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sábado, 29 de junho de 2013

05. 'Mediunidade e Charlatanice'



05) Mediunidade e Charlatanice

por Indalício Mendes
Reformador (FEB) Junho 1958


            Neste mundo de preconceitos agressivos, o Espiritismo tem pago pesado tributo à ignorância e à má fé. Não obstante a hostilidade que sofre, da parte de religiões fanadas e apenas sustentadas por conveniências políticas, e da parte de cientistas e pseudocientistas que se arreceiam de ser descidos do pedestal de prestígio a que foram guindados, se contrariarem os cânones religiosos e científicos, o Espiritismo caminha e se agiganta. 

            Homens de cultura científica, humanística e cultura geral, portadores de irreprochável autoridade moral, que ousaram reconhecer e testemunhar a verdade espírita, foram achincalhados por seus pares e acicatados pelo alto clero, que considera de seu privilégio a verdade e não admite que outros credos, livres de prejuízos seculares, demonstrem, por uma imposição de processos evolutivos, que o homem não ultimou suas conquistas no ramo da ciência e que sua religião terá de ser a religião racional, que não se apoia em dogmas absurdos nem se alimenta de restrições à liberdade de pensamento e de opinião. 

            Os médiuns devem estar sempre muito atentos, a fim de que sejam os maiores zeladores da pureza do Espiritismo. Em vez de se mostrarem excessivamente suscetíveis, devem permanecer vigilantes, para impedirem que seus trabalhos possam ser acoimados de charlatanice, de mistificação, de embuste, por aqueles que, cegos pelo fanatismo, preferem mentir a si mesmos, a confessar a verdade que teimam em não aceitar. Como em todas as atividades humanas, também no Espiritismo têm aparecido casos de mistificação voluntária e involuntária. Neste último caso, por exemplo, podemos incluir as manifestações de animismo, que podem ser decorrentes, em alguns casos, do insuficiente desenvolvimento mediúnico do indivíduo, que, sem o saber, engana a si mesmo, convencido de estar em contato com o Além. Ora, em casos tais, que deveriam fazer aqueles que, sendo cientistas, tinham a obrigação de evitar a negação apriorística? Estudar o caso, examiná-lo de todos os ângulos possíveis e oferecer, finalmente, uma conclusão imparcial, porque, em vez de estar prestando um serviço isolado ao Espiritismo, estaria servindo à Ciência e à Humanidade. Hoje, felizmente, já não são poucos os que separam os casos de mediunismo dos casos de animismo. Para nós, o animismo pode ser perfeitamente contornado, mediante um trabalho persistente e bem orientado de desenvolvimento mediúnico. Uma vez que o médium se encontre desenvolvido e em condições de pôr suas energias mediúnicas a serviço do Além, o animismo se reflui e pode desaparecer, em virtude da educação do espírito do médium. O animismo pode ser considerado, em determinadas circunstâncias, como a energia potencial de um médium ainda não capacitado para usá-la no trato com o mundo invisível. Em tal caso, admite-se que essa energia se expanda, favorecida por um fenômeno de auto sugestão, dando a seu portador a impressão de que está sendo intermediário de uma personalidade do mundo invisível, quando é seu próprio espírito que se manifesta. Daí não se pode inferir que o indivíduo em questão seja um farsante, um mistificador, porque bem pode suceder que ele próprio ignore o que se esteja passando. Caberá, então, ao diretor dos trabalhos observá-lo e esforçar-se para corrigi-lo. Ninguém tem mais interesse de destruir a mistificação e a charlatanaria no Espiritismo do que os espíritas. Desejamos com toda a sinceridade que os trabalhos espíritas sejam examinados e criticados com absoluta boa-fé. Atacar-se o Espiritismo e os espíritas porque os seus detratores supõem ter havido mistificação da parte de um médium, ou comprovado a charlatanice de médium sem escrúpulos, não é sensato.

            “Antes de imputar a uma doutrina a culpa de incitar a um ato condenável qualquer, a razão e a equidade exigem que se examine se essa doutrina contém máximas que justifiquem semelhante ato. Para conhecer-se a parte de responsabilidade que, em dada circunstância, caiba ao Espiritismo, há um meio muito simples: proceder de boa-fé a uma perquirição, não entre os adversários, mas na própria fonte, do que ele aprova e do que condena. Isso é tanto mais fácil, quanto ele não tem segredos; seus ensinos são patentes e quem quer que seja pode verifica-los. Assim, se os livros da Doutrina Espírita condenam explícita e formalmente um ato justamente reprovável; se, ao contrário, só encerram instruções de natureza a orientar para o bem, segue-se que não foi neles que um indivíduo culpado de malefícios se inspirou, ainda mesmo que os possua.

            “O Espiritismo não é solidário com aqueles a quem apraza dizerem-se, espíritas, do mesmo que a Medicina não o é com os que a exploram, nem a sã religião com os abusos que se cometam em seu nome. Ele não reconhece como seus adeptos senão os que lhe praticam os ensinos, isto é, que trabalham por melhorar-se moralmente, esforçando-se por vencer os maus pendores, por ser menos egoístas e menos orgulhosos, mais brandos, mais humildes, mais caridosos para com o próximo, mais moderados em tudo, porque é essa a característica do verdadeiro espirita.” (Kardec - "Obras Póstumas", págs. 232/3, 11ª edição.)

            Temos de ser muito mais rigorosos com os trabalhos espíritas do que os nossos adversários. Importa-nos menos a opinião daqueles que nos combatem, fugindo dos princípios éticos normais, do que a necessidade de preservar o Espiritismo de elementos capazes de comprometê-lo.

            "Entre os antagonistas do Espiritismo, muitos atribuem aqueles efeitos (efeitos físicos e efeitos inteligentes das manifestações), ao embuste, pela razão de que alguns puderam ser imitados. Segundo tal suposição, todos os espíritas seriam indivíduos embaídos e todos os médiuns seriam embaidores, de nada valendo a posição, o caráter, o saber e a honradez das pessoas. Se isto merecesse resposta, diríamos que alguns fenômenos da Física também são imitados pelos prestidigitadores, o que nada prova contra a verdadeira ciência. Demais, pessoas há cujo caráter afasta toda suspeita de fraude e preciso é não saber absolutamente viver e carecer de toda a urbanidade, para que alguém ouse vir dizer-lhe na face que são cúmplices de charlatanismo:" (Kardec - "O Livro dos Médiuns", págs. 43 – 25ª edição.)

            Não nos fazem mossa as hostilidades de certos credos religiosos contra o Espiritismo. Adotam a atitude natural dos que lutam pela sobrevivência, absolutamente certos de que o de perecimento é uma fatalidade inexorável. Questão de tempo, apenas. Não nos intimidam as restrições e acusações da ciência, porque temos a certeza de que um dia ela chegará até nós, à medida que se for evoluindo e, consequentemente, se libertando de preconceitos que a impedem de ter uma visão mais clara das verdades espíritas. Se os cientistas costumam ser combatidos pelos cientistas... Basta que surja um fato novo, capaz de destruir um tabu da ciência oficial, para que esta se insurja contra os "iconoclastas" e procure defender de todas as maneiras possíveis os pontos de vista vencidos pelo progresso. São tantos os exemplos que a história nos dá, que não vale a pena perder tempo em repisá-los... O Espiritismo também tem sido vítima de espertalhões e jamais se esquivou a qualquer prova, por mais rigorosa que fosse, para estabelecer a verdade. Médiuns de ambos os sexos foram submetidos a exames e “tests" muitas vezes vexatórios, para que os cientistas não pudessem alegar, depois, que haviam encontrado dificuldades para realizar as mais audaciosas investigações, em busca da fraude. Na maioria dos casos, porém, não encontrando a fraude, não podendo afirmar a existência de embuste, de charlatanice, procuraram os pesquisadores explicações novas, confusas, inconcludentes, apenas para não estenderem a mão à palmatória e confessarem, nobre e lealmente, o que sua consciência não podia deixar de reconhecer. É evidente que tem havido abuso no Espiritismo, não por culpa dos espíritas, mas em virtude de especuladores, que, intitulando-se espíritas, procedem de maneira contrária ao que determina nossa Doutrina. 

            “De tudo se abusa, até das coisas mais santas. Porque não abusariam do Espiritismo? Porém, o mau uso que de uma coisa se faça não autoriza que ela seja prejulgada desfavoravelmente" - comenta o Codificador em "O Livro dos Médiuns", pág. 43.

            Quando insistimos em que se estude cada vez mais a Doutrina Espírita; é porque esse estudo é extraordinário meio de defesa dos médiuns, levando-os, uma vez esclarecidos, a serem defensores naturais do Espiritismo. Os que frequentemente maldizem o Espiritismo, sem o conhecer, sem haver lido sequer o essencial para emitirem uma opinião, em lugar de fazerem mal aos espíritas, fazem-no a si mesmos. Nós não temos pressa em convencer o mundo... Saberemos esperar que o mundo se convença por si mesmo. É o que tem acontecido. Sem campanha de proselitismo, o Espiritismo cresce por toda a parte. Desenvolve-se e encontra cada vez maior número de adeptos. Porquê? Evidentemente, porque a Humanidade tem sofrido muito, espicaçada, de um lado, pelo materialismo, que estimula o egoísmo e divide os homens, e, de outro lado, por credos obsoletos, que lutam furiosamente pela sua sobrevivência e procuram anular a capacidade de raciocínio das criaturas, impondo-lhes dogmas que têm de ser aceitos com passividade, por não admitirem se conciliem a fé e a razão. Como a Humanidade tende a iluminar-se progressivamente, renunciando a prejuízos e superstições, sua atenção se volta, sem esforço algum, para a religião simples e objetiva, que não lhe promete milagres, mas lhe aponta o caminho da reeducação da criatura humana, ensinando-a principalmente a ser pessoa de bem, porque isto é o que poderá contribuir eficazmente para a felicidade humana.

            Não tem o Espiritismo necessidade de iludir o homem, para ser apoiado. E não o faz. É a própria vida terrena que se incumbe de tocar os espíritos mais esclarecidos para que eles, por si mesmos, abandonem crenças antigas, arcaicas, ingressando no Espiritismo, que lhes não promete absolvições nem vida paradisíaca, a troco de fórmulas insensatas. O que o Espiritismo promete ao homem é a felicidade, se ele seguir as leis morais a que está subordinada a Doutrina Espírita, baseada nas lições evangélicas, interpretadas em espírito e verdade, livre de fantasias dogmáticas. É preciso compreender que “a doutrina dos Espíritos não é de concepção humana. Foi ditada pelas próprias inteligências que se manifestaram,  quando ninguém disso cogitava, quando até a opinião geral a repelia. Ora, perguntamos, onde foram os médiuns beber uma doutrina que não passava pelo pensamento de ninguém na Terra? Perguntamos ainda mais: por que estranha coincidência milhares de médiuns espalhados por todos os pontos do globo terráqueo, e que jamais se viram, acordaram em dizer a mesma coisa?” (Introdução - "O Livro dos Espíritos".)

            Aos médiuns bem orientados cabe importante papel no futuro da Humanidade. É imprescindível, no entanto, que se capacitem das enormes responsabilidades que lhes pesam sobre os ombros. Para que possam cumprir com exatidão seus deveres mediúnicos, devem porfiar em seguir o mais rigorosamente possível os ditames da Doutrina e do Evangelho segundo o Espiritismo, familiarizando-se também com "Os Quatro Evangelhos", de Roustaing, onde está explicado e bem desenvolvido o Espiritismo Cristão. O conhecimento da Doutrina Espírita e sua difusão, pela palavra, pela escrita, nas reuniões, no rádio, nos jornais, onde quer que seja necessário expandir suas luzes, é obra de benemerência, obra humanitária. Não nos preocupemos com os ataques dirigidos ao Espiritismo. Nossa resposta deve estar em nossos atos, em nossa palavra, no comportamento fielmente pautado pela Doutrina. Como até aqui, devemos continuar o nosso trabalho, empolgados por ele, dando-lhe o máximo da nossa inteligência e de nossa energia. Se surgem, de quando em quando, em nossas fileiras, falsos apóstolos, embusteiros, charlatães, mistificadores, não esperemos que os nossos adversários os apontem, confundindo-os com aqueles que estão acima de quaisquer restrições de ordem moral. Sejamos os primeiros a identificá-los e a impedir que comprometam nossa obra. E continuemos a faze-lo com segurança e energia, mas sem perdermos de vista os princípios, doutrinários e evangélicos, que nos esclarecem sobre a maneira de agir sem incorrermos na pecha de truculentos e dogmáticos, que não o somos nem o seremos enquanto permanecermos adstritos a esses belos e edificantes princípios.

            Finalmente, aos médiuns está reservado importantíssimo papel no futuro do Espiritismo. Seja qual for a especialidade mediúnica, pois todas são respeitáveis, devem os médiuns ter em mente que a melhor maneira de realizarem suas tarefas, nesta encarnação, está em adotar atitudes de digna humildade, de franca solidariedade humana, de ampla disposição para servir ao próximo. O Espiritismo não é nem uma aventura nem um divertimento: é um compromisso sério e sagrado que tomamos com o Alto, interessando, não apenas à vida presente, mas às futuras encarnações.


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