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2a. "Regressão de Memória"
por Hermínio C. Miranda
in Reformador (FEB) Julho 1972
Em artigo anterior, ficou a promessa de prosseguirmos no
estudo do fascinante problema da regressão de
memória apoiado nas pesquisas do engenheiro e coronel francês Albert De Rochas que, sem
aderir aos postulados do Espiritismo, deixou impressionante relato de suas
experiências de magnetização.
De Rochas era homem de profunda cultura e variados
interesses. Os livros que escreveu abordam com extraordinária lucidez os
assuntos mais diversos. Muitos deles foram premiados com medalhas de ouro,
prata e "vermeil", como "Poliorcétique des Grecs" (história
militar), "Le Patois du Queyras" (linguística), "Principes de Ia
Fortification Antique" (arqueologia), "Les Vallées Vaudois"
(geografia) e "La Campagne de 1692 dans le Haut-Dauphiné" (história).
Essas obras se esgotavam rapidamente e não poucas, já em vida do autor, haviam
sido traduzidas para o alemão, sueco, espanhol e russo. A despeito de toda essa
atividade, ainda era ele professor da Faculdade de Engenharia.
É, pois, autor altamente qualificado para as tarefas que
realizou, pela sua objetividade, cultura e espírito científico, tanto quanto
pela sua absoluta insuspeição, dado que jamais se filiou ao movimento espírita,
que na sua época já alcançara notável desenvolvimento e atraíra sábios e
pensadores de grande projeção.
Esse é o homem. Agora, vejamos um pouco da sua obra. Ficaremos
limitados, nesta oportunidade, ao exame do seu magnífico estudo intitulado
"Les Vies Successives" ("As Vidas Sucessivas"), do qual
possuo um exemplar da primeira edição de 1911, da Bibliothèque Chacornac.
O livro é iniciado com a declaração de que a imortalidade
da alma tem ocupado através dos tempos a atenção dos filósofos, mas o problema
das vidas sucessivas não tem merecido a mesma atenção, a despeito da sua
extraordinária importância na definição de "condições mais justas para recompensar ou punir, no contexto da
eternidade, as boas ou más ações cometidas durante o lapso de tempo
infinitamente curto que é a vida terrena". O autor parte, assim, de
uma especulação filosófica para a qual as religiões ortodoxas nada têm a
oferecer, a não ser a incongruente doutrina do céu e do inferno. Que acontece
com a pessoa que praticou crimes inomináveis? Vai para um inferno eterno, sem
mais uma única "chance" de recuperação pelos erros praticados no
curtíssimo espaço de uma existência terrena? E, no reverso da medalha, será que
a criatura humana toma o "céu" de assalto pelos simples méritos de
uma só vida e lá se instala entre os espíritos perfeitos por todo o resto dos
tempos eternos? Não, não deve ser assim, e realmente não é.
Procurando expor primeiro os aspectos históricos e
filosóficos da questão, De Rochas resume o pensamento de antigos e modernos,
dando notícia do que achavam egípcios, caldeus, hindus e gauleses, tanto quanto
Platão, Jâmblico, Cícero e Virgílio, este nos versos imortais da "Eneida":
"Meu filho, disse o velho, tu vês aqui aparecerem
Aqueles que em outros corpos devem um dia
renascer
Mas que antes doutra vida, doutros trabalhos
duros,
Buscam as águas impassíveis do Letes
E no longo sono das paixões humanas
Bebem felizes o esquecimento de antigas penas..."
São mencionados, a seguir, os textos evangélicos que
narram a indagação acerca da identidade de Elias e João Batista, bem como as
dúvidas de Nicodemos. Quanto aos pais da Igreja, ou seja, os seus primeiros
teólogos, muitos dos mais eminentes tinham o princípio da reencarnação como
pacífico e nele não viam nenhum conflito com a doutrina do Cristo. No entanto,
os dogmas posteriores e alguns artigos de fé entraram em choque com a doutrina
das vidas sucessivas e, no Concílio de Constantinopla, em 553, essa e outras
questões ficaram liquidadas em favor da rigidez cadavérica da fé cega, das
penas eternas; da predestinação e do julgamento inapelável.
Entre os mais modernos, Pezzani, Lavater, Voltaire,
Reynaud, Victor Hugo, François Coppée, Tolstoi e outros também admitiram, sem
dificuldade, o princípio de que o ser humano vive muitas existências na Terra.
Lavater, por exemplo, em carta de 1º de agosto de 1798 à Imperatriz Maria
Feodorovna, da Rússia, escrevia o seguinte: "A alma se aperfeiçoa a si mesma, vivendo na Terra as qualidades do
corpo espiritual, veículo através do qual ela continuará a existir depois da
morte do corpo material e que lhe servirá de órgão para conceber, sentir e agir
na sua nova existência."
E o verso tão belo de François Coppée, sob o título de
"La Vie Antérieure"? Contemplando a figura da amada, diz o poeta:
"Tu deves vir, criança, desse país de luz
Ao qual minhalma há pouco devia pertencer.
Porque tu me trazes a vaga recordação,
Porque ao te contemplar, loura donzela ingênua,
Gemi como se te houvera reconhecido...
E assim que meu olhar mergulhou no fundo
[do teu
Senti que no passado já nos amamos..."
* * *
2b. "Regressão de Memória"
por Hermínio C. Miranda
in Reformador (FEB) Julho 1972
Tudo isso, porém, são apenas crenças, especulações e a
maravilhosa intuição dos poetas, dos místicos, dos sonhadores. Mas, e a verdade
dos fatos, qual é? Será que o homem vive realmente muitas vidas sobre a Terra?
Como pesquisar? A esse trabalho se propôs o engenheiro AIbert De Rochas e o seu
livro dá conta de seus estudos e de suas
conclusões, em 504 páginas compactas.
O autor empregava a técnica da magnetização do paciente
por meio de passes longitudinais, combinados com a imposição da mão direita
sobre a cabeça, estando o paciente sentado confortavelmente diante dele. Às
vezes tomava o sensitivo pelos polegares e o encarava fixamente nos olhos, para
provocar um adormecimento preliminar. Observou logo, no decorrer de suas
experimentações, que o paciente atravessava estados característicos e
sucessivos, sempre na mesma ordem, sempre separados por uma curta fase de letargia.
Disso extraiu uma classificação que apresenta da seguinte forma:
1º estado: Vigília.
I fase de letargia
2º estado: Sonambulismo - o paciente parece acordado,
encontra-se na posse de seus sentidos, mas é muito
suscetível à sugestão e apresenta o fenômeno da insensibilidade cutânea, que
persiste durante os estados seguintes. A memória é normal.
II fase de
letargia
3º estado: "Rapport" (Afinidade) - o paciente
somente percebe a presença do
magnetizador e das pessoas
que este colocar em contato com ele. Notável sensação de bem-estar. Diminuição
da memória normal e da sugestibilidade. Diz De Rochas que neste ponto começa a
se "exteriorizar a sensibilidade". Diríamos nós que se inicia o
desprendimento do perispírito. De Rochas comprovou que a sensibilidade à picada
de agulha fica a cerca de 35 milímetros da pele do paciente. Nesse estado, o
paciente vê "os eflúvios exteriores dos corpos organizados e dos
cristais", isto é, a chamada aura dos seres e dos corpos
inanimados.
III fase de
letargia
4º estado: Simpatia ao contato - a sensibilidade
(perispírito) continua a se exteriorizar, podendo ser encontrada uma segunda
camada sensível a 6 ou 7 cm da primeira de 35 milímetros. O paciente
experimenta as mesmas sensações que o operador, quando este se põe em contato
com ele. A sensibilidade cutânea desaparece e também a memória dos fatos. Esta
não retorna nos estados subsequentes, mas a memória da linguagem permanece,
dado que o paciente é capaz de conversar com o magnetizador.
IV fase de
letargia
5º estado: Simpatia à distância - o paciente percebe
todas as sensações do
magnetizador, mesmo sem
contato, desde que a distância não seja grande. Não vê mais a aura, mas é capaz
de ver os órgãos internos dos seres vivos. Não está mais sujeito à
sugestibilidade e esquece-se por completo de sua existência atual. Não conhece
senão duas pessoas: seu magnetizador e ele próprio, mas nem os nomes sabe
repetir. A partir desse momento, um pouco mais ou um pouco menos, conforme o
paciente, a sensibilidade (perispírito), que até então se exteriorizava em
camadas concêntricas, na periferia do corpo, se condensa para formar, a cerca
de um metro à direita, uma coluna nebulosa de cor azul e um pouco atrás, e
depois à esquerda, uma coluna análoga de cor vermelha. Em alguns pacientes -
esclarece De Rochas em rodapé - essa formação é em ordem inversa. Ao cabo de
algum tempo, as duas colunas se fundem numa só, que vai se definindo até
constituir o "fantasma" do paciente, ou seja seu perispírito. Essa
figura fluídica permanece ligada ao corpo físico por um fio luminoso e
sensível, como um cordão umbilical. (1) A figura desprendida se eleva acima do corpo e o
paciente fica em tal estado de euforia que, com frequência, detesta a ideia de
retornar ao corpo físico.
(1) Já tive
oportunidade de ver fotografias notavelmente nítidas desse fenômeno, algumas
das quais estão reproduzidas aqui.
É nesse estado último que o paciente penetra com maior ou
menor segurança - dependendo da sua posição evolutiva e de suas condições
espirituais - nos vastos domínios da lembrança de vidas anteriores. Albert De
Rochas prosseguia daí em diante com os passes longitudinais, recuando o
paciente no tempo, de vida em vida, aprofundando-se no passado remoto. Nessas
condições, o sensitivo parecia reviver
todas as cenas de dor e alegria, plenamente entregue às antiquíssimas e
esquecidas sensações que a elas se ligavam. Se a experiência era repetida em
outra oportunidade, o paciente repassava pelos mesmos pontos, pelas mesma
sensações, na mesma sequência, sem enganos, sem contradições, sem hesitações.
Para despertá-lo, o coronel dava passos transversais,
enquanto o paciente voltava pelos mesmos caminhos percorridos, repassando, em
sentido contrário e em maior velocidade, suas dores e alegrias.
As experiências de De Rochas começaram em 1893 e foram
até 1910. Durante esses anos testou 19pacientes, homens e mulheres de diversas
idades, ocupações e tendências. Confessa que ao começar ignorava o trabalho de
outros magnetizadores, mas que verificou depois que as conclusões a que
chegaram eram análogas às que ele próprio alcançou.
Diz que foi por
acaso que deu com o fenômeno, na pessoa de Laurent, jovem de 20 anos de
idade, paciente precioso porque, dono de alguma instrução, era não somente
sensível à magnetização, mas também de “viva curiosidade científica e de
acurado espírito de análise”. Além disso, dispunha da faculdade de observar as suas
próprias reações, em condições de relatá-las posteriormente com toda a clareza.
Ao escrever seu primeiro depoimento, em 21 de julho de
1893, Laurent confessa um “vago sentimento de temor”. “A ideia de um sono durante o qual minha vontade seria anulada me fazia
quase recusar-me à experiência, se o receio de me acreditarem medroso não se
opusesse. Sentimento muito complexo: pavor do desconhecido, respeito humano, no
fundo muito banal e – o que predomina de repente – confiança encorajadora no
experimentador. No entanto, é com vivíssima emoção que me entrego às mãos do
senhor De Rochas, sem esperança de que eu seja suscetível de adormecer.”
Este relato é aqui reproduzido porque, com ligeiras
variações pessoais, o comportamento do paciente se assemelha notavelmente a
todas as experiências até hoje realizadas: o temor, a confiança, a euforia, a
verificação de que à medida que se aprofunda o estado de desprendimento o
paciente vai ficando menos suscetível à sugestão e, portanto, mais seguro de si
mesmo. Esta última impressão, no entanto, é falsa. Somente em estado de
completa alienação mental, disparado por um de fuga e autodefesa, o espírito
perde consciência de si mesmo. O que acontece nos estudos avançados de
desprendimento do períspirito é que a memória espiritual não está mais na
dependência do cérebro físico, ou seja, o estado de consciência vai com o
espírito desprendido, tanto que este continua a conversar - e com extraordinária segurança e equilíbrio
– com seu operador. Só que ao despertar, regressando ao amortecimento do corpo
físico, não se lembra do que se passou e do que disse enquanto esteve
exteriorizado, para usar a terminologia de De Rochas.
Esse foi o caso número 1, ou seja, o do jovem Laurent.
Até então, as experiências foram apenas tateantes e totalmente limitadas aos
procedimentos da existência atual do paciente.
Somente em 1904, o ilustre engenheiro retomaria suas
pesquisas, desta vez com Joséphine, uma jovem de 18 anos. Adormeceu-as por meio
de passes longitudinais, “para saber que
fenômenos ela apresentaria e fiquei surpreendido ao verificar que, sem nenhuma sugestão, eu a fazia percorrer
em sentido inverso o curso de sua vida, tal como Laurent, coisa que eu não
observava desde 1893.” O grifo é meu, porque, em casos de meu conhecimento
pessoal, também observei a desnecessidade de dar sugestão para reconduzir o
paciente ao passado. Logo que desprendido, parece ele na plena posse de sua
memória integral e, com algum treinamento, em condições de discorrer sobre
qualquer uma de suas existências, apenas com o reforço de mais alguns passes,
de vez em quando.
Joséphine recuava com facilidade à infância. “Ei-la aos
sete anos” – diz De Rochas. “Pergunto-lhe o que faz – Vou à escola – Você sabe
escrever? – Sim, estou começando.”
Note o leitor o tempo do verbo: estou começando, como se o paciente estivesse novamente na sua
infância, a responder a uma pessoa que lhe perguntava coisas. De Rochas põe lhe
uma pena na mão e ela escreve algo a seu pedido; duas sílabas apenas: pa-pa.
“Após algumas sessões destinadas a treiná-la e a diminuir o tempo necessário a leva-la ao
estado de sua primeira infância, a responder a uma pessoa ao estado de sua
primeira infância, tive a ideia de prosseguir com os passes longitudinais.
Interrogada, Joséphine respondeu por sinais às minhas perguntas; e foi assim
que ele me comunicou, pouco a pouco, em diferentes sessões, que não havia ainda
nascido, que o corpo no qual deveria encarnar-se estava ainda no ventre de sua
mãe, em torno de quem ela permanecia, mas cujas sensações tinham pouca
influência sobre ela.”
Com o aprofundamento do sono, manifestou-se uma nova
personalidade, “com a qual experimentei,
de início, alguma dificuldade em determinar sua natureza". É que a
pessoa que ali falava agora não queria se revelar, dizendo quem era e onde se
encontrava. Respondia com voz de homem, desconfiado, e que estava ali presente,
pois que falava; quanto ao mais, nada via, estava no escuro.
Foi assim, confessa o autor, em extensa nota de rodapé,
que se viu lançado "numa ordem de
pesquisa que estava longe de suspeitar" e na qual tinha de prosseguir
ele próprio, aprendendo com as reações e informações dos seus pacientes.
Por fim, Joséphine, adormecida, ao cabo de muita
tergiversação, começou a responder às perguntas do seu magnetizador. Chamava-se
Jean-Claude Bourdon, vivia num lugarejo por nome Champvent, na comunidade de
Polliat. Esclareceu que havia dois lugares com esse nome; o dele ficava perto
de Nézériat, e que ele costumava ir sempre a St. Julien sur Reyssouse. Com
essas informações, foi possível ao coronel De Rochas localizar o vilarejo de
Champvent, no Departamento de Ain.
Foi difícil vencer a sua resistência, captar sua
confiança e sacar-lhe os pormenores da sua história. O experimentador usou de
um artifício: "envelhecia"
o paciente, a despeito dele próprio, para puni-lo da resistência; e o "rejuvenescia", fazendo-o recuar no
tempo, para recompensá-lo e estimulá-lo nas respostas. A biografia de Jean-Claude
era modesta. Nascera em 1812, frequentou a escola até aos 18 anos, porque
"não aprendia grande coisa", serviu no 7º Batalhão de Artilharia, em
Besançon. Para testar esta informação, o coronel apurou que o 7º realmente
esteve sediado em Besançon de 1832 a 1837, fato que Joséphine não tinha meios
de saber, pois era de instrução primária. O comportamento de Jean-Claude com as
mulheres não foi muito correto; em vez de desposar a antiga namorada, que
deixara quando foi servir ao exército, tomou-a por amante. Envelheceu solitário
e morreu aos 62 anos de idade, ao cabo de longa enfermidade. Não acreditava na
sobrevivência do ser. Ao reviver para De Rochas os últimos instantes, recusou a
sugestão de chamar o padre. Na sua opinião, quem morria ficava morto, e pronto.
Em seguida, sente-se preso ao seu corpo físico, e, flutuando em torno dele,
assiste ao seu próprio enterro. Ouvia vagamente alguns comentários dos
circunstantes. Durante a cerimônia religiosa na igreja, antes do enterro,
observou que, quando o padre deu uma volta em torno do seu caixão, formou-se uma parede algo
luminosa que impedia que "os maus
espíritos" se precipitassem sobre ele. As preces do
sacerdote infundiram-lhe calma, mas tudo isso foi de pouca duração. No
cemitério, ficou nas proximidades do corpo e o sentia decompor-se, com o que
muito sofria. Passou a viver mergulhado em penosa escuridão, mas suportável,
porque não tinha grandes crimes a lhe pesarem na consciência - nunca roubou nem
matou. A morte não é, pois, o que ele julgava que fosse. Ao cabo de indefinível
espaço de tempo, tem a inspiração de renascer num corpo feminino, para expiar
as faltas que cometeu contra as mulheres. Aproxima-se de uma senhora que será
sua mãe e aos poucos tem a sensação de ir-se apossando do corpo da criança. Até
aos 7 anos percebia em torno de si uma espécie de cerração, na qual via muitas
coisas que não conseguiu rever mais tarde.
Reconstituída a história de Jean-Claude, De Rochas
recomeçou os passes longitudinais, provocando, durante três quartos de hora,
uma prolongada magnetização. Nova personalidade. Desta vez é uma mulher
"três méchante" - muito perversa. Língua ferina, divertia-se em
praticar o mal. Tinha dores horríveis e às vezes se contorcia no sofrimento
revivido. Ao morrer, sente-se envolvida em trevas, à mercê de Espíritos
terríveis que a atormentam e aos quais ela acaba por se misturar para, por sua
vez, atormentar os encarnados. Chama-se Philomène
Carteron. Nasceu em 1702 como Philomène... Charpigny; seu avô materno era um
certo Pierre Machon e morava em Ozan. Casou-se em 1732, em Chevreux e teve dois
filhos que morreram. Antes dessa, viveu uma existência em que foi um homem
violento que matou e roubou, um verdadeiro bandido. Por isso, sofria nas
trevas, nos intervalos de suas vidas.
A experiência não pôde ser aprofundada porque a magnetização
durava já três horas, a paciente dava sinais de cansaço e ainda era preciso
fazê-la percorrer o caminho de volta. por meio de passes transversais, a fim de
despertá-la. No entanto, numa das experiências subsequentes, pressionando com o
dedo um ponto no meio da testa, ordenou-lhe o magnetizador que regressasse mais
longe ao passado. "Ela me disse,
então - escreve De Rochas -, com
hesitação e girando a cabeça com um ar confuso, que havia sido um macaco, um
grande macaco quase parecido com o homem. Diria mais tarde, em outra
experiência, que entre a vida como macaco e a que vivera como bandido havia
tido muitas encarnações: lembrava-se de ter vivido nos bosques matando lobos -
e ao dizer isso assumia um aspecto feroz."
Foi com esse mesmo paciente que De Rochas tentou, pela
primeira vez, reverter o processo e em vez de penetrar no passado, incursionar
pelo futuro, por meio de passes transversais de dispersão, mas as experiências
não foram conclusivas. As predições a curto prazo não se realizaram e as que se
projetaram a prazo mais longo não foram verificadas, porque depois que a moça
deixou Paris nunca mais o experimentador teve notícias dela. Há um pormenor
curioso, porém. Numa das sessões, ela diz que já se encontra no futuro e se
reencarnara como uma menina chamada Marie. Seu pai é um negociante de calçados
em Saint-Germain-du-Mont-d'Or e se chama Edmond Baudin. Sua mãe chama-se
Rosalie. Marie declara estar com 12 anos
de idade, mas recusa-se a responder qual o ano em que se encontra, alegando que
seu pai não gosta de folhinhas. Aos dezesseis anos informa, afinal, que está no
ano de 1970 e escreve seu nome. É uma sexta--feira, mas ela não sabe dizer de
que mês. O regime político é republicano. Que tal se tentássemos localizar
agora, em 1972, a jovem Marie Baudin, em Saint-Germain-du-Mont-d'Or, aos 18 anos?
Há outra experiência interessante com Joséphine e que
confirma observação que também tive oportunidade de fazer. Uma vez alcançado o
estado de desprendimento, o paciente pode viajar quase que à vontade no tempo,
sem necessidade de magnetização contínua. De Rochas deixou a jovem entregue a
si mesma e de vez em quando "conferia" o tempo, fazendo-lhe
perguntas. À uma e trinta da tarde, depois de magnetizada, Joséphine é
abandonada aos seus próprios recursos, numa fase de suas recordações em que
conta 15 anos de idade. Dez minutos depois, perguntada, responde que tem 10
anos. Não vê o experimentador, mas ouve a sua voz. Encontra-se em companhia de
outras criança, que não ouvem a voz do coronel e dizem que ela, Joséphine, está
louca. A sensibilidade - ou seja, o perispírito - está exteriorizada. Às duas e
dez tem 5 anos, às duas e vinte e cinco não sabe da idade. Parece sugar o seio
materno. Às duas e trinta e cinco agita-se e parece sofrer. Está passando pelo episódio da morte de
Jean-Claude. O coronel dá-lhe passes longitudinais e novamente a deixa só, a
partir do momento em que a paciente alcança os dois anos de idade, em sua vida
atual. Em suma, Joséphine precisa de uma hora e quarenta e cinco minutos para
percorrer 14 anos (dos 4 aos 18) e deverá acordar naturalmente às quatro e
meia; mas, de certo ponto em diante, há uma aceleração no processo e ela
desperta espontaneamente às quatro horas e oito minutos.
Para fazê-la recordar-se do que se passou com ela, o
coronel faz-lhe uma pressão no meio da testa.
Seria impraticável reproduzir, num breve trabalho como
este, experiências e comentários de um livro de mais de 500 páginas. Tomemos
algumas características dominantes e que se reproduzem, de uma forma ou de
outra, em outros pacientes. Eugénie (caso nº 3) vê ao seu lado, depois de
desprendida, os Espíritos de sua avó e de uma de suas tias. Com esta paciente,
são bem sucedidas as experiências de progressão. De Rochas tenta chegar a
acontecimentos futuros por meio de passes transversais. A paciente tem 35 anos
de idade na vida presente. Ao chegar aos 37, levada pela magnetização,
manifesta os sinais do parto e sente-se envergonhada por não ser casada. Isto
deveria passar-se no futuro ano de 1906. Alguns meses
depois, apresenta sintomas de afogamento e De Rochas leva-a dois anos à frente.
Novos sintomas de parto. O experimentador lhe pergunta onde se encontra naquele
momento.
- Em cima d'água, diz ela.
A resposta pareceu estapafúrdia e ele concluiu que a moça
divagava. Em seguida, despertou-a. Não obstante, tudo quanto ela predisse
realizou-se. Em 1906 teve um filho de um amante. Pouco depois, desesperada,
atirou-se ao rio Isère e foi salva. Enfim, em janeiro de 1909, novamente
grávida, sentiu as dores do parto quando se achava exatamente em cima d'água,
numa ponte do rio Isère...
Platão
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