Pesquisar este blog

Mostrando postagens com marcador Felipe Salomão. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Felipe Salomão. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Carências psico-afetivas


Carências psico-afetivas
por Felipe Salomão
Reformador (FEB) Julho 1975

            A certeza das vidas múltiplas abre aos nossos olhos um horizonte incomensurável e possibilidades de estudos as mais diversas.

            Podemos deter-nos no estudo do automatismo psicológico ou analisar as grandes tendências do homem; podemos comparar o destino das nações ou verificar o processo de sedimentação das virtudes no espírito humano.

            É, assim, a Reencarnação uma espécie de ‘telescópio que nos permite andar o passado, analisar o presente e conjecturar sobre o nosso futuro, com imensa possibilidade de acertar. 

            E, pelo estudo das nossas lutas no gigantesco esforço para reequilibrar-nos voltando ao ponto da nossa queda, chegamos a conclusões muito interessantes.

            Vejamos, por exemplo, o capítulo das nossas carências psico-afetivas.

            Sabemos que nos "tipificamos em ondas" (André Luiz) e que trocamos vibrações com as criaturas que também estejam na mesma faixa de pensamentos e vibrações.

            São essas vibrações o alimento da nossa alma, do nosso espírito. E por intermédio das vibrações que estabelecemos a renovação intima, num intercâmbio constante, permanente, com fontes geradoras e receptores de mesma identidade.

            Ora, é por isso que "necessitamos" continuadamente trocar vibrações com pessoas que nos rodeiam. Vibrações de afeto com pais, irmãos, parentes, amigos e vibrações de amor com namoradas, noivas e esposas. É um processo de intenso relacionamento, em que damos alguma coisa e recebemos alguma coisa de alguém.

            Mas, o ponto principal da questão não é somente a troca de vibrações. Há que se considerar que estabelecemos com alguém, por motivos que dormem na noite do nosso passado, um relacionamento mais especial, mais profundo, mais duradouro.

            Esse alguém nos completa, nos satisfaz, por assim dizer, no campo das nossas vibrações sentimentais. Com esse alguém o processo de trocas se estabelece com mais facilidade, mais intensidade e independente da nossa vontade, pelo menos consciente.

            Quer isso dizer que todos temos alguém muito especial que completa o nosso ser, pelo menos por enquanto.

            Alguém, diferente dos demais, que nos motiva, que nos sensibiliza, que nos toca no mais íntimo do ser, que é, finalmente, o complemento emocional de que necessitamos.

            Por essa razão, às vezes encontramos na história fatos que nos chocam, mas que demonstram o quanto somos carentes psico-afetivamente.

            Espantam-nos atitudes de grandes homens, estadistas, damas da nobreza, gente do povo, que demonstram possuir grandes amores aos quais entregam a própria vida.

            Grandes missionários que, conquanto não resvalem para o plano inclinado das vibrações menos dignas, lançam-se na tarefa hercúlea de recuperar espíritos aprisionados nos grandes dramas da existência.

            E por que agem dessa forma? Exatamente porque, além do sentimento de caridade que os anima, muitas vezes buscam o complemento das suas personalidades, seres que lhes são multo caros e que, somente eles, são capazes de vibrar na onda de que necessitam.

            Não nos cause estranheza, portanto, a atitude de um irmão nosso que busque
desesperadamente alguém que lhe é muito caro.

            Mesmo que esse nosso irmão esteja catalogado nas chamadas posições de liderança, que esteja na direção de uma grande casa assistencial ou, no topo de uma grande causa.

            Também ele tem carência psico-afetivas. Também ele necessita permutar vibrações psico-afetivas e, como nós, tem no seu Íntimo a permanente ausência do ser amado.

            Saibamos compreender e respeitar.  A vida apenas nos revelou pequenos detalhes e estamos longe da percepção das verdades que nos governam.

            Inda mais, tenhamos em mente as palavras de Jesus, ante a mulher adúltera: "Aquele que estiver sem pecados, atire a primeira pedra."  

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Sintonia e Adensamento

Sintonia e Adensamento
por Felipe Salomão
Brasil-Espírita / Reformador (FEB) Janeiro 197  ?

            Às vezes, somos defrontados pela pergunta: por que estamos encarnados? Em resposta, quase sempre apresentamos argumentação baseada na Lei de Causa e Efeito, isto é, de que aqui estamos para ressarcir débitos de outras existências. Parece que a Questão estaria completamente resolvida. O ontem determinando o nosso hoje, o nosso hoje
balizando o nosso amanhã; de tal sorte que somos os herdeiros de nós mesmos, de nossos atos e ações, que assumem, por isso, grande importância, não podendo ninguém agir a esmo, nem olvidar as consequências. Já dizia Jesus Cristo: "Quem com ferro fere, com ferro será ferido", isto é, quem se desequilibra perante a Lei necessariamente sofrerá o reflexo da Lei em si mesmo, até que se reequilibre.

            Dissemos, contudo, que o argumento parece resolver completamente a questão. Mas não resolve. Alguém poderia aludir ao nosso anteontem e, depois, recuaria mais no passado, até remontar, afinal, à nossa primeira encarnação no planeta, E, então, permaneceria a indagação: por que reencarnamos?

            Logo nos virá à mente que a Terra não é apenas um mundo de expiações e provas; é, podemos afirmar, um educandário onde nos candidatamos a novas etapas da evolução. E lembraríamos que as nossas encarnações primeiras podem não ter ocorrido aqui neste mundo e, sim, em mundos de categoria ainda inferior, os mundos primitivos, onde a alma (Espírito encarnado) ensaia os primeiros passos para a angelitude.

            Mas o problema continuaria sem solução (aparentemente), já que não sabemos o exato momento em que a alma está sob a Lei de Causa e Efeito, não valendo portanto o argumento de que somos julgados à medida que adquirimos conhecimento. Ora, se somos criados simples e ignorantes e vamos adquirindo livre arbítrio ao tempo em que se nos amplia a capacidade mental, quando é, precisamente, que sofremos pela primeira vez as injunções das leis que infringimos, já que tem de existir uma causal determinante do nosso sofrer?

            Esclareçamos melhor a questão.

            Quais as causas determinantes do nosso sofrimento na primeira encarnação humana, já que, acabados de ser humanizados, não temos passado culposo? Dizer-se que se trata da dor-aprendizado esclarece um aspecto verdadeiro da Questão, mas não soluciona toda a questão. Continuaremos sem saber o exato momento em que entramos no reinado absoluto das nossas responsabilidades.

            Já foi dito por ilustre conferencista espírita: "É o mesmo que colocar uma arma na mão de um canibal e pedir-lhe que tenha amor". Como vemos, a questão permanece sem solução, porque ou somos responsáveis por nossos atos ou não somos.

            Como, então, resolver plenamente a questão?

            A anterioridade de nossas culpas surgidas no mundo espiritual está muito bem colocada na figuração (notem bem: figuração) de Adão e Eva, simbolizando a nossa queda quando da tomada de consciência no plano espiritual.

            Essa anterioridade é que justifica a necessidade da humanização para o resgate e o aprimoramento do Espírito.

            Assim, a questão só é resolvida mediante as noções contidas na "Revelação da Revelação" ou "Os Quatro Evangelhos", de João Batista Roustaing, que nos levam a conhecer a razão da nossa primeira queda e as consequências que somos levados a suportar. Assim, a Lei de Causa e Efeito começa a funcionar exatamente quando ganhamos plena consciência, no plano espiritual, logo se justificando a dor-aprendizado e, sobretudo, a dor-resgate.

            Ouçamos o que diz Emmanuel, no livro "O Consolador", na questão 248:

            - "Como se verifica a queda do Espírito?

            R. - "Conquistada a consciência e os valores racionais, todos os Espíritos são investidos de uma responsabilidade, dentro das suas possibilidades de ação; porém, são raros os que praticam seus legítimos deveres morais, aumentando os seus direitos divinos no patrimônio universal.

            "Colocada por Deus no caminho da vida, como discípulo que termina os estudos básicos, a alma nem sempre sabe agir em correlação com os bens recebidos do Criador, caindo pelo orgulho e pela vaidade, pela ambição ou pelo egoísmo, quebrando a harmonia divina pela primeira vez e penetrando em experiência penosa a fim de restabelecer o equilíbrio de sua existência."  (O grifo é nosso).

            Aí está explicada a questão. Tomamos a vestimenta física porque caímos na nossa vida espiritual (comemos a maçã), fazendo com que a nossa mente (que passou a funcionar em circuito fechado: egoísmo-orgulho-ateísmo), adensasse o perispírito, impossibilitando a nossa permanência nas esferas mais altas de aprendizado, por absoluta falta de sintonia vibratória.

            É o mesmo que uma bola de ferro que quisesse permanecer suspensa no ar, sem apoio, o que é impossível.

            E, de acordo com a gravidade de nossa falta, somos jogados nos mundos
apropriados, isto é, de acordo com a densidade da vibração do nosso perispírito adensado pela perturbação que sofremos, ocasionada pelo nosso desequilíbrio.

            Fica, assim, também esclarecida a questão nº 607, item "b", de "O Livro dos Espíritos":

            - "Esse período de humanização principia na Terra?

            R. - "A Terra não é o ponto de partida da primeira encarnação humana. O período da humanização começa, geralmente, em mundos ainda inferiores à Terra. Isto, entretanto, não constitui regra absoluta, pois pode suceder que um Espírito, desde o seu início humano, esteja apto a viver na Terra. Não é frequente o caso; constitui antes uma exceção". (O grifo é nosso).

            Quer dizer: um Espírito, na sua primeira encarnação humana, pode estar apto a viver na Terra, deixando, portanto, de encarnar nos mundos primitivos, segundo determinaria a lei natural de evolução.

            Vejamos um exemplo: Como se pode verificar pelas, Escrituras, a nossa Terra está chegando ao "fim dos tempos", isto é, aproximam-se os tempos em que haverá a "separação do joio do trigo". Quando se realizar a mencionada seleção de valores, conforme rezam as tradições espirituais, haverá um expurgo dos espíritos empedernidos no mal, que serão levados a outros mundos, compatíveis com o seu estado de evolução e onde haverá "pranto e ranger de dentes". Isso acontecerá porque a Terra deixará de ser um mundo de expiação e prova, para se tomar um mundo de regeneração, mais conforme com a evolução dos espíritos aqui encarnados e que sobraram do expurgo.

            Pois bem, os degredados encontrarão nos mundos para onde forem levados a humanidade ali surgida, em estado primitivo de progresso e necessitando da ajuda dos oriundos da Terra, para o aceleramento da sua evolução.

            Perguntamos agora: Não estarão sofrendo os nativos do planeta? Não haverá sofrimento para os que chegam?

            Para estes, há o passado culposo em outros orbes; mas, e para os primeiros,
onde a culpa? Não resta dúvida de que foi no plano espiritual que cometeram as suas faltas, tornando-se lhes indispensável a encarnação material, mais conforme ao seu estado de adensamento.

            Finalizando, atentemos para o que diz Kardec, na parte 2ª, capítulo I - Dos Espíritos, de "O Livro dos Espíritos" :

            Questão 86 - "O mundo corporal poderia deixar de existir, ou nunca ter existido, sem que isso alterasse a essência do mundo espírita?

            R. - "Decerto. Eles são independentes; contudo, é incessante a correlação entre ambos, porquanto um sobre o outro incessantemente reagem."


            Aí está: não precisaria nem ter existido o mundo material, e, nem por isso, a obra de Deus deixaria de ter-se realizado. Mas, aqui estamos, porque caímos. Resta-nos o esforço do melhor para que sejamos incluídos na leva dos que ficam e não na dos que serão lançados "às trevas exteriores". 

sábado, 30 de maio de 2015

Instituições em Crise

              A Doutrina Espírita provoca nos que lhe transpõem os umbrais imediato desejo de transformação. Isso é muito compreensível, já que este é o objetivo primordial da Doutrina: transformar o homem. Kardec, por isso mesmo, afirma: "Conhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral."

            Assim, com os primeiros adeptos que surgiram no nosso país, veio a ideia de que a Doutrina exige de todos a aplicação imediata de seus conceitos. Ainda mais que a bandeira do Espiritismo é a CARIDADE, a virtude por excelência, conforme Paulo.

            Surgiu daí, pois, a ideia da criação de casas assistenciais, com os mais diversos objetivos, para o amparo das criaturas necessitadas da Terra. Vieram os asilos, os lares, as creches, os orfanatos, as casas de saúde, os hospitais, os sanatórios, casas de sopa, casas de mãe pobre, educandários, etc ... Foi uma proliferação de entidades por todo o Brasil, fazendo com que o Espiritismo ficasse assentado sobre sólidas bases assistenciais. Era a manifestação patente de que o Espiritismo é Jesus de novo, o Consolador prometido, trazendo bálsamo para os humanos sofrimentos.

            Louve-se aqui o trabalho dos pioneiros da Doutrina, que se lançaram a esta faina, enfrentando tudo e todos, para introduzir o Espiritismo no Brasil. Achamos, mesmo, que de outra forma a Doutrina não se teria implantado em nossa nação.

            Passada esta fase, contudo, os pioneiros começaram a voltar ao plano espiritual, deixando na retaguarda os seus continuadores, para a conservação e ampliação do trabalho edificado.

            Com o surgimento das novas gerações de espíritas ocorreram, porém, os primeiros choques; os mesmos que explodiam entre as gerações da sociedade. E os choques surgiram porque os pioneiros construíram antes as obras de ação social, e deixaram para depois a edificação do novo homem recomendado pelo Codificador.

            Dizendo isto, não estamos criticando os precursores do atual movimento doutrinário, já que eles realizaram a sua missão aqui na face da Terra. Estamos tentando analisar a causa da crise que está rondando as nossas entidades assistenciais. Crise porque se cuidou de edificar as paredes, fizeram-se campanhas as mais diversas para colocar a cobertura, "bolaram-se" os planos mais diferentes para a pintura e para o acabamento, mas esqueceu-se do recheio que deve ser colocado dentro das entidades espíritas: exatamente o Espiritismo.

            Vemos, então, o presidente que briga com os novos profitentes por causa dos azulejos que "ele fez campanha para colocar". Vemos o dirigente do Centro que doou o terreno para a edificação da entidade e quer ser agora o presidente vitalício do grupo. Vemos o confrade que coloca a sua opinião acima da própria sociedade que o elegeu, ou o dirigente que faz questão do seu cargo, como autoridade máxima. Enfim, briga-se por tudo. Cada qual achando que é dono disso ou daquilo, quando não acha que é "dono" da Doutrina Espírita e que sua palavra é lei.

            Mas, não é o cúmulo?

            Vemos, pois, que a crise das entidades espíritas não é propriamente delas, isto é, não lhes falta o alimento, não lhes falta o remédio, não lhes faltam os recursos monetários; faltam-lhes os verdadeiros espíritas, que vivam o que ensinam.

            Achamos que já passou a hora de vivermos em choque, acreditando que algo que tenhamos edificado, reunido ou criado seja realmente nosso. Tudo vem de Deus, que nos deu as chances de trabalhar para o aprimoramento e adestramento espirituais.

            Quer dizer, não podemos esquecer-nos de que o principal de uma obra assistencial espírita é a Doutrina Espírita, sentida por todos os diretores, associados, participantes e beneficiados.

            Às vezes, um confrade nos mostra extensa lista de pessoas assistidas: 12.000 pessoas, 1.000 famílias, 20.000 quilos de arroz ... e tudo o mais. E nós perguntamos: e quanto de Espiritismo foi distribuído? Junto do pão material, quanto do pão espiritual foi ofertado?

            Enfim, precisamos nos preocupar com o principal de uma entidade assistencial espírita: a Doutrina Espírita. Seja exemplificando-a no exercício dos cargos para que fomos eleitos, seja mostrando-a aos que procuram a entidade como meio de salvação, isto é, como meio de redenção da criatura. Em suma: é a vivência do Evangelho, que tanto pregamos e que tão pouco exercitamos...

            Mesmo porque, podemos levantar inúmeras obras assistenciais espíritas, sem ter incutido o Espiritismo em nós mesmos.

            Afinal, de que nos adiantará construir uma obra espírita se ainda não vencemos os nossos maiores inimigos: o orgulho, a vaidade, o egoísmo, a presunção, o autoritarismo, a cólera, a inveja ... e tudo o mais?

Instituições em crise
Filipe Salomão

Reformador (FEB) Outubro 1972

domingo, 24 de junho de 2012

Sejamos Iconoclastas



“Sejamos Iconoclastas.”


            Que a Doutrina Espírita é o Consolador Prometido, conforme narrado em João, não resta a menor dúvida. Quanto mais o tempo passa, mais se confirma a asserção, não só no campo material (prático) como no campo das ideias (filosófico).

            A cada dia mais se avoluma o número de criaturas beneficiadas pela Doutrina dos Espíritos, nas diversas casas erigidas pelos pioneiros do Espiritismo no Brasil. Não há uma só cidade do país onde não haja um Centro Espírita e que, paralelamente, um trabalho assistencial não se desenvolva. Ora é um albergue noturno, ora um asilo para os velhinhos, ora uma casa de crianças, ora um Lar-Escola, ora um prato de sopa, ora um agasalho; enfim, todas as formas de ajuda ao próximo são experimentadas. Isso, ainda que com algumas imperfeições na sistemática, dá bem uma mostra do que o Espiritismo tem feito para acalmar a fome e a dor das criaturas.

            No campo dos esclarecimentos filosóficos, perdemos a conta das inúmeras pessoas que se livraram do suicídio, do desespero, da apatia, por terem lido um livro espírita. Também sem conta são os que se abateram pela perda de um ente querido e que, através da mediunidade, voltaram à esperança, porque viram seus mortos falarem ou escreverem. São famosos os casos de identificação de espíritos pela mediunidade de Chico Xavier, Divaldo Franco, Ivone Pereira e tantos outros, citando apenas os mais recentes.

            Indubitavelmente, é a Doutrina Espírita o Consolador que o Cristo de Deus prometeu aos homens. É o Paracleto que veio para ficar eternamente conosco.

            Com o correr dos anos, porém, na prática doutrinária, surgiram algumas “adoções” que merecem ser estudadas, a fim de que se compreenda bem o papel consolador do Espiritismo.

            Por exemplo: na atualidade doutrinária, erigiu-se à água fluidificada, ao passe e, às vezes, à prece, um verdadeiro altar de devoções, em detrimento do próprio conhecimento da Doutrina.

            Assim, muitas pessoas procuram o Centro Espírita para receberem o passe, a água fluidificada e assistirem aos trabalhos doutrinários. Quantas vezes já ouvimos de pessoas nossas conhecidas a seguinte frase: “Toda quarta-feira eu vou ao Centro. Ah! eu não posso ficar sem os trabalhos!” Outros, nem bem alguém se arrepie por qualquer circunstância, vêm logo com a observação: “Você precisa desenvolver mediunidade”. Já ouvimos também: “O Guia do Centro mandou que eu tomasse 3 passes toda sexta-feira e água fluidificada diariamente, antes das refeições”.

            Ora, convenhamos, está se erigindo uma idolatria dentro da Doutrina Espírita, substituindo-se o que é perene, duradouro, pelo transitório, material.

            Senão vejamos: não é a Doutrina o Consolador Prometido, para nos esclarecer, nos orientar, alertando-nos contra os nossos vícios e as nossas mazelas? Não é a Doutrina uma doutrina de Causas, mostrando-nos de onde nos vêm os males e ajudando-nos a evitar os efeitos?

            Se assim é, de nada adianta tomarmos água fluidificada, passes, e fazermos orações no Centro, se não modificarmos a nossa conduta, que é a causa de todos os nossos malefícios.

            Se alguém vai ao Centro perseguido pelo espírito das trevas, receberá, sem sombra de dúvidas, auxílio e socorro. Deverá, porém, modificar os seus hábitos e a sua conduta, para ficar livre, de vez, do seu inimigo espiritual. De fato, a Doutrina Espírita nos alivia, porém, não realiza por nós o trabalho que nos compete. Se voltarmos a incidir nos mesmos erros, os nossos males voltarão.

            Assim, achamos que muita gente tem tomado o secundário pelo principal, o acessório pelo essencial, porque o substrato, que é a Doutrina dos Espíritos, tem ficado para trás.

            Perguntar-nos-ão: você é contra os passes, a água fluidificada e as orações?

            De forma nenhuma. Quantas vezes já  os tenho procurado, como recurso para os grandes males. Acho que são terapêuticas espirituais de emergência, aplicáveis nos casos específicos a que se destinam.

            O que me preocupa é o fato de se erigirem falsos ídolos na Doutrina, buscando-lhe as palavras apenas, e se esquecendo do Espírito que nela se encerra...

            Lamento quando o meu irmão se beneficia da Doutrina, mas não  toma conhecimento dela, iludindo-se supinamente. O que nos liberta, afinal, é o conhecimento da Verdade.

            Convoco, pois, meus irmãos a sermos iconoclastas de falsas práticas, evitando, com isso, que a parte principal da Doutrina Espírita, que é a Verdade nela encerrada, possa ficar esquecida, em desuso.

            Atentemos para o ensino da Codificação: “Conhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral”.

            Não está claro?


por Felipe Salomão  
Brasil Espírita (FEB) Jan 1971
             




quinta-feira, 10 de maio de 2012

Esquemas de Segurança


Esquemas de Segurança


            A tecnologia atual tem facilitado sobremaneira a vida material do homem na Terra. São inúmeras as conquistas feitas pelos cientistas e que beneficiam, diretamente, o ser humano. Descobertas surgem diariamente, solucionando problemas, prevenindo doenças, estimulando a vida, lutando contra a morte.

            Mas a técnica não dá virtude ao homem e, por isso mesmo, o homem de hoje ainda não se despojou do orgulho, do egoísmo, da vaidade e de tantos outros males que o atormentam. É o mesmo homem que perambula pelos milênios da História, sempre a matar, a roubar, a trair, a cobiçar.  Apenas refinou a técnica de ação e as armas usadas; continuou com os mesmos objetivos.

            Então, vemos os governos preocupados com inúmeros "esquemas de segurança", isto é, determinando providências para evitar que a ação destruidora do homem se manifeste na plenitude de suas forças.

            Aqui são policiais encarregados da manutenção da ordem, impedindo vândalos de depredarem o bem público; ali são agentes do trânsito incumbidos de forçar o homem a obedecer às leis e regulamentos vigentes; mais adiante são fiscais para todos os tipos de impostos, para que haja equânime distribuição das responsabilidades sociais, vez que ninguém quer cumprir o que a lei determina: uns burlam no peso, outros no total a recolher, outros no preço. Há, até, fiscais da qualidade de produtos de alimentação, porque o homem, na sanha do lucro, do ganho maior, não se importa de vender algo estragado ou fora do prazo de validade, mesmo que isso esteja comprometendo a saúde do seu irmão.

            A importância monetária que se gasta com fiscalização, repressão, impedimento e tantas outras coisas é impressionante, subindo à casa dos trilhões ...

            Tudo por quê?

            Porque o homem ainda não se evangelizou! Ainda não compreendeu o ensino do Cristo: "Fazer aos outros o que queremos que nos seja feito", que é a "Lei Áurea" da vida.

            E vemos tantos correrem atrás de cultura, valores mundanos, posição, dinheiro, destaque, quando uma só coisa é importante: a evangelização da criatura humana.

            Muitos objetarão: mas o homem deve estudar! As leis de segurança são necessárias, dado o atraso do mundo em que vivemos!

            Sim, são objeções ponderáveis; o que afirmamos, entretanto, é o descuido com que temos olhado para a evangelização da criatura humana. Há até, às vezes, quem tenha vergonha de dizer que estuda o Evangelho ... E é no Evangelho que estão todas as normas indispensáveis à sublimação do homem. Ali repousam as chaves da nossa libertação. Da libertação de toda a humanidade, por isso que quando o homem se evangelizar todas as medidas de segurança, todas as fiscalizações, todas as leis coercitivas não terão razão de ser, já que por si mesmo ele reconhecerá que antes de reclamar direitos precisa cumprir seus deveres.

            Teremos, então, inúmeros recursos voltados para o bem da humanidade, no
esclarecimento da mente humana e na busca da nossa redenção, porque o dinheiro que ora se gasta e se aplica na repressão, à falta de evangelho no homem, será revertido ao lazer, ao aprendizado que constrói e edifica.

            Terá chegado, assim, o momento em que o homem poderá dizer-se verdadeiramente irmão do próprio homem.  


Felipe Salomão

inReformador’ (FEB) Maio 1974



sexta-feira, 20 de abril de 2012

Perdão foi feito prá gente pedir



“Perdão foi feito
prá gente pedir.”

por Felipe Salomão  

            Muita razão tinha o cancioneiro popular quando escreveu a frase que dá título ao comentário: "Perdão foi feito pra gente pedir". Claro está que, se não fôssemos criaturas passíveis (e quanto!) de errar, não haveria necessidade da existência do perdão.

            Para que perdão, se fôssemos perfeitos?

            É, pois, o perdão, um dispositivo imprescindível no mundo em que vivemos; uma válvula de escape para todos nós que vivemos no erro, cometendo os mais disparatados atos contra o nosso equilíbrio.

            Mas, que é o perdão?

            Segundo Martins Peralva ("Estudando o Evangelho" - FEB – 1ª edição - 1961), "o conceito de perdão, segundo o Espiritismo, é idêntico ao do Evangelho, que lhe é fundamento: concessão indefinida de oportunidades para que o ofensor se arrependa, o pecador se recomponha, o criminoso se libere do mal e se erga, redimido, para a ascensão luminosa". Assim, a nós, os espíritas, a Lei do perdão é uma aplicação da Lei do amor ao próximo, consequência mesma da Lei de caridade que devemos aplicar nos nossos atos.

            Ninguém pode, pois, duvidar da eficácia do perdão. Ele nos é recomendado pelos Evangelhos e é ensinado claramente pelo Cristo, como forma de adquirirmos perdão para as nossas faltas.

            Registra o Evangelho: "Se contra vós pecou vosso irmão, ide fazer-lhe sentir a falta em particular, a sós com ele; se vos atender, tereis ganho o vosso irmão. - Então, aproximando-se dele, disse-lhe Pedro: Senhor, quantas vezes perdoarei a meu irmão, quando houver pecado contra mim? Até sete vezes? - Respondeu-lhe Jesus: Não vos digo que perdoeis até sete vezes, mas até setenta vezes sete vezes." (Mateus, cáp. XVIII, vv. 15/21 e 22; "O Evangelho segundo o Espiritismo"  52ª edição - FEB)

            E afirmava Jesus: "Perdoai as nossas dívidas, assim como nós perdoamos nossos devedores." Ainda: "Se, porém, não perdoardes aos homens, tampouco vosso Pai vos perdoará as ofensas" (Oração dominical do "Pai Nosso").

            Não resta dúvida, assim, de que a prática do perdão evangélico - diferente do frio perdão formal - capacita-nos a crédito espiritual; dando-nos condições de, se errarmos, solicitarmos, por nosso turno, ao Pai Celestial, perdão para as nossas ofensas e dívidas.

            O que queremos analisar, contudo, não é a necessidade do ato de perdão, que ela está sobejamente demonstrada no que apresentamos acima e em inúmeras outras palavras do Cristo, que perdoou incessantemente, terminando a sua passagem aqui na Terra com as seguintes palavras: "Perdoai-lhes, Pai, eles não sabem o que fazem."

            Há um outro ângulo da questão que merece estudo.

            Nós ofendemos profundamente alguém que conosco vive. Sentindo o alcance da nossa falha, procuramos o ofendido e lhe pedimos perdão pela falta que cometemos. O nosso irmão, evangelizado, sem dúvida, imediatamente perdoa a nossa falta e até desculpa a nossa insensatez. Para ele, o ofendido, os méritos de haver praticado sinceramente a atitude digna de perdoar o seu ofensor. E para nós? Basta-nos somente o perdão do ofendido? Cremos que não. Sem dúvida, já conseguimos alguma coisa com a nossa ida até o ofendido, reconhecendo que erramos e que carecemos da sua desculpa. É, até, um ato de humildade. Mas, não estamos livres da consequência do nosso ato. Teremos que colher os frutos da nossa atitude, sejam eles quais forem.

            Dirão alguns: "Mas você foi perdoado pelo ofendido!" Sim, fui perdoado, mas não estou desobrigado do esforço pelo reequilíbrio.

            "Deus perdoou." Sim, aceitou o nosso pedido sincero, cheio de arrependimento pela falta cometida, mas, como não é Ele que nos exige reparação, e sim nós que precisamos dela, dá-nos novas oportunidades para o pagamento das nossas dívidas. 

            Queremos dizer: não há o perdão de mão beijada, pura e simplesmente. É indispensável que nós, os ofensores, limpemos as máculas que imprimimos no nosso perispírito. E isso só faremos através do bem, já que só o bem anula o mal.

            Poderão argumentar: "Mas se temos que nos depurar, não há perdão; simplesmente, pagamos o que devemos; não necessitamos de pedir perdão. Exemplo: compro roupas na loja. Fico devendo 500 cruzeiros. Se eu pagar, ainda que em prestações, não há perdão da minha dívida."

            Há o perdão, sim! Ele está manifestado nas diversas oportunidades que Deus nos dá para tentarmos vencer as nossas dificuldades. Depois, parece-nos que o perdão é um pedido de desculpas e não um livramento incondicional, até porque não é Deus que nos pune e sim nós que nos punimos com a Lei de causa e efeito. É o famoso choque de retorno.

            Citemos o caso do "bom ladrão". Na cruz, juntamente com o Cristo, pede ao Mestre perdão por suas faltas, já que era culpado. O Mestre o perdoou, indubitavelmente, mas não o isentou das responsabilidades e consequências dos seus atos. Deveria ele, para entrar no paraíso, volver muitas vezes ao plano da Terra, para refazer aquilo que estragara, construir o que destruíra. Caso contrário, seria o perdão da última hora, quando o pecador, irremediavelmente perdido, suplicaria ao Pai perdão para suas faltas ...

            Citemos o caso de Paulo, o apóstolo da gentilidade. Viu o Cristo na estrada de Damasco. Converteu-se ao Cristianismo e fez, até o fim dos seus dias, a maior pregação do Evangelho de que se tem notícia. Mas, será que ficou livre, por isso, da sua responsabilidade no ato da lapidação de Estêvão, primeiro mártir do Cristianismo? Acreditamos que não. É bem verdade que toda a sua semeadura entre os gentios foi levada a seu crédito na Espiritualidade, mas, verdadeiramente, apenas o bem que haja feito anulará o mal que praticara.

            Não queremos dizer, com tudo isso, que somos adeptos da lei do "olho por olho e dente por dente". Não é preciso que a criatura passe pelos mesmos problemas que criou para o próximo. Isso seria um círculo vicioso. O que é obrigatório é que a criatura, com o bem que pratique, retorne ao equilíbrio, pois quando praticamos o mau os maiores prejudicados somos nós mesmos. É a ideia que já deixamos exposta anteriormente: somente o bem anula o mal que tenhamos feito.

            Para finalizar, ouçamos o que diz Emmanuel:

            "Em nossas faltas, na maioria das vezes, somos imediatamente perdoados, mas não limpos.

            Fomos perdoados pelo fel da maledicência, mas a sombra que tencionávamos esparzir, na estrada alheia, permanece dentro de nós por agoniado constrangimento.

            Fomos perdoados pela brasa da calúnia, mas o fogo que arremessamos à cabeça do próximo passa a incendiar-nos o coração.

            Fomos perdoados pelo corte da ofensa, mas a pedra atirada aos irmãos do caminho volta, incontinenti, a lanhar-nos o próprio ser.

            Fomos perdoados por todos aqueles a quem ferimos, no delírio da violência, mas, onde estivermos, é preciso extinguir os monstros do remorso que os nossos pensamentos articulam, desarvorados.

            Chaga que abrimos na alma de alguém pode ser luz e renovação nesse mesmo alguém,mas será sempre chaga de aflição a pesar-nos na vida.

            Ridicularizados, atacados, perseguidos ou dilacerados, evitemos o mal, mesmo quando o mal assuma a feição de defesa, porque todo mal que fizermos aos outros é mal a nós mesmos.

            Quase sempre aqueles que passaram pelos golpes de nossa irreflexão já nos perdoaram incondicionalmente, fulgindo nos planos superiores; no entanto, pela lei de correspondência, ruminamos, por tempo indeterminado, os quadros sinistros que nós mesmos criamos. Cada consciência vive e evolve entre os seus próprios reflexos." (Do livro "Caminho Espírita", ed. Comunhão Espírita Cristã.)

            Contudo, o ideal mesmo é que jamais tenhamos necessidade de pedir perdão, como lembrou Luciano dos Anjos, em "O Atalho-5", "Reformador" de dezembro de 1973. 





quarta-feira, 18 de abril de 2012

Donos da Doutrina


Donos da
Doutrina


            Ao que nos parece quando dizemos Doutrina dos Espíritos queremos significar que a Doutrina Espírita pertence aos Espíritos “que são as virtudes dos céus, qual imenso exército que se movimenta ao receber as ordens do seu comando, espalham-se por toda a superfície da Terra e, semelhantes a estrelas cadentes, vêm iluminar os caminhos e abrir os olhos aos cegos" (O Evangelho segundo o Espiritismo - prefácio).

            Assim sendo, entendemos que à nossa Doutrina tem suas raízes no plano espiritual superior, encarregado da evolução da Terra, e estando sob a responsabilidade direta de Jesus, o Cristo de Deus, a orientação e propagação das suas verdades eternas.

            Mas quem é aqui na Terra que é o "dono" da Doutrina Espírita? Quem é aquele que representa o seu mais alto papel, podendo ser considerado o seu máximo represente?

            Foi Kardec? Seus descendentes? Algum movimento?

            Na verdade, ninguém é dono da Doutrina Espírita. Os seus verdadeiros donos são os Espíritos Superiores que a ofereceram à humanidade sofredora, como resposta de Jesus aos sofrimentos do homem.

            A nós, os encarnados, compete assessorar a tarefa desses luminares, tudo fazendo para a implantação dessas verdades maravilhosas no seio da humanidade.

            Compete-nos, ainda, aprofundar-nos nos conhecimentos que a Doutrina Espírita oferece, pesquisando, analisando, tudo fazendo para melhorar o entendimento do Espiritismo. Mas nós, os encarnados, nenhum de nós somos os donos da Doutrina Espírita.

            Espanta-nos, assim, a atitude dos que desejam, a todo custo, dar a ÚLTIMA PALAVRA A RESPEITO DE ESPIRITISMO.

            É bem verdade que todos temos o direito de pensar dessa ou daquela forma, porém, temos obrigação de permitir que  o nosso semelhante também tenha o seu ponto de vista, ainda que diferente do nosso. Mas, daí partir para uma posição de intransigência, de intolerância, querendo estandardizar o pensamento das pessoas, obrigando-as a pensarem de uma só forma, todos de uma mesma maneira, é uma aberração que a Doutrina não apoia, como condena.

            Se assim fosse, daqui a pouco teremos a institucionalização de um sacerdócio, formado daqueles que supostamente se julgam os verdadeiros conhecedores da Doutrina. A seguir virá uma nova Inquisição, destinada a punir aqueles que não pensem como os sacerdotes e o seu chefe.

            Não, alto lá. A Doutrina veio exatamente para dar novo caminho ao homem, caminho de liberdade, de tolerância, de indulgência.

            Aonde vamos?

            Querer que o movimento espírita seja unificado é coisa louvável e que muito benefício trará a todos, mas forçar a situação para que os espíritas sejamos unos em interpretação doutrinária, fere o mais comezinho princípio de tolerância religiosa.   

            Vez por outra, vemos surgir alguns confrades que querem ser mais "kardecistas” que o próprio Kardec, isto é, mais realistas que o rei. A sua palavra, pretendem, é a que basta para solucionar todas as questões que surgem. Se eles não aprovam ou não dão seu "veredictum" final (em última análise) o “imprimatur”, nada mais se pode fazer ou falar, que eles chamarão de heresia.

            Kardec, o "bom senso encarnado", não tomou tal atitude. Sempre dizia que a opinião dele, sobre determinado assunto, estava passível de mudança, com o correr do tempo. Não envolvia os Espíritos no assunto para, reforçar a sua tese ou ideia.  Exatamente por isso é que não surgiu um movimento chamado "kardecismo", que seria tudo menos Doutrina Espírita. O Espiritismo sim pode ser encarado do ponto de vista  kardecista, isto é,  segundo a codificação de Allan Kardec.

            Alguém poderia se preocupar com a diversidade de ideias que surgiriam, já que todos somos livres para entender ou aceitar alguma coisa. Essa diversidade, no entanto, seria na maneira de pensar e não na de agir que é uma só para nós todos: a vivência cristã nos nossos atos. Individualmente poderemos divergir aqui ou ali, mas no movimento doutrinário estaremos unidos no objetivo comum da Doutrina Espirita:

            Achamos, até, mal muito maior pretender um bitolamento do pensamento doutrinário, que seria causa de descrédito para o movimento, de vez que fingiríamos aceitar aquilo que não aceitamos. Aliás, por acaso não foi esse o grande erro do Dogmatismo, obrigando (com ferro e fogo) as pessoas a pensarem de acordo com uma única ideia dominante?

            Precisamos estar atentos com os dizeres: “A letra mata, o espírito vivifica”.


Felipe Salomão

inReformador’ (FEB) Março 1974


quarta-feira, 7 de setembro de 2011

'A Evolução de Adão'


     “A Evolução de Adão”
por Jorge Damas Martins e Roberto Silveira

(Edição dos autores – 1ª Ed – 1984)

Prefácio     por          Felipe Salomão

ENSAIO SOBRE “EVOLUÇÃO”

            Escrever um livro não é tarefa fácil. Primeiro, porque o espírita, em geral, é um estudioso e tem ao seu dispor uma bibliografia excelente e diversificada. Depois, a escolha do tema é um desafio.

            Os autores do presente livro, Jorge Damas Martins e Dr. Roberto Silveira, conseguem com muita habilidade vencer os obstáculos acima.

            Apresentam-nos este “A EVOLUÇÃO DE ADÃO”, trabalho a quatro mãos, dentro de uma linha doutrinária muito coerente, num esforço perseverante de pesquisa e estudo de texto.

            O Jorge Damas Martins, conquanto ainda novato no movimento espírita[1], não ficou na rama das considerações Doutrinárias. Aprofundou-lhes o sentido e tem se esmerado em procurar “o espírito que vivifica” nos conceitos que lhe são oferecidos. Seu primeiro livro “PONTE EVANGÉLICA” —, recentemente editado, dá-nos esta confirmação.

            O Dr. Roberto Silveira, seu sogro, já está há mais tempo na Doutrina Espírita, tendo publicado “AGENDA DE UM PSIQUIATRA ESPÍRITA”, “AQUI E ACOLÁ” (A Psiquiatria nos Dois Planos da Vida) e “ELE ESTÁ BEM, OBRIGADO”. E aqui estão os dois reunidos para a apresentação deste estudo sobre a temática da evolução.

            Antes de mais nada, deve-se dizer que eles conseguem realizar verdadeira “costura”, abordando obras de Allan Kardec, J. B. Roustaing, Pietro Ubaldi, Emmanuel, André Luiz, num admirável poder de síntese. Evidentemente, as ideias expostas são o produto da sua interpretação e resultado da sua madureza espiritual. E eles as expõem dentro do espírito de liberdade que bem caracteriza a Doutrina Espírita. Liberdade, aliás, tão útil à oxigenação de ideias, de formulação de pensamentos e que permite a livre discussão dos assuntos, sem as amarras do dogmatismo ou a prisão do fanatismo.

            A primeira parte do livro, escrita pelo Jorge, trata da queda espiritual e sua demonstração nas chamadas “Sagradas Escrituras”. Começa com a substanciosa introdução “Lei, Liberdade e Consequências” onde o autor apresenta um verdadeiro tratado sobre evolução, dor e sua razão de ser no processo evolutivo, para o espírito que faliu. Aqui fica nítida a diferença entre a dor-resgate e a dor-aprendizado, com que pretendem justificar a necessidade do sofrimento para a caminhada do Ser rumo às finalidades maiores. E uma verdade irretorquível ressuma das ideias expostas: só há uma fatalidade — a da nossa evolução.

            A seguir, o texto do Gênesis é esmiuçado tim-tim por tim-tim. É como se colocasse uma lente de aumento sobre a narrativa escriturística para melhor esclarecê-la. E não fica na mera especulação interpretativa, segundo a “letra que mata”. Há a preocupação da explicação científica, segundo a física moderna, da qual André Luiz já revelara alguns conceitos, como o da “LUZ COAGULADA”, de que modernamente se fala.

            Há amarração de todos os textos e autores entre si, verificando-se uma sólida argumentação. E não fica por aí. Vai-se ao original para se descobrir o verdadeiro significado das palavras, a fim de melhor compreendê-las. Conquanto muito se tenha escrito sobre o assunto, aqui ADÃO, EVA, SERPENTE, ÉDEN, JARDIM DO ÉDEN, PARAÍSO, EXPULSÃO, PECADO, encontram o seu significado verdadeiro, sua simbologia é desvendada e uma explicação detalhada nos é apresentada.

            É uma tese e, somente como tal, poderá ser refutada, isto é, com apresentação de dados, de ideias, de argumentos.

            Até aqui se falou filosoficamente sobre a QUEDA. Na segunda parte, o Dr. Roberto Silveira, aborda o problema da QUEDA como fato consumado, isto é, nossa vida, depois de havermos nos rebelado contra a LEI DE DEUS.

            E, também, ele, apresenta uma inovação. É a tentativa de se partir de uma ideia apresentada pelo psiquiatra ALBERT MOREL, que aceitando a queda espiritual, encontra nela a causa dos desvios psíquicos da humanidade. E com a mestria que lhe é conferida pelos longos anos de trabalho psiquiátrico, o autor faz-nos uma emocionante narrativa da reencarnação. Não como deve ser, mas como é. Aqui as almas desfilam seus dramas e os seus problemas existenciais, cuja explicação lógica só a reencarnação pode dar. E, sabemos, reencarnação oriunda de queda, que todos nós nos iguala pelo simples fato de estarmos ligados a este mundo de expiação e provas, chamado Terra. Esta mesma razão que permitiu ao Cristo de Deus desafiar aos acusadores da chamada mulher adúltera: “Aquele que estiver sem pecado, atire a primeira pedra”. Evidentemente que Ele não falava somente aos homens ali presentes. Falava aos espíritos reencarnados, por isso mesmo submetidos à Lei, por estarem comprometidos e em queda espiritual. Por isso ninguém teve coragem para atirar pedra. Ele, o Filho de Deus, no entanto, estava sem pecado (“Quem de vós me arguirá de pecado?”), mas Espírito Puro ofereceu seu imenso amor na compreensão dos conflitos da alma humana, sem acusar e sem pactuar com o erro (“Vai e não peques mais”). Não se consegue ler a narrativa apresentada pelo Dr. Roberto Silveira aos poucos. Há um envolvimento emocional tão grande, que somos dominados pelo desejo de chegar ao fim, de ver a narrativa toda, para compreender o que se passa com o espírito comunicante. E aqui, com as luzes da Lei dos Renascimentos, tudo se explica, tudo se aclara.

            Enfim, o presente livro não é para ser lido. É para ser estudado, tanto e tais são os argumentos e ideias aqui apresentados.

            E, ao fazermos esta apresentação por deferência dos autores, concluímos afirmando que esta é uma obra que enriquece o patrimônio cultural espírita.
           
                                                          


[1] Nota do Blogueiro – Observação de Felipe Salomão em 1984. Já lá se vão quase 30 anos e a pena do Dr Damas só fez brilhar desde então.