" A Reencarnação- estudo sobre as vidas sucessivas."
por Aurélio A. Valente
Editora: Moderna - Ano: 1946
Biblioteca Espírita Brasileira
"Não vos admireis do que vos digo:
é preciso nascer de novo."
Jesus em João Cap. 3, vv. 1\15
“Nascer, viver,
morrer, renascer ainda; progredir sempre, tal é a lei.”
Allan Kardec
“Este
livro é uma afirmação incontestável da influência e assistência dos espíritos
sobre nós. Algum tempo depois de terminarmos a assistência dos espíritos sobre
nós. Algum tempo depois de terminarmos “Sessões Práticas e Doutrinárias do
Espiritismo”, tivemos desejo de escrever este livro. Ocorrências diversas
impediram-nos de trabalhar imediatamente, mas, para não perder tempo, íamos
colhendo fatos, concatenando ideias, armazenando tudo na memória apenas, como
um homem pobre, que vai adquirindo conforme as suas posses, areia, tijolos,
telhas, cimento, ferro, para construção de uma casa, para depois pensar nos
operários.
Um dia, os obreiros do Senhor advertiram que a hora do serviço era
chegada. Iniciamos a nossa tarefa em fevereiro e em abril estava terminada.
Vezes havia que quinze, vinte e mais folhas eram escritas de uma vez, sem que
houvesse tempo de grafar convenientemente cada palavra. Deste modo, leitor
amigo, o que houver de bom é proveniente dos bons espíritos, mensageiros de
Jesus, o que tiver de falho é nosso.
Esses amigos do Alto são ainda aqueles, bem o sentimos, que
carinhosamente, nos encaminharam na senda da Verdade, em Belém do Pará, no
jamais esquecido “Grupo dos Filhos Pródigos”. A eles, portanto, manifestamos a
nossa imorredoura gratidão, e aos velhos companheiros que naquela cidade ainda
mourejam (vivem), o nosso abraço saudoso e fraterno.Rio,
Fevereiro-Abril, 1944 A. A. V.
Introdução
Fracassaram, lamentavelmente, as doutrinas religiosas, filosóficas e
políticas no objetivo de fraternizarem os homens. As lutas mais cruentas se
desenrolam; as cidades que suportavam sítios de meses e anos debaixo do fogo da
artilharia, arrasam-se em horas sob os bombardeios aéreos; no mar, os tranquilos
e confiantes passageiros mudaram o rumo da sua viagem, para o fundo das águas,
obrigados pela guerra mais desumana e covarde dos submarinos. Tem-se a
impressão que a inteligência do homem está possuída pela volúpia de descobrir
os segredos da natureza, para usá-los como meios de destruição dos infelizes.
A
miséria e o egoísmo sob todos os prismas dominam a humanidade. Cada um cuida
exclusivamente de si, esperando o momento oportuno para obter algo, com ou sem
direito. Não lhe preocupa se os meios são lícitos, se alguém fica prejudicado,
pois, primeiro a sua posição e os seus proventos, segundo os seus caprichos e
paixões, terceiro ainda os seus gozos, o seu estômago insaciável, e para os
outros... nada.
As
minorias audazes e inescrupulosas em numerosos países dominam prepotentes,
porque as massas ignaras (incultas) não têm sentimento de solidariedade.
Por toda parte, as corporações mais numerosas, as instituições mais
respeitáveis têm as suas leis e regulamentos violados, sem que uma só voz de
protesto se faça ouvir. Todos sentem-se prejudicados, entretanto, ninguém
reclama porque teme descontentar os superiores e, assim, a subserviência
tornou-se um culto consagrado.
De
dia para dia, cresce o número de assassínios, suicídios, roubos, estelionatos,
seduções, desmoronamento de lares, em consequência de vidas de ostentação, de
luxo desmedido, de frequência de cassinos onde campeiam os vícios elegantes.
Os medíocres, à custa de sindicatos de
elogios mútuos, aparecem no cenário mundano como capacidades extraordinárias e
insubstituíveis, mas aqueles que conhecem os bastidores sorriem de escárnio da
nudez sórdida desses personagens de ópera bufa. E tudo isso acontece porque aqueles, que mais quiseram
sufocar o materialismo, foram justamente os que mais contribuíram para dar-lhe
vida e vigor. A humanidade tornou-se materialista por completo. Desapareceu a
verdadeira espiritualidade.
O
romanismo com o seu cortejo de pompas deslumbrantes, rastejante e acomodatício
para viver bem em todos os climas, a ciência orgulhosa, encastelada na
fortaleza dos seus princípios teóricos e dogmáticos, tais são os culpados da
situação atual da humanidade.
Triste, bem triste, véspera de trágica, podemos assim dizer, é a posição
daqueles que tem os destinos dos povos nas mãos. Eles são acusados dos nossos
sofrimentos, das nossas misérias, dos fracassos de certas doutrinas, quando
tudo isso não passa de fatal consequência de erros acumulados durante séculos
por gerações ignorantes, imprevidentes e fúteis. “Cada povo tem o governo que
merece” – disse um célebre estadista do século passado, e assim é. Como poderá
pois queixar-se dos seus dirigentes quem não coopera ativa e honestamente para
o cumprimento da lei? Em geral, os que mais reclamam, que protestam mais alto,
que falam em patriotismo, sabedoria, probidade, são justamente os mendigos da
moral, de luz e de caráter. Em vez de fazer cada um por si para auxiliar os
poderes públicos, pois do esforço individual de todos é que se forma a
coletividade ansiosa de conhecimento e moralidade, cada qual só tem vistas para
o argueiro do olho do seu semelhante,
Sofremos todos as consequências da nossa própria semeadura, e da dos
nossos antepassados. Tínhamos que chegar ao ponto a que chegamos porque até
agora só cuidávamos da matéria em detrimento do espírito. Quando líamos no
Evangelho de Jesus a sua advertência de que não ficaria pedra sobre pedra,
meditávamos e perguntávamos a nós mesmos como poderia ser isso se a
consolidação do solo terráqueo havia afastado de há muito a possibilidade de
terremotos em certos lugares? E como resposta temos as cidades seculares
reduzidas a escombros, a cinzas fumegantes, pagando o pesado tributo de
iniquidades de seus habitantes de outrora e atuais.
O
“princípio do fim” está se processando. Ouvimos falar de guerra, de fome, de
miséria, de epidemia, tremores de terra.
Aqueles que não tem guerra em seu território, ne por isso deixam de
sentir os seus efeitos e tormentos de toda espécie, pois não haverá um só povo
que não experimente a influência da transição de uma civilização decrépita para
outra mais nova, idealista, espiritual que viverá numa era de luz e de verdade.
Cada povo terá que pagar na razão direta dos seus feitos, e não vemos
nenhum que esteja isento de culpas, que não tenha manchas de sangue na sua
história.
Ainda criança, ouvimos a vovozinha com aquela meiguice de segunda mãe
pedir aos netinhos que nunca jogassem comida fora, mesmo que fosse um pedacinho
de pão, porque isso faria falta aos pobres filhos de Deus. E contava, pata
ilustrar, casos de pessoas ricas reduzidas imprevistamente à miséria, porque
atiraram restos de comida ao lixo, negando-os até aos próprios cães.
Muitos anos depois, vários exemplos encontramos na nossa peregrinação
terrena, que vieram aumentar o número das histórias verdadeiras da vovozinha.
Em
certa cidade de grande vulto comercial, à porta de um hotel luxuoso,
encontramos um homem em tal estado de pobreza física e moral, que era capaz de
comover o coração mais endurecido. Quando ele se retirou, um empregado do
hotel, aproximou-se e contou-nos a vida do desgraçado. Fora o melhor cozinheiro
da zona e estava empregado no referido hotel. Anos antes, quando o dinheiro
corria a granel, ele desdenhava das pequenas gorjetas e, todas as notas de
cinco e dez mil réis atirava ao fogão dizendo: “para que me serve esta
miséria?” Adoeceu inesperadamente e foi para um hospital, onde ficou muito mal,
durante mais de dois anos, tendo esgotado todos os recursos. Ainda enfermo teve
que deixar a casa de saúde e agora vive esmolando. Em outra cidade encontramos
um pobre homem que havia sido riquíssimo fazendeiro, o qual acendia charutos
finos com cédulas de quinhentos mil réis, sob as vistas assustadas dos matutos,
para mostra que seu dinheiro era tanto que não fazia caso dele.
Se isso acontece com os indivíduos, por que não acontecerá com as
coletividades culpadas da aplicação de loucos princípios de economia política
na destruição de produtos que dariam para mitigar a fome de milhares de
necessitados? As coletividades responderão inexoravelmente pela cumplicidade
nesse crime, porém, maior será a responsabilidade dos idealizadores dessas
medidas e todos os interessados nos lucros. Aguarde, pois, cada um a sua parte,
pois Jesus disse: “a cada um será dado de acordo com as suas obras”.
E porque fracassaram religiões, ciência, política? As religiões,
principalmente o romanismo, porque a casta clerical de todos os credos, em
todas as épocas sempre foi exclusivista e exploradora da ignorância e boa fé do
povo. Essa casta parasita teme perder o seu prestígio, o seu fausto, o domínio,
e por isso entrava todo o progresso e persegue os inovadores e libertadores.
Foi o clero quem crucificou Jesus – quem forçou Sócrates a beber cicuta
– quem queimou Joana d’Arc – Giordano Bruno – Jerônimo de Praga, esquartejou
Hypatia em Alexandria, foi ele ainda quem queimou a fogo lento Miguel Serveto.
Foi ele o criador da Inquisição, quem sacrificou inúmeras vítimas na célebre
noite de São Bartolomeu, quem exterminou os Albigenses, quem fomentou guerras
de toda espécie. Entretanto, por ironia da Justiça, que terrível irrisão! O
Tribunal da Inquisição não condenou ninguém por assassínio, roubo, adultério,
incesto, violações. Para o clero só havia um crime: heresia – isto é, não
aceitar, mesmo em sonhos, um só ensinamento que não fosse imposto por ele;
bastava uma só dúvida, uma vacilação. Admitia-se delações de pais contra
filhos, de filhos contra pais, e os testemunhos das rameiras eram de maior
valor que os dos homens mais respeitáveis. Os denunciados nunca chegavam a
saber quem os tinha acusado.
Os mártires tudo sofreram porque queriam um Deus grandioso, Bom,
Misericordioso, adorado e, Espírito e Verdade, sem a intromissão de castas
intermediárias e parasitas. Jesus disse que ninguém iria ao Pai sem ser por seu
intermédio, assim, não temos necessidade de quem se jacta de ser seu
procurador, visto como todos nós não passamos de “sepulcros caiados de branco”.
“Os méritos dos apóstolos de modo algum poderia ser automaticamente
transferidos aos sacerdotes degenerados pelos interesses políticos e
financeiros de determinados grupos terrestres, depreendendo-se daí que a igreja
romana, a que mais tem abusado desses conceitos, mais uma vez desviou o sentido
sagrado da lição do Cristo.
Importa, porém, lembramos, neste particular, a promessa de Jesus de que
estaria sempre entre aqueles que se reunissem sinceramente em seu nome”. Estas
palavras encontramos no admirável livro “O Consolador”, ditado a Francisco
Cândido Xavier por Emmanuel, pág. 155.
A ciência, orgulhosa das suas conquistas, não quer
aceitar nada que contrarie os seus conhecimentos. Os “doutos” esquecem que W.
Harvey muito sofreu quando afirmou que o sangue corria em nossas veias, Pasteur
foi ridicularizado com os micróbios, Erlich, Paracelso, Bacon, Galvani, Fulton,
todos, enfim, que tiveram a coragem moral de apresentar coisas até então
desconhecidas. O caso do fonógrafo apresentado na Academia de França pelo
emissário de Edison, não causa somente riso, mas revolta. O homem sábio é
humilde e simples, tudo deseja examinar e para ele não existe a palavra
“impossível”, mas o seu número é bem pequeno; maior é o dos “sabichões”,
pretenciosos, orgulhosos a tal extremo que se aproximam dos limites da estupidez.
O seu lema é: “não creio, não é possível, é contrário a todas as leis
conhecidas, logo não é verdade.
A
política, que é a arte de governar os povos, fracassou, porque ela sempre foi o
reflexo da religião e da ciência da sua época.
Não poderia fazer melhor com homens tão descrentes e interesseiros,
quanto néscios e pedantes.
Todavia, Deus, o nosso Pai de Infinita Misericórdia; que enviou há dois
mil anos o Seu Filho bem Amado – Jesus -, em Sua Onisciência, achou que havia
chegado o momento propício para enviar-nos o “Consolador” prometido -, essa
legião de espíritos mensageiros do Bem, sob a luminosa direção do Espírito de
Verdade.
Esses habitantes do Além espalharam-se então, desde o meado do século
passado, por toda a Terra, para despertar na humanidade indiferente, sofredora
e egoísta, o amor a Deus, ao próximo, o desejo de progresso, de sabedoria, de
solidariedade e fraternidade.
Eles vieram dizer-nos que erem as almas das pessoas que haviam estado
neste mundo, dando vida a corpos de homens como nós e que eram felizes ou
desventurados conforme as suas obras, que o paraíso celeste não era mansão de
beatitudes místicas e improdutivas, nem o inferno lugar de penas eternas, pois
a qualquer criminoso era dado ensejo paro resgate de culpas e acolhimento na
casa do Pai Celestial, de acordo com a sublime parábola do Filho Pródigo.
Assim, o céu e o inferno deixaram de ser utopias para transformarem-se em
verdades mais consentâneas com a Bondade e Misericórdia Infinitos de Deus.
Eles vieram afirmar-nos de maneira insofismável a sua existência,
forçando-nos a não lhes chamar de “mortos”, visto que estão vivos quanto
nós.
Na
infância, quantas vezes ouvimos em certas casas, ao sair um enterro, parentes e
amigos despedirem-se do cadáver com esta angustiosa frase: “nunca mais”, e
apesar da nossa inexperiência, essas palavras não foram esquecidas até a
juventude, quando a luz do Espiritismo iluminou a nossa inteligência.
Frequentemente, triste, meditávamos na “morte”, o aniquilamento completo do
homem que levava para o túmulo as suas ilusões, o seu patrimônio de sabedoria e
probidade, o anseio de ser bom e também um rosário de misérias.
E
hoje, o Consolador, o Espírito de Verdade, fez as lágrimas secarem, as dores
suavizarem, trazendo-nos a Esperança para lançar sobre os sofredores do corpo e
da alma, o seu manto de consolação. Os semblantes tristonhos transmudaram-se em
fisionomias alegres, confiantes na luz que irradia da Doutrina de Jesus, que
sempre foi para a humanidade o Pão, o Caminho e a Luz.
Os
Espíritos do Senhor continuam a sua faina de estimular o nosso desejo de
redenção. Eles agem de todas as formas despertando a nossa atenção por meio de
fenômenos, da dor e do amor.
Mas... que tristeza atrás, como no tempo de Jesus, quando lhe pediam
para produzir milagres uns após outros para convencer os fariseus, os
desconfiados, os céticos duvidam da sinceridade das pessoas mais respeitáveis e
desinteressadas de mundanismo e pedem também fenômenos e mais fenômenos.
Os
espíritos advertem-nos constantemente que o valor da Doutrina Espírita não tem
alicerces nos fenômenos, mas na consequência dos seus ensinamentos, que
transformam o homem mal e viciado, no homem bom e regenerado. Apesar disso, insistem sempre: desejamos
fenômenos, queremos ver. Entretanto, se ao menos tivessem a sinceridade de Tomé
que viu e acreditou, ainda seria perdoável, mas infelizmente as suas vistas
curtas e inteligência medíocre, o orgulho de um falso saber e a vaidade, não
favorecem a compreensão de coisa alguma. Esses presumidos são aqueles de que
nos falou Jesus, que tem olhos e não querem ver, tem ouvidos e não querem
ouvir.
Um
dos mandamentos do código na Maçonaria, a Sublime Ordem, cuja admirável
filosofia é puramente cristã pela identidade dos ensinamentos, ao ponto de
apresentar Jesus como o símbolo do maçon perfeito, grau trinta e três, impõe a
todo iniciado o dever de transmitir aos homens aquilo que houver apreendido, a
fim de contribuir para expurgar do mundo os três grandes flagelos da
humanidade: a ignorância, o fanatismo e a hipocrisia.
Eis a
razão deste livro. Consideramos a nossa maior felicidade o batismo de luz da
Doutrina Espírita nos primeiros anos da nossa juventude, e por isso temos
tomado parte ativa, desde essa época, na propaganda do Espiritismo, porque
desejamos partilhar com os nossos semelhantes a fortuna espiritual que Jesus já
nos proporcionou.
O
Espiritismo dominará o mundo porque fala a tríplice linguagem do coração e do
espírito. É amor – é inteligência, é partícula divina.
A
Doutrina Espírita não tem dogmas, se por tal entendemos postulados idênticos
aos da igreja romana, impostos mesmo sem compreensão, ainda que absurdos.
Entretanto, se considerarmos dogmas como pontos fundamentais de uma religião,
firmados pela lógica, diremos que o Espiritismo tem três, sem os quais ele não
existe: Deus, Alma – Reencarnação. Deus
é a causa primária de todas as coisas, disseram em síntese os espíritos a Allan
Kardec. Deus é infinitamente Bom, Justo e Misericordioso, reúne em si todas as
perfeições imagináveis pelo homem. Onde houver falha não pode ser obra divina.
Deus
é a única incógnita para a qual o Espiritismo não procura solução. Para os seus
adeptos basta acreditar na sua existência, respeitá-lo, venerá-lo cumprindo
rigorosamente as suas sábias e imutáveis leis. Se Ele é infinito como poderemos
compreende-lo? Como poderá o finito compreender o infinito? Que
ele existe não há dúvida alguma. Por um princípio filosófico nós sabemos que
“todo efeito tem uma causa e todo efeito é da mesma natureza da causa”- logo,
um efeito inteligente é gerado por uma causa inteligente. Só uma força
sumamente inteligente seria capaz de criar e dirigir a mecânica celeste, onde
milhares de mundo de todos os tamanhos movimentam-se sem haver colisão,
obedecendo a uma lei. Aqueles que estudam a natureza descobrem em suas leis uma
sabedoria incalculável. Poderá o nada formar o nada? Uma força cega formar alguma coisa bela e
perfeita?
Chame-se a essa força – Deus – Alá – Grande Todo – Desconhecido – Grande
Arquiteto do Universo -, o fato é que sentimos a sua existência e somos
beneficiados pela sua Bondade.
Não
podemos olhar para uma coisa sem termos logo a ideia do seu autor. Este livro é
o atestado da existência de quem o escreveu. O leitor poderá não o conhecer.
Não sabe se é magro ou gordo, jovem ou velho, jovial ou circunspecto, mas sabe
que ele existe. E que são para nós os reinos mineral, vegetal, animal e
hominal, senão obras admiráveis de beleza e perfeição de alguma força poderosa
e Onisciente? Deus – a quem convencionamos chamar Pai – para fazer brotar em
nossos corações o respeito e um meigo sentimento de amor. Ele está em toda a
parte, integrado em tudo, como bem o entendeu o mavioso vate português Guerra
Junqueiro, quando disse:
..”Deus, o Deus em que acredito,
“Essa luz que alumia essa noite – o infinito,
“Esse eflúvio d’amor que em tudo anda disperso,
“Cabe com todo o seu vastíssimo esplendor
“Num olhar de criança ou num cálix de flor.”
Alma –
eis o segundo dogma do Espiritismo. Ela anima todos os seres muito embora a
nossa inteligência pouco evoluída não tenha da sua essência uma exata
compreensão. “Atração no mineral, sensação no vegetal, instinto no animal,
razão no homem, divindade no anjo” – eis a alma, assim disse Emmanuel no
maravilhoso e instrutivo livro “O Consolador”.
O
Espírito não é, como julgam os nossos contraditores, uma abstração. É alguma
coisa que tem vida própria limitada por um corpo de matéria quintessenciada que
lhe dá forma, ao qual chamamos “perispírito”. A eletricidade também é alguma
coisa. Embora indefinida, ninguém contesta a sua existência, devido às
múltiplas aplicações na vida da humanidade.
O
magnetismo também já é admitido por numerosos sábios, apesar de também não
conhecerem a sua essência.
A
criação da alma e a sua evolução, até alcançar a humanidade, não serão objeto
do nosso estudo pela sua transcendência. Vamos apenas tentar a explicação,
simples e intuitiva aos humildes, da trajetória da alma na terra e no além, no
escopo de alcançar a perfeição relativa, justificar a razão da diversidade de
dons intelectuais e morais, alegrias e sofrimentos, riqueza e pobreza, posições
altas e baixas, vidas curtas e longas, problemas até hoje sem solução para
todas as doutrinas conhecidas.
A
alma tem por toda parte liberdade de ação, a qual está na razão direta da sua
evolução harmônica de saber e de amor, como para nós está a infância, a
juventude e a maturidade. A criança goza de uma liberdade restritiva, o moço de
forma relativa e o adulto de modo amplo. Este age como bem entende e lhe apraz,
de acordo com a sua vontade, pois as leis humanas, por mais rigorosas que sejam,
não tiram da mão do assassino a arma homicida, nem fazem parar à porta do lar
honesto o miserável Don Juan.
Deus, o Nosso Pai de Infinita Misericórdia, favoreceu-nos com uma lei
sábia que nos permite a conquista de tudo quanto é preciso para a nossa
evolução – a Reencarnação. Submissos a essa lei, nascemos, morremos, tornamos a
nascer tantas vezes quantas sejam necessárias para alcançar a nossa perfeição.
“Nascer, morrer, tornar a nascer, progredir sempre, tal é a lei”, foi a
frase com que Allan Kardec definiu a Reencarnação.
O ensino da lei da Reencarnação é o meio mais seguro para forçar o homem
à meditação sobre a Justiça Divina, à regeneração e ao progresso tal é a moral
e intelectual. O conhecimento dessa lei por toda a humanidade revolucionará o
mundo, porque os homens ficarão sabendo que não há predestinados para a
felicidade, nem réprobos, que todos nós sofremos as consequências dos nossos
atos, que não há falta sem punição, nem prejuízos sem reparo, pois Jesus
avisou-nos que não entraríamos na casa do Pai sem havermos pago o último
ceitil. Somente a divulgação da lei da Reencarnação facilitará a implantação no
mundo, das doutrinas que nos parecem utopias, facultando-nos uma vida de
Liberdade, Igualdade e Fraternidade, tão sonhada pelos homens de boa vontade e
desejada pelos espíritos mensageiros do Bem, que nos exortam continuamente a
termos por lema de vida o lábaro “Trabalho, Tolerância, Solidariedade”.
A
Reencarnação é o objetivo do nosso estudo. Procuremos aplica-la por todos os
meios ao nosso alcance, apresentando sempre fatos que justifiquem a nossa
dialética. Allan Kardec, Leon Denis e
outros escritores espíritas dedicaram capítulos inteiros ao estudo da lei da
reencarnação, tendo Gabriel Delanne publicado um livro exclusivamente sobre o
assunto, e outro que se relaciona com o mesmo: “A Evolução anímica”, mas, a
profundeza da sua exposição, a sua argumentação rica para os cérebros
esclarecidos, talvez não tenham iluminado suficientemente o entendimento dos
humildes, por isso, de há tempos vimos alimentando o desejo de escrever também
algo, com a mesma simplicidade com que apresentamos o nosso livrinho “Sessões
Práticas e Doutrinárias do Espiritismo”, sob a orientação dos nossos amados
guias.
Desejamos sinceramente que a “Reencarnação” tenha a mais vasta
aceitação, pois só assim a humanidade tornar-se-á melhor. O perdão de Deus será
compreendido de uma forma mais racional. Deus não cobre com o mesmo manto de
piedade um passado de erros e crimes de toda espécie., equiparando os maus
arrependidos aos bons perseverantes. Os arrependimentos originados pela dor e
não pelo desgosto de haver cometido o crime levariam os culpados mais perversos
e cínicos a serem nivelados, no paraíso, às almas simples, que sempre aceitaram
com humildade as leis do Senhor. O
perdão divino consiste nos meios de resgate de todo mal, proporcionando àqueles
que se arrependem e querem expiar e reparar todo mal produzido. O homem pobre de hoje é o mal rico de vida
anterior; o trabalhador honesto e infatigável, que sofre injustiças, é o mesmo
que anos antes, talvez no mesmo lugar, explorava miseravelmente os que estavam
sob as suas ordens; o idiota, que causa riso e dó ao mesmo tempo, é a encarnação
do sábio que fez mal uso das suas faculdades intelectuais; o surdo-mudo foi em
vida passada o fomentador de discórdias e lutas sangrentas.
Tudo
isso procuraremos demonstrar e, confiantes na assistência dos nossos guias, é
que empreendemos esta árdua tarefa.
O
conhecimento da lei da Reencarnação mudará a face do mundo, pois os homens
ficarão sabendo que praticando sempre o bem, nove sobre dez serão as
probabilidades de uma vida ulterior melhor. Se hoje trabalhamos para ter uma
velhice confortável e feliz, porque deixaremos de preocupar-nos com a próxima
vida, sabendo que ela será boa ou má, conforme o nosso esforço presente?
A vida
de hoje é uma consequência das existências anteriores, como a de amanhã – a
futura – será um reflexo da que estamos vivendo. Pratiquemos, pois, a maior
quantidade de bem que nos for possível, pois o Espiritismo, ampliando o panorama
da Fraternidade, ensina também que não sofremos apenas pelos males que fizemos,
mas também pelo bem que deixamos de fazer. Resignemo-nos com a nossa dor sem
deixarmos que o desalento se apodere de nossa alma, porque resignação não
significa abatimento, desolação, mas simplesmente conformação humilde com a
pena imposta pela Providência Divina, e o anseio de libertação do erro para a
felicidade celestial.
Quando moramos próximo de um rio sujeito a inundações, que tudo arrasta,
o nosso apego ao mundo faz-nos lutar para arrancar das águas aquilo que ela
pode carregar e, passada a tormenta, nós tratamos de reconstituir tudo,
aproveitando a experiência para o futuro, assim, pois, temos o dever de fazer
tudo que estiver ao nosso alcance em benefício do espírito, porque ele é que é
imortal e não o corpo.
Olhemos com mais amor para o nosso irmão e pratiquemos o sentimento da
solidariedade que nos dá forças para defesa comum.