Pesquisar este blog

quinta-feira, 11 de julho de 2013

1º centenário de 'O Livro dos Médiuns'





1º Centenário de
 ‘O Livro dos Médiuns’
por Ismael Gomes Braga
Reformador Jan 1961

            Em Abril de 1957 festejamos respeitosamente o primeiro centenário do aparecimento de "O Livro dos Espíritos", que foi o início da Codificação do Espiritismo, por Allan Kardec; mas a Codificação não ficou completa com aquele primeiro livro que tratou da parte filosófica da Doutrina, porque o mestre, em prosseguimento, demonstrou que o Espiritismo tem de ser encarado sob três aspectos: científico, filosófico e religioso, e sobre cada um desses aspectos publicou ele um livro básico, além de muitos outros trabalhos complementares em forma de livros e de artigos em "Revue Spirite".

            Na primeira quinzena de Janeiro de 1861, mais provavelmente entre os dias 5 e 10, apareceu em Paris, impresso pelos livreiros-editores Srs. Didier & Cia., "O Livro dos Médiuns", cujo primeiro centenário estamos hoje comemorando. No frontispício da obra, Allan Kardec declarou "... pour faire suite au Livre des Esprits", e no parágrafo 35 nº 4 repetiu que o livro é complemento de "O Livro dos Espíritos".

            Veio ele substituir um outro bem menos extenso, também de Allan Kardec, publicado em 1858 sob o título de "Instruction pratique sur les manifestations spirites", trabalho este então esgotado e que, segundo palavras do próprio Autor, não mais seria reimpresso.

            Apresentando "O Livro. dos Médiuns" ao público, o mestre lionês assim se referiu, na "Revue Spirite" de 1861, págs. 6 e 7, a esta nova obra da Codificação:

            "Procuramos, neste trabalho, fruto de longa experiência e de laboriosos estudos, esclarecer todas as questões que se relacionam com a prática das manifestações; ele contém, de acordo com os Espíritos, a explicação teórica dos diversos fenômenos e das condições em que eles se podem produzir; mas a parte concernente ao desenvolvimento e ao exercício da mediunidade foi, sobretudo, de nossa parte, objeto de atenção toda especial.
            "O Espiritismo experimental está cercado de muito mais dificuldades do que se acredita geralmente, e os escolhos aí encontrados são numerosos, traduzindo-se em decepções inúmeras para os que dele se ocupam sem possuir a experiência e os conhecimentos necessários. O nosso objetivo foi acautelar contra tais escolhos, nem sempre isentos de consequências desfavoráveis para quem quer que se aventure, com imprudência, por esse novo terreno. Não podíamos descurar um ponto tão capital, e o tratamos com um cuidado igual à sua importância."

            Tal como acontecera com "O Livro dos Espíritos", importantes alterações para melhor foram introduzidas na segunda edição de "O Livro dos Médiuns", muito mais completa do que a primeira, e dada a lume em Outubro de 1861. É o próprio Codificador que na "Introdução" esclarece o assunto, com riqueza de detalhes, ressaltando a significativa participação dos Espíritos no trabalho de ampliação e revisão geral da obra. Também na Revue Spirite de 1861, págs. 361-2, esclarecimentos semelhantes saíram estampados.

            Segundo declarou Kardec, a segunda edição de "O Livro dos Médiuns" foi a definitiva, como definitiva se tornou a segunda edição de "O Livro dos Espíritos", após ser inteiramente refundido e consideravelmente aumentado.

            Quanto à parte religiosa ou moral, preparou Kardec a "Imitação do Evangelho segundo o Espiritismo", que foi publicada em Abril de 1864.  Revista, ampliada e modificada na segunda edição, inclusive no título.. é este até hoje o livro espírita mais estudado no Brasil.
           
            A filosofia é durável, pouco se altera com o decorrer do tempo; a religião do Espiritismo é a moral ideal do Evangelho, universal e eterna; mas a ciência em geral é muito mutável, porque os conhecimentos se dilatam sempre, corrigindo coisas que pareciam certas em outro tempo e descobrindo novas leis na Natureza.

            Seria muito natural que, depois de um século de sua publicação, "O Livro dos Médiuns" fosse uma peça para o Museu Histórico de velharias imprestáveis como tantas outras coisas.

            Assim pensando, relemos agora, com a máxima atenção, a 11ª edição francesa (1869), procurando o que pudesse ser tido como revogado pelas descobertas destes cem anos mais recentes; mas não encontramos realmente coisa alguma que se possa qualificar de obsoleta. Ajustamentos complementares poderiam ser feitos em determinadas questões, o que é perfeitamente natural e compreensível. Notamos apenas que algumas palavras propostas como termos técnicos não entraram para o uso geral. São elas "Médiumat" (missão providencial dos médiuns); "Pneumatographie" ( escrita direta); "Pneumatophonie(voz direta); "Sématologie” (comunicação dos Espíritos pelo movimento de corpos inertes); "Stéréotite" (qualidade das aparições tangíveis).

            No número 223 § 15, há um ponto que mereceria ampliado: - diz que os Espíritos se comunicam uns com os outros pela linguagem do pensamento, sem palavras. Isso é verdade entre os Espíritos superiores, já completamente libertos das encarnações planetárias, mas nas esferas próximas da Terra os Espíritos sofrem as limitações da palavra e até das barreiras linguísticas que tanto prejudicam os povos. O ensino não está errado, mas incompleto, e foi completado pelos fenômenos de xenoglossia e por numerosas comunicações recentes.

            É pasmoso que os fenômenos observados durante um século nada tenham invalidado em "O Livro dos Médiuns".

            No nº 301, as perguntas 8 e 9 tratam da reencarnação e as respostas são perfeitamente atuais. Só agora as muralhas de preconceitos anglo-saxônicos contra a reencarnação começaram a desmoronar-se e esse desmoronamento coincide com o fim do regime colonial que dominava os povos de Ásia e África, considerados inferiores pelos europeus. O racismo entrou em declínio em 1939 e com ele vão caindo muitos preconceitos infelizes. O mundo está-se transformando. Começa a surgir maior respeito pela criatura humana, sem distinção de raças e cores.

            Para nós espíritas nada existe a alterar-se em "O Livro dos Médiuns"; está perfeitamente em dia. O máximo que eu faria, se tivesse que traduzi-lo hoje, seria acrescentar um pé-de-página de duas linhas, dizendo que a transmissão direta do pensamento ainda não é conquista da nossa esfera espiritual, quer estejamos encarnados ou desencarnados; só existe em esferas mais altas do que a nossa. Cá por baixo ainda precisamos da linguagem articulada.

            Para a Ciência oficial materialista, porém, tudo é diferente!

            A princípio negou ela todos os fenômenos espíritas como inexistentes. Só a pouco e pouco foi reconhecendo a existência de alguns fenômenos e tentando explicá-los sem a intervenção dos Espíritos. Fundaram a Metapsíquica, que tomou também o nome de Parapsicologia, e vão timidamente caminhando para descobrir o que para nós já é velho e muito sabido.

            O nosso estudioso confrade Sr. Hermínio de Miranda tem-se dado ao trabalho muito louvável de lhes acompanhar os passos lentos e nos informar pelas colunas de "Reformador" sobre a caminhada penosa que eles vêm fazendo nestes cem anos decorridos. Observando-se as "descobertas" que vão realizando os Srs. parapsicologistas, não podemos ter dúvidas de que estão no rumo certo para descobrirem, dentro de mais um ou dois séculos, "O Livro dos Médiuns".

            Um ensinamento muito precioso de Allan Kardec se acha no nº 19. Diz que os fenômenos espíritas não são os que convencem o materialista; que tais fenômenos só convencem o espiritualista. Ao materialista cumpre demonstrar primeiramente que há nele alguma coisa que escapa às leis da matéria, há uma alma. Só depois de compreender que tem uma alma, tornando-se, portanto, espiritualista, é que poderá o materialista aceitar os fenômenos espíritas e tornar-se um espírita.

            Nessa mesma ordem de ideias temos feito uma observação que nos parece curiosa como estudo de psicologia humana. Temos notado que certas pessoas têm mais facilidade em aceitar a reencarnação do que as provas espíritas da sobrevivência. Conhecem pouco os fenômenos mediúnicos claros, indiscutíveis. Tudo que já viram lhes parece duvidoso, sujeito à imitação; mas as provas da reencarnação lhes parecem decisivas. A diversidade de pendores inatos, de talentos, de caráter na criança, a ciência infusa, as simpatias e antipatias inexplicáveis, as grandes vocações, as crianças-prodígio, suas próprias capacidades e gostos, esse infinito de observações lhes criaram uma predisposição para aceitarem a reencarnação como lei natural necessária, e, quando encontram as provas, não hesitam: aceitam como demonstrada a reencarnação. Parece-nos que já possuíam a intuição das vidas anteriores.

            Nos estudos da Parapsicologia os nossos cientistas ocidentais ainda abrem mão de tudo que já conhecem há milênios os povos orientais, inclusive a reencarnação e a telepatia. Lutam para descobrir de novo verdades milenárias, das quais Allan Kardec, superiormente guiado pelos Espíritos, pode apropriar-se rapidamente em nosso benefício.

            Os livros de Allan Kardec estão alguns séculos adiantados em relação aos estudos dos parapsicólogos, e estabelecem preciosa ligação entre o pensamento ocidental e o oriental, rumo a uma unidade geral que se está processando em nosso tempo.

            Tudo caminha para a unidade em nossos dias e a Religião não poderá ficar encarcerada entre muralhas sectaristas de um passado obscurantista e desumano, com privilégios odiosos e dogmas exclusivistas.

            O simples fato de nada termos a alterar em "O Livro dos Médiuns", depois de decorrido um século que transformou tudo no mundo, demonstra que o Espiritismo é uma Revelação Divina, capaz de vencer os milênios, e não uma criação humana sujeita a frequentes reformas no tempo.

            Podemos, ainda hoje, repetir as palavras que Henri Sausse, o grande biógrafo de Allan Kardec, proferiu, há cerca de meio século, sobre esse vade-mécum do Espiritismo experimental:

            "Nada apareceu de melhor depois, e os autores que esfloraram o mesmo assunto não fizeram senão seguir as grandes linhas dessa magistral obra."

            O Espiritismo permanece firme como uma rocha, perfeitamente integrado nos tempos modernos; mas temos muito que reformar em nós mesmos para nos ajustarmos à sua severa moral de fraternidade universal e de ventura para todos, para encarnados e desencarnados. Tem sido esta a campanha de nossos Guias, de nossos livros e jornais, de nossas sociedades, de nossos pregadores, durante o século decorrido. O Espiritismo está certo, mas nós, os homens, ainda não.


Nenhum comentário:

Postar um comentário