05) Mediunidade
e Charlatanice
por Indalício
Mendes
Reformador
(FEB) Junho 1958
Neste
mundo de preconceitos agressivos, o Espiritismo tem pago pesado tributo à
ignorância e à má fé. Não obstante a hostilidade que sofre, da parte de
religiões fanadas e apenas sustentadas por conveniências políticas, e da parte
de cientistas e pseudocientistas que se arreceiam de ser descidos do pedestal
de prestígio a que foram guindados, se contrariarem os cânones religiosos e
científicos, o Espiritismo caminha e se agiganta.
Homens
de cultura científica, humanística e cultura geral, portadores de irreprochável
autoridade moral, que ousaram reconhecer e testemunhar a verdade espírita,
foram achincalhados por seus pares e acicatados pelo alto clero, que considera
de seu privilégio a verdade e não admite que outros credos, livres de prejuízos
seculares, demonstrem, por uma imposição de processos evolutivos, que o homem
não ultimou suas conquistas no ramo da ciência e que sua religião terá de ser a
religião racional, que não se apoia em dogmas absurdos nem se alimenta de
restrições à liberdade de pensamento e de opinião.
Os
médiuns devem estar sempre muito atentos, a fim de que sejam os maiores
zeladores da pureza do Espiritismo. Em vez de se mostrarem excessivamente
suscetíveis, devem permanecer vigilantes, para impedirem que seus trabalhos
possam ser acoimados de charlatanice, de mistificação, de embuste, por aqueles
que, cegos pelo fanatismo, preferem mentir a si mesmos, a confessar a verdade
que teimam em não aceitar. Como em todas as atividades humanas, também no
Espiritismo têm aparecido casos de mistificação voluntária e involuntária.
Neste último caso, por exemplo, podemos incluir as manifestações de animismo,
que podem ser decorrentes, em alguns casos, do insuficiente desenvolvimento
mediúnico do indivíduo, que, sem o saber, engana a si mesmo, convencido de
estar em contato com o Além. Ora, em casos tais, que deveriam fazer aqueles
que, sendo cientistas, tinham a obrigação de evitar a negação apriorística?
Estudar o caso, examiná-lo de todos os ângulos possíveis e oferecer, finalmente,
uma conclusão imparcial, porque, em vez de estar prestando um serviço isolado ao Espiritismo, estaria servindo
à Ciência e à Humanidade. Hoje, felizmente, já não são
poucos os que separam os casos de mediunismo dos casos de animismo. Para nós, o animismo pode ser perfeitamente contornado,
mediante um trabalho persistente e bem orientado de desenvolvimento mediúnico.
Uma vez que o médium se encontre desenvolvido e em condições de pôr suas
energias mediúnicas a serviço do Além, o animismo se reflui e pode desaparecer, em virtude da educação do espírito
do médium. O animismo pode ser considerado, em determinadas circunstâncias,
como a energia potencial de um médium ainda não capacitado para usá-la no trato
com o mundo invisível. Em tal caso, admite-se que essa energia se expanda,
favorecida por um fenômeno de auto sugestão, dando a seu portador a impressão
de que está sendo intermediário de uma personalidade do mundo invisível, quando
é seu próprio espírito que se manifesta. Daí não se pode inferir que o
indivíduo em questão seja um farsante, um mistificador, porque bem pode suceder
que ele próprio ignore o que se esteja passando. Caberá, então, ao diretor dos
trabalhos observá-lo e esforçar-se para corrigi-lo. Ninguém tem mais interesse
de destruir a mistificação e a charlatanaria no Espiritismo do que os
espíritas. Desejamos com toda a sinceridade que os trabalhos espíritas sejam
examinados e criticados com absoluta boa-fé. Atacar-se o Espiritismo e os
espíritas porque os seus detratores supõem ter havido mistificação da parte de
um médium, ou comprovado a charlatanice de médium sem escrúpulos, não é
sensato.
“Antes de imputar a uma doutrina a culpa de incitar
a um ato condenável qualquer, a razão e a equidade exigem que se examine se
essa doutrina contém máximas que justifiquem semelhante ato. Para conhecer-se a
parte de responsabilidade que, em dada circunstância, caiba ao Espiritismo, há
um meio muito simples: proceder de boa-fé a uma perquirição, não entre os
adversários, mas na própria fonte, do que ele aprova e do que condena. Isso é
tanto mais fácil, quanto ele não tem segredos; seus ensinos são patentes e quem
quer que seja pode verifica-los. Assim, se os livros da Doutrina Espírita
condenam explícita e formalmente um ato justamente reprovável; se, ao contrário,
só encerram instruções de natureza a orientar para o bem, segue-se que não foi
neles que um indivíduo culpado de malefícios se inspirou, ainda mesmo que os
possua.
“O Espiritismo não é solidário com aqueles a
quem apraza dizerem-se, espíritas, do mesmo que a Medicina não o é com os que a
exploram, nem a sã religião com os abusos que se cometam em seu nome. Ele não
reconhece como seus adeptos senão os que lhe praticam os ensinos, isto é, que
trabalham por melhorar-se moralmente, esforçando-se por vencer os maus
pendores, por ser menos egoístas e menos orgulhosos, mais brandos, mais
humildes, mais caridosos para com o próximo, mais moderados em tudo, porque é
essa a característica do verdadeiro espirita.” (Kardec - "Obras
Póstumas", págs. 232/3, 11ª edição.)
Temos
de ser muito mais rigorosos com os trabalhos espíritas do que os nossos
adversários. Importa-nos menos a opinião daqueles que nos combatem, fugindo dos
princípios éticos normais, do que a necessidade de preservar o Espiritismo de
elementos capazes de comprometê-lo.
"Entre os
antagonistas do Espiritismo, muitos atribuem aqueles efeitos (efeitos físicos e efeitos inteligentes das manifestações), ao embuste, pela razão de que
alguns puderam ser imitados. Segundo tal suposição, todos os espíritas seriam
indivíduos embaídos e todos os médiuns seriam embaidores, de nada valendo a
posição, o caráter, o saber e a honradez das pessoas. Se isto merecesse
resposta, diríamos que alguns fenômenos da Física também são imitados pelos
prestidigitadores, o que nada prova contra a verdadeira ciência. Demais, pessoas
há cujo caráter afasta toda suspeita de fraude e preciso é não saber
absolutamente viver e carecer de toda a urbanidade, para que alguém ouse
vir dizer-lhe na face que são cúmplices de charlatanismo:" (Kardec -
"O Livro dos Médiuns", págs. 43 – 25ª edição.)
Não
nos fazem mossa as hostilidades de certos credos religiosos contra o
Espiritismo. Adotam a atitude natural dos que lutam pela
sobrevivência, absolutamente certos de que o de perecimento é uma fatalidade inexorável. Questão
de tempo, apenas. Não nos intimidam as restrições e acusações da ciência, porque temos a
certeza de que um dia ela chegará até nós, à medida que se for evoluindo e,
consequentemente, se libertando de preconceitos que a impedem de ter uma visão
mais clara das verdades espíritas. Se os cientistas costumam ser combatidos
pelos cientistas... Basta que surja um fato novo, capaz de destruir um tabu da
ciência oficial, para que esta se insurja contra os "iconoclastas" e
procure defender de todas as maneiras possíveis os pontos de vista vencidos
pelo progresso. São tantos os exemplos que a história nos dá, que não vale a
pena perder tempo em repisá-los... O Espiritismo também tem sido vítima de
espertalhões e jamais se esquivou a qualquer prova, por mais rigorosa que fosse,
para estabelecer a verdade. Médiuns de ambos os sexos foram submetidos a exames
e “tests" muitas vezes vexatórios, para que os cientistas não pudessem
alegar, depois, que haviam encontrado dificuldades para realizar as mais
audaciosas investigações, em busca da fraude. Na maioria dos casos, porém, não
encontrando a fraude, não podendo afirmar a existência de embuste, de
charlatanice, procuraram os pesquisadores explicações novas, confusas, inconcludentes,
apenas para não estenderem a mão à palmatória e confessarem, nobre e lealmente,
o que sua consciência não podia deixar de reconhecer. É evidente que tem havido
abuso no Espiritismo, não por culpa dos espíritas, mas em virtude de
especuladores, que, intitulando-se espíritas, procedem de maneira contrária ao
que determina nossa Doutrina.
“De tudo se abusa, até das coisas mais
santas. Porque não abusariam do Espiritismo? Porém, o mau uso que de uma coisa
se faça não autoriza que ela seja prejulgada desfavoravelmente" -
comenta o Codificador em "O Livro dos Médiuns", pág. 43.
Quando
insistimos em que se estude cada vez mais a Doutrina Espírita; é porque esse
estudo é extraordinário meio de defesa dos médiuns, levando-os, uma vez
esclarecidos, a serem defensores naturais do Espiritismo. Os que frequentemente
maldizem o Espiritismo, sem o conhecer, sem haver lido sequer o essencial para
emitirem uma opinião, em lugar de fazerem mal aos espíritas, fazem-no a si
mesmos. Nós não temos pressa em convencer o mundo... Saberemos esperar que o
mundo se convença por si mesmo. É o que tem acontecido. Sem campanha de
proselitismo, o Espiritismo cresce por toda a parte. Desenvolve-se e encontra
cada vez maior número de adeptos. Porquê? Evidentemente, porque a Humanidade tem sofrido muito,
espicaçada, de um lado, pelo materialismo, que estimula o egoísmo e divide os
homens, e, de outro lado, por credos obsoletos, que lutam furiosamente pela sua
sobrevivência e procuram anular a capacidade de raciocínio das criaturas,
impondo-lhes dogmas que têm de ser aceitos com passividade, por não admitirem
se conciliem a fé e a razão. Como a Humanidade tende a iluminar-se
progressivamente, renunciando a prejuízos e superstições, sua atenção se volta,
sem esforço algum, para a religião simples e objetiva, que não lhe promete
milagres, mas lhe aponta o caminho da reeducação da criatura humana,
ensinando-a principalmente a ser pessoa de bem, porque isto é o que poderá
contribuir eficazmente para a felicidade humana.
Não
tem o Espiritismo necessidade de iludir o homem, para ser apoiado. E não o faz.
É a própria vida terrena que se incumbe de tocar os
espíritos mais esclarecidos para que eles, por si mesmos, abandonem crenças
antigas, arcaicas, ingressando no Espiritismo, que lhes não promete absolvições
nem vida paradisíaca, a troco de fórmulas insensatas. O que o Espiritismo
promete ao homem é a felicidade, se ele seguir as leis morais a que está
subordinada a Doutrina Espírita, baseada nas lições evangélicas, interpretadas
em espírito e verdade, livre de fantasias dogmáticas. É preciso compreender que
“a doutrina dos Espíritos não é de concepção
humana. Foi ditada pelas próprias inteligências que se manifestaram, quando ninguém disso cogitava, quando até a
opinião geral a repelia. Ora, perguntamos, onde foram os médiuns beber uma
doutrina que não passava pelo pensamento de ninguém na Terra? Perguntamos ainda
mais: por que estranha coincidência milhares de médiuns espalhados por todos os
pontos do globo terráqueo, e que jamais se viram, acordaram em dizer a mesma coisa?” (Introdução
- "O Livro dos Espíritos".)
Aos
médiuns bem orientados cabe importante papel no futuro da Humanidade. É
imprescindível, no entanto, que se capacitem das enormes responsabilidades que
lhes pesam sobre os ombros. Para que possam cumprir com exatidão seus deveres
mediúnicos, devem porfiar em seguir o mais rigorosamente possível os ditames da
Doutrina e do Evangelho segundo o Espiritismo, familiarizando-se também com
"Os Quatro Evangelhos", de Roustaing, onde está explicado e bem
desenvolvido o Espiritismo Cristão. O conhecimento da Doutrina Espírita e sua
difusão, pela palavra, pela escrita, nas reuniões, no rádio, nos jornais, onde
quer que seja necessário expandir suas luzes, é obra de benemerência, obra
humanitária. Não nos preocupemos com os ataques dirigidos ao Espiritismo. Nossa
resposta deve estar em nossos atos, em nossa palavra, no comportamento
fielmente pautado pela Doutrina. Como até aqui, devemos continuar o nosso
trabalho, empolgados por ele, dando-lhe o máximo da nossa inteligência e de
nossa energia. Se surgem, de quando em quando, em nossas fileiras, falsos
apóstolos, embusteiros, charlatães, mistificadores, não esperemos que os nossos
adversários os apontem, confundindo-os com aqueles que estão acima de quaisquer
restrições de ordem moral. Sejamos os primeiros a identificá-los e a impedir
que comprometam nossa obra. E continuemos a faze-lo com segurança e energia,
mas sem perdermos de vista os princípios, doutrinários e evangélicos, que nos
esclarecem sobre a maneira de agir sem incorrermos na pecha de truculentos e dogmáticos, que não o somos
nem o seremos enquanto permanecermos adstritos a esses belos e edificantes
princípios.
Finalmente,
aos médiuns está reservado importantíssimo papel no futuro do Espiritismo. Seja
qual for a especialidade mediúnica, pois todas são respeitáveis, devem os
médiuns ter em mente que a melhor maneira de realizarem suas tarefas, nesta
encarnação, está em adotar atitudes de digna humildade, de franca solidariedade
humana, de ampla disposição para servir ao próximo. O Espiritismo não é nem uma
aventura nem um divertimento: é um compromisso sério e sagrado que tomamos com
o Alto, interessando, não apenas à vida presente, mas às futuras encarnações.
Nenhum comentário:
Postar um comentário