A
Deus e a César
Editorial
de Reformador (FEB) Nov Dez 1974
Pelo
menos alguma coisa diferente da craveira comum os espíritas são chamados a
fazer na Terra, numa demonstração mínima de que o Evangelho, entendido em
espírito e verdade, é apelo para que ele entranhe em si a noção precisa de que
é um Espírito encarnado, valendo-se temporariamente dos bens materiais e
transitórios com o precípuo objetivo de incorporar definitivamente em seu
patrimônio íntimo os bens eternos e imperecíveis.
A
posição acomodatícia do meio termo não resolve a questão, como aquela dos que
se escudam na lição evangélica do “dai a César o que é de César, e a Deus o que
é de Deus”, para justificar o desfrute das posições de relevo no mundo sem
detrimento do gozo das coisas celestiais. Meditado à luz dos esclarecimentos da
Doutrina Espírita, esse mandamento faz apenas perceber que o homem deve atender
com diligência as exigências que fazem parte, normalmente, do programa de
reabilitação espiritual que o traz ao palco do mundo. Mas, atender não quer
dizer entregar-se, nem muito menos disputar. A palavra do Evangelho deve levar
ao desprendimento das coisas terrenas, a entendê-las como meios abençoados para
alcançar os fins implícitos na imortalidade. Ninguém pode servir a dois
senhores, ou porque aborrecerá a um e amará a outro, ou porque se devotará a um
e desprezará o outro; isto é, ninguém pode servir a Deus e às riquezas, ao
mesmo tempo. Ou serve a Deus, ou serve a César.
Tais
reflexões se apresentam muito oportunas nesta hora em que o país realiza mais
uma etapa inerente ao processo de governança das coisas de César, visto que o
espírita, atento ao mandamento evangélico, há que desincumbir-se prudentemente
não só dos direitos como das obrigações que a condição de cidadão lhe confere,
buscando concorrer na escolha daqueles que se mostrem os mais dignos a
exercerem os mandatos eletivos no país. Porém, atento igualmente à recomendação
de não servir às riquezas, há de abster-se de crer que sua profissão de fé se
constitua em título honorífico para candidatar-se a semelhantes postos, e de pensar que o
exercício de cargos de mando sejam galardões para a Doutrina.
Os
mentores espirituais tem sido de clareza meridiana, quando dizem que trocar a
missão da Doutrina “por um lugar no
banquete dos Estados é inverter o valor dos ensinos, porque todas as
organizações humanas são passageiras”. Não é que ao espírita esteja vedado
assumir responsabilidades nas administrações transitórias do mundo; porém, ele
não deverá perder de vista que a realização definitiva e real somente se
processa dentro dos padrões do Evangelho e, portanto, “não deve provocar uma situação de evidência para si mesmo”. Desse
modo, quando alçado a ela, por “força das
circunstâncias, deve aceitá-la como provação imperiosa e árdua, onde todo êxito
é sempre difícil.”
Não é difícil concordar com essas ponderações,
pois realmente o Espiritismo não veio para dotar seus profitentes de
habilitações que lhes facultem o senhorio do mundo, mas sim “para vencerem o
mundo”. E se se inflamarem da pretensão de consertar o mundo, mais imperioso se
torna recordar que a missão da Doutrina é consolar e instruir, ensejando a
iluminação das consciências.
Jamais
a política do mundo contribuiu para a iluminação de qualquer consciência, nem o
Espiritismo veio forjar “políticos
espíritas”. Ao revés, o que é necessário é a formação de “espíritas políticos”, capazes de porem em
função a política de Deus...
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