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sábado, 6 de fevereiro de 2021

O Batismo

 

O Batismo     

A Redação    Reformador (FEB) 16 Janeiro 1919

             “Em verdade, em verdade te digo: se o homem não renascer pela água e pelo espírito, não pode entrar no reino dos céus.” João, Cap. II, V. 5.

             Foram estas as palavras do Divino Mestre a Nicodemos, que serviram e ainda servem de fulcro à cerimônia que a Igreja Católica instituiu como sacramento imprescritível.

            Nisto, aliás como em tudo que forma o seu cânone para não falir a regra de todos os tempos, os teólogos sectários sacrificaram à letra que mata o espírito que vivifica.

            E da exegese apaixonada e tendenciosa surdio, então, como flor de estação fria e nebulosa, em sentido inverso, inexpressivo e turbido (turvo) o conceito da salvação da alma numa graça toda eventual, subordinada a fórmulas de certo valiosas ao tempo de sua instituição, pelo simbolismo que representavam, mas que hoje perderam inteiramente a sua razão de ser.

            Entretanto, da mais rigorosa ortodoxia eclesiástica é a afirmativa de que Deus cria a alma para o corpo que ela deve habitar em uma existência única.

            Não se compreende assim, como da Onisciência Divina possa originar-se um ser inquinado de mácula e, ao demais, desigual ao infinito nos seus predicados essenciais de reabilitação.

            Pecado original?

            Mas, para admiti-lo como pontifica a Igreja, fora de mister renunciar em bloco àquelas palavras outras do mesmo Cristo no versículo seguinte ao supracitado, que dizem: “O que é nascido da carne é carne e o que é nascido de espírito é espírito.”

            Logo, portanto, a quem estuda os Evangelhos sem o prejuízo dogmático que tudo relega ao cômodo e absurdo magister dixit é lícito concluir que não responde o corpo por faltas do espirito, se faltas se pudessem atribuir a este, hereditariamente, quando ex-abrupto criado à revelia de toda a vontade e consciência próprias...

            Que, dentro das leis biológicas, a hereditariedade seja um fato e fato comprovado pela ciência, admite-se; mas, que ao espírito inédito, abrolhado à vida por um mistério insondável da Onipotência Divina se irroguem faltas a priore é coisa que mal se concebe ou, antes, que só se pode conceber pela frivolidade de consciências acomodatícias e negligentes no encararem estes problemas transcendentais.

            A cada época o seu ensino, em linguagem equivalente à sua cultura moral e científica, eis o que nos dizem agora os portadores da Boa Nova.

            O Precursor batizava em água preparando a geração do seu tempo para a compreensão do batismo do espírito em nossos dias. E se assim o fazia, acrescentam, é porque nesse tempo conformemente com as interpretações científicas para os Hebreus consoante as tradições da Gênesis (1), a água era considerada como princípio gerador dos reinos orgânico e inorgânico.

                 (1) Gênesis - C.I VV. 2-6-7-9-10-11-20 e Caps. 11-1-4-5-6-7.

             De notar é também que, ainda hoje, célebres naturalistas - como Haekel e outros consideram a monera, princípio vital, como germinativo inerente dos meios líquidos.  

            Seria o caso do nihil sub sole novum  (nada de novo sob o sol).

            De qualquer forma, porém a verdade é que o Batista não levava simbolicamente ao Jordão imbele (frágeis) criancinhas incapazes de compreender o símbolo.

            Aqueles que aceitavam a sua doutrina - a dos essênios - e pela penitência e propiciavam ao batismo do Espírito isto é, a receberem o Cristo, ele os batizava entornando lhes água sobre a cabeça para que renascessem por ela e pelo espírito, e não do Espírito Santo, como afirma a Igreja alterando o texto original das palavras de Jesus.

            Mas, admitindo-se que o batismo tal com o praticam as seitas neo cristãs, inclusive o catolicismo aberrante tenha a virtude de expungjr (eliminar) o estigma do pecado original  inconcebível dentro da lógica e do bom senso, ainda assim, pergunta-se: será cristão aquele  que, lavado e ungido no batistério, cria-se na impiedade e degenera em fanático por amor a fórmulas vãs, quando as não renega de todo para ser o homem moderno, armado para todos os triunfos e conquistas de um mundo que o Cristo dizia lhe não pertencer?

            Ninguém de boa-fé o dirá, mas a verdade é que todo o mundo continua a considerar pagão e renegado aquele que se não submete a fórmulas arcaicas e balofas duma liturgia inexpressiva, embora praticando obras de piedade e tolerância.

            E o que mais contrista é ver que espíritas, confrades nossos ainda vacilam na conduta que se lhes impõe em relação à respectiva prole.

            Isto significa simplesmente a força da tradição e do preconceito secularmente zelados pelo clero suspicaz (suspeito) e cioso de prerrogativas que criou de épocas em que elas poderiam justificar-se, mas que hoje perderam a sua razão de ser e hão de fatalmente anular-se pela nova ordem de coisas que o Espírito Santo (os espíritos elevados) vem inaugurar explicando racionalmente o simbolismo evangélico.

            Checada é a época ele serem ditas aquelas coisas que o Divino Mestre calou, por não estarem os seus coevos (contemporâneos) em estado de as compreender e para elucidação das quais enviaria o Consolador. (1)

             (1) João Cap. XVI – v.12

             Vejamos portanto, o que nos dizem os Evangelistas:

             “Assim, renascer pela água quer dizer renascer em novo corpo, e renascer pelo espírito o habitá-lo.” (2)

            (2) Roustaing-3º volume pag. 225.

             Era justamente da pluralidade das existências corporais que Jesus falava veladamente a Nicodemos, e isso que era com é, um fato hoje unanimemente proclamado pelos espíritos, tornou-se uma heresia para os que atribuíram a investidura única de únicos depositários e intérpretes da ciência divina.

             “Tempora mutantur”! (“os tempos mudam” ou “os tempos mudaram”)

             Hoje ninguém concebe privilégios tais de casta e aptidões graciosas: hoje todo o mundo admite que o homem só pode ser responsável por atos praticados livre e conscientemente, mas prossegue-se na subordinação cega a hábitos e costumes de longada praticados na mesma inconsciência de há vinte séculos, quando não no temor desse mesmo ódio sectário, que plantou a jornada grandiosa do Calvário.

             Espíritas, compenetremo-nos nós outros de que é preciso haver por oportuna ainda, aquela voz que clamava no deserto o – penitte. (penitenciar?)

             Penitenciar-nos é trabalhar, é estudar, é amar, é praticar os ensinos de Jesus.

            É na exemplificação das virtudes domésticas que importa batizar os nossos filhos, preparando-os em tarefa de lapidário paciente para o renascimento do espírito, ou seja para a graduação moral do planeta em melhoradas e sucessivas encarnações.

             Lavar um vaso exteriormente não é modificar lhe a essência.

            As cerimônias de caráter material podem, a rigor, valer relativamente pela significação moral que lhes emprestamos, mas não modificam substancialmente o espírito e a prova é que depois de vinte séculos de afusões (banhos), unções e aspersões simbólicas, a humanidade se debate em angústias indefiníveis, lembrando aquele fariseu meticuloso e mesureiro (bajulador, servil), requintado no seu formalismo ortodoxo mas porejando orgulho vanilóquios (falas sem sentido).

            Batizemos os nossos filhos em nome do Padre, sim, incutindo-lhes o amor de Deus sobre todas as coisas - em nome do Filho, ainda, lançando lhes na alma, da mais tenra idade o gérmen do amor do próximo, qual viva expressão de toda a Lei e os Profetas e em nome do Espírito Santo, também, preparando-os para receber os espíritos de luz que ora se abatem obre a Terra em revoadas de graças, para levantar a criatura do volutabro (lamaçal) das próprias paixões, do pecado original do seu orgulho para a compreensão em espírito e verdade das coisas santas, do Verbo de Deus.

            Tudo que não seja isso será iludir-nos à nós mesmos, com a agravante do acréscimo de responsabilidades decorrentes daquela palavra que diz: “muito se pedirá a aquém muito se houver dado e a quem pouco tiver tudo se tirará.”

            Aquele espírito austero e cristianíssimo que se chamou entre os homens Bittencourt Sampaio, em uma de suas obras mediúnicas lançadas no Grupo Ismael (4) verberando a indecisão e transigência em matéria de Fé, reproduz a apóstrofe dirigida à igreja de Laodicéia: sei as suas obras: não és quente nem frio. És morno.

                 (4) “Do Calvário ao Apocalipse”. Pág.230

            Não sejamos mornos também nós outros. Os frios pela renúncia literal de princípios que não temos a coragem moral de sustentar, ou quentes pela coerência dos nossos atos, extremados do sacrifício, embora, mas dentro da lei do amor.

            Aceitando a Revelação Espírita como desdobramento lógico da Revelação Messiânica, ou aceitamos integralmente os seus preceitos demonstrando lhes a eficiência prática ou renunciamos ao qualificativo de espíritas.

            Ser e não ser, não pode ser. Ou quente ou frio: morto é que não.


sábado, 30 de abril de 2011

02/02 Sobre o Batismo



Ainda o Batismo
           
            Reformador (FEB) 15 de Dezembro de 1903

            Os conceitos que sobre este assunto emitimos em nossa edição de 15 de outubro passado mereceram alguns reparos do nosso prezado colega d ‘A Doutrina, do Paraná, a quem, antes de tudo nos confessamos gratos por nos proporcionar este ensejo de melhor esclarecer e completar o nosso pensamento ali imperfeitamente enunciado. Uma só coisa, entretanto, deploramos, e é que tão ligeiramente tivesse lido o nosso escrito, que começasse por considerá-lo ‘uma carta de respeitável confrade’ dirigida a esta redação, quando claramente assinalávamos que as apreciações que se iam ler, e a que conservávamos, como de razão, a forma epistolar, havia sido o assunto de uma carta por nós escrita, em resposta à consulta que em tal sentido nos fora feita por um confrade do interior.

            Foi ainda a atenção, indubitavelmente superficial com que nos leu, que o fez atribuir ao nosso pensamento uma elasticidade que os próprios termos em que foi expresso de forma alguma autorizavam.

            Restabeleçamos, com alguns esclarecimentos, a questão nos seus primitivos termos.

            Pediu-nos dedicado irmão em crença, na carta a que aludimos na resposta publicada, que lhe indicássemos uma fórmula para batizar crianças, ‘a fim de poder satisfazer os pedidos que em tal sentido lhe eram sucessivamente feitos, e aos quais, em sua boa fé, não via inconveniente em atender, porque – dizia ele – ‘parece que é tempo de seguirmos o Evangelho de Jesus.’

            O inconveniente, que ele não descobria, vimos nós na instituição solicitada, ‘fórmula’ que viria – ou virá, onde e quando quer que se lembrem de a estabelecer – a constituir nada mais nada menos que um sacramento, tal qual a igreja de Roma o adotou para o mesmo caso.

            Foi, pois, a esse grave precedente de se introduzir uma nova liturgia nas práticas espíritas, que opusemos os conceitos emitidos na carta aqui reproduzida. Salientamos então:

            1º que o batismo, a que se submetiam os primeiros cristãos, tinha para eles a significação simbólica, no ponto de vista da formalidade exterior, da livre adoção do novo credo, a que eles previamente começavam por se converter.

            2º que o faziam como homens, na plenitude, portanto, do seu livre arbítrio; e acentuamos em seguida a diferença entre esse costume e a prática, que a igreja de Roma nos legou, de se impor arbitrariamente a filiação religiosa às crianças em tenra idade, mediante a administração desse sacramento, com evidente violação da liberdade espiritual. Acrescentamos por fim que a esse procedimento, inspirado no orgulho humano, ‘em cujo nome os pais julgam poder dispor da consciência dos filhos’, devíamos opor o espírito de tolerância, tão pouco infelizmente introduzido nos nossos hábitos, e assim aguardar que os nossos filhos, chegados à idade da razão ‘adotem livremente a crença que melhor consulte as aspirações de sua própria alma’.

            Daí concluiu o colega – atribuindo ao nosso pensamento uma extensão que ele, de resto, não comporta, - que proscrevíamos todo ensino religioso às crianças, e depois de citar alguns trechos de artigos nesta folha publicados, a cerca da utilidade da educação espírita da infância, no intuito porventura de descobrir incoerência na nossa atitude atual, raciocina: ‘portanto não nos parece que o ‘Reformador’, revista que muito e muito nos merece, vinha agora dizer que é um crime que se pratica, ensinando às crianças desde os seus primeiros dias a doutrina que julgamos ser a melhor até hoje conhecida’.

            Ora, o colega, como se vê, confunde a administração do batismo, em virtude da qual fica a criança arbitrariamente vinculada a determinado credo – não importa qual seja: o fato é sempre o mesmo – com o ensino religioso, contra o qual não articulamos uma única sílaba. E não precisava rebuscar as nossas edições de 1891 para demonstrar que já proclamamos as excelências  desse ensino; bastava ler com um pouco de atenção, linhas abaixo, esse mesmo escrito ‘Sobre o batismo’ para verificar que reconhecemos ser esse o primeiro dever dos pais para com os filhos, assinalando que o batismo de que estes carecem ’é o preparo dos seus pequeninos corações, nos quais devem, o mais cedo possível, ser lançados os ensinos da obediência, da humildade, da paciência, da humildade, da paciência e da doçura como do amor, desde o que se reporta ao nosso Pai celestial, até a piedade pelos próprios animais’ etc.
            É a isto que o colega chama ‘ não ter o Reformador mais fé na doutrina que há vinte e um anos propaga? Nesse amor, que abrange desde o Criador até os mais ínfimos seres que nos rodeiam, não se encerram com efeito toda a lei e os profetas? E onde o hão de ir beber os pais, para transmitir a seus filhos, senão naquele código divino, que é o coroamento triunfal do Espiritismo? Não podia, pois, ser mais gratuita do que essa, a afirmação de que proscrevemos o ensino religioso à infância? E tudo por que? – Porque nos insurgimos contra a instituição do batismo, que se pretende transplantar, com o odioso característico apontado, para os hábitos da nossa doutrina!
                                                                       *
            Dirá o colega – o claramente o disse em seu artigo – que não é o batismo, como fórmula ou rito, que defende, porque, para o combater, onde quer que o pratiquem desse modo, tê-lo-emos solidariamente ao nosso lado; o que se defende é ‘a apresentação da criança |à proteção dos bons espíritos’ afim de pedir-lhes para que ela seja boa e dócil aos seus pais, que ela siga o caminho do bem’, acrescentando: ‘e que tudo isto se realize dentro de casa, no santuário da família, não nos parece que seja um rito,’ etc.

            Antes de tudo, quer nos parecer que essa apresentação, a que tomamos a liberdade de fazer alusão em nossa crítica – e daí a impugnação do colega – não seja uma cerimônia tão íntima e tão simples como o faz crer, nas linhas que acabamos de citar; porque nessa mesma edição de 1º de Dezembro, em que vêm os seus reparos à nossa  carta-editorial, deparamos com esta local em seu noticiário:

            ‘Apresentação – No dia 25 de Outubro passado, foi apresentada à proteção dos Bons Espíritos, no Centro Espírita, uma filhinha do nosso confrade Sr. José Ferrari, que no registro civil tomara o nome de Elisa. Que seja sempre guiada no caminho do Bem, são os nossos votos’.

            Vê-se, pois, que a ‘apresentação’ não tem lugar ‘no santuário da família’ mas é, algumas vezes pelo menos, efetuada com toda a solenidade nos centros espíritas, assim convertidos, similarmente aos da igreja, em templos para esse privativo mister.

            Em sua sincera boa fé, a que folgamos de render a mais espontânea justiça, mas que só a força do hábito e da educação religiosa justifica, o colega não descobre o mínimo perigo nesse ato, tão simples na aparência.

            O perigo, todavia, existe, não tanto no que se faz, e que parece realmente inócuo, mas no precedente que constitui e cujas conseqüências não são difíceis de prever. Nestas coisas, como em tudo, o embaraço está em começar. Principia-se por uma ‘apresentação’, invocando a proteção dos guias espirituais; depois a tendência para as pompas exteriores, inata na natureza humana, passará a achar a cerimônia demasiado simples; agradar-lhe-ia alguma coisa mais impressionante, que afetasse os sentidos por mais lisonjeira forma; introduzir-se-ão alguns aparatos para quebrar a monotonia do ato, e dentro em pouco teremos um cerimonial, ao começo limitado, e em seguida cada vez mais complexo e atraente,pelo mistério do simbolismo – quem sabe? – até que toda uma liturgia, invocando os precedentes, se tenha estabelecido, em detrimento da essência espiritual que, a nosso ver, tão exclusivamente deveria predominar, agora e sempre, nos ensinos e nas práticas espíritas.

            Dirá o colega que fantasiamos.  Mas aí estão, para nos edificar, as lições da história particularmente da história e da tradição eclesiásticas. Acredita o colega que o pomposo ritual com que a igreja deslumbra hoje os seus fiéis, foi por ela adotado de um só jato? Não. Ele se foi lentamente introduzindo, de concessão em concessão, através dos séculos, até chegar, como se vê, a substituir-se inteiramente aos ensinos primitivos.

            Ah! A força do tempo e dos precedentes uma vez admitidos! Tenhamos, pois, o cuidado de fugir sistematicamente a todo o formalismo, que não é senão um produto do nosso atraso e ignorância, como de nosso apego às coisas do passado.

            Ao demais, acredito realmente o colega que, para que os bons espíritos tomem a sério os santos encargos de direção e inspiração das criaturas da terra, será necessário que, ao vir uma dela ao mundo, lhes seja formalmente apresentada?  Que noção julga que possuem esses espíritos superiores acerca dos seus elevados deveres? É, em virtude dessa apresentação que eles assumem o compromisso de inspirar os seus guiados para o bem, ou é por força da missão que em tal sentido lhes outorga o Criador? Mas, então, para que serve essa formalidade?   

            De duas uma: ou é indispensável para essa proteção se torne efetiva, e nesse caso ai dos infelizes que não tenham sido ‘apresentados’ porque ficarão à míngua desse amparo, convindo, portanto, quanto antes, decretar a adoção forçosa e geral dessa formalidade; ou mesmo sem ela os guias deixarão de velar pelos seres confiados’ à sua proteção, e em tal caso é inútil, e deve-se por esse motivo suprimi-la, a menos que essa ‘apresentação’ tenha a significação de vincular o recém nascido à crença espírita.

            Incidimos, então, na monstruosidade, contra que nos insurgimos, de violar a liberdade de consciência, tão respeitável no adulto como na criança.. Não. Não nos assiste esse direito, que seria criminoso, por mais convencidos que estejamos de que o maior benefício que podemos dispensar aos nossos filhos é fazê-lo espíritas e sobretudo espíritas cristãos.

            Mas, neste caso, o procedimento que a própria consciência nos indica é inteiramente outro; e aproveitamos o ensejo para tornar bem claro o nosso pensamento, afim de que se não preste novamente a errôneas interpretações.

            Desde os mais tenros anos devem naturalmente os pais ir transmitindo aos filhos o que denominaremos lições práticas de Espiritismo, isto é, não perdendo ensejo de ensinar-lhes as noções elementares das grandes leis que regem a vida e o destino humanos, como a existência de Deus, com os seus infinitos atributos, a preexistência da alma e as vidas sucessivas e solidárias, sobre a base da imortalidade, a justiça divina a que  nenhuma das nossas ações pode escapar, e ao lado disso insinuando-lhes os sentimentos cristãos, de que lhes devem, em primeiro lugar, dar os exemplos, formando assim o caráter e emancipando o espírito dos filhos de todas as superstições e preconceitos, isso até aos 10 ou 11 anos. 
Porque só então começarão as crianças, segundo o seu desenvolvimento moral e intelectual, a estar verdadeiramente aptas para fazer um curso regular de Espiritismo, ainda assim elementar, sendo bem para lastimar que ainda não possuamos aqui no Brasil um trabalho didático apropriado a esse fim.

            Acompanhará, pois, a solicitude paterna a evolução do espírito de seu filho, até a idade propriamente da razão.

            Se, porém, chegado ai, e não obstante essa educação preparatória em cuja superioridade somos os primeiros a depositar a mais absoluta confiança, se mostrar ele refratário ao ensino dado, e descobrir que o seu espírito tem mais afinidade com outra qualquer crença, o que não é impossível – a natureza humana apresenta tão grandes singularidades! – que pensa o colega que devem fazer os pais? Respeitar, sem o menor ressentimento, a livre manifestação da consciência de seu filho, não é assim? Esse é, pelo menos, o seu dever de tolerância.
                                                                                   *

            Assim fica, portanto, completamente esclarecido o nosso pensamento. Insistirá o colega depois disso na necessidade de apresentação das crianças à proteção dos guias espirituais, sob o pretexto que, de resto, invocou em seu escrito, de que o Mestre incluiu em O Evangelho segundo o Espiritismo uma prece pelas crianças que acabam de nascer, o que – digamos de passagem – nenhum apoio oferece à sua argumentação?

            Isto, porém, é uma outra questão que bem merece um artigo à parte.
                                                                        

01/02 Sobre o Batismo


Sobre o Batismo
 Reformador (FEB) 15 Outubro  1903

            Uma tendência que, com desgosto, temos visto se estar generalizando entre os espíritas é a de introduzir nas práticas de nossa doutrina cerimônias que, todavia, de modo algum se compadecem com o seu caráter essencialmente espiritual, destituído, por conseguinte, de toda exterioridade formalística. Entre essas cerimônias figura o batismo de crianças, a que alguns procuram dar o dissimulado nome de ‘apresentação’, sem reparar em que, no fundo, é o mesmo erro dos católicos romanos que praticam.

            Julgamos por isso oportuno submeter à apreciação de tais confrades, cuja boa fé reconhecemos, mas a cuja perspicácia terá certamente escapado o perigoso desvio que há nesse procedimento, os seguintes conceitos que resumem o nosso modo de ver a tal propósito.

            Conservamos-lhes a forma epistolar em que foram calcados, por isso que se trata de resposta a uma carta em que dedicado irmão de crença nos consultava pelo modo indicado no começo dessa réplica, a que, ocultando nomes por dever de discrição, damos publicidade unicamente para tornar conhecida do maior número a nossa opinião.

            É possível que estejamos em erro. Apelamos, em tal caso, para o critério dos mais esclarecidos, e eles que digam se esse pronunciamento consulta ou não os ditames da razão e do bom senso.

            Eis a carta:

            ‘Saudações fraternas,
            Com resposta à vossa carta de 16 do corrente, na qual nos solicitais uma fórmula batismal, a fim de atenderdes aos pedidos que vos são feitos no sentido de batizardes crianças, e porque vos ‘parece que é tempo de seguirmos o Evangelho de Jesus’ permiti-me dizer-vos que, precisamente, por já ser tempo de seguirmos EM ESPÍRITO os seus divinos preceitos, é que nos devemos abster de todo formalismo.

            O batismo, tal como era praticado nos primeiros tempos do Cristianismo,e que consistia na ablução dos novos convertidos, segundo os usos daquela época, tinha para estes a significação simbólica da adoção do novo credo, no ponto de vista da formalidade exterior. Porque eles começavam por se converter ao Evangelho, vindo em seguida essa prática material, como mero simbolismo. Lembrai-vos, entretanto, de que eram homens e, na plenitude do discernimento, adotavam livremente a nova crença.

            Diferente, porém, é pegar de uma criança, que nenhuma noção tem ainda do mundo exterior, e dispor arbitrariamente da sua consciência impondo-lhe de antemão a crença religiosa a que, por essa flagrante violação da liberdade espiritual, ficará pertencendo na vida – sob pena de apostasia. Esse uso é um atestado do orgulho humano, em cujo nome os pais julgam poder dispor da consciência dos filhos, esquecendo-se de que o livre arbítrio, que o próprio Criador, que no-lo outorgou, jamais viola, deixando que dele usemos para o bem como para o mal, como o entendermos, é atributo contra cujo exercício nenhum de nós tem o direito de atender.

            E é esse o característico, por excelência condenável,  do batismo nas crianças, o qual, em tais condições, constitui um verdadeiro crime.

            Deixem os pais que seus filhos cresçam e que, quando chegarem à idade da razão, adotem livremente a crença que melhor consulte as aspirações de sua própria alma. Este é o princípio absoluto e inflexível.

            Quando particularmente a adotarmos os espíritas uma fórmula batismal, Deus nos livre de que tais preocupações materiais se introduzam em nossas práticas. Que valor podem ter aos nossos olhos as exterioridades, os símbolos, os ritualismos, quando os ensinos de Jesus todos se reportam aos atos morais, ao que se passa na intimidade dos corações e das consciências, sempre patentes aos seus olhos e aos olhos do nosso Criador?

            Aos que, por conseguinte, vos pedem que lhes batizeis os filhos, respondei-lhes que o batismo de que eles carecem é o dos seus exemplos de virtude, paciência e bondade; é o preparo dos seus pequeninos corações nos quais devem, o mais cedo possível, ser lançados os ensinos da obediência, da humildade, da paciência e da doçura, como do amor, desde o que se reporta ao nosso Pai celestial, até à piedade pelos próprios animais, contra os quais praticam as crianças tão frequentemente a crueldade.

            Esse é que é o batismo que todo pai deve dar a seu filho, certo de que, se assim o educar, dele fará mais tarde um verdadeiro discípulo do Divino Mestre.

            O Espiritismo não cogita de formalidades que, de resto, se tiveram sua razão de ser outrora (e por forma diferente do que se pretende hoje fazer, seguindo os perniciosos exemplos da igreja de Roma), nenhuma utilidade apresentam na nossa época e em relação aos ideais da nossa doutrina, que procura fazer homens novos, seguidores dos preceitos de Jesus, em espírito e verdade, e não imitadores de fórmulas vãs, que ele jamais insistiu.’