A 3ª Revelação, que trouxe ao homem o Consolador prometido, aclara sobre distorções culturais que martirizaram gerações, entre elas a noção de Inferno. Allan Kardec, encarregado maior, entre os encarnados, de transmitir-nos essas revelações, apresenta em “O Céu e o Inferno” muito bons esclarecimentos sobre o tema...
O Inferno
“Desde todas as épocas o homem acreditou, por intuição, que a vida futura seria feliz ou infeliz, conforme o bem ou o mal praticado neste mundo. A idéia que ele faz, porém, dessa vida está em relação com o seu desenvolvimento, senso moral e noções mais ou menos justas do bem e do mal.”
“Não podendo compreender senão o que vê, o homem primitivo naturalmente moldou o seu futuro pelo presente; para compreender outros tipos, além dos que tinha à vista, ser-lhe-ia preciso um desenvolvimento intelectual que só o tempo deveria completar.”
“O inferno pagão, descrito e dramatizado pelos poetas, foi o modelo mais grandioso do gênero, e perpetrou-se no seio dos cristãos, onde, por sua vez, houve poetas e cantores. Comparando-os, encontram-se neles - salvo os nomes e variantes de detalhe - numerosas analogias; ambos têm o fogo material por base de tormentos, como símbolo dos sofrimentos mais atrozes. Mas, coisa singular! Os cristãos exageraram em muitos pontos o inferno dos pagãos. Se estes tinham o tonel das Danaides, a roda de Íxion, o rochedo de Sísifo, eram estes suplícios individuais; os cristãos, ao contrário, têm para todos, sem distinção, as caldeiras ferventes cujos tampos os anjos levantam para ver as contorções dos supliciados (Sermão pregado em Montpeillier em 1860); e Deus, sem piedade, ouve-lhes os gemidos por
toda a eternidade.”
“Os cristãos têm, como os pagãos, o seu rei dos infernos - Satã - com a diferença, porém, de que Plutão se limitara a governar o sombrio império, que lhe coubera em partilha, sem ser mau; retinha em seus domínios os que haviam praticado o mal, porque essa era a sua missão, mas não induzia os homens ao pecado para desfrutar, tripudiar os seus sentimentos.
Satã, no entanto, recruta vítimas por toda parte e regozija-se ao atormentá-las com uma legião de demônios armados de forcados a revolvê-las no fogo.”
“As mesmas considerações que, entre os antigos, tinham feito localizar o reino da felicidade, fizeram circunscrever igualmente o lugar dos suplícios. Tendo-se colocado o primeiro nas regiões superiores, era natural reservar ao segundo os lugares inferiores, isto é, o centro da Terra.”
“Esta mistura de idéias cristãs e pagãs nada tem de surpreendente. Jesus não podia de um só golpe destruir inveteradas crenças, faltando aos homens conhecimentos necessários para conceber a infinidade do Espaço e o número infinito dos mundos; a Terra para eles era o centro do Universo, não lhes conheciam a forma nem o centro do Universo, não lhes conheciam a forma nem a estrutura interna...”
“Jesus encontrava-se, pois, impossibilitado de os iniciar no verdadeiro estado das coisas...”
“Ele - Jesus - limitou-se a falar vagarosamente da vida bem-aventurada, dos castigos reservados aos culpados, sem referir-se jamais nos seus ensinos a castigos e suplícios corporais, que constituíram para os cristãos um artigo de fé...”
“Eis aí como as idéias do inferno pagão se perpetuaram até os nossos dias. E foi preciso a difusão das modernas luzes, o desenvolvimento geral da inteligência humana para se lhe fazer justiça...”
“Localizados o céu e o inferno, as seitas cristãs foram levadas a não admitir para as almas senão duas situações extremas: a felicidade perfeita e o sofrimento absoluto. O purgatório é apenas uma situação intermediária e passageira, ao sair da qual as almas passam, sem transição, à mansão dos justos. Outra não pode ser a hipótese, dada à crença na sorte definitiva da alma após a morte. Se não há mais de duas habitações, a dos eleitos e a dos condenados, não se podem admitir muitos graus em cada uma sem admitir a possibilidade de os franquear e, por conseguinte, o progresso. Ora se há progresso, não há sorte definitiva, e se há sorte definitiva, não há progresso. Jesus resolveu a questão quando disse: “-Há muitas moradas na casa de meu Pai”.”
“É verdade que a igreja admite uma posição especial em casos particulares. As crianças falecidas em tenra idade, não podem ser condenadas ao fogo eterno. Mas, também, não tendo feito o bem, não lhes assiste direito à felicidade suprema. Ficam nos limbos, diz-nos a igreja, nessa situação jamais definida, na qual, se não sofrem, também não gozam da bem-aventurança.”
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