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Fenômenos
de Materialização
por Manoel Quintão
Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
1942
Os fatos
Posto
fosse nosso companheiro de viagem, não tivemos, a bordo, o ensejo de nos
aproximar do Sr. Eurípedes Prado, o
marido da médium. Ao aportar em Belém, ficamos surpreendido ao ler seu nome na
lista dos passageiros. Houvemos, pois, de recorrer ao nosso distinto confrade
Carlos Souza, digno presidente da União Espírita Paraense, para alcançar daquele
uma sessão de materializações. Não o solicitávamos por nós, mas principalmente
para podermos trazer ao Rio de Janeiro, qual o fazemos aqui, a prova testemunhal
e documental daqueles fenômenos que tantas conversões haviam produzido,
inclusive a do Dr.
Matta Bacellar, médico reputadíssimo e ancião
justamente estimado, quão venerado na sociedade paraense, o qual não teve a mínima
dúvida em abrir mão dos preconceitos científicos, para declarar-se adepto do
Espiritismo, atestando "coram
populo" (diante do público) a veracidade dos fatos.
Acolhido
com extremada gentileza o nosso desejo, no dia, ou antes na noite aprazada,
possuído de natural curiosidade, dirigimo-nos à casa do maestro Bosio, no
bairro de "Batista" Campos", onde se realizam habitualmente
aquelas sessões. A companha (o mesmo que companhia), a assistência que lá encontramos reunida, pode dizer-se, do ponto de
vista mundano, era a mais seleta. Pessoas de nome, de ilustração, de conceito e
reputação social. De escantilhão memorando: Drs. Matta BacelIar e Pereira de Barros,
médicos; Dr. Nogueira de Faria, juiz; Dr. Pena e Costa, promotor público; Dr. A. Morris, advogado;
Apolinário Moreira, diretor da Recebedoria do Estado; o maestro Bosio, A.
Lucullo, inspetor federal de seguros, Carlos B. Sousa, Adalberto de Macedo e
outros. Entre as senhoras, além da Exma. D. Ana Prado - a médium - a família
Lucullo e uma filha do Dr. Bacellar.
A
primeira sessão realizou-se à plena luz.
Nela
obtivemos a escrita direta, o transporte de objetos, a manipulação de flores em
parafina, esta com luz graduada.
Um
cético já nos perguntou, quando relatávamos os fatos, se no assoalho não
haveria algum alçapão... Fútil, a objeção. A sala é pavimentada a cimento. E as
paredes? -- lisas como a alma do interlocutor. Não podia haver alçapão... As
sessões se realizam nos baixos da casa - o que chamamos aqui um porão habitável
- mas suficientemente amplo. O maestro Bosio, que foi cético renitente, tem gosto
pelos fenômenos e a nada se poupa a fim de lhes dar toda a nitidez, de modo a
convencerem o maior número.
A
sessão fez-se, primeiro, em torno de uma mesa grande e comum, de jantar. D. Ana
Prado - a médium - é uma senhora austera, mãe exemplar e esposa dedicada.
Católica por educação e tradição de família, hostil, de começo, aos
preliminares do seu desenvolvimento mediúnico, só condescendeu em aceitá-los e
auxilia-los a instancias do marido. Ciosa da sua reputação e precavida da
maledicência ignara (ignorante; estúpida) e fácil, não é
sem escrúpulo que transige na demonstração das suas preciosas faculdades, fora
do círculo das suas relações.
Em
torno da mesa, assentamo-nos, todos, mas reparai bem nos detalhes, disto
fazemos questão.
Aqui
está (mostrando) um desenho, um esboço do cenário, pelo qual os meus ouvintes
mais exigentes poderão fazer ideia do local. (*) A sala tem apenas três portas de comunicação, duas para a frente, e uma
para os fundos da casa, e portas das quais o maestro Bosio nos oferecera as
chaves. Precaução inútil, todavia, porque o ambiente estava iluminado bastante
para que ali não se pudesse insinuar alguém que não fosse imediatamente visto.
Demais, que interesse teria aquela gente em enganar-nos e enganar-se a si
mesma? Não nos lembramos que houvesse outros móveis além da mesa e cadeiras de
que nos utilizávamos. Lembramo-nos, sim, que; ao fazer essa observação,
mentalmente consideramos: - retiraram tudo para que se não diga que há qualquer
artificio oculto...
À cabeceira da mesa, o médium, nós à
sua direita e à nossa frente o Dr. Pereira de Barros, que conosco rubricou o
papel em que obtivemos a escrita direta.
À nossa
direita ficou o Dr. Bacelar. Pediram colocássemos o papel debaixo da mesa e
perto o lápis. Fize-mo-lo, junto, porém, dos nossos pés, de modo a poder,
assim, controlar o fenómeno, pelo menos sentir se alguém - embora fechada a
sala e perfeitamente unidas as nossas cadeiras se insinuava debaixo da mesa...
Enquanto
esperávamos, o médium, mãos visíveis, conversando - e todos conversavam sobre
assuntos variados - apenas se interrompia dizendo: - Ele está pedindo menos
impaciência, que pensem em outra coisa, etc., até que deu o sinal "pronto".
Como
atrás dissemos, a sala estava suficientemente iluminada, todos nos víamos, o
médium não se achava em transe.
Mas,
dizem os pirrônicos sistemáticos: "por que em baixo e não em cima da
mesa?" Respondemos: em baixo, por mais escuro, e mais escuro porque a luz
- dizem os Espíritos - tem ação dissolvente sobre os fluidos combinados, dos períspiritos.
Que há nisso de extraordinário? São leis e leis que mal começamos a
lobrigar. aqui na Terra, ninguém ilude
as leis naturais: assim, por exemplo, ninguém, revela à plena luz do dia uma
chapa fotográfica.
Mas
(mostrando), aqui está o papel que eis de examinar. Na parte que ficou para
cima, escreveram: “Sofram com coragem as
injúrias do padre.” E no verso, isto
é, na parte voltada para o chão: “Coragem
meus irmãos, mais sofreu Jesus”.
O
padre, ao qual já nos referimos, é o famigerado pitorra (criança de colo) Florêncio
Dubois, padre francês adstrito a Abadia, como lá dizem, de Nazaré.
Homem
inteligente, mas sem escrúpulos, porque lhe franquearam a primeira coluna de um
órgão da imprensa, dela fez pelourinho para denegrir pessoas e coisas
espíritas, com grande gáudio da sua ‘claque’ estulta e fanática. Esse padre
recebeu-nos – natural que o fizesse – à ponta de faca. Deu-nos de mascate,
intrujão, idiota para baixo, só porque, a pedido de distinto amigo, simpático à
doutrina – o Dr. Pena e Costa, respondêramos a uma reportagem do “Estado do
Pará”, evidenciando a vida e o programa desta casa (1). Com isso, angariou ele uma polêmica lamentável, por si só vasada em
terreno pessoal, com Dr. Pena e Costa, e
polêmica que degenerou em processo por injúrias, tais os mimos que se trocaram.
(1) A Federação
Espírita Brasileira..
De
nossa parte, sem procurar revidar ao padre, quisemos aproveitar o ensejo para
doutrinar, e, quando mais acesa ia a contenda, ao lado de artigos rubros e
escandalosos, tresandando a lodo e fel, inserimos o que escrevemos no
Reformador intitulado "Calma e coerência",
a propósito da Pastoral do Arcebispo contra espíritas e protestantes, e cujo fecho
é o preceito do - Perdoai não sete, mas
setenta vezes sete vezes. Esta nossa atitude, não de passividade incondicional
mas de coragem cristã, na vera acepção da humildade, não foi, infelizmente, ao
que parece, compreendida pela maioria de nossos confrades paraenses, e daí o
sermos nessa mesma folha averbado de místico, quando unicamente fomos
racionalista do Evangelho. Não, certo, desse Evangelho por ai pregado ao sabor
de todos os esculcas (sentinelas) de pequenas
igrejas, mas do Evangelho em espírito e verdade, tal como o inculcam os Espíritos
elevados, ou sejam os mensageiros de Jesus. Ao "Estado do Pará"
poderia convir que escorchássemos o padre. Era o escândalo. Mas ao "Estado
do Pará" não conviria que doutrinássemos Espiritismo, escandalizando a consciência
dos seus leitores católicos...
Assim
o compreendemos e deixamos a liça.
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