O que o Evangelho
diz - e não diz
Ensinam os mestres humanos
doutrinas profundas - vive Cristo uma
vida perfeita e morre uma morte heroica.
Por isso são aqueles
de ontem e anteontem - Cristo de ontem, de hoje e de amanhã.
Por isso são
admirados os mestres humanos - e amado o profeta de Nazaré.
Analisam os
homens verdades inteligíveis - rasga o Filho de Deus perspectivas de vida
eterna.
Fácil é não ser
derrotado quando se foge do campo da luta - heroico é viver em plena guerra e
não sucumbir.
Cristo é hoje
mais atual do que no século primeiro - giram em torno dele os pensamentos de todos os
homens ...
Mais de 50.000
obras foram, em centenas de línguas, escritas sobre ele - e continua a ser o
"Deus desconhecido" .
Há tempo que o
Cristo transpôs o recinto dos templos e as páginas da teologia especulativa.
Dele se ocupam o
acadêmico e o artista, o negociante e o industrial, o crente e o descrente -
amigos e inimigos.
Kant e Bergson,
Chesterton e Renan, Murray e Barbusse, Keyserling e Papini, Rojas e Maurois - todos
os modernos e ultramodernos escrevem o que dele sabem ou julgam saber.
Toyohiko, o
Dostoiewsky oriental, no bairro operário de Kobe, escreve estranha novela:
"Antes da alva" - tragédia duma alma em busca da luz.
Gandhi e Tagore
falam do Nazareno - e não decifram a esfinge.
Expira
Livingstone às margens do Tanganica - proclamando no coração africano as
glórias de Cristo.
Pioneiros da fé
aos milhares o apregoam do Alasca ao Cairo - desde os polos até o equador.
Mas não valem
50.000 obras nem milhões de bocas dizer mais do que dele dizem os toscos
fragmentos de Mateus e Marcos, de Lucas e João.
E mais do que nas
linhas se lê adivinha-se nas entrelinhas ...
Ó Jesus! se tão
admirável é o que de ti diz o Evangelho - tão estupendo deve ser o que de ti
calou!
Se tanto dizem os
sacros fragmentos que possuímos - quanto não entredizem as lacunas que entre eles
se abrem! ...
Se tão belo é o
que, por dizível, foi dito - quão sublime será o que, por indizível, não foi
dito! ...
Se tão vasto é o
dia luminoso do que contemplamos - quão profunda deve ser a noite estrelada do
que Ignoramos ....
Leio nos dizeres
evangélicos o poema da tua vida terrestre - e adivinho-lhe nas reticências a
epopeia dos teus mistérios divinos ...
Não, não quero
saber o que mais disseste e fizeste - quero ter a liberdade de voar por espaços
ignotos ...
Quero inebriar
minha alma com o que não foi escrito em parte alguma ...
Quero voar para
além de todos os litorais - para além de todas as atlântidas, vias-lácteas e
nebulosas ...
Para encontrar o
que nunca foi dito nem escrito de ti - por indizível e indescritível. . .
Quero ler o
Evangelho inédito!
O Evangelho do
eterno silêncio...
A ti mesmo, Jesus...
Evangelho divino...
Huberto
Rohden
in “De Alma para
Alma”
(Ed. União
Cultural Editora 1956)
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