Pesquisar este blog

Mostrando postagens com marcador Anchieta. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Anchieta. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

04 / 04 Anchieta



04/04
 José de Anchieta
1553 – 13 de Julho – 1953

por Almerindo Martins de Castro


inReformador’ (FEB) Agosto 1953

            Em 1578, o provincial da Companhia o levou, por insistência, à Bahia, centro mor da Ordem, onde alguns padre ciosos das boas aparências e do prestígio social que o Colégio dali conseguira, em evidência e brilho, não podiam acolher com agrado aquela figura minúscula e desgraciosa, com a sua batina poída.

            O padre que o recebeu, ao olhá-lo, pensou: Que irá fazer esse camarada aqui ? Anchieta, mediunicamente, ouviu o pensamento do outro, e, abraçando-o, a rir, respondeu: "Você tem  razão, meu irmão; de que valho eu, com esta cara e este corpo?”

            Foi nomeado reitor, mas o Colégio apelou para o tipo desfavorável do escolhido, e Anchieta, ue não desejava postos de comando, rumou  para a Ilha de Itaparica, na função de simples missionário. O provincial, porém, não se conformou, e ordenou-lhe regressasse à Capital, e, em presença toda a Comunidade, Ihe transferiu os poderes de provincial, ficando assim sob a autoridade do humilde e grandioso corcunda, a jurisdição da Ordem dos Jesuítas no Brasil, desde Olinda (Pernambuco) ao Tietê (S. Paulo).

            E não houve administração mais séria, nem de maior valor, isso até 1585, quando a saúde não lhe permitiu atender às obrigações de tão espinhoso cargo, e regressou ao Rio de Janeiro,    de – fundador de onde foi mandado repousar na aldeia de Reritiba, no Espírito Santo. Mas, ainda assim, trabalhou, ensinando e escrevendo, e dali mais uma vez o tiraram, em grande estado de debilidade, para regressar à Vila, onde, o superior dizia necessitar dos seus conselhos e labores. E não podiam os contemporâneos prescindir de, tal colaboração.

            Os feitos da sua mediunidade, em todos os sentidos, em chamados milagres, davam-lhe fama em qualquer dos pontos onde podiam chegar, notícias da sua personalidade, e os próprios índios, mesmo os que não o conheciam, nem haviam assistido aos seus prodígios, tinham por grande respeito e consideravam-no enviado do céu, um pajé - como chamavam os profetas,  profetas da tribo - mas superior a estes - ,o pajé maior - que os dos índios não eram capazes de realizar ou predizer.

            Essa admiração e quase culto, essa influência dominadora de almas, aliada ao efeito da palavra evangelizadora e aos encantos das cerimônias rituais, tiveram grande fundamento na austeridade casta de José de Anchieta, apanágio da sua mediunidade altíssima. Era do uso nas tribos o pajé oferecer aos hóspedes ilustres as  mais formosas donzelas, às  vezes, as próprias filhas. E Anchieta sempre as recusou, explicando que a sua missão ali era mostrar os poderes de Deus, sem se fundir em: gozos, deixando, por isso, pasmos os selvícolas, que não podiam compreender essa força espiritual que galvanizava a natureza animal que vive em cada criatura humana.

            E tinham razão; porque, ainda hoje; fora do conhecimento seguro das forças espirituais, é difícil compreender que um homem, no vigor, pleno da sua mocidade, rodeado de grosseiras  cenas excitantes, de amores clandestinos, até por parte de padres, enfrentando mulheres todas nuas, atuado pelo ambiente tropical da terra, resistisse; impávido, inacessível a pensamentos materialões, conservando sempre a fronte mergulhada nas fronteiras da espiritualidade.

            Mas, a afanosa existência nem sempre lhe foi de serenidades espirituais, porque as lutas entre as tribos rivais, não raro equipadas e dirigidas por estrangeiros, que pretendiam o domínio colonial exercido pelos Portugueses, muito e muito o angustiavam além da escravidão dos índios, largamente praticada, com acréscimo de torturas e dizimação. E isso porque a sua insondável piedade também fulgia para os sofredores, e o testemunho ele nos legou, ao fundar humilde abrigo para enfermos, o qual com o decurso do tempo, se transformou no que hoje se chama -- Santa Casa da Misericórdia, onde uma estátua lhe perpetua a memória de - fundador.

            A sua abnegação ao serviço da paz e da fraternidade dos selvícolas o levou muitas, vezes a intermediar entendimentos no sentido de extinguir as rivalidades, os ódios pueris, as intrigas insidiosas que faziam dos índios – todos Brasileiros - inimigos mútuos e permanentes.

            Dessas verdadeiras missões devia ficar perpetuada na memória do futuro a que exerceu na ilha de, Iperoig, onde ficou, sozinho, na qualidade de refém, em garantia de pazes, de cuja sinceridade e conclusão os índios duvidavam. Foi então que, sobrepondo o seu Espírito aos perigos, inclusive ,ameaça de morte que lhe fizeram, eclodiu em lavas de luz o vulcão de primores do seu gênio, que ainda não tivera chegado tempo de entrar em erupção

            Passeando nas desertas praias, começou a compor esse monumento de poesia religiosa, que dedicou à Virgem Maria - De Beata Virgine  - constituído de 5.700 versos. Sem papel, nem tinta, nem elemento que lhe permitisse escrever, ele, o excelso médium, para esculpir Indeléveis na memória, com auxílio de uma haste traçava os versos na areia da praia, e assim os fixava na prodigiosa retentiva mental, até que,' restituído  à convivência do seu cubículo, os pudesse legar definitivos à posteridade.

            Assombra, atoniza, a extensão erudita desse Espírito. Exilou-se adolescente da Europa; viveu, até encanecer, num rude labor nas selvas; separou-se das bibliotecas e das leituras; mas., o seu estupendo poema, que é a vida de Maria e do Cristo, evocando a Bíblia, revela profundo e seguro conhecimento dos clássicos religiosos e dos monumentos poéticos de então, inclusive Ovídio, e Virgílio, sem esquecer, delicadíssimas composições poéticas que escreveu, em castelhano, reveladoras do seu engenho literário embora ungido do quase exclusivismo religioso.

            No grande firmamento da vida Brasileira, José de Anchieta foi uma aurora boreal do pensamento, polarizando os átomos luminosos da divindade, para iluminar, na madrugada da nova Pátria, a treva espiritual daqueles índios inscientes da Verdade.

            Ele construiu, ao término da jornada, a grande escadaria, subindo e argamassando, um a um, os degraus da ascese, para, do cimo, contemplar a estrada percorrida. E a incoercível poeira destruidora, que os séculos acumulam sobre os monumentos do passado, soterrou a lembrança e os feitos desse grande e nobre taumaturgo, até que, escavando os lençóis de esquecimento estratificados sobre a memória dos verdadeiros fundadores do Brasil civilizado, possível for avistar, no ápice em que adormeceram esses alicerçadores, a sombra imortal desse médium ímpar, que, dando ao chão Brasileiro apenas o frágil corpo, legou à História Pátria  os testemunhos de que Deus mandou ao solo dos Guaranis um emissário para gravar  nas almas dos primitivos filhos desta terra a trilogia do seu futuro: DeusPátriaFamília.


03 / 04 Anchieta



03/04
 José de Anchieta
1553 – 13 de Julho – 1953

por Almerindo Martins de Castro

inReformador’ (FEB) Agosto 1953


            Mediunidade curativa - Desse dom, os casos enchem - centenas de páginas, entre os quais dois ou três são testemunho do traço inconfundível que o Cristo estabeleceu para credencial dos seus Mensageiros.

            Numa leva de índios, trazidos da selva para Reritiba pelo padre Diogo. Fernandes, um deles era aleijado de nascença, de modo que só podia locomover-se engatinhando, à maneira de quadrúpede. José de Anchieta foi recebê-los, conforme costumava, e lhes falou, na linguagem deles; dizendo da alegria de trazê-los para o conhecimento de Deus, Mas, notou que entre todos, de pé, um havia de cócoras, e a isso se referiu. Os bugres riram, e explicaram a deformidade do companheiro. Anchieta, condoído daquele pobre ente, que, de rastos, andara centos de léguas, em ásperas sendas, chamou-o a si, e, estendendo-lhe o seu bordão, disse: "Anda de pé, direito, porque Deus quer teus olhos para o céu, homem que és e não voltados chão, iguais aos dos Bichos."

            O índio, arrimando-se ao cajado, e depois sem ele, ficou ereto, e andou, e correu feito gamo pelo campo fora.'  

            Num dia de S. João, em aldeia desse nome, entre outras recreações oferecidas durante as
festividades de arraial, havia uma de uso época: corrida ao pato, disputada por destros cavaleiros . Mas, no apanhar afinal a ave, surgiu dúvida entre dois concorrentes, e Anchieta, presente ali, foi solicitado para dar decisão, na qualidade de juiz da contenda. Chamou ele um menino, - mudo – conhecido de todos nessa condição. A surpresa foi geral, principalmente quando Anchieta disse ao menor, criança de 5 de idade e mudo de nascença, que pronunciasse a sentença, porque seria respeitada. E então o pasmo se tornou maior, pois o infante falou:

            ‘O pato é meu, a mim se há de dar, para que o leve à minha mãe.” E foi para casa, sob aplausos, levando o palmípede, e a voz que Deus lhe dera por intervenção do grande médium.

            Uma senhora estava embaraçada. havia quinze dias, sem poder dar a luz um filho, e, já em perigo de morte, por isso que a Medicina, desde remotos 4 séculos estava ausente. Recorreram a José de Anchieta, que, com os passes  das suas mãos puras sobre o ventre da mulher, fez nascer a criança.

            A crônica do tempo registrou centenas de curas relevantes, dos mais variados matizes e  circunstâncias, que atestavam o grande poder espiritual do médium taumaturgo, citando os nomes dos beneficiados, com, indicação da residência.

            Levitação – Este raro dom mediúnico José de Anchieta o possuía em notável extensão. Bastava concentrar-se nas suas orações de fervor e efeitos admiráveis, para que o corpo se levitasse, sendo necessário, algumas vezes, despertá-lo, nem sempre facilmente.  De uma vez, esse fenômeno se operou em plena missa, e a ele assistiram, com o natural espanto, todos os presentes. Em outra ocasião, José de Anchieta foi visto levitado em seu cubículo, à noite, estando o pequeno recinto iluminado com a luz irradiada de Espíritos.

            Transporte ubíquo - Mais rara, ainda é a faculdade transportar-se o médium e tornar-se visível, com o duplo materializado, em local diferente daquele onde está seu corpo,  Inúmeras vezes foi avistado simultaneamente em S. Vicente e em S. Paulo, segundo testemunhos de leigos e sacerdotes, e em outros sítios, para acudir a necessitados de socorro espiritual. Registrou-se mesmo o sensacional caso de haver celebrado, na mesma hora de uma noite de Natal, missa em S. Vicente e em Santos.

            Efeitos físicos - Da série imensa de maravilhas de toda espécie que produziu, José de Anchieta se agrandou naquelas que mais de perto o aproximam de Jesus, confirmando sempre aquela promessa solene de que os verdadeiros seguidores fariam as mesmas e maiores coisas do que o Mestre Divino.

            Pelas serranias aspérrimas de Paranapiacaba, rumo de S. Paulo, viajavam, a pé, Anchieta e mais cinco seculares. Na matalotagem levavam um moringue cheio de vinho que, por esmola, Anchieta recebera de um devoto, Nicolau Grilo, Durou três dias a viagem, e durante ela, bebiam do vinho, ao jantar e à ceia. E, quando o moringue esvaziava, Anchieta mandava enchê-lo com água e esta em vinho se transformava, cada vez melhor , Era o mesmo milagre das bodas do Caná, quando Jesus, num festim de matrimônio, mudou água em vinho. (João, cap. II, 3-10).

            Na casa dos padres, em Santos, José de Anchieta, já consagrado sacerdote, tendo terminado a sua missa de Natal, outro padre quis celebrar também; mas, o sacristão avisou ter acabado o vinho próprio. Anchieta, que, era então o então o Superior da Casa, ouviu isso, e disse: “Ide irmão, e trazei o vinho que está na botija." O outro, porém, respondeu que havia escorropichado a vasilha, e verificara não restar mais nada. "Ide, e achareis vinho", insistiu Anchieta. O sacristão obedeceu, e voltou, quase sem poder falar, do espanto, trazendo a botija bem cheia de vinho.

             Jesus multiplicou pão e peixes; Anchieta multiplicou azeite.

            Certa vez, no Colégio da Ordem, em São Vicente, e bem assim em toda a Capitania, houve falta de azeite. O Irmão-despenseiro  comunicou que o respectivo barril para consumo da Casa estava esgotado, isso, porque o Colégio supria as Casas subordinadas, a Igreja, e o pobres.

            Disse Anchieta: "Irmão, nas necessidades, não deixeis de acudir ao vosso barril, porque Deus é Pai, e fará que não falte azeite," Replicou o despenseiro tê-lo erguido sobre o torno e verificado estar seco, podendo ser usado para outro fim até. "Fazei, irmão, o que vos tenho dito", recomendou de novo Anchieta. O outro acatou a determinação, e, em todas as ocasiões, o barril deixava escorrer um fio de azeite suficiente para a necessidade do movimento.

            E isso se prolongou por 24 meses que foi o tempo decorrido para que chegasse de Portugal novo suprimento do precioso óleo.

            Achava-se José de Anchieta na Igreja da Conceição, em Itanhaém, e ouviu dos mordomos queixa de não haver azeite para iluminar a imagem no altar. Disse: "Irmãos, façam mais diligência, e talvez encontrem azeite." Responderam haverem virado a respectiva botija de boca para baixo, e dela não mais saía coisa alguma. Replicou, cheio de fé: "Não tomem por demasiado trabalho verificar mais uma vez, e quiçá encontrem azeite." Foram à botija, .e - oh! maravilha! - acharam azeite, e, apregoado o prodígio, de toda a parte acudiu gente para adquirir o milagroso óleo, com o intuito de usá-Io feito remédio para curar enfermidade.

            À vibração fluídica da sua voz obedeciam coisas e animais,  inexplicavelmente para os embasbacados assistentes desses insólitos fenômenos, quase incríveis, provindos que eram de um homem mirrado, meio disforme, paupérrimo, andrajoso, humilde, cujas mãos, se escreviam erudições, também se chafurdavam no amassar do barro e se calejavam na ajuda das construções que os da sua Ordem erguiam para os serviços religiosos e para instalação e abrigo dos índios cristianizados.

             Pássaros e aves pousavam-lhe nos ombros, nos braços, acompanhavam-no inequívocas demonstrações da influência fluídica, exercida sobre eles; mas, quando as testemunhas desse privilégio espiritual lhe. atribuíam isso à santidade personalíssima, Anchieta respondia, sempre humílimo: "Lembrai-vos de que os pássaros e as aves também pousam em monturos e imundícies.”

            Tal humildade, porém; não alterava o quase culto que lhe era tributado, tendo em conta as maravilhas que realizava, à vista de todos, e ainda as do dom de dupla vista, pois via, a distância revelando o local onde estavam coisas consideradas perdidas, e referindo acontecimentos que estariam ocorrendo bem longe dos seus olhos materiais. Mais ainda: em ocasiões prementes, transportava para junto. de si objetos que, por circunstâncias várias, eram. necessários, Indispensáveis no momento.

            Por isso, a deformidade do corpo, a pobreza extrema da sua aparência venciam os óbices
preconceitualistas das convenções sociais. Mem de Sá, Governador expedido pelo trono Português, lhe ouviu e acatou as informações e conselhos, e Estácio de Sá, Capitão-mor, escolhido. pela rainha D. Catarina para combater contra os que pretendiam assenhorear-se do Rio de Janeiro, teve Anchieta a seu lado, e, nos momentos da peleja, enquanto Estácio de Sá falava, em português, à sua gente, José de Anchieta, com a linguagem dos guaranis, eletrizava a alma dos índios, seus queridos filhos espirituais,
           
            E ainda por esse fulgor do seu Espírito, ao lado de todas as figuras de projeção nos pródromos do Brasil, foi o co-fundador da hoje opulenta capital de S. Paulo e da nossa bela Cidade Maravilhosa.
           
            Quando vencidos pelo valor da sua obra - cada dia mais e mais engrandecida pelos chamados milagres - e pelos tesouros do seu saber, os maiorais da Ordem quiseram elevá-Io a postos de mando, não faltou quem - moderadamente, é certo - chamasse a atenção para a chocante antítese da poderosa Companhia de Jesus apresentar, no cargo de chefe providencial, um homem de aspecto quase ridículo, de batina remendada e pés totalmente calosos.

            Mas, a seu tempo, José de Anchieta devia galgar esses postos supremos, tornando-se a principal figura da Ordem dos Jesuítas no Brasil.








quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

02 / 04 Anchieta


02/04
 José de Anchieta
1553 – 13 de Julho – 1953

por Almerindo Martins de Castro
inReformador’ (FEB) Agosto 1953


            Quanto ao domínio do Espírito sobre a fragilidade do corpo: Em começo de 1595, quando as forças  já se lhe esgotavam rapidamente, à distância de vinte e poucos meses do túmulo, partiu para repousar na sua predileta aldeia de Reritiba (Iriritiba, hoje Anchieta). Saindo da casas do Espírito Santo  (hoje Estado desse nome), aquiesceu com os padres dali  em ser conduzido em rede. aos ombros de 4 índios, por ser esse o veículo de transporte naquele tempo. Mas, logo ao sair da então vila, lembrando-se de que a rede servia de esquife para os mortos, e parecendo-lhe que o levavam a enterrar vivo, desceu para o chão e andou a pé, deixando para trás os mais velozes dos seus condutores, confirmando mais uma vez o nome que os indígenas lhe haviam dado – caraibebe – homem de asas.

            O traço impressionante da mediunidade de Anchieta foi a ininterrupta manifestação em todos os setores, como se estivesse em permanente contato com o mundo dos Espíritos, captando ou recebendo a notícia, a revelação dos fatos, das coisas que a mente comum não pode saber ou adivinhar. Era o milagre do Céu passeando pela Terra.

            Profecia ou Premonição – Muitas e muitas vezes, transitando na rua,  ouvia prantos e lamentos. Entrava na casa de onde provinham e chegando junto do enfermo, tido por desenganado, ou quase agonizante, acalmava a desolação, afirmando que o doente teria cura, ou, então, exercendo a mediunidade curativa, o fazia erguer-se do leito, liberto do mal.

            Mas, essas profecias ou premonições se estendiam a circunstâncias de maior vulto e mais  distantes. Sobem a muitas dezenas tais vaticínios.

            Estavam de saída, da então vila de Santos, dois navios que se destinavam a aprisionar e fazer cativos índios, no chamado porto dos Patos, Indígenas que viviam em paz e amizade com os padres e os portugueses. José de Anchieta estava no púlpito, na sua pregação prognosticou que os barcos afundariam com os inumanos tripulantes. E assim foi, salvando-se apenas dois homens, que vieram,  contritos, confessar depois o arrependimento por não haverem aceitado a advertência de Anchieta.

            Com o mesmo intuito, Manuel Veloso de Espinha preparava-se - secretamente - para rumar ao dito porto, e por esse motivo não se animava a despedir-se de Anchieta, de quem era amigo. 

            Mas, este, mediunicamente, apreendeu a intenção de Manuel Veloso, e foi procurá-lo, dizendo-lhe:  "Sr. amigo, não convém fazer a viagem que andais traçando, porque não há de ter bom êxito.”

            Sentiu-se o cobiçoso ver-se descoberto; mas, comprometido nos aprestos e trabalhado pela ambição dos lucros, partiu às escondidas. A potente força mediúnica de Anchieta foi encontrar a bordo o cego amigo, e lhe provocou um sono súbito e o fez entressonhar com uma temerosa récua de Espíritos infernais; que se atiravam a ele, pretendendo arrastá-lo a ígneos tormentos. Despertando apavorado, quis regressar, sem embargo de todas as ponderações quanto ao absurdo de anular a viagem e aos prejuízos subsequentes. Mas, o aterrorizado homem abriu   mão de tudo quanto empregara no barco, para que o reconduzissem a praia firme. Tentados pelo valor do que lhes era deixado, concordaram os tripulantes, e, depois de desembarcar o Manuel Veloso, prosseguiram a viagem, e - .para sempre - porque do navio nunca mais houve notícia.   

            Essas premonições, numerosíssimas aliás, eram infalíveis em Anchieta.

            A muitas mulheres aflitas; que não tinham notícias do esposo, ausente a negócios ou em  expedições  perigosas da época, Anchieta segurança de regresso, quase sempre marcando dia e local em que o ausente devia voltar.

            A Frutuoso da Costa, de S. Paulo, e bem assim a muitos outros, em ocasiões diferentes, avisou para que não empreendesse viagem para Santos, pois seria morto. O prevenido desprezou profecia, e foi efetivamente assassinado, e com crueldade.

            E a premonição em Anchieta era verdadeiramente mediúnica, porque abrangia acontecimentos impossíveis de apreender por outra fonte.  
           
            Antônio de Saavedra, muito dedicado a José de Anchieta, pretendia seguir de Santos para o Paraguai, e foi por isso despedir-se. Anchieta desaprovou a viagem, aconselhando o amigo a permanecer e mesmo constituir família ali.  Saavedra, conformou-se mas disse que, a casar-se só aceitaria uma das filhas de Jorge Moreira.  "Assim será, disse Anchieta, de haverdes desposado Beatriz Gonçalves, porque esta morrerá, e só então casareis com uma filha de Jorge Moreira, não com a que tiver mais idade, e sim com a mais jovem."
           
            Tudo se confirmou, a seu tempo: houve os casamentos previstos no vaticínio de Anchieta, sendo que o navio, da pretendida viagem de Saavedra ao Paraguai, naufragou. A esse mesmo amigo salvou a vida, por mais quatro vezes: duas, impedindo, de viajar para a Bahia, pois as embarcações foram a pique; a terceira, evitando que o vitimassem numa aventura pecaminosa; a quarta, livrando-o de ser morto pelos cunhados, quando Saavedra se dirigia para o jogo da bola, sendo que coroou o grande bem, e conciliando os parentes com o amigo.

            Mas, o cimo de desdobramento da sua potência espiritual se comprova talvez com o fato de haver ele tido conhecimento mediúnico da desastrada peleja de Alcácer-Quibir, onde pereceu D. Sebastião, o rei de Portugal, isso: na própria data de 4 de Agosto de 1578.

            Essa força indefinível que os grandes médiuns exercitam nos passes, na fluidificação da água, no alivio e cura dos males, na materialização de coisas, e em outras demonstrações dos poderes do Espírito, José de Anchieta a possuía em grau que o tornou verdadeiramente célebre no seu tempo, mesmo para além das fronteiras do então incipiente Brasil.

            Certa vez (e não foi a única), em a carreira de acreditado estaleiro, estava um navio para ser lançado ao mar. Por motivo não descoberto, o barco permanecia emperrado, não havendo forças, nem acessórios adequados que o fizessem descer para a água. Esgotados todos os esforços, falhadas as tentativas, desiludidos e convictos de que não conseguiriam mover a nau, os interessados recorreram a Anchieta. Este, que jamais negou socorro a quem quer que fosse -, mesmo com enorme sacrifício do corpo -, avizinhou-se da embarcação, e, encostando a extremidade do seu cajado à quilha, fez, o movimento de empurrar o navio, e este deslizou imediatamente para o mar.

            Miguel de Azeredo, senhor de Engenho; no distrito de Espírito Santo, desejava ter nele uma enorme lágea, para servir de mesa de sua oficina; mas, dado o exagerado do tamanho, não dispunha de braços suficientes para o transporte do megalito. Sabedor do caso, falado em sua presença, Anchieta foi, em companhia de Azeredo, ao local, onde: lhe disse: "Mande V. Mercê vir a gente que eu ajudarei, e espero em Deus que lhe há de cumprir o desejo."

            Vieram os do Engenho e pondo Anchieta a mão na pedra, esta começou a mover-se, e a foram levando até à casa, onde parou. Poe segunda vez, Anchieta colocou a mão sobre o imenso bloco e moveram-no de novo e assentaram-no precisamente no lugar desejado. Celebrando o que para todos era milagre, batizaram o bloco "Pedra de José".

            As potências insondáveis de tais energias do Espírito mais e mais maravilham, porque se irradiam e até imantam, objetos que estiveram em contato com, o médium, os quais recebem e retém, polarizados, os fluidos desprendidos e concentrados na aura do médium. Assim, um barrete de uso de Anchieta curou muitas cefaleias, bastando que o padecente o mantivesse, por instantes, enfiado na cabeça.

            Casos indubitáveis, pelo copioso, e idôneo dos testemunhos; atestam que até com os ossos de Anchieta (repartidos quando da exumação, em 1609, doze anos depois do sepultamento) foram obtidas maravilhosas curas e outros prodígios, inclusive com águas benzidas (fluidificadas) com pedaços desses ossos.  







quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

01 / 04 Anchieta


01/04
 José de Anchieta
1553 – 13 de Julho – 1953

por Almerindo Martins de Castro


inReformador’ (FEB) Agosto 1953


            Quando a Humanidade espiritualizada do futuro estudar os grandes vultos do passado esses heróis que as ondas revoltas das tempestades do mundo atiram às praias do esquecimento, há de maravilhar-se ante as figuras imortais que trouxeram aos seus contemporâneos, as provas do quanto pode o Espírito ao serviço das eternas leis da vida universal.

            Em todos os períodos da História do mundo, em todos os povos das suas regiões, têm descido, das insondáveis oficinas do Infinito, desses operários da Luz, aprendizes I da sabedoria divina, para instrução  dos analfabetos dessas letras da  Verdade, que só nas aulas da Virtude as almas aprendem a unir em sílabas e em palavras.

            Nas areias dessas praias de silêncio, têm os espíritas  deixado, durante um século, permanecer sepulto, olvidado, desconhecido, um grande, extraordinário médium que se chamou -  JOSÉ DE ANCHIETA, portador de todos os dons mediúnicos, o qual deu, na Terra e no Espaço, provas de profundas raízes espirituais, confirmando, nas suas realizações, aquela afirmativa do Cristo segundo o 'Evangelho de João, cap. XIV, vers. 12-14:

            “Em verdade vos digo que aquele que aquele que crê em mim, esse fará também as obras que eu faço,  e fará ainda maiores, porque eu vou para o Pai; e tudo que pedirdes em meu nome, isso farei,  a fim de o Pai seja glorificado no Filho; se me pedirdes qualquer coisa em meu nome, eu a farei.”

            Não podendo permanecer sempre ao alcance da Terra, o Cristo credenciou os seus mensageiros futuros, dando-lhes por sinal inconfundível o fazerem, eles, os mesmos prodígios que o Mestre realizara. E José de Anchieta  confirmou o mandato, através dos chamados milagres que teceram a auréola da sua trajetória  na vida terrena e espiritual.

            Nasceu na velha capital das Ilhas Canárias, possessão Espanhola, a 19 de Março de 1534.  E, apesar de possuir o Reino de Castela  afamadas universidades , inclusive a de Salamanca, já duas vezes secular a esse tempo, mandaram-no para Portugal, onde na de Coimbra, fez o seu  curso. Com os prodígios da mediunidade, assimilou grandes cabedais, e aos, 17 de idade se fazia noviço da Companhia de Jesus, a então potente e notável Ordem dos Jesuítas.

            Chegando ao Brasil, a 13 de Julho de 1553, pouco depois de adolescente, aonde viera para que o clima tropical ajudasse a corrigir a franzina compleição, e aqui permanecendo durante mais de quatro decênios,  trabalhar incessantemente, dia e noite, por assim, dizer, desde início sua cultura assombra, o seu saber serve para dar lições a o s próprios componentes da Ordem, seus maiores, em autoridade, sem que se encontre a fonte total de tantos conhecimentos, difíceis de acumular no relativamente curto espaço do curso universitário - daquela época. -  e dada ai escassez quase absoluta de livros onde pudesse aumentar e desenvolver a base do que estudara.

            Mas, esses notabilíssimos dons de intelecto deviam revelar-se, ainda e principalmente, na facilidade com que aprendeu a língua tupi dos índios (que o padre Antônio Vieira disse ser impossível de aprender) da  qual fez uma gramática, e compôs hinos, diálogos, catecismo e até pequenos entreatos, que fazia representar, para diversão e ensinamento, difundindo preceitos morais aos silvícolas, a quem se dedicou de todo o coração, trabalhando para eles, na instrução religiosa das almas e nas aulas, de música inclusive, para o que o muitas  vezes amanheceu escrevendo os cadernos que substituíam a falta. de livros  para o aprendizado.

            E, paralelamente a tudo isso, cumpria com os deveres que lhe cabiam na Comunidade, e dava assistência espiritual a quantos dela necessitavam, andando léguas para confortar os últimos instantes de um moribundo - no intuito de iniciá-Io nas verdades da vida eterna.

            E a sua força mediúnica se exercia a qualquer momento. Exauria o corpo sem minguar as forças da alma, plena sempre de inesgotáveis energias, hauridas das fontes do Infinito.

            Moço, na lídima quadra da juventude, no áureo período em que as seduções do mundo açulam os instintos adormecidos na criatura humana, José de Anchieta se consorcia com a missão da catequese, se irmana com o sacrifício, faz doação de todas as suas horas de repouso ao labor, crucifica no calvário  da abnegação todo futuro de prazeres e de glórias da Terra.

            Deslumbrando, com as maravilhas da, sua mediunidade, vivendo num ambiente de primitivos costumes nudistas, onde, as lindas mulheres valiam por tentações ambulantes, José de Anchieta pousava as mãos puras naqueles corpos para lhes aliviar, os sofrimentos, com a mesma excelsa majestade com que o Cristo curava os enfermos que lhe imploravam misericórdia e socorro.

            A pobreza e humildade nele tinham proporções absolutas, porque eram bem mais sublimes do que as  dos ascetas do deserto: estes viviam na ausência de tudo; a Anchieta todas possibilidades agradáveis lhe ,eram oferecidas. Mas, dizia ele, "o uso das coisas de um religioso há de ser de modo de uma estátua insensível que nem apetece o com que a cobrem, nem resiste quando é despojada".

            A casinha onde começou seu apostolado, em Piratininga, era de torrão, teto de palha; a cama, uma tábua ou rede de índio, sem lençol, coberta ou travesseiro; a mesa, o chão; as toalhas e guardanapos, folhas de bananeira; o calçado, alpercatas feitas de cardos silvestres; a comida, paupérrima, ganha de esmola ou com o labor em comum das próprias mãos.

            E aumentando mais ainda a antítese com a formosura  de sua alma e com a gigantesca potência da sua mediunidade  ímpar, era quase um aleijão: franzino, de estatura meã, vítima de escoliose (curvatura da espinha  dorsal, consequência – segundo alguns autores – de lhe ver caído uma escada sobre as costas), caminhava meio corcunda e pendido para um lado, dando-lhe aspecto de insanável insignificância, de apoucamento quase risível. Dir-se-ia que seu espírito elegera um assim disforme físico, para evitar que atrativo plástico, aliado ao fulgor da palavra, eloquente e aos feitos da mediunidade, servir-se para despertar sentimentos mundanos. E a deformidade não lhe impedia de, verdadeiro andarilho, percorrer, claudicando com o corpo todo, vertiginosamente, léguas c léguas, sem a menor fadiga.

            Anos e anos se sucederam, e o notável missionário, por onde passava, sempre encontrava ocasião para  pregar, aconselhar, moralizar e exemplificar.

            Em 1582, chegou ao Rio de Janeiro a armada do general Diogo Flores Valdez, de 16 veleiros, com a qual Filipe II mandava assegurar o Estreito de Magalhães. Informado de que Anchieta realizava prodígios, inclusive o que conseguira, orando, para salvamento de quatro dos navios recém-vindos, e que haviam corrido  grave perigo, o general fez  familiaridade com ele, visitando-o assiduamente e aprendendo valiosos  conhecimentos, tornando-se mesmo obediente aos conselhos de Anchieta, sempre certos, superiormente inspirados."

            São do general estas expressões, ditadas pelo desfavorável físico do grande médium: “A primeira vez  que o vi, nunca coisa mais desprezível se me apresentou; mas, ouvindo-o e tornando a  olhar para ele, nunca. em presença de alguma Majestade me sento mais apoucado e reverente”.