A Verdade nos
Libertará
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Agosto 1955
Para o espírita cônscio dos deveres
que tem de cumprir, e da grandiosidade do destino que o espera, todos os
esforços e preocupações devem tender a um fim último e primordial - a conquista
da verdade.
Jesus disse: "Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará."
A verdade, porém, para nós
habitantes da Terra, míseros calcetas dum mundo de imperfeições é assaz
rudimentar e precária. Está condicionada ao grau de evolução mental de cada um de
nós.
O que parece verdade para uma
criatura humana, rústica e boçal, já não o é para o civilizado. É o que pode
ser considerado como tal para um civilizado comum, já deixou de ser para o intelectual
que perquire, estuda e raciocina.
Para cada indivíduo, como para cada
geração, muitas coisas que ontem foram tidas por verdade, hoje já não o são - e
muita verdade de hoje, não o será amanhã.
O Universo, para os nossos
antepassados não muito remotos, se circunscrevia à face do planeta na qual
viviam, no chão que pisavam, com o mar, o céu a lua e as estrelas. Essa era
para eles, há quatrocentos anos, a verdade em relação à Terra, que tinham por
achatada e fixa, e no alto, sob a abóboda celeste, o Sol descrevia diariamente
o seu giro circular.
E quando o sábio matemático Galileu,
no princípio do século décimo sétimo, confirmando e ampliando a teoria de Copérnico,
com dados seguros extraídos de seus estudos e investigações científicas,
revelou ao mundo que a Terra é redonda, gira sobre si mesma e se move em torno
do Sol, foi, pelos julgadores infalíveis da época, obrigado a abjurar de
joelhos, na avançada idade de setenta anos, essa verdade hoje corrente e
incontestável, classificada por eles de heresia, sob pena de ser queimado vivo
nas fogueiras da Inquisição.
Em face do exposto, ninguém na Terra
se poderá presumir de detentor da verdade absoluta. Quando muito, o será de
aspectos fragmentários da verdade, que o habilitem ao título de sábio entre os
homens.
Quem se tenha por senhor absoluto da
verdade, neste mundo contingente de aparências e ilusões, seja embora muito
instruído, não passará dum pobre pretensioso com fumaças de sábio, a quem o
orgulho e o amor-próprio impedem de perceber que, se muito sabe e muito
aprendeu, muitíssimo mais lhe falta aprender e saber.
Há muitos que se presumem de sábios
e infalíveis, sem que tenham sequer o conhecimento de verdades elementares,
como a da compreensão da existência de Deus e da imortalidade da alma, -
conhecimento este que é comum até mesmo entre as criaturas humanas de
mentalidade rudimentar.
Para a Humanidade terrena, por
conseguinte, a verdade é sempre incompleta e relativa, mas os espíritas sabemos
que a vida não começa com o nascimento e nem termina no túmulo. Outras
existências já temos passado na face do Planeta; nele já temos encarnado e
desencarnado muitas vezes, e muitas outras vezes havemos de encarnar e
desencarnar na sua superfície, para o fim de nos purificarmos e aperfeiçoarmos
em espírito. E, depois de chegarmos a um certo grau de adiantamento, passaremos
a viver noutro planeta mais evoluído, encarnando em corpos de matéria menos
pesada, menos grosseira, para, completado o ciclo de evolução correspondente, passarmos
a outro planeta ainda mais avançado em progresso, tomando corpos cada vez mais
leves, mais sutis, de acordo com o grau de aperfeiçoamento que tivermos
atingido, até alcançar-mos a condição de espírito puro.
Sabemos, assim, que, após cada
encarnação e correspondente período de vida livre no plano espiritual, mais nos
aproximaremos da verdade - da verdade que um dia nos libertará. E isto há de
acontecer quando, purificados, deixarmos de ser escravos do pecado, pois Jesus,
tendo dito que a verdade nos libertará, respondendo a uma objeção dos fariseus,
elucidou: "- Em verdade, em verdade
vos digo - todo o que comete pecado é escravo do pecado. O escravo não fica na
casa para sempre; o filho é que fica para sempre. Se, pois, o filho vos
libertar, sereis realmente livres." (João VIII, vers. 32 a 36.)
Para Jesus, portanto, o pecado, que
é a cegueira da maldade, da ignorância e do fanatismo, é, como a mentira, a
antítese da verdade. Mas, dizendo ele que o escravo não fica para sempre na
casa, e sim o filho, quis expressar que nem sempre o homem ficará pecador. O
filho, ou seja ele próprio, Jesus, ou o seu Evangelho de sabedoria e amor, com
o qual se identifica, está sempre na casa, isto é, está sempre presente para
aquele que o queira procurar para libertar-se pela luz do conhecimento - pois
que, noutra oportunidade, explicou claramente: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”.
Eis porque o espírita consciente e
esclarecido, sabendo embora que a verdade para ele será aqui incompleta e
relativa, que jamais a alcançará íntegra e pura sobre a Terra, age sempre, se
esforça e luta, no sentido de conquistá-la.
Sabe que, se não a pode alcançar
neste mundo de expiação e provas, onde ainda reinam as paixões e predominam as
ilusões da matéria, um dia, depois de passar pela experiência de múltiplas
encarnações, aqui e noutros planetas mais evoluídos, há de adquiri-la e
tornar-se livre inteiramente da escravidão do pecado.
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