cada vez mais procurem melhorar a suas condições espirituais particularmente as morais, e para isso façam da mediunidade um santo sacerdócio, sem recompensa outra que não seja a paz, que advém da prática da caridade. Trabalhem esforçadamente para o progresso de seus espíritos, quer adquirindo conhecimento que os ilustrem na ordem científica, quer, sobretudo, eivando-os dos dotes morais que lhe permitam estar constantemente, face a face, com seus anjos da guarda e por eles assistidos sem cessar. Tomem a sério e se compenetrem verdadeiramente da colossal responsabilidade que lhes dá a mediunidade, que, por sua vez, é uma força especial que o Pai lhes deu. Saibam ser reconhecidos ao nosso Pai, exercendo a mediunidade com o máximo desprendimento; tendo sempre o cuidado de fazer desaparecer no caridoso exercício a sua personalidade, que, efetivamente, nada é no caso. Exerçam, repito, com todo o devotamento a mediunidade; tendo sempre em mira o cultivo incessante da moral, como, de resto, exige a própria doutrina.

            Assim procedendo, o médium atrairá para si a assistência dos espíritos superiores e repelirá as insinuações dos espíritos inferiores, que não poderão, ao menos, dele se aproximar.

            Dos muitos compromissos tomados no espaço por um espírito é o exercício e a prática da doutrina o maior de todos.

            Convença-se desta verdade o crente.

            O que venho de afirmar está plenamente provado por tudo quanto a mais de trinta anos tem sido dito pelos espíritos encarregados da direção da propaganda do Espiritismo no Brasil, mas que é ignorado pela maioria dos espíritas, que - diga-se de passagem - não conhece a história pátria da nossa santa doutrina, história compreendida em um conjunto de comunicações grandiosas publicadas muitas em livros, como o intitulado “Trabalhos Espíritas de um pequeno grupo de crentes humildes”, que corre mundo desde 1893; algumas nas “Elucidações Evangélicas” publicados pelo nosso confrade A. Sayão; outro do

arquivo da  Fraternidade”, e mais algumas publicadas há dias no Reformador, e outras tantas que existem por aí inéditas.

            Nessa comunicações nos dizem os espíritos que a nossa missão no Brasil é a do estudo e da prática do Evangelho. Para isto, bem o sabeis, nos são fornecidos os médiuns apropriados, que se devem aparelhar convenientemente para o desempenho de tão melindrosa quão dignificadora função.

            As mediunidades psicográficas ou escrevente e sonambúlica são as típicas; as demais são esporádicas.

            Os espíritos aplicam particularmente estas duas espécies de mediunidade às curas morais e físicas; sendo que, em regra, a psicográfica é, sobretudo, utilizada no receituários e comunicações instrutivas e a sonambúlica na prática das conversões do espírito e elucidações que a todos instruem.

 

O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade 

parte 4

por Pedro Richardº

Reformador (FEB) 16 Maio 1914

             Como ficou dito no meu último escrito, os trabalhos espíritas no nosso país devem se destinar ao estudo e à prática dos Evangelhos de N. S. Jesus Cristo, não como sendo um fim para nele nos extasiarmos ou aí nos determos, mas tão somente como meio eficaz seguro para chegarmos ao ponto colimado, que é o cultivo da moral, praticando a caridade em todas as suas nuances e sob todos os aspectos, prática que nos lavará da alma as manchas negras do egoísmo, do ciúme, da inveja e de todos os demais derivados do orgulho.

            Sem dúvida que a teoria precede à prática e o estudo à execução, como é das boas normas; mas o fim de toda teoria e estudo é o seu aproveitamento prático.

            Assim sendo, todo espírita tem o dever de estudar a doutrina para poder compreender, em espírito e verdade, os Evangelhos.

            Todos sabemos que é o Espiritismo a nova Revelação que, pelo mestre Allan Kardec, nos transmitiu a misericórdia do Divino Mestre; é a chave para a compreensão, em espírito, dos Evangelhos.

            À medida que formos compreendendo este código divino cumpre-nos pratica-lo os seus belos ensinamentos, sobretudo quem é médium. Esse, particularmente, tem o dever imperioso de tomar parte dos trabalhos de caridade, pois, para isso é que lhe foi dada a luz, tendo, porém, o critério de começar pelo princípio, e não por onde os outros acabam.

            O trabalho de caridade divide-se em vários ramos, porque diversas são as necessidades do espírito e muitos os estádios por onde transita, na escola progressiva de sua rota.

            O espírita, que se inicia nos trabalhos práticos de caridade, não deve frequentar, nem mesmo comparecer às sessões onde são chamados espíritos maus. Pode e deve frequentar os trabalhos onde roga-se a Deus a presença de espíritos sofredores que, em regra, são mais levianos do que maus. Esses tais espíritos foram, geralmente, vítimas do meio pernicioso em que viveram e onde contraíram responsabilidades, do que das próprias maldades.

            São, mesmo, espíritos perturbados, muitas vezes, que se julgam vivos; nessas condições procuram aqueles com quem tiveram, perturbando-os, e destarte retardando seu progresso, ainda que, não raro, inconscientemente.

            Relevem que conte um fato que tem aplicação oportuna ao que acabo de dizer. Ei-lo:

            Senhora de nossa velha amizade casou-se. Um ano e tanto depois era mãe de uma linda criancinha...

            Daí começou a manifestar sintomas de alucinação. A vítima das suas alucinações era a pobre criança.  

            Num dos seus desvarios quase a matou, justamente quando a amamentava aconchegada ao seu seio.

            Desvairado o marido dessa pobre senhora recorre ao médium Frederico Júnior solicitando-lhe os recursos do Espiritismo.

            Frederico, bom e caridoso como sempre, realizou um trabalho prático de caridade onde manifestou-se o espírito de um rapaz que aqui na Terra tinha sido noivo da senhora em questão e que fora muito ciumento. Esse rapaz, tendo contraído varíola, morrera antes de realizar o casamento.

            Despido de crenças religiosas, vai para o espaço, coitado, sofrer naturalmente a perturbação devida aos espíritos nas condições do dela: sem crença e sem o cultivo e a preocupação dos sentimentos natos, de um Deus, que é o nosso Criador e Pai.

            Mais tarde, passado o período da perturbação, ele desperta, julgando-se, porém, ainda na vida material; procura a sua noiva e a compreende com um filhinho nos braços. Considera-se traído pela sua noiva! Sente necessidade de vingar-se, e, então, para isso, imprime-lhe pela ação da vontade, fluídos, no intento malévolo de matar a criancinha, que julgava ser o produto de um crime.

            Nessas condições de desvario manifesta-se pelo médium.

            Procuraram persuadi-lo com provas irrecusáveis que ele houvera passado pelo fenômeno natural, que, na Terra se denomina morte e que se achava então no espaço simplesmente como espírito e que já então sua ex-noiva estava legalmente casada com outro. Nesse momento ele compreendeu toda a situação.

            Sinceramente arrependido rogou a Deus o perdão de seus desvarios e seguiu com o seu anjo da guarda com o fim de preparar-se para uma nova jornada. E assim deixou o casal feliz e agradecido ao Senhor pela misericórdia que d'Ele houvera recebido.

            Há uma variedade infinita de trabalhos de caridade, porque na estrada progressiva que o espírito percorre há também uma variedade sem fim de estágios.

            O espírito sensato, que deseja realizar trabalhos práticos, de caridade, começa por educar o coração, procurando sentir; o trabalho é feito com lágrimas nos olhos e a emoção a embargar-lhe a voz. Pouco a pouco vai ele habituando o coração a sentir e assim, paulatim et gradatim - como dizia o saudoso mestre Bezerra de Menezes - preparando e aparelhando o seu espírito para maiores empreendimentos, estará um dia apto para a prática de trabalhos de obsessão.

            Esta ordem de trabalhos é, por sua natureza, tão melindrosa, que o crente, para pratica-la, tem que oferecer o seu coração como ante-mural à justiça de Deus, que se cumpre e ao sofredor em quem ela se executa.

            Nada adiantaria dizer-vos a respeito de semelhantes trabalhos. Muito já eloquentemente nos disse o bom mestre Allan Kardec em uma série de comunicações que o “Reformador” ultimamente publicou.

 

            (*) Vide “Reformador” de 1 e 25 de Dezembro de 1913. (Do Blog: Serão publicados em breve)

  

            Tudo quanto de grandioso e profundo se poderia dizer ali está magistralmente dito.

            Estudemos e tenhamos sempre em vista o que disse o Divino Mestre a seus discípulos, quando lhe trouxeram um doente que não puderam curar: “Para expelir essa classe de espíritos é preciso muito jejum e oração”.

            É preciso, pois, pureza e fé.

            Ninguém que deseje desenvolver a sua musculatura começa levantando grandes pesos, e se incriteriosamente o fizesse seria vítima da sua ignorância e teimosia. Começará, sem duvida, por levantar pequenos pesos, a fim de, paulatinamente ir-se habituando e obtendo o desenvolvimento progressivo dos músculos de seu próprio organismo, até que, mais tarde, possa levantar grande pesos.

            Ninguém se lança na água sem que saiba nada.

            A nossa missão é, pois, meramente evangélica, isto é, o que nos compete é estudar a doutrina de Jesus e praticar os seus ensinamentos de alta moral. Para isso se faz mister que o estudo e a prática desses ensinamentos sejam gradativos; a natureza não faz saltos, quer na ordem física, quer no ponto de vista científico, quer, finalmente, na ordem moral.

            O que é preciso é o desenvolvimento simultâneo e paralelo das duas asas com que o espírito sobe, como dizia o bom Bezerra, a fim de que o espírito equilibrado possa voar, purificado, a aninhar-se no seio de seu Pai.

            Em resumo, estou convencido de que esperar o homem tornar-se puro para poder trabalhar é utopia.

 

O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade 

parte 5

por Pedro Richardº

Reformador (FEB) 16 Junho 1914

 

            Como, suponho, ficou provado pela lógica, pela razão e pelos fatos, o médium, que baixou ao mundo para exercer as suas próprias funções, deve instruir-se convenientemente nos conhecimentos da doutrina, antes de dar começo ao exercício de semelhantes funções, 

à proporção que for adquirindo novas instruções a tal respeito, deve simultaneamente ir produzindo e se exercitando na prática de trabalhos de caridade.

            Mas o médium, a não ser no exercício do receituário, não é um instrumento isolado de trabalhos. O médium tem necessidade de trabalhar em centros ou grupos que o auxiliem e defendam.

            Desses centros ou grupos está dependendo o bom êxito do trabalho, mais do que do próprio médium, porquanto o centro é o fator fluídico do sentimento que, por sua vez, é - pode-se dizer - o elemento único garantidor do êxito do trabalho. O sentimento de caridade provoca a misericórdia de Deus.

            Relevem que narre um fato a propósito, já que o fato é a base da nossa doutrina.

            Sabendo-se que é da contemplação dos fatos que se deduzem as leis naturais, a narração de um fato é sempre motivo de interesse e curiosidade. Ei-lo:

            Quando o nosso saudoso mestre e prezado amigo, Dr. Bezerra de Menezes, mantinha uma sessão de estudos e manifestações espontâneas na rua de S. José, nº. 44 antigo, 2° andar, nesta capital, manifestou-se um espírito com o propósito de refutar o estudo do dia. Disse chamar-se Geoffroy, o conhecido fundador de um gênero de filosofia que corre mundo.

            Este espírito, então no espaço, negava a existência do Criador-Espírito porque não podia compreender o incriado; admitia, no entanto, o éter como causa primária da criação universal!

            A manifestação desse espírito deu lugar a uma série de sessões, cada qual mais interessante e nos proporcionou oportunidade de ouvirmos debates científicos e morais a que jamais tive a ventura de assistir.

            As manifestações se faziam por um médium de quase nenhum preparo intelectual, mas cujo espírito era dotado de cabedal científico de raro valor.

            Quero me referir no médium Britto, já desencarnado.

            Narrar detalhadamente o que eram essas sessões, com as más peripécias e arrojos de alta ciência, é tarefa para a qual me falece de todo a competência.

            Todavia, vou tentar um pálido esboço.

            O que assistimos ai foi um verdadeiro duelo entre mestres exímios. De um lado o espírito materialista de Geoffroy, de outro lado a competência de Bezerra de Menezes encarnando com o seu alto descortino a nossa doutrina. Eram dois campeões ilustres, que se batiam em campos diametralmente opostos.

            Geoffroy, espírito orgulhoso e ilustrado, esforçava-se por sair vitorioso; Bezerra, não menos ilustrado, porém humilde e afetuoso, teve ocasião de por em prova, mais uma vez, a sua grande cultura científica.

            Eram tais as argumentações aduzidas por um e outro que a gente estasiava-se na contemplação de tanto saber e de tão dilatada ilustração.

            Poderia ser Bezerra vencido?

            Por certo que não, porquanto, ele era, naquele certame, o representante da boa causa e da verdade, que é Jesus.

            Bezerra de Menezes, meus amigos, possuía e sabia cultivar em alta escala a maior das virtudes que conhecemos na Terra, a humildade.

            Foi, principalmente, pela posse desta virtude que ele conquistou a assistência dos espíritos de luz, que lhe trouxeram o concurso de seus altos conhecimentos. E assim poderosamente ajudado pelos obreiros de Jesus, Bezerra levou de vencida o ilustrado espírito de Geoffroy, que, dobrando o joelho ante o adversário, disse-lhe com toda a lealdade: “Venceste mas não me convenceste.”

            Mas o intento principal e o verdadeiro interesse do bom e meigo Bezerra era levar a espírito rebelde de Geoffroy à convicção da existência de Deus; e, então, depois de ter esgotado todos os recursos da ciência e da moral planetárias e, já exausto, apela o apóstolo da verdade para a fé e convida o espírito a fazer uma prece.

            Geoffroy não acede a tomar parte na prece, porque, diz, espírito leal, não lhe era dado desempenhar uma farsa, porquanto não acreditava na existência de Deus.

            Bezerra não desanima. Antes, porém, de orar, dirige-se aos seus companheiros presentes e fala-lhes: “Meus amigos, tudo fiz; esgotei todos os recursos; dei tudo quanto podia dar; nada mais possui o meu pobre espírito para dar. Mas, o que não pude fazer com o máximo esforço, Jesus, a ciência das ciências, a ciência do amor, não custará a fazer. Vamos apelar para Ele pedindo-Lhe que venha em nosso socorro.”

            Assim falando, com as lágrimas a lhe brotarem dos olhos e a emoção a embargar-lhe a voz, levanta-se aquela figura angélica para orar.

            Então, aquele tipo de apóstolo, barbas espessas e. branqueadas pelo tempo, pelas lutas heróicas que constantemente tinha de sustentar na Terra e pelas lágrimas que tantas vezes derramava; olhar meigo, calmo e vívido, que atestava a fé e a bondade excelsa de seu meigo espirito; aquele tipo de apóstolo, disse, balbuciou uma prece arrancada do íntimo de sua alma, feita de amor c caridade,

            Dizer o que foi essa prece, meus amigos, é impossível, pois o sentimento de que foi ela ungida não se traduz por palavras. Só a alma poderá sentir, mas ninguém seria capaz, nem de leve, de traduzi-lo por palavras.

            Era tal a pureza do ambiente preparado pela nossa concentração e sentimentos cristãos, que me senti no ar.

            Terminada a prece, volta-se para Bezerra o espírito e diz-lhe:

            “Basta! Para que vocês orem assim é preciso que Deus exista.”

            O que não pode a ciência, pode a fé; o que não conseguiu o cérebro, conquistou o coração.

            E por quê? Porque o enfermo era o espírito, que, desquitado de seu Criador e Pai, cultivara o entendimento, descuidando-se por completo do sentimento.

            Era preciso fazer-lhe sentir vibrar a corda sonora do amor, que aquele espírito, como nos demais, fora doada por Deus, mas que ali estava atrofiada pelo cancro do orgulho. O cancro corroía a semente e destarte o gérmen não encontrava expansão para medrar.

            A fé reinante no centro, fecundada pela humildade invejável de Bezerra - qual outro Moisés - fendeu a rocha do orgulho e fez rebentar a água cristalina da crença.

            A imagem majestosa de Deus se lhe estampou no espírito e nesse auspicioso instante ele sentiu o aroma extasiante da primeira flor, que, até então em estado de hibernação, brotava agora primaveril e bela: a fé.

            Como se vê do que acabo de narrar, foi o centro ali o grande fator; o médium foi mero expositor; quem agiu e esperou fluidicamente foi o meio.

            O mais original é que era franca a entrada para essas sessões; a assistência era, pois, heterogênea.

            Algumas pessoas iam ali por mera curiosidade; outras, até, com espírito de animosidade!

            Bezerra fazia que se sentassem em volta de uma grande mesa os seus companheiros de trabalho, e destarte ele conseguiu isolar o resto da assistência, que, assim, como que não existia.

            A corrente isoladora era, como convinha, completamente homogênea, porquanto o sentimento daquelas pessoas que se achavam em torno da mesa era uno com o do seu presidente, em quem confiavam sem tergiversação, pois o sabiam capaz dos mais nobres cometimentos.

            Fatos como este provam que de prodígios consegue a fé - do grão de mostarda pedido por Jesus!

            Um centro assim organizado, mesmo quando servido por médiuns medíocres, produz assombros. Centros deste jaez são fatores de grandes produções e raras belezas morais e científicas.

            É, antes de tudo, preciso lembrar que o trabalho aí produzido é principalmente mecânico.

            Isso indica que é mister e imprescindível preparar-se um ambiente fluídico conveniente para envolver o espírito moralmente enfermo, que, pela misericórdia de Deus é trazido ao centro para ser curado pela caridade de Deus e a fé que n'Ele devemos ter, sem tréguas.

            É vezo velho dos espíritas atribuírem ao médium o mau resultado ou a improficuidade do trabalho, o que quase nunca é a expressão da verdade!

            Mas é que as condições precárias dos nossos espíritos a tanto nos arrastam maxime o orgulho, que, quase sempre, é quem comanda todas as noções contrárias à caridade.

            Estamos sempre dispostos a ver o argueiro no olho do vizinho, não vendo, no entanto, a trave no nosso!

            Sempre atribuímos aos outros os males que nos afligem; isso porque as condições precárias de nossos espíritos nos induzem a deprimir os outros e a nos inocentar ou, pelo menos, nos desculpar.

            Muito se exige do médium, mas nada se lhe dá.

            O médium, coitado, que quase sempre é um abnegado, entrega-se ao trabalho comprometendo a sua saúde e, não raro, o seu bem estar corporal, pois os maus espíritos, contrariados, sabendo que é ele o instrumento de suas contrariedades, não o poupam: perseguem-no em toda parte e por tudo.

            É certo que, por isso mesmo que ele é perseguido por amor da caridade, terá recompensa proporcional; mas também não é menos verdade que, por isso mesmo, tem ele direito à nossa caridade, ao nosso carinho e à nossa benevolência.

            O médium, ligado a nós por sagrados compromissos, é ele de jure um credor que nos bate à porta reclamando o que lhe devemos.

            O médium deve ser para o centro o que é a donzela no lar: o alvo de toda a assistência e do máximo cuidado e desvelo.

            E a constituição do centro?

            Será isso assumpto do meu próximo escrito.

 

 O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade 

parte 6 e final

por Pedro Richardº

Reformador (FEB) 1º Julho 1914

 

            Tende paciência, leitor amigo - vós que tendes tido a condescendência de me ler; é este escrito o último da série enfadonha com que tenho flagelado a vossa atenção nas páginas condescendentes deste iluminado periódico. Vou terminar, mas, com a franqueza que me é peculiar, confesso-vos que, mesmo sem atavios e fluência de linguagem, tenho me esforçado por vos dizer e expor tudo quanto a minha longa prática de trabalhos espíritas me tem facultado e a minha pobre memória tem armazenado.

            Meditai sobre o que vos tenho dito. Que o vosso anjo guardião faça com que retenhais no vosso espírito o que de bom e útil aí tendes encontrado é o voto sincero e fraternal que faço a bem da uniformidade da orientação dos nossos próprios espíritos.

            O que posso vos confessar é que o meu pobre espírito, na medida de suas forças, deu tudo quanto possuía, isto é, tudo quanto a misericórdia de Deus lhe concedeu.

            Prossigamos:

            A constituição dos centros foi o assunto prometido para este escrito de hoje. Digamos, pois, algo da constituição dos centros que se propõem a trabalhos práticos de caridade.

            Os centros, cientes e conscientes da enorme responsabilidade que estão assumindo perante N. S. Jesus Cristo de quem receberam a vara da abundância e a quem tudo devem, precisam de ter cuidado especial consigo mesmos. Para isso precisam velar cuidadosamente todos os seus pensamentos, palavra e obras pois devem saber que dessa vigilância é que lhes advirá a boa ou má assistência determinante das condições fluídicas para trabalhos espiritas de ordem moral, como soem ser os trabalhos de caridade.

            Como acabamos de ver, as pessoas que compõem o grupo formado para trabalhos espíritas tem tanto, ou mais, necessidade de ser instruídas e educados na doutrina, quanto a tem os médiuns, pois o bom êxito do trabalho fica dependendo mais do centro do que do próprio médium.

            Coloquemos um médium bem orientado e instruído num centro mal constituído e nada de bom obteremos.

            Ao contrário, se o centro for bom, ainda que o médium seja prejudicado, sempre colheremos alguma coisa de bom, porque o ambiente formado pela assistência dos bons espíritos atraídos pelos sentimentos puros do centro, dificulta o acesso aos espíritos maus e, atuando sobre o médium, o envolverá em uma a atmosfera salutar saturada de sentimentos de amor e caridade. Então, esses sentimentos agirão sobre o espírito do médium despertando nele a necessidade do cumprimento de seus deveres morais para com N. S. Jesus Cristo.

            Assim sendo, sempre se obterá alguma coisa de aproveitável, porque o bem é a lei.

            Para que se realize com proveito um trabalho de caridade imprescindíveis se fazem certas exigências, dependentes principalmente do centro, que, como já disse, é o fator fluídico do próprio trabalho.

            O que não resta duvida é que o centro necessita de profunda concentração, muita fé, amor, humildade e caridade; e para possuir estes predicados é preciso que se saiba compreende-los, a fim de que conscientemente os ponha em ação sem hesitar um só momento.

            Não cabe nos estreitos limites deste o desenvolvimento dessas profundas questões de alta filosofia espírita.

            Tudo quanto sobre elas me foi possível dizer já o fiz. No entanto, sinto que há necessidade de dizer algumas palavras a respeito da concentração e da fé.

            A concentração é um elemento imprescindível em todo cometimento espírita, mormente nos de ordem moral; entretanto, muitos espíritas nem sequer cogitam desse elemento primordial nos trabalhos espíritas.

            Por isso vou esboçar, ainda que deficientemente, o que penso a tal respeito.

            A maneira pela qual devemos fazer a nossa concentração varia de acordo com a necessidade do momento.

            Assim é que, para orarmos, devemos erguer o nosso pensamento a Deus ou ao seu intermediário, a quem endereçamos as nossas súplicas no sentido de que nos faça a caridade de deposita-las nos pés do Senhor.

            Para isso devemos fixar o nosso pensamento imprimindo-lhe toda a energia de nossa vontade, a fim de que o nosso desejo possa alar-se no fervor da crença fecundada pela fé, que, no caso, é a certeza da existência de Deus, que se manifestará infalivelmente pela sua misericórdia e justiça.

            Se a concentração é para ajudar a um médium que se acha recebendo um comunicado instrutivo, devemos dirigir o nosso pensamento a Deus, suplicando-lhe luz e misericórdia para o nosso irmão que se está prestando ao trabalho santo da caridade.

            É preciso ter-se o máximo cuidado no sentido de que não seja o pensamento desviado um só momento do objetivo da concentração, a fim de que não se interrompam a corrente fluídica da boa assistência com que caridosamente nos favorecem os espíritos mensageiros do Senhor, pois, é sabido e inúmeras vezes tem sido verificado que, toda essa corrente, em consequência de desvios do pensamento de algum ou alguns dos seus elos, os Espíritos mistificadores, que sempre estão alerta e à espreita do momento propício, não se fazem esperar pela sua perniciosa ação: mistificam todo o trabalho, e do tal modo o fazem que, não raro, iludem os mais perspicazes.

            Se a concentração é necessária para auxiliar o irmão moralizador que confabula com o espírito sofredor, que no momento se está manifestando, devemos levantar o nosso pensamento a Deus esforçando-nos com todo o fervor de nossa alma por atuar sobre o infeliz espírito fornecendo-lhe a força e o vigor de que necessita para reagir contra os seus erros e desvios, e, dessarte, concorrermos com o nosso contingente moral no sentido de que ele se volte para o nosso Criador e Pai, de quem tudo deve esperar, até mesmo o perdão de suas culpas, por mais tenebrosas e carregadas que sejam.

            Em tais condições deve o centro dar todo o apoio e força à argumentação do moralizador, embora dele discorde em algum ponto ou processo.

            A assistência é chamada para ajudar fluidicamente o moralizador e com ele colaborar nas suas opiniões e sentimentos de amor e fraternidade.

            Para melhor me fazer compreender cito um caso quo se passou comigo numa sessão, caso que serve de exemplo elucidativo para o que venho dizendo:

            Num trabalho de caridade, para o qual fui convidado pelo diretor de um certo grupo, assisti o moralizador ordenar a um espírito orgulhoso que se metesse debaixo da mesa, a fim de humilha-lo e dar-lhe uma prova da inutilidade do seu orgulho.

            Eu não estava de acordo com semelhante processo de provas - que, além do mais, não é cortês, nem digno, para quem se presa e presa a seus irmãos - mas, como compreendia que a corrente fluídica não devia ser interrompida pelo desvio do meu pensamento, colaborei com a minha vontade na ordem que ao espírito foi dada pelo moralizador; e assim, não havendo interrupção da corrente fluídica formada pelas vontades dos membros do centro, o espírito viu-se forçado a cumprir a ordem do moralizador e meteu-se humildemente debaixo da mesa.

            Escusado é dizer que não mais voltei a semelhante grupo tão mal orientado.

            A homogeneidade, pois, de pensamentos e vontades na concentração é condição essencial para que possa o trabalho ser produtivo.

            No trabalho de caridade o sentimento é tudo; a palavra ocupa um lugar muito secundário.

            O que, porém, é mister saber-se é que a divergência de opiniões não pode ser profunda pois que o centro deve sempre estar de acordo com o seu diretor. Do contrário não será nunca um centro bem constituído, e desse modo a produção é má.

            A fé é tudo; isto é, a certeza absoluta da misericórdia de Deus que não podemos analisar porque para tanto nos falecem todos os meios; é o que nos anima e nos alenta em todas as situações de nossa existência espiritual.

            É a fé que nos ensina e nos aconselha a bater - que se nos abrirá, a pedir - que se nos dará.

            Batei e pedi sem cessar.

            Se até o juiz iníquo serviu à viúva, para se ver livre da importuna, o que não nos fará Deus, que, antes de ser juiz, é pai amoroso e bom?

            Tenhamos, pois, fé n'Aquele que, para estimular a seus filhos, lhos dá cem por um.

            Tenhamos fé, que tudo pode, que transporta montanhas e que nos impele a caminhar em demanda da felicidade, que é Deus.

            Eduquemos o médium e o façamos, principalmente, nos moldes da moral cristã e na resistência que deve opor às pretensões perniciosas dos espíritos perturbadores e maus.

            Mas, concomitantemente, eduquemos os centros, tendo-se o máximo cuidado na escolha dos seus membros constituintes, que devem ser homogêneos.

            Os membros de um centro, tomam compromisso muito sério e formal com o médium, pois que são eles os trabalhadores, que têm de preparar convenientemente o campo onde vai o médium operar.

            Cabem-lhes, pois, graves responsabilidades.

            E tenho concluído, leitor amigo.

            Perdoas-me a ousadia de me ter proposto a tratar de questões tão transcendentais: mas se o fiz foi arrimado no meu bom Guia,

            Obrigado.