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domingo, 16 de junho de 2013

Aos ministros da igreja



7
‘Rimas do Além Túmulo’
Versos Mediúnicos de
 Guerra Junqueiro

Grupo Espírita Roustaing
Belém do Pará 1929

Casa Editora Guajarina


Aos Ministros da Igreja

Eu não venho magoar as almas dedicadas,
que inda guardam no peito as flores do Passado,
embora sem perfume e um tanto deformadas,
por terem-nas assim, tanto tempo, encerrado,
sem receber os raios do astro que se chama
Razão e que desfaz o Erro e o Temor,
nascidos do veneno Mentira em derrama
nos brandos corações dos que creem com ardor.

Ó almas, como vós, eu também consagrava
um afeto sincero à crença de meus pais;
mas, um dia, a montanha, que eu idolatrava,
tombou por terra e não pude elevar-se mais.
É que meu pensamento, a girar incansável,
costumava abranger, com seu arguto olhar,
a base principal da Fé inabalável,
Penetrando a Doutrina em modo singular.

Mas, oh! nunca julgueis que o ente que vos fala
tenha sido na Terra um descrente, um ateu
(quando a crença é robusta, nada a alue, abala;
nas não perdurará, se do Erro nasceu)
Eu sempre acreditei num Deus consolador,
que tinha para o crime um gesto de perdão
e que amparava a infância, com divino Amor,
acalmando a tortura a todo coração.

Afagando ideal mais reto e mais brilhante,
eu senti dentro d'alma a Análise feroz
revoltar-se, brandir, impávida, triunfante,
contra os erros do Clero, o azorrague atroz.

Por isso, entrelacei em rimas corruscantes
a Evidência, que vinha, intrépida, mostrar
que desfazer podia, em rápidos instantes,
a montanha dos erros que estava a enterrar,
a consciência humana em treva e no monturo,
como um verme que teme a luz do Sol radiante;
sufocar, para sempre, esse Passado obscuro,
p'ra não enodoar o Porvir cintilante,

Mas, quando, na velhice, nublava o viver
o véu da enfermidade, eu muito padeci;
pressentindo o momento em que ia adormecer
na campa, deplorava aquilo que escrevi.
Eu queria dormir na paz abençoada,
cerrar os olhos meus sob a luz do Perdão;     
por isso vacilei, no fim de uma jornada:
julguei ter maculado uma religião.
Mas, logo após a morte, eu tive a felicidade
de poder devassar, por entre os esplendores,
a face virginal e austera da Verdade,
tão pura como o odor que evola-se das flores.
E digo-vos, bem alto: vós encarcerais,
ó ministros da Igreja, em treva e no mistério,
 envoltas no negror das farsas clericais,
as verdades que emanam do esplendor sidério.
Jesus, bem compreendeis, vivia pobremente,
e no mundo deixou o exemplo da Bondade,
como um livro de Luz, imenso e refulgente,
que dará instrução a toda a Humanidade.
Mas, e vós, que fazeis? Cumpris a lei sagrada?
Respeitais, porventura, o nome de Jesus?
A crença é para vós o mesmo que uma empada,
por isso negociais esse manjar de Luz!
E digo-vos também, sem faltar à verdade,
embora me lanceis de novo a excomunhão:
se celebrais a missa, pela Caridade,
embolsais, entretanto, os lucros da função!
Eu bem sei que existiram alguns missionários
da Igreja que cumpriram grandiosas missões;
mas, estes, foram pobres, simples operários,
e não se enriqueceram com as orações,
pois tinham como lemas a Fé e a Humildade;
enfrentavam com calma os olhares hostis,
falando ao coração da pobre Humanidade
na linguagem ideal de Francisco de Assis
andavam andrajosos; quando porventura,
maldosamente, alguém chamava-os desvairados
por única resposta riam com brandura, 
com ar sereno de homens bem aventurados.
Porém, estes ensinos foram olvidados
pelo Clero, que tem por única divisa
encher cada vez mais os cofres recheados
pois nunca chega o ouro que a Igreja precisa.
E semelhante absurdo repugna à Razão.
A Igreja quer ter jus a ricas oferendas.
e, para isto, exibe, em santa exploração,
os mártires cobertos de sedas e rendas;
Jesus, que abençoava as sombras seculares
das árvores, viveu contemplando a amplidão,
vive agora escondido à sombra dos altares,
com uma coroa de ouro, o báculo na mão!
E aos pés de uma figura a Humanidade ajoelha,
a fazer o sinal da cruz, maquinalmente,
no gesto glacial e vago, onde se espelha
falsa credulidade de um povo inconsciente.
E o Cristo, que contempla do Alto estas baixezas,
derramando por sobre a pobre raça humana
o seu pranto, onde as mais seráficas tristezas
vibram na dor imensa e soberana;
Ele, que lá dos mundos seus, celinos,
derramou sobre mim a luz da Inspiração,
Jesus, o protetor dos pobres pequeninos,
Jesus também reprova a torpe exploração!

E vós que procurais, mesmo desencarnados,
interromper o curso à Doutrina Sagrada,
eu vos afianço que, ó pobres desvairados,
não podereis manchar a esplêndida Alvorada!
1º de Fevereiro de 1929

NOTA - Estes últimos quatro versos foram dirigidos a espíritos adversos que, presentes, 
tentaram perturbar a reunião, durante o tempo em que o Espírito de Guerra Junqueiro,
 incorporado na médium, declamava a poesia.

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