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‘Revelação dos Papas’
(Obra Mediúnica)
- Comunicações d’Além Túmulo -
Publicada sob os auspícios da
União Espírita Suburbana
Rua Dias da Cruz 177, Méier
Officinas Graphicas d’A
Noite
Rua
do Carmo, 29 1918
Pedro, o apóstolo
O médium vê um homem
de barba e cabelo brancos, envolto em luz também branca.
A irradiação luminosa impede que ele distinga
as suas vestes.
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Meus irmãos, quem vos visita hoje é
Pedro, a quem chamais apóstolo e guarda das portas do céu.
O humilde espírito que ora baixa à Terra
para vos falar, em nome de Deus e de Jesus, é aquele a quem denominais santo e
proclamais fundador da Igreja, que dizeis ser do Nosso Senhor Jesus Cristo.
Tendes hoje, junto a vós outros, o
espírito de Pedro — o humilde pescador da Galileia, que vem a vossa presença
para dissipar as trevas que ainda envolvem a vossa consciência, impedindo-vos a
visão clara e perfeita das coisas a que chamais sagradas.
Deus, meus irmãos, coloca-me nesta
hora perante a cristandade para que lhe fale em Seu nome, desmentindo tudo
quanto de falso e absurdo se afirma a Seu e a meu respeito.
Ides ouvir a palavra do humilde e
obscuro pescador da Galileia, do mais fraco e pequeno discípulo do Mestre, que
neste momento olha para mim e me ordena que diga a verdade inteira e pura, como
pura é a consciência do meu amado Mestre, em cuja presença falo.
Jesus está me acenando e dizendo:
“Pedro, fala como falei, prega como eu preguei, ensina como ensinei, guia como
guiei, nega como neguei, afirma como afirmei, ama como o teu Mestre amou e
perdoa como ele perdoou. Pedro, fala, proclama, anuncia, profetiza, promete,
garante em nome do teu Pai e abençoa em nome do teu Mestre”.
O pescador vai, pois falar, declarar
o que sabe; vai dizer o que todos precisam saber desde já; vai confiar as
palavras do Mestre e destruir o erro e a mentira ensinando em nome de Jesus e
também no seu.
Fui discípulo de Jesus e ouvi dos
seus lábios a verdade que hoje proclamo: recebi dele os ensinamentos que ora
divulgo pelos homens; bebi na fonte inesgotável, que é o Evangelho do Mestre,
todas as lições que vos venho trazer.
Fui humilde e obscuro pescador,
jamais recebi a luz das instruções que, no meu tempo, era difundida pelos
homens.
Os meus pais me destinaram no mar e o
mar exigia de mim apenas duas coisas: robustez física e coragem para lutar
contra a fúria dos elementos. A minha inteligência era, por isso, inculta e
acanhada, vida do marujo, e eu era dos mais audazes e resolutos.
Todo o meu saber se limitava às
coisas do mar, às necessidades da vida do marujo, e eu era dos mais audazes e
resolutos.
Nada compreendia do que dizia
respeito à filosofia, às superiores cogitações a que se entregavam os doutores
nas sinagogas, onde eu assistia, absorto, aos atos religiosos e divinos,
unicamente levando até ali pela fé simples e ingênua do homem do mar. Nada
sabia das coisas sublimes de que se ocupavam os doutores da Lei; nada percebia
do que estava escrito no Antigo Testamento, que o meu mestre pescador lia a
tardinha, sentado na proa da nossa barca, explicando-nos aquilo que a sua
inteligência, também precária e desprovida de luzes e do preparo com que a
instrução aperfeiçoa o nosso entendimento e esclarece a nossa razão, mal podia
compreender.
Nada, portanto, sabia eu das verdades
eternas e dos ensinamentos trazidos ao mundo pelos profetas de Israel.
Leigo, obscuro, ignorante e simples,
vivi até o dia em que fui ouvir o Mestre, que, então, falava aos pescadores da
Galileia, ensinando-lhes a interpretar o Decálogo que Moises recebera no alto
do Sinai.
Jesus falava mansamente; a sua voz,
pausada e firme, era cheia de ternura e encanto e abalava os corações dos que
ouviam, arrebatados de assombro, as grandes verdades expostas, com tanta
simplicidade e clareza por aquele homem moreno, de tez lisa e ampla, cabelos
cor de vinho claro que bebíamos a hora do repasto.
Jesus sentara-se sobre o bordo da
barca de Luís, e dali dizia aos pescadores, agachados no fundo das suas barcas,
a verdade emanada de Deus, que o incumbira de trazê-la aos homens para
libertá-los das trevas do obscurantismo.
Quando Jesus terminou era noite já,
e, ao clarão dos fachos que acedemos para acompanhá-lo até a margem, escolheu
os que desejavam aprender dele - que era bom e manso - as sublimes verdades da
vida eterna, da bondade infinita de Deus e também da Sua infinita misericórdia.
Jesus disse: “Quereis acompanhar-me,
vinde. Dar-vos-ei outro ofício, outra tarefa, outro trabalho, mas não pagarei
salário, como faz o vosso mestre pescador, porque sou muito pobre, nada tenho
para mim e muito menos para dar. Meu Pai, entretanto, vos pagará um dia, e,
garanto-vos, aquele dentre vós que mais se esforçar para servi-lo Ele pagará
generosa e fraternamente.”
“São estas as condições em que ides
trabalhar; se vos agradam, aceitai-as, se não, deixai-me ir só, ficai com o
vosso mestre pescador”.
Eu e Thiago fomos os primeiros que
bradaram: “Não mais vos abandonaremos Senhor; morreremos ao vosso lado.”
Jesus sorriu e acrescentou: “Refleti
bem no que ides fazer, pois eu venho para sofrer e todos aqueles que me
pertencem sofrerão também.”
Tomamos o compromisso de comer o
mesmo pão e beber a mesma água que o nosso Mestre.
Partimos. Caminhamos dia e noite para
chegar a Palestina, onde o esperavam ansiosos para ouvi-lo.
Ali chegados, embora cansados e
famintos, sentiam-nos satisfeitos, contentes e confortados, sem que soubéssemos
porque.
Nada do que nos ofereciam para matar
a fome e mitigar a sede foi devorado com sofreguidão, avidez.
Alguns bocados foram suficientes para
refazer as forças perdidas durante a marcha penosa, através dos campos e das
cidades que percorremos.
Jesus tocou apenas num bocado de pão
e bebeu um pouco d’água, que lhe ofereceu uma mulher que se aproximara para
beijar-lhe a mão e ofertar-lhe aquela água do seu poço, por ser - dizia ela - a
mais fresca do lugar. Daí por diante, começou para mim nova vida, nova era:
tudo se me afigurava claro e risonho; toda a dificuldade que até então
encontrava para compreender o porquê e a razão de ser das coisas desapareceu e,
dentro de alguns dias, eu explicava aos que procuravam o Mestre, durante o seu
repouso, as grandes verdades que ouvira dele durante a jornada.
Quando se me perguntava onde havia
estudado para falar assim, com tanto acerto, ficava embaraçado para responder,
e era sempre Thiago que me socorria, dizendo: “Foi o Mestre quem nos ensinou a
falar assim.”
Tinha então adquirido tanta
facilidade de raciocínio e exposição, que a mim mesmo causava assombro.
Jesus dizia-me: “Tu és fraco, não
tens a coragem e a energia de João, a coragem e a resignação de Simão; não
obstante, a tua palavra medrará, a tua boca derramará as claridades divinas
sobre os teus irmãos. Mas, olha lá, não te deixes levar pelo teu gênio
inquieto, sôfrego, altivo e intolerante.”
“Tu não és homem para a firmeza e
para o sacrifício. Possuis virtudes, mas não tens ainda a fé bem enraizada no
fundo da tua alma. Toma cuidado, pois,
contigo mesmo; o teu inimigo está na tua própria alma, vê se te livras dele.”
Pensava, meditava sobre estas palavras do
Mestre e dizia comigo mesmo: Onde irei buscar a força e a coragem de que me
fala sempre o mestre? E desatava a chorar copiosamente, pedindo a Deus me
tornasse digno da missão que eu tomara sobre os ombros, concedendo-me a graça
de ser um verdadeiro discípulo do Seu Filho.
Continuamos sempre unidos, sempre
juntos - Mestre e discípulos, caminhando de terra em terra, espalhando a luz da
verdade que Jesus punha nos nossos lábios.
Por toda a parte éramos ouvidos com atenção
e respeito, chegando a receber em alguns lugares, aplausos extraordinários, que
se traduziam nas ofertas trazidas ao mestre e a nós, no agasalho e conforto que
nos ofereciam povos inteiros.
Correram assim os dias, os meses e os
anos, até chegar o momento do sacrifício do Mestre. Todos os discípulos se
resignaram a ver aproximar-se a hora do martírio de Jesus, conformando-se com a
afronta que publicamente ia suportar nosso Senhor Jesus Cristo.
Pedro era o único que não se conformava
com a idéia de ver o seu Mestre sacrificado; mas, quando lhe diziam - “Se não
queres vê-lo torturado, humilhado e morto, dá a tua vida por ele” - a minha
resposta era o silêncio.
Recolhia-me dentro de mim mesmo,
apavorado ante a idéia de me deixar imolar pelo Mestre.
Jesus fitava-me sempre e dizia:
“Meu Pedro, meu filho, és fraco, mas
a tua palavra terá força; continua, pois.”
Chegara a hora da condenação de Jesus
e o galo cantara já duas vezes, pois duas vezes eu fora interrogado sobre as
minhas relações íntimas com o Rabino da Galileia e o negara, declarando jamais
tê-lo visto, sequer de relance.
À terceira pergunta respondi
negativamente, como às outras, mas desta vez Jesus apresentou-se na minha
frente e disse: “ - És fraco, Pedro, mas eu te perdoo.”
Olhei em volta e não mais encontrei o
Mestre. Chorei toda a noite; não dormia, não comia, não tinha sossego, não
encontrava alívio em parte alguma; a cada passo parecia-me ouvir o Mestre: “És
fraco Pedro, mas eu te perdoo.”
Aqui tendes o que fui enquanto estive
junto de Jesus: fraco e vacilante, tendo fé pouco firme e confiança muito
limitada na Infinita Sabedoria e na Misericórdia Divina.
Jesus me perdoou, dando-me esta luz
que trago e intercedendo junto ao Seu Pai pelo pescador da Galileia, fraco e
vacilante.
Após a morte, o espírito de Pedro
ficou errante, confuso, ouvindo sempre a voz do Mestre ecoar-se nos ouvidos:
“És fraco Pedro, mas eu te perdoo.”
Fui, pois, dos discípulos de Jesus o mais fraco e o menos crente.
Por que razão havia de caber-me uma
tarefa tão espinhosa, qual a de defender a sua doutrina após a desencarnação do
Mestre?
Por que havia de merecer o espírito
que está na vossa presença a graça de ser no mundo o esteio da doutrina de
Jesus, defendendo-a dos golpes desferidos contra ela e os seus adeptos pelos
grandes da Terra, que procuravam, pelo ultraje e massacre, abafar a voz do
Messias ainda ecoando dos lábios dos discípulos e dos crentes?
Para que me chamais príncipe dos
apóstolos, quando fui o último deles?
Por que haveis de acreditar tenha
sido eu o organizador da Igreja, se, por ocasião da sua fundação, Pedro já se
achava na eternidade, de onde sai hoje para vir dizer-vos estas grandes
verdades?
Nosso Senhor Jesus Cristo me confia
hoje a magna tarefa de vir dizer-vos que a verdade está toda inteira no
Espiritismo, que é o seu Evangelho em espírito e verdade, anunciando-vos ao
mesmo tempo, que o Mestre mandará ao mundo muitos espíritos bem-aventurados
para vos ensinarem as verdades eternas e as restabelecerem onde os homens as
desvirtuaram, comprometendo a sua doutrina, procurando apagar o nome do seu Pai
e o seu no coração da criatura eterna.
Pedro vem, assim dizer-vos que não
acrediteis seja ele o porteiro do céu - que não existe senão na imaginação dos
fracos e embusteiros, interessados em afastar-vos do caminho da verdade e da
luz.
O céu, que só existe na paz das
consciências dos bons e dos puros, tem uma única chave, e esta está na vossa
própria mão - a caridade.
Vós mesmos é que sois porteiros do
céu, onde haveis de viver um dia, quando terminardes a vossa provação terrena.
Pedro, meus amigos, foi fraco e vacilante ao lado do Mestre e não teve a
resignação, a coragem e a confiança dos seus companheiros; para que, pois
emprestar ao humilde pescador da Galileia honras e títulos que não merece?
Ficai certos e seguros de que tudo quanto
vos contam a seu respeito são criações dos homens. Pedro foi grande, eloquente
e sábio enquanto esteve ao lado do Mestre, recebendo as irradiações sublimes do
seu espírito divino.
Tudo isso desaparece, porém, no
momento em que negou o Mestre, na hora em que abandonou o compromisso de
acompanhá-lo até a morte, comer o mesmo pão e beber a mesma água que o Mestre,
faltando deste modo à sua palavra e confirmando as de Jesus: “És fraco, Pedro;
não serves para o martírio e para o sacrifício. És fraco, Pedro, mas eu te perdoo”.
E perdoou-me, o meu querido Mestre, o
meu divino Jesus, e vai conceder-me novamente a graça de voltar à Terra, para
continuar a sua obra, concluir o que há mil e novecentos anos não tive forças
para sustentar.
Volto, e desta vez o galo não mais cantará e não mais ouvirei aquelas
terríveis palavras que tantas vezes me escaldaram os ouvidos: “És fraco, Pedro,
mas eu te perdoo”.
Jesus me falará e ouvirei sempre a
sua voz; mas esta será um incitamento, um conforto que me alentará na luta em
prol da verdade eterna, que voltei a defender.
Ficai, porquanto, certos, meus irmão,
que Pedro voltará entre vós, porém mais forte, mais enérgico, mais firme na sua
crença, mais inabalável na sua fé, confiando, em absoluto, no seu Deus e no seu
Jesus, que o enviaram aqui para dizer-vos estas verdades e ainda mais - que
será Pedro o escolhido para dizer-vos muitas outras verdades em ocasiões
diversas, em emergências difíceis, em situações perigosas nas quais vos
achareis um dia na Terra.
Pedro vem, pois, à vossa presença
declarar que não é santo, nem príncipe dos apóstolos; de todos os espíritos que
acompanharam Jesus na Terra, foi ele o que mais se perturbou após a sua
desencarnação, e isso por ter sido o mais fraco e o menos crente de todos.
Pedro já teve outras missões após
aquela em que esteve entre vós. O seu espírito evoluiu, caminhou para poder
hoje falar-vos humildemente, dizendo: “ Sou pequeno e fraco, conservo ainda a
simplicidade e a rudeza do pescador dos mares tempestuosos da Galileia; estou
em meio do caminho e tenho muito que andar para chegar à perfeição. Nada sei,
muito me falta aprender ainda, muito tenho que estudar para alcançar o título
de espírito sábio. Nada, pois, deveis conferir-me, nenhum título deveis dar-me,
nenhuma honra deveis tributar ao meu nome, quando vos referirdes a mim, dizei
sempre - o pescador da Galileia. Isto me honrará muito mais que o principado
que injustamente me ofereceis.
Aconselho-vos à prática do bem e da
caridade, da justiça e do amor ao vosso semelhante e também o respeito à lei de
Deus e a observância rigorosa dos ensinamentos de Jesus.
Agradeço-vos a todos o ouvirem-me com
atenção e afeto. Que Deus vos proteja e Jesus vos acompanhe em todos os atos da
vida.
Adeus, até breve.
Pedro, o
pescador da Galileia.
Junho de 1916
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