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Fenômenos
de Materialização
por Manoel Quintão
Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
1942
Vejamos:
Para a ciência oficial, o homem biológica, anatômica e filosoficamente
considerado, não passa de um complexo celular, de uma trama de moléculas animadas,
e a expressão mais alta da sua existência, o que nós chamamos faculdades da
alma - memoria, discernimento, vontade, etc. - é simplesmente a soma, a
totalidade de consciência dos neurônios.
É
isso o que afirma, não um "louco" como nós, mas um sábio de tomo,
qual Le Dantec. E porque a nós não nos sobre autoridade cientifica
para confutá-lo, valha-nos a opinião de sábios por sábios.
Le
Dantec conjetura, Geley experimenta; e este, na sua obra já citada, após
relatar diversos casos de trepanação e ablação parcial do cérebro, assim conclui:
"Donc,
les hypothèses materialistes, qui faisaient de Ia pensée une secretion du cerveau
et vouIaient assigner des centres aux facultés mentales, sont erronées: -
"Il n'y a pas des centres speciaux présidant l'un à l'abstraction, l'autre
aux émotions, un troisième à Ia memoire; un autre à l’imagination. Cette mythologie
cerebrale est abandonée; notre activité spirituelle n'obéit à de divinités
locales, erigées par des savants crédules dans les dlfferents coins de Ieurs
schémas cerebraux!" (*)
(*) Portanto, as
hipóteses materialistas, que faziam do pensamento uma secreção do cérebro e
pretendiam localizar as faculdades mentais, estão em erro: "Não há centros
especiais a presidirem a abstração, as emoções, a memória, a imaginação. Esta
mitologia cerebral caducou, nossa atividade espiritual não obedece a divindades
locais erigidas por sábios crédulos nos diferentes escaninhos dos seus esquemas
cerebrais!
Mas,
na verdade e sem recorrer a grandes acrobacias mentais, o que nós não
concebemos e os materialistas não explicam, é como simples movimentos celulares
se transformam em pensamentos e sentimentos.
Outra
coisa que, de boa fé, escapa ao raciocínio lógico, é o fato de poder a simples
célula geratriz produzir a diferenciação dos tecidos, cartilagens, músculos,
ossos, nervos, vísceras e mais: a morfologia orgânica, a conjugação dos órgãos
em molde específico e a unidade de funções, como se tudo se passasse visando um
fim inteligente - a vida! A vida! E que é a vida?
O
Dr. Ferraz de Macedo, médico português ilustre, ao falar da vida
"post-mortem" (1) diz: Nunca me lembrei de que, ao analisar
anatomicamente um corpo morto, lhe não podia descobrir a vida, porque ela o
tinha abandonado.
(1) ‘Do
País da Luz’ - 1. II.
E
linhas abaixo, referindo-se ao corpo abandonado à terra: - Por que parou de trabalhar, quando continuava a ter todo que o fazia
trabalhar até então?
São problemas de alta
filosofia, estes, que se não podem tratar minuciosamente nos limites de uma
palestra, nem nos sobra, repetimos, maior autoridade para fazê-lo.
Montesquieu,
citado por Gíbier (1) dizia que, preferível a esgotar um assunto, era dizer
dele o suficiente para fazer pensar.
(1) ‘Analyse des Choses’ - cap. II, pág. 22
Acolhendo o conceito e por vos não molestar com
muitas citações clássicas, contrárias ao materialismo, nós vos inculcamos a
obra em que o Dr. Geley, com o método de um sábio verdadeiro, reuniu todas as
teorias correntes, provando com fatos da própria ciência que a maior parte
delas não passa de mero verbalismo convencional.
Assim,
por exemplo, entestando a teoria da evolução, afirma e demonstra que ela não
pode recusar, antes só pressupõe a existência de um dínamo-psiquismo superior,
que condiciona os organismos e que a eles preexiste e subsiste.
Um
fato só, ilustrativo do assunto - a histólise (fenômeno
da reabsorção dos tecidos, para sua renovação) do
inseto - é de molde a infirmar os fatores clássicos da Embriologia, para
justificar a evolução especifica.
Há,
diz Geley, um himenóptero (diz-se do inseto que tem quatro asas membranosas
e nuas, como as abelhas, certas formigas, etc.) que,
saindo da terra, precisa, para garantir a espécie, depositar o óvulo em certa
lagarta. A imobilidade da lagarta é, porém, condição indispensável ao
desenvolvimento do germe e, então, o que se dá é o seguinte: o himenóptero
ataca a lagarta de maneira duplamente inteligente, isto é, dosando o seu veneno
"quantum satis" (quanto baste, quanto for suficiente) para
não matar o inimigo e ferindo-o precisa, matematicamente, nos centros nervosos
da
locomoção.
Ora,
comenta o ilustre cientista, esse inseto saiu da terra, seus antepassados não
existiram para ele, nem tempo teve de lobrigar um coetâneo (que tem a mesma idade, que viveu na mesma época) de sua espécie... Como explicar esse instinto original, se a função
de espécie fosse, como querem os partidários de Darwin e Lammark, decorrente da
adaptação, da experiência, da amplificação hereditária?
Mas,
senhores, não é a própria ciência que nos afirma que o "complexus
celular", que o nosso corpo, como o dos animais e as próprias plantas são
cadinhos em constante transformação?
Por
uma tal afirmativa, a só estrutura específica, anatômica, tanto quanto a euritmia
(regularidade, justa proporção, entre as partes
de um todo) fisiológica, assume proporções de enigma
indecifrável.
E
se quiséssemos à luz de semelhantes postulados encarar a identidade moral do
ego, esse quid que afirma que existimos porque pensamos, sentimos, queremos,
amamos?
Entretanto,
meus senhores, fato é que, de todos os tempos, em todas as teogonias, na tradição
religiosa e mesmo profana de todos os povos, vamos encontrar assinalados os fenômenos
anímicos, os da manifestação das almas, hoje controlados pela ciência, mau
grado ao misoneísmo da própria ciência, que ora tenta negar "a
priori", ora afirma com "camouflage", como aconteceu com o
magnetismo, travestido em hipnotismo, e está sucedendo com o Espiritismo
mascarado de alucinação, metapsiquismo, histerismo, dinamismo, subconsciente,
etc.
Ah!
o misoneísmo da ciência vale bem pelo dogmatismo das religiões!
Foi
ele, foi esse misoneísmo que fez o grande Arago dizer que nunca se chegaria a
conhecer a composição química dos astros. Mas a espectrometria desmentiu
Arago...
Foi
ele que levou o grande Lavoisier a dizer: "Como hão de cair pedras do céu,
se no céu não há pedras?" E a astrofísica desmentiu Lavoisier.
Foi
ele, ainda, que levou BoilIeau a insultar o representante de Edison, chamando-o
ventríloquo impostor, diante do fonógrafo.
Foi
ele, sempre ele, que lançou o ridículo sobre o grande Galvani, despercebido que
da rã bailarina se originaria uma das maiores conquistas do século - a
aplicação da eletricidade, também desconhecida em sua essência.
E
o outro? O farisaísmo, irmão siamês daquele, hoje seu êmuIo (rival, contrário, adversário), senão mentor, na guerra ao que lhe escapa da rotina interesseira e
regalista?
Envenenou
Sócrates...
Crucificou
Jesus...
Queimou
Joana d'Arc...
Encarcerou
Gallileu...
Matou
Coligny...
Calcinou
João Huss...
Excomungou
Allan Kardec.
Mas,
senhores, seria um libelo interminável. Respigai nas páginas da História e
vereis quanto se há feito em nome da Religião e da Ciência, substancialmente
separadas nos seus princípios, quando uma afirma e outra nega a Deus, mas
virtualmente conjugadas e até reciprocamente enamoradas, quando atingidas no
que julgam privilégios seus, como se a inteligência e a razão fossem delas
patrimônio exclusivo!
Vejamos
agora como essa mesma ciência exclusivista, inquinada de presunção e orgulho,
procura nas malhas da própria inanidade, desobrigar-se do problema que se criou
e impôs, para definir as manifestações da inteligência, por exemplo. Não
podendo já atribuí-la à quantidade nem à qualidade da
massa cinzenta do cérebro, imagina fatores como o artritismo e até a sífilis! Fatores
patogênicos, nada mais.
Rides?
Mas, senhores, não sou eu quem o diz, é o Dr. Geley, comentando os seus
compares. Diz ele (1):
"Ainsi,
tout ce qui, au point de vue intellectuel, serait, soit ou dessous, soit au
dessus de Ia normale, serait le fait de Ia maladie" (*). E acrescenta:
"O Dr. Chabaneix fala de autointoxicação e "surmenage" nos
predispostos: -"Une des maladies du cerveau, e'est l'automatisme ou
l'apparition du subconscient" (**). Singular doença, obtempera Geley, que
em vez de ser uma causa de perturbação e diminuição para o indivíduo, aumenta
as suas capacidades e o seu poder. Mas, se perguntássemos a Chabaneix - que vem
a ser esse subconciente?
(1) De ‘L'Inconsctent,
au conscient’, Pág. 112.
(*)
Assim, tudo o que do ponto de vista intelectual estivesse abaixo ou acima do
normal, seria causa da moléstia.
(**) Uma
das moléstias do cérebro é o automatismo ou a aparição do subconciente.
O
padre Florencio Dubois, que tão galharda e ''cristãmente'' nos recebeu em Belém,
esparrimando (ou esparramando) a sua bilis
icorosa (que soa horrivelmente) pelas colunas de honra da "Folha do Norte", tambem nos falou
da "massa parda" ... Mas o Padre, coitado, é sempre um energúmeno e
de sobra conhecemos a sua ética - "O
cristão pode obrar precisamente como homem e despojar-se da personalidade de
cristão, naquelas ações que são próprias do homem cristão.” (pág. 3) (2).
(2) Teses
do Jesuíta Caen - Ecos de Roma, do
Padre Guilherme Dias, pág. 35.
A
teoria da sífilis... Senhores, não queremos privar-vos do sabor da
originalidade e assim damo-la aqui "ipsis Iitteris" no idioma do
genial autor.
"Si
Ia siphylis, conclut gravement Ie Dr. Paschal Serph (1) fait le mal que tout Ies medicins sont unanimes à reconnaitre et à
craindre pour l'humanité, elle lui donne, en revanche, Ia possibilité de
perfectioner ses moyens d'actions et compense ainsi, das une certaine mesure,
par son action hipertrophiante cérébrale, créatrice des idées particuliéres
géniales, ses mefaites redoutables."
(1) ‘Gazete mèdicale de
Paris’, 12 Juillete 1916.
Não
será o caso de darmos parabéns aos sifilíticos?
Mas,
admitido, por argumentar, o valimento da teoria da morbidez para justificar os
fenômenos psicológicos, é preciso considerar que as nevroses, como a loucura,
do ponto de vista da anatomia patológica ainda são puros enigmas para a ciência
médica. E não é dizendo simplesmente que o gênio é nevrose ou loucura, que se
fará compreender o mecanismo das produções geniais.
Mas,
senhores, se nós considerarmos o fato (e o fato é real) de um louco que, em
estado de hipnose, recobrava as suas faculdades normais? Aqui mesmo, no Rio,
conhecemos um homem, um amigo que esteve no Hospício como louco e era um
simples obsidiado.
Restabelecido
pelo Espiritismo, dele fez-se adepto fervoroso e era de ver-se como contava o
que denominava pitorescamente - "as memórias da sua loucura". Eram
puros fenómenos mediúnicos, de vidência e audição, que ele não podia rechaçar
por lhes ignorar a origem e que, provado está, não se combatem a soros nem a
ducha, nem a capacetes de gelo.
Voltando
a considerar com Le Dantec que o pensamento é função do corpo vivo, como
explicar o haver Walter Scott escrito "lvanhoé" em completo delírio
febril (1)? E os fatos de lucidez e clarividência?
(1) Alberto Seabra, ‘O
Problema do Além’, pág.101.
Dentre
muitos e mil mais, que se contrapõem à hipótese materialista, permitido nos
seja citar um só, narrado pelo Sr. Roberto Bruce:
"Navegando
perto da Terra Nova, absorvido em seus cálculos, ao passar pelo camarim do
capitão, julgou vê-lo sentado à mesa; mas; atentando melhor, verificou que era
um estranho a olhá-lo fixa e admiradamente. Surpreso com a ocorrência, vai
interrogar o capitão e este lhe assegura que ninguém lá poderia estar. De fato,
a verificação foi negativa; mas, insistindo o oficial que o homem que vira
estava escrevendo na ardósia, encontraram nesta as palavras: "Toquem para
noroeste" .
"A
increpação de que fosse a letra do próprio capitão e feita a contra prova da
caligrafia, não só deste como de todo o pessoal de bordo, verificado que nenhum
dos presentes escrevera na ardósia, o comandante deliberou seguir o rumo
indicado e três horas depois divisaram um "iceberg" e, junto dele, um
navio ao desamparo. Transbordados dele passageiros e equipagem, Bruce comovido
reconhece entre eles o homem do camarim. Chamado a explicar-se e solicitado a
escrever na outra face da ardósia as mesmas palavras, ficou demonstrada a
perfeita identidade da grafia. E contou que, precisamente um pouco antes de
meio dia, fatigado adormecera e sonhara que estava a bordo de um outro navio.
Contara o sonho ao capitão e agora o que lhe admirava era parecer-lhe tudo
quanto via muito familiar, quando, certo, ali nunca estivera."
Aqui,
comenta judiciosamente o nosso ilustre patrício Dr. Alberto Seabra, está um
caso de desdobramento inconsciente. Ele serve, diremos nós, e vós de certo já o
inferistes, para provar que o Espírito pode agir material e fisicamente, fora
do invólucro carnal.
É
postulado pacífico da psicologia oficial que todas as faculdades psíquicas
dependem de localizações cerebrais, precisas e nítidas: nihil est in intellectu quod non prius fuerit in sensu... (nada há no intelecto que não tenha primeiramente
estado nos sentidos. Aristóteles) Entretanto,
aqui estão, nesta obra, fundamentalmente consignadas as conclusões do Dr.
Guépin, comunicadas à Academia de Ciências de Paris em 24 de Março de 1917, a
saber (1):
(1) De L'Inconscient,
au conscient, pág. 82.
1º)
que a amputação do cérebro no homem é possível, relativamente fácil e salva
certos feridos, que os tratados clássicos condenam ainda à morte certa, ou,
pelo menos, a enfermidades incuráveis.
2º)
que esses operados demonstram, as vezes, não haverem perdido tal ou tal região
cerebral.
O
célebre Dr. Laveran regista a comunicação mais surpreendente ainda, do
presidente da Sociedade Antropológica de Sucre (Bolívia), fato ocorrido na
clinica do Dr. Nicolas Ortiz. Trata-se de um rapaz de 12 a 14 anos, falecido no
pleno gozo de suas faculdades intelectuais, e cuja autópsia revelou as meninges
hiperemiadas (a hiperemia é um aumento da quantidade de sangue
circulante num determinado local, ocasionado pelo aumento do número de vasos
sanguíneos funcionais) e um grande abcesso ocupando quase todo o cerebelo,
uma parte do cérebro e a protuberância.
Todos
sabemos que a hemiplegia é uma lesão cerebral, que se caracteriza pela
paralisia de um dos lados do corpo, o oposto ao da lesão. Pois bem: conhecemos
um jornalista de talento, o Dr. Tomaz Gomes dos Santos, filho do conselheiro desse
nome, o qual, em idade avançada, redigia o seu jornal em Vassouras e praticava
com proficiencia a odontologia. Era um intelectual.
Conclusão
única: nem quantidade, nem qualidade de massa encefálica para justificar a
existência da alma como epifenômeno (fenômeno que vem juntar-se a outro, mas sem influenciá-lo), no dizer de Huxley. Melhor fora confessar com Charles Richet:
que importa ao fisiologista toda essa extraordinária complexidade das células
nervosas com suas dendrites, arborescências, ramificações, corpúsculos, se ele
ignora o uso destas partes ? (1)
(1) ‘0 Fenômeno
Espírita’, pág. 122.
Não
citaremos mais fatos, fatos e fatos, mesmo porque, esta palestra não se
adstringe a fatos concretos e ao relatá-los, de escantilhão e sem ordem sistemática,
desejamos, de preferencia, realçar a doutrina pela indução filosófica dos
fatos.
Em
poucas palavras: para nós, mais alto que todas as comprovações da cirurgia, da
anatomia, da fisiologia, falam da imanência do ser, da sobrevivência do espírito,
da mônada consciente, desse dinamismo psíquico superior evolvendo e fazendo
evolver os organismos - mais alto para nós, repetimos - falam os fenômenos de
pura intelectualidade. E desses citaremos aquele que de longa data guardamos,
como dos mais categóricos.
Eis
como a ele se refere Eugène Nus em seu livro ‘Choses de l' Autre Monde’: "Nossa tripeça não se embaraçava
com tão pouca causa e desafio todas as academias literárias a formularem instantaneamente,
sem, preparo prévio nem, reflexão alguma, definições circunscritas a doze
palavras, tão completas e por vezes tão elegantes, como as improvisadas pela nossa mesa, à qual concedíamos no
máximo e a custo, a faculdade de formar uma palavra composta por um traço de
união...
Vejamos
algumas dessas definições:
Infinito - Abstração puramente ideal,
acima e abaixo do que é concebido pelos sentidos.
Espírito. - Suntuosidade do pensamento.
Galanteria harmoniosa das relações, das comparações e das analogias.
Harmonia. - Equilíbrio perfeito do todo com as partes e das partes entre si.
Mas,
basta. E os ditados musicais pela mesma tripeça?
Pergunta-se:
quem respondia? O subconciente de um assistente? O conjunto de todos eles? Mas,
o mecanismo do fenômeno em si? E, por que o não tentam os céticos, por que não
experimentam com essa fraude, esse ilusionismo que alardeiam tão fácil,
reproduzi-lo, efetiva-lo em igualdade de condições e controle? Ah! os
explicadores de inverossímeis com impossíveis!
Então,
se um ser rústico, boçal e até anormal, (é o caso da histérica de Charcot
escrevendo mediunizada uma sentença de PIatão em grego antigo) chega a tais
prodígios, então, é o caso de dizer-se que a fraude ultrapassa todas as inteligências
humanas!
Venham
os opugnadores, os caluniadores, os infirmadores destes fenômenos, vistam eles
batina ou empinem beca, venham todos os basófios reproduzir essas fraudes e nos
retrataremos.
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