a.
“Dos Princípios Incontroversos
às
Hipóteses Plausíveis”
Princípios
Incontroversos
Tem o homem por hábito firmar
doutrinas onde há apenas cabimento para hipóteses mais ou menos plausíveis.
Uma certa parte da bibliografia
espírita, fugindo, aliás, ao critério adotado por Allan Kardec, cognominado o
"bom senso encarnado", não podia, por isso que é de origem humana,
fugir a esse defeito que só o tempo, com o seu contingente precioso de experiência,
pode trazer aos que não se contentam com a satisfação dos seus pontos de vista,
mas reconhecem imparcialmente que o homem não tem um estalão segundo o qual
possa julgar das coisas divinas - assim consideradas aquelas que transcendem ao
plano das formas, isto é, do que se acha na dependência apenas da matéria, para
cujo estudo se constituíram, por sedimentação lenta e laboriosa de
contribuições multifárias da inteligência, as ciências que fazem o orgulho da civilização
hodierna, de cunho positivamente materialista e que devem constituir o alicerce
sobre o qual edificarão as gerações futuras, não mais um templo às vanglórias
humanas, mas o grande templo da Fraternidade pelo esclarecimento dos espíritos,
graças ao influxo da Religião.
Nenhuma destas ciências, afirmou-o
nobremente Allan Kardec, como aviso amistoso aos espíritas, dá aos cientistas
autoridade para entenderem das coisas de que trata o Espiritismo, pois que,
textualmente (Livro dos Espíritos, 17ª edição em português, pag. 27,
Introdução), “as ciências ordinárias assentam nas propriedades da matéria, que se pode
experimentar e manipular livremente: ao passo que os fenômenos espíritas
repousam na ação de inteligências dotadas de vontade própria e que nos provam a
cada instante não se acharem subordinadas aos
nossos caprichos."
O conceito, parecendo ser, à
primeira vista, restrito à distinção que se deve fazer nos métodos a seguir
para o estudo de uma e de outra destas modalidades do saber, encerra,
entretanto, sentido mais profundo, por significar que o saber humano não está
em condições de firmar princípios no que concerne às coisas pertinentes às
faculdades do Espirito, que nenhuma similitude tem com as propriedades da
matéria.
Da confusão estabelecida, à força de
se querer aplicar os mesmos processos no estudo de fenômenos tão diferentes em
sua origem e em sua natureza, é que resultam os erros e as verdadeiras
monstruosidades que se tem escrito a respeito das manifestações espirituais que constituem
objeto da Psicologia, no sentido espírita do termo em cujos domínios apenas constatamos fatos, em regra,
porque não estamos ainda em condições de explicar a maior parte deles.
Esse é o terreno em que só podemos
guiar-nos pelo roteiro da Fé, sentimento que constitui apanágio das almas
humildes, cônscias da distância que as separa dos Espíritos Puros, da infinita
distancia que as separa de Deus.
Tentar a pesquisa nos domínios do
Espírito com os nossos instrumentos de investigação científica, é cair em erros
parecidos com os que têm sido perpetrados por causa do critério antropomórfico,
segundo o qual as seitas ditas religiosas atribuíram a Deus modos de ver, de julgar,
idênticos aos da precária e deficientíssima consciência humana, dando origem a dogmas
como o das penas eternas e tantos outros que rebaixaram o Criador ao nível das
mais sanguinárias e cruéis paixões observadas entre os homens.
Isto posto, tentaremos dar um rápido
balanço na marcha evolutiva do espirito humano, rumo à conquista da sua
liberdade, da sua redenção do cativeiro das atrações planetárias inferiores,
traçando um esquema que nos possa dar, em linhas gerais, uma ideia dos
progressos realizados, nestes últimos 3 quartos de século, graças ao advento do
Espiritismo.
Nesse domínio, se compulsarmos o quadro das ciências,
verificaremos que o mais alto resultado à que chegou a inteligência foi o
reconhecimento da unidade da substância, cujas Infinitas modalidades, quer cósmicas,
quer inerentes à Natureza terrena, são devidas a um princípio
cuja origem é desconhecida (para a Ciência Oficial), princípio a que deram os sábios
o nome de Energia - do grego energeia,
força, potência - esse algo que se move, a que alude Einstein, quando afirmou
que "todas as ciências se reduzem à física e a física se pode reduzir
agora a uma só fórmula que, traduzida em linguagem vulgar, diria pouco mais ou
menos assim:
"Algo se move". Estas três
palavras são a síntese última do pensamento humano" (V. ‘Metapsíquica e Espiritismo’ do coronel
Barros Fournier, opúsculo editado em 1934 - Rio de Janeiro).
Enquanto a ciência, adstrita aos seus
métodos rotineiros, estarrecida em face desse quid misterioso que engendra a Vida, confina-se ao mundo da
matéria, a Revelação Nova, apropriando-se de tudo que ela, a ciência, acumulou
de útil e de belo, comunica um influxo mais elevado à inteligência e,
libertando-a de dogmatismos, oferece-lhe essas duas grandes asas do saber e do
sentimento, para que alcandorar-se possa ao mundo do Espírito, ao plano das
causas, onde se encontra a chave para decifrar o grande enigma da Vida.
Excelsior!
Mais alto! Cada vez mais para o alto!
Temos, destarte, o quadro mais amplo
do Espiritismo, constituído, à luz de princípios incontroversos, da seguinte
forma:
a) - Reconhecimento, pela Fé
raciocinada e humilde, da existência de Deus. Criador de tudo que existe e cujo
Amor vivifica o Universo.
Se o Pai nos foi revelado por Jesus
que assentou as bases da Religião, isto é, se essa revelação se apoia na Fé,
não menos certo é que ela mais se confirma pelo raciocínio, quanto mais é o
entendimento iluminado pela cultura científica, desprendida de orgulhosos
preconceitos. De fato, o bom senso psicológico leva-nos a formular o seguinte
raciocínio: Nada existe sem causa. Um efeito inteligente não pode deixar de
revelar-nos uma causa inteligente. Ora, o Universo, em cuja estrutura se revela
tanta sabedoria, é efeito de uma causa inteligente infinitamente
superior à do homem. Logo, ele foi organizado por um Ser cuja inteligência é
incomparável, infinitamente superior à do homem. Ao Ser Onipotente, revelado
também, assim, pelo raciocínio, em confirmação ao que antes nos fora revelado
por Jesus, é que chamamos Deus, amando-O com filial amor, adorando-O em sua
absoluta perfeição. Da Paternidade Divina decorre a nossa condição de filhos,
criados por Deus e destinados à felicidade suprema a que atingiremos, porque somos
perfectíveis e temos de elevar-nos um dia até o seio do Pai, como Jesus já se
elevou, para lhe fazer a divina Vontade, que é o Amor em ação.
b) - Reconhecimento objetivo, a que
se chegou mediante experiências concludentes e observações laboriosas
(investigações realizadas nos domínios do hipnotismo e do sonambulismo, materializações
de espíritos, psicografia, etc.) da sobrevivência do Espírito à destruição do
corpo físico, ou imortalidade da alma, subjetivamente aceita pelas doutrinas
religiosas. Demonstra a Revelação Nova que o Espírito, após o fenômeno da
morte, como vulgarmente se chama a passagem do ser para o outro lado da vida,
conserva um envoltório material,
de natureza fluídica, etéreo - o perispírito - cuja extrema sutileza permite ao
Espirito muito maior amplitude de ação, facilidades de locomoção inimagináveis
pelo homem terreno, faculdades superiores de discernimento, rememoração,
percepção intelectual, etc., tudo em correlação com o grau de aperfeiçoamento
individual.
c) - Possibilidade de comunicação do
Espírito desencarnado (revestido apenas do seu corpo perispiritual) com os
encarnados (revestidos ainda do corpo físico), isto é, comunicação entre vivos
e mortos, para nos expressarmos de conformidade com a linguagem vulgar.
d) - Constatação, documentada
exaustivamente por fatos de mediunismo e hipnotismo, da doutrina da
reencarnação do Espírito, objetivando o seu constante aperfeiçoamento.
e) - Reconhecimento do princípio
insofismável da responsabilidade individual, firmado na eterna moral do
Evangelho, que nos foi ensinada por Jesus e a que o Consolador trouxe um acervo
enorme e preciosíssimo de confirmações, revelando-nos coisas que antes do
Espiritismo não se sabiam, dando-nos a razão de ser da desigualdade das
situações sociais, mostrando-nos a divina Justiça em ação em todas as dores e
alegrias de que se rodeiam as existências humanas.
*
* *
São essas, postas em evidência pelo
esquema supra, as grandes conquistas do espírito humano, na última fase deste
ciclo, prestes a encerrar-se, da civilização que teve início com a vinda, a
este mundo, de Jesus Nazareno. Destarte fecha-se o 2° milênio com o cumprimento
das promessas do Cristo de que, em seu devido tempo, enviar-nos-ia o Consolador,
para ensinar-nos muitas coisas que Ele não tinha podido dizer, pela
impossibilidade de serem compreendidas ao seu tempo.
O fermento da Verdade evangélica
está, portanto, na Terra, graças à aceitação dos princípios espíritas por um
pequeno número de servos humildes do Divino Messias. E no limiar do 3° milênio
já se pode vislumbrar a Humanidade do futuro, iluminada pela grande luz que desce
do céu, aplicada ao trabalho pacifico e fecundo do aperfeiçoamento das almas,
para que, constituindo todos os homens um só rebanho com um só Pastor, possa
estabelecer-se também na Terra, o anunciado Reino de Deus.
Essa gloriosa etapa assinalará o
glorioso marco do congraçamento da Ciência com a Religião, graças à aceitação
universal do Espiritismo. Com a paz advinda, uma diminuição enorme do gasto das
energias espirituais em penosos e inúteis labores, como os da preparação para a
guerra e outros que lhe são conexos, e um correspondente acréscimo da
capacidade de estudo das leis que regem o mundo físico, como daquelas que regem
o mundo espiritual. Talvez então seja dado ao saber humano levantar o véu
perispiritual que ainda nos encobre a divina Psique, para que possamos vê-la em
toda a sua esplendente verdade, para o que precisamos ter o pensamento
despojado de impurezas, a alma inocente e límpida como a quer Jesus.
Saberemos, então, que, pertencendo
ao Espirito todos os poderes outorgados por Deus ao homem, são-lhe inerentes as
faculdades mediante as quais aqueles poderes se exercem, e que todos os
revestimentos com que o Espirito se apresenta no curso de sua evolução - Corpos
físico ou perispiritual, de matéria grosseira ou quintessenciada - são
condições necessárias ao ser ainda pouco evoluído (e neste caso se acha o homem
terreno) para que possa compreender e sentir a vida, dada a pouca amplitude de
que dispõem as suas faculdades, no estágio inferior de progresso espiritual em
que ainda nos encontramos.
Chegaremos um dia a ser Espíritos! Sim, puros Espíritos, como
Jesus, para livremente dirigirmos (sem lhes sofrer, como agora, as reações, ao
que nos obriga a nossa imperfeição) a energia e a substância, na elaboração das
formas materiais transitórias dos mundos e dos organismos vivos que eles
encerram e pelos quais transitam todas as almas criadas por Deus até um certo
ponto de sua ascensão espiritual que prosseguirá em seguida noutras paragens do
Infinito, inacessíveis ainda ao pensamento do homem, mas a que Jesus
veladamente se referiu
nas exortações aos seus discípulos.
Isto que aí fica é o que sabemos de
positivo - e já é muito, pelo menos já é o suficiente para que a sociedade
humana possa ser organizada segundo os imperativos da evolução espiritual
eterna e não apenas conforme as solicitações do bem estar e do egoísmo dos homens.
Esta a maior glória do século XX, o
triunfo insofismável do Cristo sobre o mundo, de sua doutrina de amor sobre o
materialismo odioso e insensato.
O 3° milênio assistirá á descida à
Terra de veros discípulos de Jesus para que o Mestre os possa encaminhar, sem
mais receios daquelas revoltas contra os seus desígnios superiores. que por
vezes criaram entraves a esses desígnios que se acham inscritos nos Evangelhos, base
invulnerável do Cristianismo.
Não mais, então, será penitenciária
a nossa pobre Terra, mas sim Escola!
por Arnaldo S. Thiago
Conferência realizada em 1º de
dezembro de 1940
no Centro Espirita "Discípulos
de Samuel"
in “Ao Serviço do Mestre” (Ed. FEB 1942)
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