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quarta-feira, 21 de outubro de 2020

A Revolução francesa de 1789 e o Espiritismo

                            

A Revolução Francesa de 1789 

e o Espiritismo

por Fernando de Alencar      Reformador (FEB) Junho 1908

             Desde o sangrento alvorecer da Revolução francesa de 1789 vai o nosso mundo evolucionando em marcha progressivamente célere, e, na atualidade, esse movimento ascensional vai se tornando cada vez mais precípite, sentindo-se que o coração do Planeta pulsa vigorosamente ao influxo do Cristianismo, esse flamejante sol, cuja luz, por tantos séculos velada pelo papismo e pela tirania feudal, rompendo essas duas grandes nuvens tenebrosas, vai se desdobrando vitoriosamente por sobre todas as nações, todas as cidades, todos os lares, iluminando com seus vivificantes raios todos os corações, que o gelo do ceticismo e o luto da desesperança tornaram hirtos, macilentos, cadavéricos!

            A tremenda Revolução tem, para seus rubros desvarios de alucinada sublime, uma justificativa aceitável, uma atenuante absolutória (absolutiva).

            Se fez espargir ondas de sangue, se supliciou a tirania, em compensação exauriu perenes fontes de amaríssimas lágrimas!

            Se desmoronou um trono, sob cujas ruínas foram sepultados a família real e os seus numerosos caudatários, em troca ergueu uma ara (cultivo) sacrossanta à Liberdade - essa deusa martirizada por tanto tempo, e tantas vezes, supliciada na cruz formada pelos rudes lenhos chamados cetro e básculo (cajado)!

            Se, de um lado, despedaçou o negro sólio (inabalável) da tirania secular, e se espatifou os altares que se haviam transformado em verdadeiros balcões, de outro, com a mesma energia e justiça reivindicadoras, britou, numa loucura sagrada, as enéas (?) portas da Bastilha, de cuja espessa noite - só estrelejada de lágrimas - arrancando as míseras vítimas, ali sepultadas em vida, fe-las respirar as auras oxigenadas da liberdade d'envolta com os raio vivificantes do amor e da esperança, que jaziam cadavéricos no túmulo de seus corações.

            O mundo, amortalhado na escravidão, dormia o sono da miséria e da inércia, agitado de pavoroso pesadelo, provocados pelas patas do despotismo, que tripudiava sobre o seu peito descarnado e exânime!  

            O estrondo do desmoronamento da Bastilha despertou-o subitamente! Alçou fronte para o alto. Sentiu baixar-lhe do céu sobre o cérebro uma luz deslumbradora – a luz da razão e no peito os aromas inefáveis da liberdade e do amor em sua mais alta expressão, sem os quais o progresso e a felicidade não passam de concepções quiméricas!

            Tendo conquistado a liberdade cívica, a Revolução – essa heroína que teve por mãe a Enciclopédia que Diderot, Voltaire, Rousseau, d’Alembert e tantos outros imortalizaram  desapareceu do cenário do mundo, depois de haver semeado no cérebro da humanidade os gérmens da Civilização - essa árvore de precioso frutos - a cuja alentadora sombra já se vão acolhendo harmoniosamente, em significativo amplexo quase todas as Nações, que têm agora os olhos fixos num horizonte inundado, presentemente, de azul e ouro, d'antes toldados pelas nuvens do fumo dos canhões, sulcadas pelos rubros clarões sinistros dos fuzis!

            O mundo tem evolucionado.

            As artes, as letras, as ciências marcham desassombradamente à conquista de seus ideais sacrossantos! Sente-se que um vigoroso punho invisível impulsiona a humanidade para a terra da Promissão.

            Tudo murcha, tudo progride.

             Somente Roma estaciona, queda e hirta, revestida no limo de seus dogmas, como rijo escabroso penedo impassível em meio da torrente cristalina das ideias modernas deslizando, rápida e serenamente, para o oceano sem margens da perfectibilidade, em cujas ondas abismais o naufrágio é vida!

            A atlética heroína, a Revolução, proclamando os direitos do cidadão, arvorou bem alto o lábaro da liberdade, que projetou sua sombra benfazeja por sobre quase toda a superfície do planeta.

            Mas a proclamação desses direitos por tantos evos (eternidades) conculcados (humilhados) pelos verdugos do Povo, não era certamente, a única aspiração veemente das sociedades, cujo peito arquejava, opresso, ao peso da tirania régia!

            O princípio básico das liberdades cívicas estava conquistado a golpes das penas dos Enciclopedistas e da lâmina fria e cruel da guilhotina revolucionária! O feudalismo era um cancro! Para extirpa-lo, no estado de civilização em que estava então o mundo, foi necessária a efusão de sangue, provocada pelo bisturi da Revolução. Explodiu terrível, como a tempestade, mas, como esta, purificou o ambiente social! Foi cruel, mas foi útil. Portanto, não assiste razão àqueles que, como o padre Júlio Maria, trovejam objurgatórias (condenações) contra a filosofia e a saneadora Revolução do século XVIII.

            Mas, como dizia, as liberdades cívicas tinham sido conquistadas. Sem embargo, continuava ainda maniatada a virgem chamada Liberdade de Consciência.

            Tinha-se efetuado a revolução na sociedade; era preciso realiza-la nas consciências. Mas como?

            A sangria revolucionária havia descongestionado o cérebro do mundo dormindo o sono comatoso da apoplexia, provocada pelo sol equatorial do despotismo!

            Tinha-se feito muito, mas não se fizera tudo; restava libertar as consciências. Mas como?  

            Roma tinha sido, até bem pouco tempo, o baluarte inexpugnável, que era preciso derrocar, a despeito de tudo, para libertar a pobre ultrajada.

            Da imprensa e das tribunas populares partiam esfuziando vigorosas setas contra o Vaticano – formidável reduto do Passado!

            A filosofia enciclopedista já lhe havia feito experimentar alguns estremecimentos; contudo, continuava de pé a mole (indolência) sinistra!

            Mas aquilo, que o cérebro dos encarnados não conseguiu de modo completo, já agora o vai realizando o ensino dos espíritas, com uma lógica e clareza admiráveis.  

            Os Evangelhos, até então abstrusos, lidos hoje a luz da exegese das inteligências de além-túmulo, estão sendo facilmente compreendidos, e o papismo, avaro e orgulho, entrincheirado no espantalho de seus domas, que o bom senso já repudia com gargalhadas mefistofélicas, vai cedendo o lugar, em dissimulada fuga, reprimindo a custo a explosão de sua fúria impotente diante da cruzada imponente do moderno Espiritualismo que, cônscio de seu valor e de sua vitória, avança tranquilamente, sitiando em colunas cerradas, o suntuoso palácio de Caifás de Roma, palácio que há de fatalmente arder no sublime incêndio ateado pelas flamas da Verdade, que o Espiritismo vai desdobrando ante os olhos surpresos do mundo desperto!

            O coração da humanidade já se vai abrindo, de par em par, à invasão benéfica dos sentimentos filantrópicos! O ouvido atento do observador já não lhe ausculta o ruído precipite e desordenado que, dantes, tão frequentemente, nele produziam as execrandas paixões do ódio e da vingança, cujos relâmpagos sinistros vão sendo substituídos pela encantadora aurora do amor e pelo sol da ciência. Os fragrantes eflúvios do perdão e da caridade já embalsamam o coração dos Continentes!

            O mundo marcha!

            Nunca a frase feliz de Pelletan (Pierre Clément Eugène Pelletan (29-10-1813 a 13-12-1884, escritor, jornalista e político francês) teve mais verdadeira aplicação do que na atualidade. A humanidade tem marchado; mas hoje, sob o influxo do Espiritismo, ela galopa, corre célere a conquista do seu ideal de felicidade, que só podem realizar a Verdade e o Amor!  

            Este já foi ensinado exemplarmente Jesus, com uma sublimidade sem par. Aquela só em parte foi revelada pelo enviado de Deus, o qual, consoante o que afirmou, não fez a revelação completa, por ter a certeza de que não seria compreendido pelas inteligências apoucadas das turbas que o ouviam, e prometeu que ao mundo enviaria o espírito da Verdade, que é, incontestavelmente o Espiritismo, que se vai irradiando vertiginosamente por todo o mundo, enchendo os cérebros de clarões dourados e os corações de alvissareiras esperanças, de ridentes aleluias!

            Depois da revolução nas instituições políticas, era de prever a revolução nas consciências. Aquela efetuou-a Revolução de 1789. Esta vai sendo realizada triunfantemente pelo credo espírita. Aquela deu o golpe de morte no feudalismo: foi heroína!

            Esta vai fazendo ressurgir o Mundo do túmulo do fanatismo: é divina.

            A Revolução de 1789 transformou servos e párias em cidadãos!

            O Espiritismo há de transformar os cidadãos em anjos!

 


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