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quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

O temor do inferno

 

O temor do Inferno

Djalma Matos

Reformador (FEB) Janeiro 1943

             A crença na existência do inferno... O temor do inferno, como mansão de penas eternas, como lugar destinado a sofrimentos horríveis, que jamais tem fim, para as desditosas almas que nele, por suprema desgraça, chegam a ingressar, - se em outras eras, de maior atraso moral e intelectual, teve sua utilidade, para refrear instintos perversos de consciências endurecidas no crime e na impiedade, já agora, na nossa época, em que predomina o livre pensamento, o livre exame e a livre manifestação da ideia, malgrado ao sangrento esforço dos fazedores de guerra, é de todo ineficaz e contraproducente.

             Causa estranheza que os sacerdotes se empenhem, com tanto zelo, em propagar tal crença, como se fosse ensinamento cristão, quando, evidentemente, não há nada mais contrário ao espírito do Cristianismo, quando evidentemente, não há nada mais contrário ao espírito do Cristianismo, que se inspira no amor e no perdão, pregados e exemplificados pelo seu excelso fundador.

             Esse dogma, incompatível com o grau de evolução mental e espiritual a que chegamos, não pode mais ser aceito sinceramente por quem tenha a faculdade de raciocinar.

             Se a uma criança, que vive num meio em que ainda não penetraram os melhoramentos da civilização, alguém quiser assustar com o papão, é bem possível que consiga o seu intento. Usar, porém, do mesmo expediente com um menino ou menina, que se acostumou a andar de automóvel, a ouvir rádio, a assistir cinema e a ver aviões cruzarem os ares quase que diariamente, o efeito será negativo, porque, dispondo de elementos para raciocinar e esclarecer-se, compreenderá logo o absurdo da ameaça.

             Acontece, não obstante, que muitas crianças ladinas fingem acreditar no papão, para não parecer que estão convencidas de que os maiores – quase sempre os pais – não estão falando a verdade, e se esforçam, a seu turno, por convencer aos mais pequenos da real existência do papão.

             O mesmo fenômeno mental, ou psicológico, observa-se nos pregadores e fiéis das igrejas cristãs, em relação à existência do inferno, com a condenação eterna e Satanás. São, por via de regra, bastante inteligentes e sensatos para intimamente não aceitarem tais absurdos, incompatíveis com a noção que se deve ter da justiça de Deus, equânime e misericordiosa, mas, fingem acreditar – os pregadores, por amor à intangibilidade dos dogmas, que juraram defender, e os fiéis, porque se sentem no dever de proclamar como verdade indiscutível tudo que sai da boca dos sacerdotes de sua infalível religião.

             Jesus jamais se referiu a inferno como mansão circunscrita de penas eternas, e sim como planos, ou diversos estados, em que as almas pecadoras se encontrarão pelos sofrimentos e expiações: as trevas exteriores, onde haverá “choro e ranger de dentes”, para as criminosas, endurecidas, impenitentes, e o “fogo”, fogo das más paixões e dos desejos impuros, para as viciosas de toda espécie.

             Amai a Deus sobre todas as coisas – Amai o próximo como a vós mesmos – Amai-vos uns aos outros – Não façais aos outros o que não quereis que vos façam – Perdoai para serdes perdoados – Perdoais não sete vezes, mas setenta vezes sete – Não julgueis para não serdes julgados... Estes ensinamentos que se confirmam e se completam uns aos outros, repetidos, quase todos, várias vezes, no Evangelho de Jesus, consubstanciam os fundamentos de sua santa e consoladora doutrina, como ninguém poderá negar.

             E, assim sendo, porque querer obscurece-los, dando mais importância a frases isoladas, aribuídas ao meigo Nazareno, que falam do inferno, condenação e satanás, e que, se realmente proferidas por Ele, se não rferiam a estados transitórios das almas pecadoras, só podem ser levados à conta de força de expressão?

             Como admitir que o Divino Messias fosse incoerente e contraditório, certificando da bondade e misericórdia do Pai e, ao mesmo tempo, ameaçando com a vingança extremada desse mesmo Pai, com a condenação eterna e satanás?

             Oh! Cegueira dos homens!  Dizem-se cristãos, mas, como não encontram em seus corações a predisposição para o amor e o perdão, que o Cristo pregou e exemplificou, querem ver, de preferência, nas suas palavras, o inferno e satanás, à previdente sabedoria e misericórdia do Pai, que elas revelam – a condenação e a intolerância, ao “perdoai setenta vezes sete vezes” o exclusivismo da seita, ao “amai-vos uns aos outros” – a hostilidade em nome da fé, ao “não façais aos outros o que não quereis que vos façam” o o direito de julgar emnome do Cristo, à sua formal declaração de que não veio para julgar o mundo e sim para salvá-lo, e ao conselho de não julgarmos para não sermos julgados. Como não querem reformar-se, para adaptar os atos aos preceitos evangélicos, lidam por moldar o Cristianismo ao sabor de suas mentes e sentimentos.

                 Nós, espíritas, temos a convicção de que não existe inferno com condenação eterna, nem diabo nem satanás, rival ao mesmo tempo que carcereiro de um Deus vingativo e cruel. Para nós, Deus é pai de amor e misericórdia, que não quer a perdição de nenhuma de suas criaturas, e nenhum poder contrasta à sua vontade onipotente e sabedoria infinita.

             Sabemos que nas consequências do nosso modo de agir neste mundo – em pensamento, palavras e atos – estão a punição e a recompensa.

             Os crimes que cometemos, os vícios que adquirimos, as imperfeições que conservamos, aderem à nossa personalidade e, ao desencarnarmos, levamos no perispírito – no corpo espiritual a que se referia S. Paulo – esse lastro indesejável, que mantém o nosso ser preso à pesada atmosfera da Terra, impedindo-o de elevar-se e de evoluir. É possível que, não sendo a carga muito pesada, ainda no estado de desencarnados possamos dela livrar-nos, por um vigoroso e persistente esforço da vontade. O regular, porém, - e que por via de regra acontece, é termos que reencarnar na Terra, algumas ou muitas vezes para, expirimentando o mal que fizemos aos outros, padecermos, sofrendo com aquilo que antes nos deu ilícito prazer, e nos irmos corrigindo e depurando.

             Neste processo de depuração, mais ou menos doloroso, mais ou menos prolongdo, conforme as imperfeições a corrigir e a força de vontade empregada, constate o inferno aceito e reconhecido pelos espíritas, o qual, por não ser eterno, mas transitório, condicionado às circunstâncias de cada caso e consentâneo com a bondade e sabedoria do Criador e com as esperanças da criatura, é tomado mais a sério, concorrendo muitíssimo mais para a regeneração da humanidade do que o temor absurdo das penas eternas.


sexta-feira, 6 de março de 2020

O Temor do Inferno



O Temor do Inferno
por Djalma de Matos
Reformador (FEB) Janeiro 1942

            A crença na existência do inferno... O temor do inferno, como mansão de penas eternas, como lugar destinado a sofrimentos horríveis que jamais têm fim, para as desditosas almas que nele, por suprema desgraça, chegam a ingressar, - se em outras eras, de maior atraso moral e intelectual, teve a sua utilidade, para refrear instintos perversos de consciências endurecidas no crime e na impiedade, já agora, na nossa época, em que predomina o livre pensamento, o livre exame e a livre manifestação da ideia, malgrado ao sangrento esforço em contrário dos fazedores de guerra, é de todo ineficaz e contraproducente.

            Causa estranheza que os sacerdotes das igrejas se empenhem, com tanto zelo, em propagar tal crença, como se fosse ensinamento cristão, quando, evidentemente, não há nada mais contrário ao espírito do Cristianismo, que se inspira no amor e no perdão, pregados e exemplificados pelo seu excelso fundador.

            Esse dogma, incompatível com o grau de evolução mental e espiritual a que chegamos, não pode mais ser aceito sinceramente por quem tenha a faculdade de raciocinar.

            Se a uma criança, que vive num meio em que ainda não penetraram os melhoramentos da civilização, alguém quiser assustar com o papão, é bem possível que consiga o seu intento. Usar, porém, do mesmo expediente com um menino ou menina, que se acostumou a andar de automóvel, a ouvir rádio, a assistir cinema e a ver aviões cruzarem os ares quase que diariamente, o efeito será negativo, porque, dispondo de elementos para raciocinar e esclarecer-se, compreenderá logo o absurdo da ameaça.

            Acontece, não obstante, que muitas crianças ladinas fingem acreditar no papão, para não parecer que estão convencidas de que os maiores - quase sempre os pais - não estão falando a verdade, e se esforçam, a seu turno, por convencer aos mais pequenos da real existência do papão.

            O mesmo fenômeno mental, ou psicológico, conserva-se nos pregadores e fiéis das igrejas cristãs, em relação à existência do inferno, com a condenação eterna e Satanás. São, por via de regra, bastante inteligentes e sensatos para intimamente não aceitarem tais absurdos, incompatíveis com a noção que se deve ter da justiça de Deus, equânime e misericordiosa, mas, fingem acreditar - os pregadores, por amor á intangibilidade do dogma, que juraram defender, e os fiéis, porque se sentem no dever de proclamar como verdade indiscutível tudo que sai da boca dos sacerdotes de sua infalível religião. Jesus jamais se referiu a inferno como mansão circunscrita de penas eternas e sim como planos, ou diversos estados, em que as almas pecadoras se encontrarão pelos sofrimentos e expiações: as trevas exteriores, onde haverá "choros e ranger de dentes", para as criminosas, endurecidas, impenitentes, e o "fogo", fogo das más paixões e dos desejos impuros, para as viciosas de toda especie.

            Amai a Deus sobre todas as coisas - Amai ao próximo como a vós mesmos - Amai-vos uns aos outros - Não façais aos outros o que não quereis que vos façam - Perdoai para serdes perdoados - Perdoai não sete vezes, mas setenta vezes sete - Não julgueis para não serdes julgados. .. Estes ensinamentos que se confirmam e se completam uns aos outros, repetidos, quase todos, várias vezes, no Evangelho de Jesus, consubstanciam os fundamentos de sua santa e consoladora doutrina, como ninguém poderá negar.

            E, assim sendo, porque querer obscurece-los, dando mais importância a frases isoladas, atribuídas ao meigo Nazareno, que falam em inferno, condenação e satanás, e que, se realmente proferidas, por Ele, se não referiam a estados transitórios das almas pecadoras, só podem ser levadas à conta de força de expressão?

            Como admitir que o Divino Messias fosse incoerente e contraditório, certificando da bondade e misericórdia do Pai, e ao mesmo tempo, ameaçando com a vingança extremada desse mesmo Pai, com a condenação eterna e satanás?

            Oh! Cegueira dos homens! Dizem-se cristãos, mas, como não encontram em seus corações a predisposição para o amor e o perdão, que o Cristo pregou e exemplificou, querem ver, de preferência, nas suas palavras, o inferno e satanás, à previdente sabedoria e misericórdia de Deus, que elas revelam - a condenação e a intolerância, ao "perdoai setenta vezes sete vezes" - o exclusivismo de seita, ao "amai-vos uns aos outros" - a hostilidade em nome da fé, ao "não façais aos outros o que não quereis que vos façam" - o direito de julgar em nome do Cristo, à sua formal declaração de que não veio para julgar o mundo e sim para salvá-lo, e ao conselho de não julgarmos para não sermos julgados. Como não querem reformar-se, para adaptar os atos aos preceitos evangélicos; lidam por moldar o Cristianismo ao sabor de suas mentes e sentimentos.

            Nós, espíritas, temos convicção de que não existe inferno com condenação eterna, nem diabo ou satanás, rival ao mesmo tempo que carcereiro de um Deus vingativo e cruel. Para nós, Deus é pai de amor e misericórdia, que não quer a perdição de nenhuma de suas criaturas, e nenhum poder contrasta à sua vontade onipotente e sabedoria infinita.

            Sabemos que nas consequências do nosso modo de agir neste mundo - em pensamento, palavra e atos - estão a punição e a recompensa.

            Os crimes que cometemos, os vícios que adquirimos, as imperfeições que conservamos, aderem à nossa personalidade e, ao desencarnarmos, levamos no perispírito - no corpo espiritual a que se referia S. Paulo - esse lastro indesejável, que mantém o nosso ser preso à pesada atmosfera da Terra, impedindo-o de elevar-se e de evoluir. É possível que, não sendo a carga muito pesada, ainda no estado de desencarnados possamos dela livrar-nos, por um vigoroso e persistente esforço da vontade. O regular, porém, - o que por via de regra acontece, é termos que reencarnar na Terra, algumas ou muitas vezes, para, experimentando o mal que fizemos aos outros, padecermos, sofrendo com aquilo que antes nos deu ilícito prazer, e nos irmos corrigindo e depurando.

            Neste processo de depuração, mais ou menos doloroso, mais ou menos prolongado, conforme as imperfeições a corrigir e a força de vontade empregada, consiste o inferno aceito e reconhecido pelos espíritas, o qual, por não ser eterno, mas transitório, condicionado às circunstâncias de cada caso e consentâneo com a bondade e sabedoria do Criador e com as esperanças da criatura, é tomado mais a sério, concorrendo muitíssimo mais para a regeneração da humanidade do que o temor absurdo das penas eternas.


quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Saibamos ser espíritas



Saibamos ser espíritas
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Fevereiro 1942

Procurar conhecer-se a si mesmo com a preocupação constante, quotidiana, de corrigir os próprios defeitos, constitui o dever precípuo de todo verdadeiro espírita.

De que serve ao crente conhecer a fundo a doutrina e observar teórica e exteriormente os seus ensinamentos, se, no que diz respeito à alma, ao próprio eu, não faz esforço por melhorar-se, para dar a demonstração de que o Espiritismo não é como a figueira estéril do Evangelho, mas, sim, árvore fecunda e frondosa, que dá bom fruto e acolhedora sombra?

Não pretenda ninguém ser perfeito, sob pena de se lhe turvar a vista - porque a perfeição, neste mundo, como o moto-contínuo e a pedra filosofal, ainda não houve quem a alcançasse.

Pela terra, um único Espírito perfeito já passou: o de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Muito já faz quem mantiver o propósito sincero e diuturno de melhorar-se, observando e corrigindo as próprias imperfeições, perdoando, fazendo por esquecer as faltas que provêm das imperfeições alheias. E, para não fraquejarmos, não nos sujeitarmos a falir, neste meritório intento, devemos apelar sempre para a humildade, sem jamais esquecermos a sábia e salutar recomendação do Mestre: -- Orai e vigiai, para não cairdes em tentação!

Se, quando o procedimento alheio nos causasse ofensa ou prejuízo, quer direta, quer indiretamente, antes de irrogarmos ao nosso Irmão censuras e recriminações, de levantarmos a voz para o acusar, nos detivéssemos um momento a raciocinar e, atentando nas imperfeições do nosso ser, nos puséssemos na posição do que cometeu a falta, no mesmo grau de adiantamento moral ou intelectual em que ele se encontra, haveríamos de ver que, na maioria dos casos, a revolta se transformaria em compaixão e a acusação nos inspiraria uma prece em benefício daquele que faliu por ignorância ou por fraqueza.

Se este é o critério aconselhável no cultivo das relações mundanas, muito mais será de observar-se as coisas que dizem respeito propriamente ao Espiritismo.

Não podemos, por isso, concordar com alguns confrades que, animados, aliás, de boas intenções, entendem que se deve hostilizar a todos aqueles que praticam as diversas modalidades do baixo, ou, melhor, do falso espiritismo, vigiando-os e denunciando-os à polícia, sob à alegação de que desacreditam o verdadeiro Espiritismo. Discordamos deste modo de pensar, porque temos como certo que a missão dos espíritas não é acusar, nem delatar, mas aconselhar e moralizar pela exemplificação dos preceitos evangélicos, sem jamais recorrer aos métodos coercitivos da violência e do escândalo.  

Não julgueis para não serdes julgados - disse Jesus.

E qual será o mais culpado - aquele que por ignorante (que outro qualificativo se não pode dar) pratica a feitiçaria, a macumba, etc., sob o rótulo de Espiritismo, ou o que, tendo-se por conhecedor da verdadeira doutrina e da moral evangélica, não faz o que nelas se ensina, isto é, perdoar para ser perdoado, não fazer ao próximo o que não quereria que lhe fizessem?

A resposta não é difícil... Mais censurável é aquele que, tendo o caminho iluminado à sua frente, dele se desvia do que o que pouco enxerga e se precipita no lodaçal.

Encarada assim a questão, sob o justo critério da relatividade, cuidemos em que não nos caiba a increpação de Jesus aos fariseus, que viam o argueiro no olho do vizinho e não percebiam a trave no próprio olho.

Não há, a nosso ver, o menor perigo para o Espiritismo legitimo - que não é obra dos homens e sim dos invisíveis mensageiros do Senhor - de ser prejudicado pelo falso espiritismo, porque a verdade jamais se poderá confundir com a impostura, assim como o azeite se não confunde com o vinagre. Bem saberão extremar um do outro as pessoas sensatas, esclarecidas e criteriosas, cujo juízo tão somente nos deve preocupar - porque o das de má fé, das de cérebro entenebrecido pelas teias de aranha dos prejuízos e preconceitos não devemos recear, nem dele cogitar.

O nosso pensamento sobre o assunto é este: - Tenha cada espírita o firme e constante propósito de corrigir as próprias imperfeições, procurando ser bom e justo, para combater, pelo conselho e pelo exemplo, o erro e a ignorância, dentro do âmbito arejado da caridade e da tolerância, sem julgar necessário recorrer aos meios compulsórios da repressão oficial.

Foi recorrendo a esses meios que começaram aqueles que chegaram, na Idade Média, a criar, de conivência com os poderes temporais, os tribunais do Santo Oficio, a acender as fogueiras da Inquisição - como se para demandar as coisas de Deus, fosse mister apelar para a espada de Cesar.

Saibamos, pois, ser rigorosos para com os nossos próprios defeitos e tolerantes para. com as faltas alheias.

Só assim seremos dignos de nos dizermos espíritas.

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

No Princípio



No Princípio
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Agosto 1954

            Em artigo publicado sexta-feira santa do corrente ano, sob a epígrafe "O Cristo Redentor", nas colunas dum jornal profano, citando o versículo inicial do Evangelho de João, dissemos que a locução "no princípio", ali empregada, refere-se à formação da Terra pelo influxo do verbo do Cristo, expressão genuína do verbo de Deus, e não ao Universo, constituído de incalculáveis multidões de galáxias que povoam o espaço infinito, - porque aquele jamais teve princípio, como não terá fim.

            Assim afirmamos amparados pela razão e pela revelação espírita.

            Da revelação espírita faz parte uma série de mensagens mediúnicas ditadas à Sociedade Espírita de Paris, em 1862 e 1863, pelo sábio Espírito de Galileu, versando
sobre Uranografia geral, e que constituem o capitulo VI do livro “A Gênese”, os milagres e as predições de Allan Kardec. Destacamos, de uma delas, os elucidativos ensinamentos seguintes:

            "Existindo, por sua natureza, desde toda a eternidade, Deus criou desde toda a eternidade, e não poderia ser de outro modo. Visto que, por mais longinqua, que seja a época a que recuemos, pela imaginação, os supostos limites da criação, haverá sempre, além desse limite, uma eternidade – ponderai bem nesta ideia -, uma eternidade durante a qual as divinas hipóstases, as volições infinitas, teriam permanecido sepultadas em muda letargia inativa e infecunda, uma eternidade de morte aparente para o Pai eterno, que dá vida aos seres; de mutismo indiferente para o Verbo que os governa; de esterilidade fria e egoísta para o Espírito de amor e vivificação.
.....................................................................................
            "Transportando-nos a alguns milhões de séculos somente, para trás da época atual, verificamos que a nossa Terra ainda não existe, que mesmo o nosso sistema solar ainda não começou as evoluções da vida planetária; mas que, entretanto, já esplêndidos sóis iluminam o éter, já planetas habitados dão vida e existência a uma multidão de seres, nossos predecessores na carreira humana, e que as produções opulentas de uma Natureza desconhecida e os maravilhosos fenômenos do céu desdobram, sob outros olhares, os quadros da imensa Criação, Que digo! Já deixaram de existir esplendores que, muito antes, fizeram palpitar o coração de outros mortais, sob o pensamento da potência infinita! E nós, pobres seres pequeninos, que viemos após uma eternidade de vida, nós nos cremos contemporâneos da Criação!"

            Esta revelação é plenamente confirmada pela Astronomia, que nos atesta a existência atual e pretérita dos mundos inumeráveis de sóis que já se extinguiram há milênios, mas cuja luz ainda brilha no firmamento.

            A Gênese moisaica não mais pode ser invocada para elucidar a transcendente questão da criação primária do nosso mundo, e multo menos do Cosmos, porque a autoridade de que se revestia já há muito foi superada pelos fatos e conquistas da Ciência.

            Esse venerável monumento da Revelação antiga satisfez as exigências mentais e as aspirações religiosas duma época, em que a Humanidade acreditava piamente estar a Terra fixada no centro do Universo, iluminada durante o dia pelo disco do Sol, que surgia no Oriente, percorria a abóbada celeste e se punha no Ocidente, para passar por baixo dela e reaparecer no Oriente, iluminando o novo dia. Essa época compreende o longo período histórico, que se conta desde Moisés até o século décimo sétimo da era cristã, quando o insigne Galileu foi obrigado a abjurar de joelhos, perante o Santo Oficio, porque afirmava, como verdade, que a Terra é que gira, em movimento diuturno, em redor do Sol.

            Moisés era, sem dúvida, um médium vidente poderoso e, como missionário, teve a visão retrospectiva da formação da Terra, na fase em que, cessado o estado fluido incandescente, começara a arrefecer e solidificar-se, oferecendo condições propícias à vida de seres orgânicos , mas, quem nos garante que o que ele realmente viu, foi o que se acha narrado na Gênese? - uma vez que, para representar a sua visão, serviu-se de caracteres ideológicos, e não da escrita alfabética que era então desconhecida.

            O vidente, por certo, contemplou a Terra ainda aquecida, envolta em cerrado nevoeiro que interceptava a passagem dos raios solares, parecendo-lhe que "era sem forma e vazia, e havia trevas à face do abismo" (1-2). Diluindo-se o nevoeiro, pelo gradativo arrefecimento das águas, pode, através dele, coar-se a luz do Sol, e deu-se a "separação entre a luz e as trevas" (?), distinguindo-se o dia da noite (1-3 a 5). Com a progressão do resfriamento da terra e das águas, chuvas torrenciais caiam sobre elas, e, estiadas estas, pesadas nuvens apareciam suspensas na atmosfera, operando-se, aparentemente, a separação "das águas que estavam por baixo do firmamento das que estavam por cima" (1-6 a 8). Corno surgissem, mais tarde, o Sol e a Lua por entre as nuvens, Moisés, na compreensível ignorância em que estava do nosso sistema planetário, supôs que Deus criara, depois da Terra, "dois grandes luminares; - o luminar maior para governar o dia e o luminar menor para governar a noite; e as estrelas" (1-14 a 18).

            Ora, sem esta, ou semelhante, interpretação dada pelo Espiritismo, a Gênese moisaica não resiste à crítica: será relegada para o rol das lendas antigas como já a consideram os corifeus da ciência materialista.

            Assim também, as figuras de Adão e Eva não representam, em face da revelação espíritas, as primeiras criaturas humanas das quais toda a Humanidade descende e sim, entidades alegóricas, simbolizando uma numerosa falange de Espíritos intelectualmente adiantados, degredada por seu desmedido orgulho, de um planeta mais evolvido (paraíso perdido), do sistema da Capela, onde se tinham constituído entrave ao progresso, e, vindo encarnar na Terra, transformaram-se em fator eficiente do desenvolvimento mental e cultural dos povos. Não se concebe, aliás, que a primeira mulher se tivesse formado da costela de Adão - como pretendem os que interpretam a figura, simbólica ao pé da letra, porque, no capítulo 1º, versículo 27, está consignado que Deus, ao sexto dia, criou o homem macho e fêmea. Assim se explica porque, tendo Caim matado a Abel - como narra o capítulo 4º e, arrependido, desejasse morrer, lhe foi posto um sinal para que ninguém o matasse, prova de que já havia então mais gente, além de seus pais- o que se torna mais evidente por ter ele casado e fundado uma cidade, como consta do versículo 17.

            Donde poderiam provir a mulher de Caim e a população da cidade senão dos seres humanos que já haviam sido criados macho e fêmea?

            Ao enunciar estes esclarecimentos, guiados pela razão e o bom-senso, mas sem a menor pretensão à infalibilidade que seria estultícia, não nos move, a nós espíritas, senão secundariamente, a intenção de fazer prosélitos.

            Sentimo-nos felizes e confortados com a nossa fé esclarecida, racional e consoladora, e desejaríamos que todos compartilhassem da nossa felicidade; desejaríamos que todos compreendessem Deus, como nós o compreendemos. Pai de amor e justiça, que "enviou seu Filho ao mundo, não para o condenar e sim para salvá-lo", e que sendo a suprema sabedoria, a suprema bondade, não iria eternizar o mal em sua obra, criando um inferno de sofrimentos sem fim, satanás e a condenação eterna pois temos a serena convicção de que dá a seus filhos, por mais perversos e ignorantes que sejam, a oportunidade de se tornarem sábios e bons, mediante o cadinho purificador das vidas sucessivas,

            Não queremos porém, de modo algum, desviar ninguém da religião, seja qual for, em que se sinta bem e confortado, desde que faça por ser bom e fraterno, procurando pôr em prática a recomendação de Jesus, de não fazer aos outros o que não queira que lhe façam, - uma vez que a finalidade do Espiritismo é a de promover a reforma moral dos indivíduos, para que possam reinar, neste mundo, a paz, o amor e a harmonia, sem exigir que todos rezem pela mesma cartilha.

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

No Princípio




No Princípio
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Agosto 1954

Em artigo publicado Sexta-feira Santa do corrente ano, sob a epígrafe "O Cristo Redentor", nas colunas dum jornal profano, citando o versículo inicial do Evangelho de João, dissemos que a locução “no princípio”, ali empregada, refere-se à formação da Terra pelo influxo do verbo do Cristo, expressão genuína do verbo de Deus, e não ao Universo, constituído de incalculáveis multidões de galáxias que povoam o espaço infinito, - porque aquele jamais teve princípio, como não terá fim.
           
Assim afirmamos amparados pela razão e pela revelação espírita.

Da revelação espírita faz parte uma série de mensagens mediúnicas ditadas à Sociedade Espírita de Paris, em 1862 e 1863, pelo sábio Espírito Galileu, versando sobre uranografia geral, e que constituem o capitulo VI do livro “A Gênese” – Milagres e Previsões, de Allan Kardec, destacamos, de uma delas, os elucidativos ensinamentos seguintes:
           
"Existindo, pois, sua natureza desde toda a eternidade, Deus criou desde toda eternidade, e não poderia ser de outro modo visto que, por mais longínqua que seja a época que recuemos, pela imaginação, os supostos limites da criação, haverá sempre, além desse limite, uma eternidade - ponderai bem nesta ideia - a eternidade durante a qual as divinas hipóstases, as volições infinitas, teriam permanecido sepultadas em muda letargia inativa e infecunda, uma eternidade de morte aparente para o Pai eterno, que dá vida aos seres; de mutismo indiferente para o Verbo que os governa: de esterilidade fria e egoísta para o Espírito de amor e vivificação.

Transportando-nos alguns milhões de séculos somente, para trás da época atual, verificamos que a nossa Terra ainda não existe, que mesmo o nosso sistema solar ainda não começou as evoluções da vida planetária; que, entretanto, já esplêndidos sóis iluminam o éter, já planetas habitados dão vida a existência a uma multidão de seres, nossos predecessores na carreira humana, e que as produções opulentas de uma Natureza desconhecida e os maravilhosos fenômenos do céu desdobram, sob outros olhares, os quadros da imensa Criação. Que digo! Já deixaram de existir esplendores que, muito antes, fizeram palpitar o coração de outros mortais, sob o pensamento da potência infinita! E nós, pobres seres pequeninos, que viemos após uma eternidade de vida, nós nos cremos  contemporâneos da Criação!"

Esta revelação é plenamente confirmada pela Astronomia, que nos testa a existência atual e pretérita dos mundos inumeráveis, de sóis que já se extinguiram há milênios, mas cuja luz ainda brilha no firmamento.

A Gênese mosaica não mais pode ser invocada para elucidar transcendente questão da criação primária do nosso mundo, e muito menos do Cosmos, porque a autoridade de que se revestia já há muito foi superada pelos fatos e conquistas da Ciência.

Esse venerável monumento da Revelação antiga satisfez as exigências mentais e religiosas duma época, em que Humanidade acreditava piamente estar a Terra  fixada no centro do Universo, iluminada durante o dia pelo disco do Sol, que surgia no Oriente, percorria a abóbada celeste e se punha no ocidente, para passar por baixo dela e reaparece no Oriente, iluminando o novo dia. Essa época compreende o longo período histórico, que se conta desde Moisés até o século décimo sétimo da era cristã, quando o insigne Galileu foi obrigado a abjurar de joelhos, perante o Santo Ofício, porque afirmava, como verdade, que a Terra é que gira, em movimento diuturno, em redor do Sol.
           
Moisés era sem dúvida, um médium vidente poderoso e, como missionário, teve a visão retrospectiva da formação da Terra, na fase em que, cessado o estado fluido incandescente, começam a arrefecer e solidificar-se, oferecendo condições propicias à vida de seres orgânicos. Mas, quem nos garante que o que ele realmente viu, foi o que se acha narrado na Gênesis? – uma vez que, para representar a sua visão, serviu-se de caracteres ideológicos e não da escrita alfabética, que era então desconhecida.

            O vidente, por certo, contemplou a Terra ainda aquecida, envolta em cerrado nevoeiro que interceptava a passagem dos raios solares, parecendo-lhes que “era sem forma e vazia, e havia trevas à face do abismo” (1-2). Diluindo-se o nevoeiro, pelo gradativo arrefecimento das águas, chuvas torrenciais caíam sobre elas e, estiadas estas, pesadas nuvens apareciam suspensas na atmosfera, operando-se, aparentemente, a separação “das águas que estavam por baixo do firmamento, das que estavam por cima” (1-6 a 8). Como surgissem, mais tarde, o Sol e a Lua, por entre as nuvens, Moisés, na compreensível ignorância em que estava do nosso sistema planetário, supôs que Deus criara, depois da Terra, “dois grandes luminares: - o luminar maior para governar o dia, e o luminar menor para governar a noite; e as estrelas” (1-14 a 18).

            Ora, sem esta, ou semelhante, interpretação dada pelo Espiritismo, a Gênese mosaica não resiste à crítica: será relegada para o rol das lendas antigas, como já a consideram os corifeus da ciência materialista.

            Assim, também, as figuras de Adão e Eva não representam, em face da revelação espírita, as primeiras criaturas humanas, das quais toda a Humanidade descende, e sim, entidades alegóricas, simbolizando uma numerosa falange de Espíritos intelectualmente adiantados, degredada, por seu desmedido orgulho, de um planeta mais evolvido (paraíso perdido), do sistema da Capela, onde se tinham constituído entrave ao progresso, e, vindo encarnar na Terra, transformaram-se em fator eficiente do desenvolvimento mental e cultural dos povos. Não se concebe, aliás, que a primeira mulher se tivesse formado da costela de dão – como pretendem os que interpretam a figura simbólica ao pé da letra – porque, no capítulo 1º, versículo 27, está consignado que Deus, ao sexto dia, criou o homem macho e fêmea. Assim se explica porque, tendo Caim matado a Abel – como narra o capítulo 4º - e, arrependido, desejasse morrer, lhe foi posto um sinal para que ninguém o matasse, prova de que já havia então mais gente, além de seus pais – o que se torna mais evidente por ter ele casado e fundado uma cidade, como consta do versículo 17.

            Donde poderia provir a mulher de Caim e a população da cidade, senão dos seres humanos que já haviam sido criados macho e fêmea?

            Ao enunciar estes esclarecimentos, guiados pela razão e o bom-senso, mas sem a menor pretensão à infalibilidade, que seria estultícia, não nos move, a nós espíritas, senão secundariamente, a intensão de fazer prosélitos.

            Sentimo-nos felizes e confortados com a nossa fé esclarecidas, racional e consoladora, e desejaríamos que todos compartilhassem da nossa felicidade; desejaríamos que todos compreendessem Deus, como nós o compreendemos, Pai de amor e justiça, que, “enviou seu Filho ao mundo, não para o condenar, e sim para salvá-lo”, e que sendo a suprema sabedoria, a suprema bondade, não iria eternizar o mal em sua obra, criando um inferno de sofrimentos sem fim, satanás e a condenação eterna, pois temos a serena convicção de que de que dá  a seus filhos, por mais perversos e ignorantes que sejam, a oportunidade de se tornarem sábios e bons, mediante o cadinho purificador das vidas sucessivas.

            Não queremos, porém, de modo algum, desviar ninguém da religião, seja qual for, em que se sinta bem e confortado, desde que faça por ser bom e fraterno, procurando por em prática a recomendação de Jesus, de não fazer aos outros o que não queira que lhe façam, - uma vez que a finalidade do Espiritismo é a de promover a reforma moral dos indivíduos, para que possam reinar, neste mundo, a paz, o amor e a harmonia, sem exigir que todos rezem pela mesma cartilha.

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

O Temor do Inferno


O Temor do Inferno
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Janeiro 1943

A crença na existência do inferno... O temor do inferno, como mansão de penas eternas, como lugar destinado a sofrimentos horríveis, que jamais têm fim, para as desditosas almas que nele, por suprema desgraça, chegam a ingressar, se, em outras eras, de maior atraso moral e intelectual, teve a sua utilidade, para refrear instintos perversos de consciências endurecidas no crime e na impiedade, já agora, na nossa época, em que predomina o livre pensamento, o livre exame e a livre manifestação da ideia, mau grado ao sangrento esforço em contrário dos fazedores de guerra, é de todo ineficaz e contraproducente.

Causa estranheza que os sacerdotes das igrejas se empenhem, com tanto zelo, em propagar tal crença, como se fosse ensinamento cristão, quando, evidentemente, não há nada mais contrário ao espírito do Cristianismo, que se inspira no amor e no perdão, pregados e exemplificados pelo seu excelso fundador.

Esse dogma, incompatível com o grau de evolução mental e espiritual a que chegamos; não pode mais ser aceito sinceramente por quem tenha a faculdade de raciocinar.

Se a uma criança, que vive num meio em que ainda não penetraram os melhoramentos da civilização, alguém quiser assustar com o papão, é bem possível que consiga o seu intento. Usar, porém, do mesmo expediente com um menino ou menina, que se acostumou a andar de automóvel, a ouvir rádio, a assistir cinema e a ver aviões cruzarem os ares quase que diariamente, o efeito será negativo, porquê, dispondo de elementos para raciocinar e esclarecer-se, compreenderá logo o absurdo da ameaça.

Acontece, não obstante, que muitas crianças ladinas fingem acreditar no papão, para não parecer que estão convencidas de que os maiores - quase sempre os pais - não estão falando a verdade, e se esforçam, a seu turno, por convencer aos mais pequenos da real existência do papão.

O mesmo fenômeno mental, ou psicológico, observa-se nos pregadores e fiéis das igrejas cristãs, em relação à existência do inferno, com a condenação eterna e Satanás. São, por via de regra, bastante inteligentes e sensatos para intimamente não aceitarem tais absurdos, incompatíveis com a noção que se deve ter da justiça de Deus, equânime e misericordiosa, mas, fingem acreditar - os pregadores, por amor à intangibilidade do dogma, que juraram defender, e os fiéis, porque se sentem no dever de proclamar como verdade indiscutível tudo que sai da boca dos sacerdotes de sua infalível religião, Jesus jamais se referiu a inferno como mansão circunscrita de penas eternas, e sim como planos, ou diversos estados, em que as almas pecadoras se encontrarão pelos sofrimentos e expiações: as trevas exteriores, onde haverá "choros e ranger de dentes", para as criminosas, endurecidas, impenitentes, e o "fogo", fogo das más paixões e dos desejos impuros, para as viciosas de toda espécie.

Amai a Deus sobre todas as coisas – Amai ao próximo como a vós mesmos - Amai-vos
uns aos outros - Não façais aos outros o que não quereis que vos façam - Perdoai para serdes perdoados - Perdoai não sete vezes, mas setenta vezes sete - Não julgueis para não serdes julgados. .. Estes ensinamentos que se confirmam e se completam uns aos outros, repetidos, quase todos, várias vezes, no Evangelho de Jesus, consubstanciam os fundamentos de sua santa e consoladora doutrina, como ninguém poderá negar.

E, assim sendo, porque querer obscurece-los, dando mais importância a frases isoladas, atribuídas ao meigo Nazareno, que falam em inferno, condenação e satanás, e que, se realmente proferidas por Ele, se não referiam a estados transitórios das almas pecadoras, só podem ser levadas à conta de força de expressão?

Como admitir que o Divino Messias fosse incoerente e contraditório, certificando da bondade e misericórdia do Pai, e ao mesmo tempo, ameaçando com a vingança extremada desse mesmo Pai, com a condenação eterna e satanás?

Oh! cegueira dos homens! Dizem-se cristãos, mas, como não encontram em seus corações a predisposição para o amor e o perdão, que o Cristo pregou e exemplificou, querem ver, de preferência, nas suas palavras, o inferno e satanás, à previdente sabedoria e misericórdia de Deus, que elas revelam - a condenação e a intolerância, ao "perdoai setenta vezes sete vezes" - o exclusivismo de seita, ao "amai-vos uns aos outros" - a hostilidade em nome da fé, ao "não façais aos outros o que não quereis que vos façam" - o direito de julgar em nome do Cristo, à sua formal declaração de que não veio para julgar o mundo é sim para salva-lo, e ao conselho de não julgarmos para não sermos julgados. Como não querem reformar-se, para adaptar os atos aos preceitos evangélicos; lidam por moldar o Cristianismo ao sabor de suas mentes e sentimentos.

Nós, espíritas, temos convicção de que não existe inferno com condenação eterna, nem diabo ou satanás, rival ao mesmo tempo que carcereiro de um Deus vingativo e cruel. Para nós, Deus é pai de amor e misericórdia, que não quer a perdição de nenhuma de suas criaturas, e nenhum poder contrasta à sua vontade onipotente e sabedoria infinita.

Sabemos que nas consequências do nosso modo de agir neste mundo - em pensamento, palavra e atos - estão a punição e a recompensa.

Os crimes que cometemos, os vícios que adquirimos, as imperfeições que conservamos, aderem à nossa personalidade e, ao desencarnarmos, levamos no perispírito - no corpo espiritual a que se referia S. Paulo - esse lastro indesejável, que mantém o nosso ser preso à pesada atmosfera da Terra, impedindo-o de elevar-se e de evoluir. É possível que, não sendo a carga muito pesada, ainda no estado de desencarnados possamos dela livrar-nos, por um vigoroso e persistente esforço da vontade. O regular, porém, o que por via de regra acontece, é termos que reencarnar na Terra, algumas ou muitas vezes, para, experimentando o mal que fizemos aos outros, padecermos, sofrendo com aquilo que antes nos deu ilícito prazer, e nos irmos corrigindo e depurando.

Neste processo de depuração, mais ou menos doloroso, mais ou menos prolongado, conforme as imperfeições a corrigir e a força de vontade empregada, consiste o inferno aceito e reconhecido pelos espíritas, o qual, por não ser eterno, mas transitório, condicionado ás circunstâncias de cada caso e consentâneo com a bondade e sabedoria do Criador e com as esperanças da criatura, é tomado mais a sério, concorrendo muitíssimo mais para a regeneração da humanidade do que o temor absurdo das penas eternas.


terça-feira, 25 de julho de 2017

Saibamos ser Espíritas


Saibamos ser espíritas
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Fevereiro 1942

Procurar conhecer-se a si mesmo, com a preocupação constante, quotidiana, de corrigir os próprios defeitos, constitui o dever precípuo de todo verdadeiro espirita.

De que serve ao crente conhecer a fundo a doutrina e observar teórica e exteriormente os seus ensinamentos, se, no que diz respeito a alma, ao próprio eu, não faz esforço por melhorar-se, para dar a demonstração de que o Espiritismo não é como a figueira estéril do Evangelho, mas, sim, árvore fecunda e frondosa, que dá bom fruto e acolhedora sombra?

Não pretenda ninguém ser perfeito, sob pena de se lhe turvar a visão - porque a perfeição, neste mundo, como o motu-contínuo e a pedra filosofal, ainda não houve quem a alcançasse. Pela terra, um único Espírito perfeito já passou: o de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Muito já faz quem mantiver o propósito sincero e diuturno de melhorar-se, observando e corrigindo as próprias imperfeições, perdoando, fazendo por esquecer as faltas que provêm das imperfeições alheias. E. para não fraquejarmos, não nos sujeitarmos a falir, neste meritório intento, devemos apelar sempre para a humildade, sem jamais esquecermos a sábia e salutar recomendação do Mestre: - Orai e vigiai para não cairdes em tentação!

Se, quando o procedimento alheio nos causasse ofensa ou prejuízo, quer direta, quer indiretamente, antes de irrogarmos ao nosso irmão censuras e recriminações, de levantarmos a voz para o acusar, nos detivéssemos um momento a raciocinar e, atentando nas imperfeições do nosso ser, nos puséssemos um momento na posição do que cometeu a falta, no mesmo grau de adiantamento moral ou intelectual em que ele se encontra, haveríamos de ver que, na maioria dos casos, a revolta se transformaria em compaixão e a acusação nos inspiraria uma prece em benefício daquele que faliu por ignorância ou por fraqueza.

Se este é o critério aconselhável no cultivo das relações mundanas, muito mais será de observar-se nas coisas que dizem respeito propriamente ao Espiritismo.

Não podemos, por isso, concordar com alguns confrades que, animados, aliás, de boas intenções, entendem que se deve hostilizar a todos aqueles que praticam as diversas modalidades do baixo, ou, melhor, do falso espiritismo, vigiando-os e denunciando-os à polícia, sob à alegação de que desacreditam o verdadeiro Espiritismo. Discordamos deste modo de pensar, porque temos como certo que a missão dos espíritas não é acusar, nem delatar, mas aconselhar e moralizar pela exemplificação dos preceitos evangélicos, sem jamais recorrer aos métodos coercitivos da violência e do escândalo.

Não julgueis para não serdes julgados - disse Jesus.

E qual será o mais culpado - aquele que por ignorante (que outro qualificativo se não pode dar) pratica a feitiçaria, a macumba, etc., sob o rótulo de Espiritismo, ou o que, tendo-se por conhecedor da verdadeira doutrina e da moral evangélica, não faz o que nelas se ensina, isto é, perdoar para ser perdoado, não fazer ao próximo o que não quereria que lhe fizessem?

A resposta não é difícil... Mais censurável é aquele que, tendo o caminho iluminado à sua frente, dele se desvia, do que o que pouco enxerga e se precipita no lodaçal.

Encarada assim a questão, sob o justo critério da relatividade, cuidemos em que não nos caiba a increpação de Jesus aos fariseus, que viam o argueiro no olho do vizinho e não percebiam a trave no próprio olho.

Não há, a nosso ver, o menor perigo para o Espiritismo legitimo - que não é obra dos homens, e sim dos invisíveis mensageiros do Senhor - de ser prejudicado pelo falso espiritismo porque a verdade jamais se podem confundir com a impostura, assim como o azeite se não contunde com o vinagre. Bem saberão extremar um do outro as pessoas sensatas, esclarecidas e criteriosas, cujo juízo tão somente nos deve preocupar - porque o das de má fé, das de cérebro entenebrecido pelas teias de aranha dos prejuízos e preconceitos, não devemos recear, nem dele cogitar.

O nosso pensamento sobre o assunto é este: - Tenha cada espírita o firme e constante propósito de corrigir as próprias imperfeições, procurando ser bom e justo, para combater, pelo conselho e pelo exemplo, o erro e a ignorância, dentro do âmbito arejado da caridade e da tolerância, sem julgar necessário recorrer aos meios compulsórios da repressão oficial.

Foi recorrendo a esses meios que começaram aqueles que chegaram, na Idade Média, a criar, de conivência com os poderes temporais, os tribunais do Santo Oficio, a acender as fogueiras da lnquisição - como se, para demandar as coisas de Deus fosse mister apelar para a espada de Cesar.

Saibamos, pois, ser rigorosos para com os nossos próprios defeitos e tolerantes para com as faltas alheias.

                     Só assim seremos dignos de nos dizermos espíritas.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

A Verdade nos libertará...


A Verdade nos Libertará
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Agosto 1955

            Para o espírita cônscio dos deveres que tem de cumprir, e da grandiosidade do destino que o espera, todos os esforços e preocupações devem tender a um fim último e primordial - a conquista da verdade.

            Jesus disse: "Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará."

            A verdade, porém, para nós habitantes da Terra, míseros calcetas dum mundo de imperfeições é assaz rudimentar e precária. Está condicionada ao grau de evolução mental de cada um de nós.

            O que parece verdade para uma criatura humana, rústica e boçal, já não o é para o civilizado. É o que pode ser considerado como tal para um civilizado comum, já deixou de ser para o intelectual que perquire, estuda e raciocina.

            Para cada indivíduo, como para cada geração, muitas coisas que ontem foram tidas por verdade, hoje já não o são - e muita verdade de hoje, não o será amanhã.

            O Universo, para os nossos antepassados não muito remotos, se circunscrevia à face do planeta na qual viviam, no chão que pisavam, com o mar, o céu a lua e as estrelas. Essa era para eles, há quatrocentos anos, a verdade em relação à Terra, que tinham por achatada e fixa, e no alto, sob a abóboda celeste, o Sol descrevia diariamente o seu giro circular.

            E quando o sábio matemático Galileu, no princípio do século décimo sétimo,  confirmando e ampliando a teoria de Copérnico, com dados seguros extraídos de seus estudos e investigações científicas, revelou ao mundo que a Terra é redonda, gira sobre si mesma e se move em torno do Sol, foi, pelos julgadores infalíveis da época, obrigado a abjurar de joelhos, na avançada idade de setenta anos, essa verdade hoje corrente e incontestável, classificada por eles de heresia, sob pena de ser queimado vivo nas fogueiras da Inquisição.  

            Em face do exposto, ninguém na Terra se poderá presumir de detentor da verdade absoluta. Quando muito, o será de aspectos fragmentários da verdade, que o habilitem ao título de sábio entre os homens.

            Quem se tenha por senhor absoluto da verdade, neste mundo contingente de aparências e ilusões, seja embora muito instruído, não passará dum pobre pretensioso com fumaças de sábio, a quem o orgulho e o amor-próprio impedem de perceber que, se muito sabe e muito aprendeu, muitíssimo mais lhe falta aprender e saber.

            Há muitos que se presumem de sábios e infalíveis, sem que tenham sequer o conhecimento de verdades elementares, como a da compreensão da existência de Deus e da imortalidade da alma, - conhecimento este que é comum até mesmo entre as criaturas humanas de mentalidade rudimentar.

            Para a Humanidade terrena, por conseguinte, a verdade é sempre incompleta e relativa, mas os espíritas sabemos que a vida não começa com o nascimento e nem termina no túmulo. Outras existências já temos passado na face do Planeta; nele já temos encarnado e desencarnado muitas vezes, e muitas outras vezes havemos de encarnar e desencarnar na sua superfície, para o fim de nos purificarmos e aperfeiçoarmos em espírito. E, depois de chegarmos a um certo grau de adiantamento, passaremos a viver noutro planeta mais evoluído, encarnando em corpos de matéria menos pesada, menos grosseira, para, completado o ciclo de evolução correspondente, passarmos a outro planeta ainda mais avançado em progresso, tomando corpos cada vez mais leves, mais sutis, de acordo com o grau de aperfeiçoamento que tivermos atingido, até alcançar-mos a condição de espírito puro.      

            Sabemos, assim, que, após cada encarnação e correspondente período de vida livre no plano espiritual, mais nos aproximaremos da verdade - da verdade que um dia nos libertará. E isto há de acontecer quando, purificados, deixarmos de ser escravos do pecado, pois Jesus, tendo dito que a verdade nos libertará, respondendo a uma objeção dos fariseus, elucidou: "- Em verdade, em verdade vos digo - todo o que comete pecado é escravo do pecado. O escravo não fica na casa para sempre; o filho é que fica para sempre. Se, pois, o filho vos libertar, sereis realmente livres." (João VIII, vers. 32 a 36.)

            Para Jesus, portanto, o pecado, que é a cegueira da maldade, da ignorância e do fanatismo, é, como a mentira, a antítese da verdade. Mas, dizendo ele que o escravo não fica para sempre na casa, e sim o filho, quis expressar que nem sempre o homem ficará pecador. O filho, ou seja ele próprio, Jesus, ou o seu Evangelho de sabedoria e amor, com o qual se identifica, está sempre na casa, isto é, está sempre presente para aquele que o queira procurar para libertar-se pela luz do conhecimento - pois que, noutra oportunidade, explicou claramente: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”.

            Eis porque o espírita consciente e esclarecido, sabendo embora que a verdade para ele será aqui incompleta e relativa, que jamais a alcançará íntegra e pura sobre a Terra, age sempre, se esforça e luta, no sentido de conquistá-la.

            Sabe que, se não a pode alcançar neste mundo de expiação e provas, onde ainda reinam as paixões e predominam as ilusões da matéria, um dia, depois de passar pela experiência de múltiplas encarnações, aqui e noutros planetas mais evoluídos, há de adquiri-la e tornar-se livre inteiramente da escravidão do pecado.