Pesquisar este blog

Mostrando postagens com marcador I. Pequeno. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador I. Pequeno. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Tempestades



Tempestades

I. Pequeno (Antônio Wantuil de Freitas)           

Reformador (FEB) Junho 1944

 

            A celeuma levantada pelas colunas dos jornais “A Noite”, “Folha Carioca” e outros diários de grande projeção, não passa de verdadeira tempestade em copo d’água.

            Não era meu desejo emitir qualquer opinião sobre o assunto, visto não acreditar que a Família de Humberto de Campos pretenda receber qualquer quantia pelas obras ditadas pelo espírito do seu genitor e publicadas pela Federação Espírita Brasileira (*). Essas obras vêm sendo editadas há alguns anos, a carinhosa mãe do saudoso escritor reconheceu-lhes a identidade e os filhos queridos do inesquecível acadêmico jamais fizeram a menor ameaça à Federação.

             (*) Nota do Blog: A publicação foi contestada na Justiça. No ‘site’ da FEB lemos:

                 ... “o Dr. Miguel Timponi aceitou "O caso Humberto de Campos", como advogado da FEB e de Francisco Cândido Xavier, para contestar a ação impetrada pela família do escritor desencarnado, que pretendia os direitos autorais da obra literária produzida pela mediunidade de Chico Xavier, recebida do Espírito Humberto de Campos.”

                “Para esse trabalho, contou com o auxílio de vários colaboradores, todos eles mencionados por Wantuil de Freitas em "Duas palavras", apresentação desta obra.”

                “A Ação Declaratória foi julgada improcedente e o Dr. Timponi obteve brilhante vitória jurídica.”

                “Lançou o livro “Magnetismo Espiritual”, publicado pela Federação Espírita Brasileira, mas com o pseudônimo Michaelus. Desencarnou aos 70 anos, no dia 13 de fevereiro de 1964.”

                Para maiores detalhes sugerimos a leitura do livro de Miguel Timponi “A psicografia ante os tribunais” (Ed. FEB), 2012.”

             Falemos, portanto, sob um ponto de vista geral.

            Que essas obras são, realmente, de Humberto, não resta a menor dúvida. O sr. Agrippino Grieco, grande crítico literário e amigo íntimo de Humberto, apesar de não ser adepto do Espiritismo, confessou de público que o estilo era do seu velho companheiro de muitos anos. Outros já disseram o mesmo.

            Ao serem publicadas as referidas obras, cujo lucro é inteiramente distribuído pelos departamentos de beneficência da editora, não se procurou formar qualquer confusão com as escritas em vida carnal por aquele estilista. Foram apresentadas, com a maior sinceridade, como ditadas pelo espírito do escritor, tal como o são as outras recebidas de outros espíritos, os quais, espontaneamente, oferecem o seu trabalho intelectual como cooperação para a obra de recristianização dos homens e de socorro aos infelizes.

            As obras que nos tem enviado o espírito do grande Humberto são, todas elas, magníficas e lidas pelo Brasil inteiro e até no estrangeiro, traduzidas que vêm sendo para outras línguas.

            Há, no entanto, outros escritores que preferiram o anonimato, talvez por não terem confiança nos seus herdeiros. Entre esses últimos, encontram-se André Luiz, pseudônimo de conhecido médico brasileiro, e Emmanuel, o mais evolvido de todos eles, que foi padre católico em evidência no Brasil e que atualmente está sendo traduzido para o Esperanto.

            Todas essas obras se vendem igualmente, porém, as de Emmanuel vencem tiragens sobre tiragens, disputadas que são antes mesmo de serem expostas nas livrarias.

            Se algum dia a Justiça proibir o direito de receber obras mediúnicas de espíritos conhecidos, colocar-se-ão pseudônimos, visto que essas obras se vendem igualmente, com ou sem nome em evidência. São disputadas, porque são boas. Se forem reconhecidas como de Humberto, creio que ninguém poderá proibi-lo de escrever para fins humanitários ou impedi-lo de assinar os seus trabalhos.

            Se, ao contrário, dogmatizarem que elas não foram escritas por Humberto; nenhum direito autoral poderá ser pedido.

            De qualquer forma, portanto, não há direitos autorais a pagar e nem razão para a celeuma feita por pessoas estranhas à digníssima Família de Humberto de Campos.

            Ninguém conhece melhor uma criatura do que aquela que lhe deu a vida e lhe formou o caráter.

            Em “Brasil, Coração do Mundo”, a extremosa genitora de Humberto se confessa feliz com a prova evidente de que seu grande filho continua vivo.

            Assim, como veem, tudo não passa de mais uma tempestade em copo d’água.


quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Da assunção corpórea de Nossa Senhora...

 


Um novo dogma

I. Pequeno (Antonio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Outubro 1950

             Depois do dogma da Infalibilidade Papal, surgirá, agora, em Novembro do corrente ano, o da Assunção corpórea de Nossa Senhora, ou seja, que ela subiu para o céu em carne e osso, dogma no qual os católicos deverão crer, sob pena de pecado mortal e consequente condenação às fogueiras infernais.

            Nada temos com isso, mas estranhamos que, em região de Espíritos puríssimos, a carne e os ossos lhe sejam a ela necessários.

            O dogma foi cuidadosamente preparado através de lendas e mais lendas e de interpretações artificiosas.

            Conta o grande Padre Júlio Maria (não confundir com um outro Júlio Maria, francês, fundador do jornal “0 Lutador”) em seu livro Mulher bendita:

             “Reproduzo aqui um soneto feito pelo próprio demônio, em 1823, por intermédio de um menino letrado de 12 anos de idade, possesso e exorcizado por dois Padres Dominicanos, na cidade de Ariano, da Apulia (ltália).

                Os dois Sacerdotes impuseram ao possesso a obrigação de provar teologicamente com um soneto de “rimas” indicadas, Filho e Mãe, a Imaculada Conceição da Mãe de Jesus.

            O pequeno possesso iletrado, num instante compôs a seguinte Soneto, que é, pelo modo de dizer e pela profundeza da doutrina, uma obra inimitável, acima da capacidade intelectual de qualquer pessoa, por mais ilustrada que seja.

                É o resumo de toda a doutrina da Imaculada Conceição e o eco perfeito e fiel da tradição dos doze primeiros séculos do Cristianismo:

 

                Mãe verdadeira eu sou, de um Deus que é Filho.

                e dele filha sou, bem que sua Mãe; 

                ab oeterno, nasceu, mas é meu Filho,

                Bem que nasci no tempo, eu sou sua Mãe.

 

                Ele é meu Criador, mas é meu Filho,  

                Sou criatura sua, e sua Mãe;

                Prodígio foi divino, ser meu Filho.

                Um Deus eterno e ser eu sua Mãe.

 

                Comum é quase o ser à Mãe e ao Filho:  

                Porque do Filho, teve o ser a Mãe,

                E da Mãe teve o ser também o Filho.

 

                Ora, se o ser do Filho teve a Mãe,

                Ou se dirá que foi manchado o Filho,

                Ou sem labéu se há de dizer a Mãe.

             O Papa Pio IX, lendo conhecimento deste soneto, leu-o, chorando de emoção, e proclamando-o uma exposição perfeita da Imaculada Conceição.”

             Como vemos, raciocinando com a própria argumentação de que usa a Igreja em casos que tais, o demônio foi favorável à criação de um dogma e para ele contribuiu com o seu trabalhinho.

            Certamente outros demônios camaradas deverão ter colaborado nos vários dogmas criados no correr dos séculos e novos demônios aparecerão, todos favoráveis às conveniências da Santa Madre Igreja.

            Para nós, porém, o que houve não foi a intervenção amistosa do “demônio”, mas a utilização da mediunidade de um garoto pelo Espírito de um tonsurado que, na Terra, já se batia fanaticamente a favor do dogma.

            Essa é a nossa opinião, todavia, como não na querem admitir, deixamos-lhes a liberdade da utilização do demônio como excelente instrumento auxiliar para a criação de dogmas.

            Que lá se entendam...


 


domingo, 24 de janeiro de 2021

Religião Espírita

 


Religião Espírita

I. Pequeno (Antonio Wantuil de Freitas)   

Reformador (FEB) Março 1950

 

            O Espiritismo não é uma religião, e, sim, a Religião; isto porque só ele ensina que todas as criaturas se salvarão independentemente dos credos que professem, religando-se todas elas, um dia, ao Criador e Pai.

            Assim, não prometendo o Espiritismo a salvação exclusiva e dogmaticamente para os seus adeptos, mas proclamando que os ensinos de todos os agrupamentos religiosos conduzem a Deus, etc., o Espiritismo, será nos tempos vindouros olhado como a verdadeira religião do Planeta.

            O Espiritismo não é uma religião porque seu fito não é destruir as centenas de religiões e seitas em que se dividiram os homens ou mesmo tomar-lhes o lugar. É, sim, o de penetrar em todas elas, levando-as, através do conhecimento das novas revelações, a se adaptarem à evolução determinada de Mais Alto, qual aconteceu na época em que Jesus esteve entre nós.

            Se alguns grupamentos religiosos forcejarem contra a Luz de Cima, assistiremos então à derrocada e ao desaparecimento deles, exatamente como aconteceu com a maior e mais poderosa organização religiosa do mundo, na época da Roma dos Césares - o Paganismo.

            À palavra religião ligaram os homens a ideia de cerimônias litúrgicas, e, daí, a necessidade de se criar um novo termo ou de se fazer voltar ao vocábulo religião a sua verdadeira significação.

            Não havendo possibilidade de se introduzir um novo termo, por estar registrado o já existente na legislação de todos os países todo o esforço deverá então ser feito no sentido de aplicar à palavra religião o seu significado nato.

            Há empenho, da parte dos nossos adversários em provar às autoridades do País que o Espiritismo não deve ser considerado como religião e que, assim sendo, não se encontra sob a proteção da Constituição Nacional.

            É apenas ciência!" - dizem eles. Mais além, retomam: “Kardec assim o afirmou!” -

A respeito desses pontos, "Reformador' de Outubro de 1949 já esclareceu devidamente, pela pena do próprio Codificador, em trabalho por ele escrito quatro meses antes do seu decesso, afirmando que o Espiritismo não é uma religião, um culto, mas, a religião.

            Em S. Paulo, há tempos, certa autoridade deixou de atender a um justo pedido que os espíritas lhe dirigiram, porque, alegou aquela autoridade, o Espiritismo não é uma religião.

            Quando se processou o último censo da população do Brasil, colocaram, nas fichas distribuídas com o povo, várias religiões e não falaram em Espiritismo, porque, disseram também eles o Espiritismo não é religião.  

            Como vemos, por essa pequena mostra bem fez a Federação Espírita Brasileira declarando taxativamente, em seus novos Estatutos que ela é uma sociedade religiosa.       r

            Vamos ver, agora, diante dessa afirmativa dos Estatutos da Casa Máter, se os nossos irmãos católicos ainda continuarão a espalhar que a Constituição do País não nos coloca em igualdade de direitos com os demais agrupamentos religiosos!


sábado, 23 de janeiro de 2021

A praga do Espiritismo

 

A Praga do Espiritismo

por I. Pequeno (Antonio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Agosto 1948

             Anonimamente me vêm sendo enviados jornais católicos que dizem “cobras e lagartos” do Espiritismo, classificado, de praga, de comunista, de prejudicial à Família brasileira, de tudo, enfim.

            E têm razão os referidos jornais. E tem-na igualmente os livros católicos que não se cansam de queixar da tal “praga”. Os fiéis têm, aos poucos, abandonado os seus templos e os donativos lhes estão fugindo, obrigando-os a aumentar, dia a dia, os preços das suas cerimônias, e, nesta época em que a Imprensa vive a apelar para as Comissões de Preços, certamente receiam que lhes tabelem oficialmente os batizados, os casamentos, as missas, os sermões, etc., etc.

            Porque não fazem como os Espíritas, que tudo dão de graça? - Seria mais evangélico. Seria, sabem eles, mas isso não lhes convém, sendo-lhes preferível a aproximação com os Governos, a fim de tentarem que estes criem leis que levem à cadeia os praticantes da tal “praga”.

            No mesmo dia em que recebi um desses jornaizinhos católicos (1-7-48), “O Globo” publicou uma entrevista que lhe concedeu monsenhor Nabuco, auxiliar direto de S. Eminência o cardeal D. Jaime: “Há no Rio 442 igrejas e capelas. A Igreja sente necessidade de criar as missas dialogadas, a fim de atrair os fiéis!”

            Ora, se existem no Rio, entre igrejas e capelas, apenas 442, razão têm os reverendos de se queixarem da “praga do Espiritismo”, pois que, ao tempo em que a Polícia obrigava os Centros Espíritas a se registarem e os seus diretores a se deixarem fichar na seção de gatunos, já existiam para mais de quatrocentas sociedades espíritas registadas na Polícia do Distrito Federal. Hoje, o número é bem maior, e vivem todas elas abarrotadas de crentes, apesar de não lançarem mão do atrativo profano dos foguetórios e da pomposidade da liturgia romana.

            Se há 442 templos católicos, à espera de fiéis, e se há maior número de templos espíritas, abarrotados de crentes, concluímos, pelos próprios dados que nos ofereceram haver mais espíritas que católicos, realmente católicos, na Capital da República, cérebro do País.

            O interessante, porém, é que os fatos se estão passando tal qual sucedeu ao tempo do aparecimento do Cristo: quanto mais apelam para as leis de César, quanto mais violentas são as perseguições, maior número de criaturas aderem à Nova Revelação que o Cristo havia prometido para a época oportuna -- o Espiritismo.

            Quando Deus quer, reverendos ...


quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Estatística Católica

 


Estatística Católica

por I. Pequeno (Antônio Wantuil)  Reformador (FEB) Outubro 1946

             A Voz de S. Antônio, jornal católico editado em Petrópolis, em seu número de Setembro p, passado, sob o título – “Não te impressiona?”, na primeira coluna da primeira página, insere um artigo assinado por Mons. Ascânio Brandão.

            Nesse artigo, queixa-se o reverendo de que “a nossa imprensa católica está hoje inferior em número à imprensa protestante e espírita. A imprensa católica perde cada dia em número e eficiência.”

            Ora, diante de outras declarações do clero, asseverando que a população brasileira é inteiramente católica, e diante da declaração que no referido artigo nos faz o reverendo, informando-nos de que a imprensa católica alcançou, na, estatística por eles realizada, apenas a 26%, cabendo os outros 74% aos “inimigos” da Igreja, chegaremos à conclusão de que os católicos brasileiros só o são para fins estatísticos, censitários, em cujas fichas foram arrojados como católicos todos os analfabetos que não sabiam preencher a ficha censitária e todos quantos não querem perder as boas graças da Igreja, enquanto ela recebe o prestígio indireto do meio oficial.

            O artigo do Monsenhor é, pois, a confissão de que entre a população que sabe ler, no Brasil, o Catolicismo só conta com 26% dos brasileiros, ou, talvez, menos, porque muita gente há que assina os jornais católicos, com receio de serem tachados de inimigos da “poderosa” Igreja.        

            Os próprios católicos sabem que a Igreja vive, há perto de um século, do oxigênio oficial.

            Seus templos de pedra já não são mais construídos com o trabalho e o esforço da fé, são no com as contribuições governamentais. Os próprios católicos, como vimos ultimamente em todos os grandes jornais de orientação católica (O Globo, Jornal do Brasil, etc.) protestaram contra o ato governamental que mandou presentear a Igreja com um terreno, na Praça Paris, do valor superior a cinquenta milhões de cruzeiros.

            Como veem, não somos nós, os espíritas, que protestamos; são os seus próprios adeptos, certamente cansados de verificar o mau emprego das quantias arrecadadas pelo Fisco, cada vez mais exigente no aumento dos impostos.

            Ruy Barbosa previu tudo isso, quando registrou em “O Papa e o Concílio” a sua opinião de que uma igreja que necessitasse do amparo governamental era uma igreja que caminhava para a falência.

            Quanto a nós, os espíritas do Brasil e do mundo, desejamos que a Igreja Católica se volte novamente para o Cristo, imitando lhe os exemplos e a simplicidade do Cristianismo inicial.

            Só assim poderá ela alcançar maior percentagem, na estatística da Cristandade que sabe ler.


terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Dogmas e mais dogmas

 

Dogmas e mais dogmas

por I. Pequeno (Antonio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Novembro 1946

             Enquanto os nossos irmãos protestantes não aceitam sequer a virgindade de Maria, os católicos dia a dia procuram conduzir aquele Espírito a uma categoria mais elevada. Depois de a apresentarem como mãe de Deus e de a subdividirem em tantas nossas-senhoras, quantas sejam necessárias aos interesses da Igreja, sob os mais extravagantes nomes, procuram agora convencer-nos, baseados numa lenda, de que Maria subiu aos Céus. tal qual Jesus, com o mesmo corpo apresentado entre nós.

            Referindo-se a esse culto prestado a Maria, em que a colocam em superioridade ao próprio Deus, por ser a genitora de uma das suas pessoas, disseram-nos os Espíritos que esse culto já ultrapassa ao que a Igreja rende ao próprio Cristo (Roustaing, IV-221); assim, diante dessa tendência do clero para deificar a Virgem, como Já o fizeram com Jesus, julgamos necessário transcrever o que disseram os Espíritos, quanto à posição espiritual de Maria, extraindo alguns trechos da 3ª edição da obra “Revelação da Revelação”:

                         - Maria era Espírito perfeito quando encarnou em missão: Perfeito, relativamente a nós, ao nosso planeta; não o era, porém, com relação aos mundos superiores. Espírito superior, de mui elevada hierarquia espírita, com relação a nós, não tinha ascendido ainda à perfeição sideral. (I-330).

                         - Após uma encarnação fluídica num planeta mais adiantado que a Terra, encarnação sofrida como consequência de pequenina falta, retornou aquele Espírito o caminho simples e reto do progresso e até hoje o trilha, pois que ainda não chegou ao cume, à perfeição sideral. (I-333).

                         - Conquanto não se ache ainda na categoria dos Espíritos puros, suas atuais encarnações estão de tal forma acima de nossas inteligências, que não podemos fazer ideia do que sejam. Sabemos, porém, que Maria é um Espírito inferior, muito inferior a Jesus. (I-331).

                         - O Senhor estava com Maria, mulher entre todas bendita, por ser, entre todas, Espírito muito puro no desempenho de uma missão na Terra. (I-369).

                         - Recomendando João a Maria e esta àquele, Jesus deu o testemunho da sua solicitude pelos encarnados e homenageou os sentimentos que devem animar os filhos com relação aos pais, sentimentos que devem ligar a grande família humana. (IV-498).

             Como vemos, apesar do muito respeito e da muita estima que nos merece o elevado Espírito de Maria, ao qual temos recorrido muitas vezes, não podemos concordar com os dogmas da Igreja, dogmas que tendem a fazer da Virgem o que já fizeram com o Cristo, deificando-a igualmente.

            Os espíritas também dirigimos preces a Maria, como o fazemos igualmente aos nossos guias e protetores; porém, entre a nossa veneração à Virgem e a outros grandes Espíritos e a divinização que lhe quer dar a Igreja, vai um infinito, um abismo quase igual ao que existe entre a criatura e o Criador, ou entre um planeta e o Universo.

            Se assim continuarem, dentro de mais alguns séculos já não mais terão a Trindade, visto que se tornará necessário criar um novo termo, no qual possam incluir as atuais três pessoas e mais o Espírito de Maria e talvez mesmo o de João Batista.

            Até lá, porém, o mundo já estará recristianizado. Os Espíritos já terão levado a verdade a todos os cantos da Terra, e os dogmas já não impressionarão a coletividade.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Confissões

Confissões - a

I. Pequeno (Antônio Wantuil)

Reformador (FEB) Fevereiro 1946

            Em continuação às transcrições que vimos fazendo de trechos do livro – ‘Deus’ - da autoria do Rev. Padre Huberto Rohden:

             “Dentro em breve estará encerrada a minha peregrinação terrestre - e eu aguardo, tranquilo, quase ansioso, esse termo final de uma longa jornada - tão longa e tão fugaz... Que novas maravilhas me revelará essa metamorfose, esse cair do pano, essa grande alvorada?...

            Partirei daqui para mundos ignotos, mundos de que tanto falei e escrevi, mundos por que tanto trabalhei e sofri, mundos que muitos dos meus ex-ouvintes e ex-leitores já conhecem de vista, e que eu anseio por conhecer também...”

            “Queriam alguns homens que eu mesclasse de elementos humanos, incertos, as tuas revelações divinas, infalíveis... Queriam que eu fizesse do teu Evangelho bandeira de interesses subalternos e chave para tesouros profanos ...

            “Mas, o teu reino não é deste mundo, e o teu Evangelho é por demais espiritual para não ser desespiritualizado pelo contato com as nossas materialidades cotidianas... Preferi sofrer a incompreensão e hostilidade de muitos a ser infiel a teu espírito e à minha consciência - e estou satisfeito com o que fiz.”

            “Sei que castigas o mal e premias o bem - mas não sei porque sofrem inocentes e exultam culpados,..

            “Sei que grandes crimes merecem grande punição - mas porque punem para sempre um verme da Terra? ...

            “Que glória ou prazer te podem dar os gemidos de Espíritos infelizes?”

            “Se sabes e desde sempre sabias que tantas almas não atingiriam seu destino feliz - porque não as deixaste na noite benéfica do não-ser?..porque chamaste ao luminoso dia da existência esses convidados à noite eterna?..

            “Disseram-me que havias criado milhares e miríades de seres incorpóreos dotados de grande poder, inteligência e beleza, destinados a serem felizes em tua companhia, mas que muitos desses seres se haviam revoltado contra ti e que tu os havias punido com penas eternas.

            "Cheio de pasmo e estupor ouvi deste primeiro fracasso do teu poder, da tua sabedoria e bondade - e fiquei desnorteado.”

            “Não sei como definir esse indefinível quê, esse misterioso algo que infundiste à matéria do teu universo”. Vejo que a matéria evolve, que progride, que procura subir de perfeição em perfeição, ela, que não possui propriamente espírito, nem alma, nem inteligência, nem vontade...”

            “Cheguei a compreender também que o teu céu não é algum lugar longínquo para onde deva a alma viajar após a sua separação do corpo - mas que o teu céu é um estado espiritual dessa mesma alma liberta, uma atitude moral, uma atmosfera divina criada dentro da alma na vida presente e revelada na vida futura ...”

            “No dia, Senhor, em que os homens inventaram que eras “pessoa”, começou a grande decadência...

            “Decadência, não tua, porque tu és eternamente forte, juvenil, indefectível; mas a grande decadência da tua divindade no conceito dos homens.

            “Modelaram-te os homens à sua imagem e semelhança, personalizando-te. Chegaram mesmo ao ponto de atribuir-te personalidade tríplice - e com isto correram enorme cortina de fumaça por diante de tua divina natureza."

            “Tu castigarás esse homem “injusto” ou “desajustado”?

            “Não, ele mesmo se castigará, porque toda culpa, quando não devidamente cancelada, leva no seio o germe da pena.”

            De acordo com o desejo dos nossos leitores, continuaremos no próximo número de ‘Reformador’ a transcrever as gotas filosóficas do Autor.

Confissões -b

I. Pequeno (Antônio Wantuil)   

Reformador (FEB) Março 1946

             Conforme prometemos, seguem mais alguns trechos do livro – ‘Deus‘- obra publicada em 1945 pelo Revmo. Sr. Padre Huberto Rohden:

             “Quem arremete com o crânio contra uma muralha de granito ofende mais a si mesmo do que ao granito.”

            “Muitos chegam ao ponto de se sentirem como que dispensados de serem bons pelo fato de serem abundantemente “religiosos”.

            “Não, não posso crer, meu Deus, que tu sejas tão cruel e insensato que crias um ser destinado a ser infeliz, que chames à existência era a uma humanidade fadada a perecer longe de ti, em terra estranha, faminta, no meio de animais imundos...”

            “Que Deus tão pouco divino serias tu se, no fim dos tempos, o teu adversário saísse mais vitorioso que tu? Se levasse consigo a maior parte da tua humanidade?”

            “O teu céu e o teu inferno não são lugares, no sentido comum do termo, são estados da alma, atitudes do espírito, perspectivas retas ou falsas do Eu.”

            “Estou no teu céu, no teu inferno quando estas coisas, divinas ou anti divinas, estiverem dentro de mim, em estado latente, agora - em estado manifesto no mundo futuro.”

            “O reino de Deus e o reino de Satã estão dentro do homem. E, aonde quer que o homem vá, leva consigo o seu céu ou o seu inferno.”

            “A vida, ao menos a do nosso planeta, é tua mortal inimiga, minha doce Caridade. Não penses que eu seja pessimista. Não o sou, como também não sou otimista - sou apenas sincero e desassombrado realista. E a realidade, aqui em nosso planeta, é esta: a vida que guerreia sem tréguas, é filha primogênita da excelsa divindade.”

            “Querem os homens fazer da religião uma tal ou qual magia ritual, um complexo de fórmulas cabalísticas - quando o teu Messias lhes disse que os teus cultores deviam cultuar-te no santuário da verdade e da justiça, no templo da sinceridade e da pureza, na ara (alta) da bondade e da caridade universal."

            “Todos eles desejariam ser amigos teus e discípulos do teu Cristo se encontrassem o Cristo genuíno e integral - não o Cristo envolto em mortalhas e sudários fúnebres, mas o Cristo vivo, Rei imortal dos século...

            “Todos eles, fartos de religião sobre Jesus, anseiam pela religião de Jesus."

            “Desde que fizemos as pazes e somos amigos, ó morte, compreendi que certas coisas que os homens tomam por miragem e fatamorganas (miragem que se deve a uma inversão térmica) são mais reais que todas as supostas realidades dos homens.”

            “Tu és, possivelmente, o único ser que não me queira mal pelo que disse. As tuas criaturas, mesmo as que vivem com o teu nome à flor dos lábios e com os teus símbolos nas vestes, me considerarão, talvez, irreverente, blasfemo, herege, ateu, herege, ateus, luciferino, porque algumas das coisas que eu disse de ti são grandes demais para caberem nos estreitos moldes da nossa humana filosofia. Entretanto, basta-me saber que tu me conheces e pões na balança o sincero amor que te consagro, no meio de todas essas noites da inteligência.” 

            Na impossibilidade de continuarmos com essas transcrições, porque acabaríamos por transcrever todo o livro do notável e erudito sacerdote, aqui ficamos seguros de que agradáveis foram para os nossos leitores essas pequenas pérolas que extraímos de tão magnífica obra filosófica.


domingo, 17 de janeiro de 2021

Confissões

 

                                                                      
Confissões

I. Pequeno (Antônio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Janeiro 1946

             Diante do grande número de cartas que recebemos, pedindo-nos transcrever mais alguns trechos do livro - ‘Deus’ - da autoria do revmo Padre Huberto Rohden, atualmente professor de uma universidade católica mantida pelos jesuítas na América do Norte, abaixo satisfazemos o desejo dos nossos leitores:

             “Por ora, é o dogma e a liturgia que dominam nas religiões e igrejas - dia virá em que a ética e a mística proclamarão o seu reinado dentro do homem e da sociedade. Prevalecerá o simbolizado sobre o símbolo, esse símbolo que, por ora, escraviza e quase que elimina o simbolizado.”

             “Os símbolos desunem, geram antagonismos, organizam sanguinolentas cruzadas de “fiéis” contra “infiéis”, acendem autos-de-fé para queimar “hereges”; fulminam anátemas e excomunhões contra os dissidentes da ortodoxia oficial - tudo isto é efeito natural e inevitável da prepotência dos símbolos divergentes, tudo isto é inerente à imperfeita e imatura espiritualidade humana, tudo isto é a vitória do símbolo sobre o simbolizado. Mas, quando despontar a grande alvorada espiritual, a maturidade espiritual do gênero humano; quando o simbolizado prevalecer plenamente sobre os símbolos, então convergirão todas as linhas divergentes da grande pirâmide para um e o mesmo vértice.”

             “Não estatuiu o Nazareno como alma do seu Evangelho a verdade, mas, sim, a  caridade - porque esta une, e aquela desune. A verdade, embora una em si, é vária nos homens que a contemplam. O homem não enxerga a verdade, só enxerga verdades - e cada uma dessas verdades tem a cor e o feitio de quem as contempla. A caridade, porém, é neutra, incolor, universal, essencialmente panorâmica e impessoal."

             “O que o chamado ateu nega é o deus da sua filosofia e do seu ambiente religioso. Esse deus cruel, mesquinho, vingativo, fraco, antropomorfo, choroso, amargurado, sem sorte nas suas obras, derrotado por seu inimigo, como inúmeras vezes aparece nas páginas da nossa literatura religiosa - esse deus não pode, naturalmente, ser afirmado nem amado por um sincero cultor da divindade, porque esse deus nem existe no mundo real, senão na imaginação doentia dos seus infelizes autores... E bom é que não exista, esse pseudo-deus.  Se existisse, devia todo homem sincero ser ateu...

             Aí têm os nossos amigos mais alguns conceitos filosóficos do famoso padre jesuíta. Lamentamos que o pouco espaço de que dispomos não nos permita fazer mais algumas transcrições.


sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Preocupações religiosas

                 

Preocupações religiosas

I. Pequeno (Antônio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Julho 1944

             Três são as religiões que atualmente contam com o maior número de adeptos no Brasil o Catolicismo, em que todos os socorros espirituais são tabelados, variando o preço conforme o aparato da cerimônia; o Protestantismo, no qual os mesmos socorros são mais ou menos gratuitos, porque os pastores só percebem ordenados mensais; e o Espiritismo, única religião do mundo em que o médium nada percebe, sob qualquer forma, visto que todos vivem de atividades outras que não a religiosa, da qual ainda tiram meios para oferecer socorro material aos que apelam para a sua interferência espiritual.

                       Essa verdade é conhecida hoje em todos os meios sociais do País. Se algum indivíduo, que se diz espírita, cobra qualquer preço pelo seu trabalho espiritual, todos sabem que tal criatura tanto tem de espírita como aqueles que, de quando em vez, são agarrados pela polícia, vestidos de padres, apesar de jamais terem pertencido ao quadro do clero. Uns e outros não são espíritas ou católicos. São, simplesmente, exploradores da credulidade do povo.

             No entanto, apesar de o Espiritismo ser a única religião que segue o preceito evangélico do “dai de graça o que de graça recebestes”, o reverendo padre Luis Salamero, C. M. F., em sua revista católica, publicou um longo artigo sob o título “A constância confirmada dos truques do espiritismo”, no qual, defendendo naturalmente a não diminuição das suas rendas, escreve os seguintes trechos:

             “... (os espíritas) se valem de uma suposta aparição ou revelação dos espíritos para ganhar dinheiro.”

            “... os médiuns fazer evocações ou chamadas por dinheiro.”

            “... e nunca faltam alguns incautos para dar o grude aos espertos evocadores.”

             O artigo do reverendo está repleto de termos da gíria. Assim, antes de o analisarmos, devemos informar os nossos leitores de que grude, para o reverendo, e ali pela Favela, quer dizer - dinheiro.

            Vê-se claramente, pelos trechos acima citados e por todo o resto da descompostura do reverendo, que a sua maior preocupação é o desvio do dinheiro, até então canalizado para o seu e para o bolso dos seus colegas.

            Lamentamos, de fato, que assim venha sucedendo. O padre Salamero não tem outra profissão e os seus paroquianos já lhe não oferecem o suficiente para a continuação da vida confortável que sempre tiveram os “representantes” d’Aquele que surgiu num estábulo e não possuía um lugar onde recostar a cabeça.

            A culpa não é nossa, reverendo, e o senhor está perdendo tempo e errando o alvo. O dinheiro que lhe foge das mãos não está conosco.

            Procure-os entre os órfãos, velhos e viúvas que socorremos ou entre aqueles que se dizem católicos e empregam as suas sobras em deleites pessoais.

            Como preocupação religiosa, reverendo, não lhe fica bem essa preocupação monetária. As ameaças do seu artigo, suplício eterno, fogo eterno e todas as outras, não mais produzem efeito. Os próprios católicos já não têm medo dessas tranquibernices (trapaças). É necessário, reverendo, mudar o disco da vitrola.             

            Se o rev . Luis Salamero, C. M. F., acredita realmente em Jesus, e, se deseja segui-lo, peço-lhe aceite o maior de todos os conselhos: leia os Evangelhos, mas faça-o com o espírito, sem essa execrável preocupação “religiosa” de pensar no bolso...


quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Dogmas e mais dogmas

 


Dogmas e mais dogmas

por I. Pequeno (Antônio WantuilReformador (FEB) Novembro 1944

             Enquanto os nossos irmãos protestantes não aceitam sequer a virgindade de Maria, os católicos dia a dia procuram conduzir aquele Espírito a uma categoria mais elevada. Depois de a apresentarem como mãe de Deus e de a subdividirem em tantas nossas-senhoras, quantas sejam necessárias aos interesses da Igreja, sob os mais extravagantes nomes, procuram agora convencer-nos, baseados numa lenda, de que Maria subiu aos Céus, tal qual Jesus, com o mesmo corpo apresentado entre nós.

             Referindo-se a esse culto prestado a Maria, em que a colocam em superioridade ao próprio Deus, por ser a genitora de uma das suas pessoas, disseram-nos os Espíritos que esse culto já ultrapassa ao que a Igreja rende ao próprio Cristo (Roustaing, IV-221); assim, diante dessa tendência do clero para deificar a Virgem, como já o fizeram com Jesus, julgamos necessário transcrever o que disseram os Espíritos, quanto à posição espiritual de Maria extraindo alguns trechos da 3ª edição da obra “Revelação da Revelação”:

             - Maria era Espírito perfeito quando encarnou em missão. Perfeito, relativamente a nós, ao nosso planeta; não o era, porém, com relação aos mundos superiores. Espírito superior, de mui elevada hierarquia espírita, com relação a nós, não tinha ascendido ainda à perfeição sideral. (I-330).  

            - Após uma encarnação fluídica num planeta mais adiantado que a Terra, encarnação sofrida como consequência de pequenina falta, retomou aquele Espírito o caminho simples e reto do progresso e até hoje o trilha, pois que ainda não chegou ao cume, à perfeição sideral. (I-333).

            - Conquanto não se ache ainda na categoria dos Espíritos puros, suas atuais encarnações estão de tal forma acima de nossas inteligências, que não podemos fazer ideia do que sejam. Sabemos, porém, que Maria é um Espírito inferior, muito inferior a Jesus. (I-333).

            - O Senhor estava com Maria, mulher entre todas bendita, por ser, entre todas, Espírito muito puro no desempenho de uma missão na Terra. (I-369).

            - Recomendando João a Maria e esta àquele, Jesus deu o testemunho da sua solicitude pelos encarnados e homenageou os sentimentos que devem animar os filhos com relação aos pais, sentimentos que devem ligar a grande família humana, (IV-498).

             Como vemos, apesar do muito respeito e da muita estima que nos merece o elevado Espírito de Maria, ao qual temos recorrido muitas vezes, não podemos concordar com os dogmas da Igreja, dogmas que tendem a fazer da Virgem o que já fizeram com o Cristo, deificando-a igualmente.

            Os espíritas também dirigimos preces a Maria, como o fazemos igualmente aos nossos guias e protetores; porém, entre a nossa veneração à Virgem e a outros grandes Espíritos c a divinização que lhe quer dar a Igreja, vai um infinito, um abismo quase igual ao que existe entre a criatura e o Criador, ou entre um planeta e o Universo.       

            Se assim continuarem, dentro de mais alguns séculos já não mais terão a Trindade, visto que se tornará necessário criar um novo termo, no qual possam incluir as atuais três pessoas e mais o Espírito de Maria e talvez mesmo o de João Batista.

            Até lá, porém, o mundo já estará recristianizado. Os Espíritos já terão levado a verdade a todos os cantos da Terra, e os dogmas já não impressionarão a coletividade.

 


sábado, 28 de maio de 2011

Carta a um Papa




Carta a um Papa


 I. Pequeno (Antonio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB)  págs. 113/114 ano 1946
               
                Transcrevemos abaixo alguns trechos da carta que o grande doutor da Igreja, S. Bernardo, dirigiu ao papa Eugênio, no começo do século XVII, carta mais tarde publicada com o título - De Consideratione - (Tratado de Consideração), traduzida para o francês pelo Sr. Buchon e por este publicada no seu livro - Seleção de Obras Místicas: Páginas  345 e 346 - Livro II - capítulo VI:
           
            “Pode-se, é certo, fazer bom uso do poder e do dinheiro, santíssimo padre. Podereis, sem dúvida, encontrar algum pretexto para granjear um e outro. Mas não podereis tirar do apóstolo o vosso direito, pois o apóstolo não vos pode haver dado o que não tinha. Ele vos deu o que tinha, isto é, a solicitude em cuidar de todas as Igrejas, porém não a dominação, visto que diz em termos formais: “Não pretenderemos ter dominação sobre o clero, porquanto fomos instituído para ser o modelo do rebanho.” (I Pedro 5,3). - E, para que não suponhais que isto haja ele dito mais por humildade do que por verdade, a voz do Senhor se faz ouvir assim no Evangelho: “Os reis das nações as tratam com império e seus governadores tiram delas benefícios; não seja assim entre vós.” (Lucas 22,25). - Donde manifestadamente se vê que a dominação é defesa aos apóstolos. Tende então, agora a coragem de juntar a dominação ao apostolado. Aí está, parece-me, uma associação que vos é defesa. Portanto, se quiserdes possuir simultaneamente as duas coisas, ambas vos serão arrebatadas...”
            Páginas 366 e 367 - Livro IV - capítulos 2 e 3, de Buchon:
            “Passemos a outras coisas. Pretenso pastor, andais coberto de ouro e todo rebrilhante de soberbos ornamentos. Que bem resulta daí para as vossas ovelhas? Se eu ousasse, dir-vos-ia que com tudo isso dais pasto aos demônios, não às vossas ovelhas. Tratava-as dessa maneira São Pedro? E São Paulo zombava assim dos fiéis?” Vemos agora todo o zelo da Cristandade aplicado unicamente em exalçar a dignidade dos seus chefes: dá-se tudo às honrarias e ao fausto, nada ou quase nada, à virtude... Permiti, pois, que eu não vos poupe, a fim de que vos poupe Deus. É preciso que desaproveis tudo isso, se não quiserdes ser desaprovado por aquele cujo lugar ocupais: quero dizer - São Pedro, a quem nunca ninguém viu carregado de pedrarias, nem vestido de seda, nem coberto de ouro, nem transportado sobre uma hacanéia branca, nem cercado de soldados, nem acompanhado de uma multidão de oficiais... Em tudo isto, sois antes sucessor de Constantino, de que sucessor de S. Pedro.
            Falarei inutilmente, mas falarei livremente. Porque inutilmente? porque os grandes da Igreja porão o máximo cuidado em não me ouvir!
            Os pontífices de outrora uma só coisa sabiam: dar tudo o que tinham e dar-se a si mesmos... todo o proveito que cogitavam de tirar dos que se submetiam à doutrina santa consistia em acharem meios de dispor dos povos a servir a Deus perfeitamente. Era no que trabalhavam de todas as maneiras, muitas vezes com o coração despedaçado e o corpo em sofrimento, ‘com fome e sede, mal vestidos sob o frio’, como diz S. Paulo. Mas, onde está agora essa moda antiga? Veio outra, algum tanto diferente, não é? As práticas do presente não são inteiramente as do passado. Confesso que o cuidado, a inquietação, o zelo, a solicitude ainda se fazem perceptíveis; mas, se não diminuíram, recaem sobre outros objetos. Sim, posso dar testemunho de que agora ninguém se poupa ao trabalho mais do que antigamente: o emprego do trabalho, o objetivo é que se tornaram menos admiráveis. Vedes, papa Eugênio, todos esses olhos postos sobre vós? Que é o que observam? Serão os vossos ensinos? Não! Olham as vossas mãos, e não sem motivo, pois que agora são as mãos que fazem todos os negócios do papado. Mostrai-me, peço-vos, em toda a vossa cidade, alguém que vos haja reconhecido por papa, sem a intervenção ou a esperança de alguma soma de dinheiro. E esses protestos, que vos fazem todos os prelados romanos, do seu devotamento ao vosso serviço, tem outro fim que não seja obter autoridade para prejudicar? Peço acrediteis que conheço bem o gênio e a maneira de agir desta nação. Hábeis para o mal, incapazes para o bem; odiosos ao Céu e à Terra por terem posto mãos sacrílegas sobre uma e outro; sem piedade real para com Deus, exploradores das coisas santas; rixentos e invejosos uns dos outros, hostis aos forasteiros; querendo que toda gente trema  diante deles; infiéis aos seus superiores e insuportáveis aos seus inferiores; importunos, desvergonhados até obterem de vós o que desejam; ingratos, desde que o tenham obtido; ninguém os pode amar, porque eles a ninguém amam... Como vedes, sei qual é a vossa camarilha: os incrédulos e os destruidores formam a vossa companhia; sois guardador oficial de lobos e não de ovelhas. Convertei-os, peço-vos, para que não vos pervertam.
            Mas como transformá-los?
            Confesso que até o presente esse povo pareceu extremamente endurecido e indomável. Estais, porém, certo de que eles são absolutamente indomáveis? Se têm uma frente dura, endurecei a vossa ainda mais do que a deles; não há nada tão duro que não ceda ao que é mais. Se tendes procedido assim, sem nada conseguir, ainda vos resta fazer uma coisa: Deixai a morada dos Caldeus! é o que vos clama o profeta. Persuado-me de que não vos arrependereis do vosso banimento, tomando por vossa habitação a terra inteira, em vez de uma cidade apenas! - Livro IV, capítulo III, tradução de Buchon, pág. 363)
            Porém, não! Volto ao meu primeiro ponto: a vós mesmo é que deveis imputar o que fazem aqueles que vos cercam, pois eles nenhum outro poder tem, senão o poder que lhes destes, ou que os deixaste tomar. 
Corre-vos por isso o dever de compordes a vossa comitiva, chamando para tão importantes funções , não esses jovens, mas os velhos verdadeiros Anciãos do Povo, a exemplo de Moisés: velhos, quero dizer: pela sabedoria e pela virtude, mais do que pelos anos, e não apanhados unicamente ao vosso derredor, mas buscados em todas as partes do mundo, porquanto, afinal, em todas as partes do mundo devem ser escolhidas aqueles que hão de julgar das coisas que interessam ao mundo inteiro... A não ser assim, os últimos tempos porão a nu o mal interior que os primeiros tempos haviam ocultado... Muito vos enganais, com efeito, se credes que a vossa autoridade apostólica promanou de Deus para ser única, não apenas soberana.
            “Toda pessoa”, diz o Livro Sagrado, “deve ser submissa às potências superiores”. Não diz: “à potência suprema”, como se fosse uma única; mas; “às potências superiores”, como sendo muitas. O vosso poder, pois, não é o único instituído por Deus; há outros menores, inferiores, que também o são. Faríeis um monstro se, destacando um dedo da mão, o ligásseis à cabeça. O mesmo se dará com esse corpo, que é a Igreja de Jesus Cristo, se colocardes os seus membros de modo diverso do em que Ele os dispôs; visto que, afinal, não imagino cometais o erro de crer que não foi Jesus Cristo quem estabeleceu na Igreja, como diz São Paulo, uns para serem apóstolos, outros para serem profetas, outros evangelistas, doutores e pastores outros, trabalharem no criar santos e em construir o corpo da Igreja... Oh! infeliz esposa de Jesus Cristo, que te achas presentemente confiada a condutores que não se envergonham de guardar para si exclusivamente o que, segundo a ordem determinada por Deus, reverteria a Igreja inteira!”
(Livro III, capítulo V, págs. 362, 364/2).