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quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Se quisermos entrar no caminho...

                         

Se quisermos entrar no caminho...

por Rodolfo Calligaris        Reformador (FEB) Fevereiro 1963

 

            Entre muitas outras fraquezas de caráter que nos cumpre vencer, reclama-nos especial atenção o mau vezo (hábito) que temos de pensar e falar a respeito do próximo, levianamente, sem procurarmos saber se o que dele pensamos e dizemos é certo ou verdadeiro.

            Antes de mais nada, precisamos convencer-nos de que pouco ou quase nada somos na ordem das coisas, que nossa pessoa tem uma importância muito reduzida para os outros e, pois, não é possível que “todo o mundo” tenha motivos para ocupar-se conosco, como se nos afigura.

            Destarte, quando um indivíduo faz algo que redunda em dano ou contratempo para nós, nada nos autoriza a crer que tenha tido o propósito deliberado de prejudicar-nos. O mais provável é que ele nem sequer se haja lembrado de nós em tal oportunidade.

            Da mesma forma, acontecendo de alguém usar expressões desagradáveis que pareçam ser-nos dirigidas com o fito de magoar-nos, não devemos dar-nos pressa em julgar que assim o seja., porque cada qual tem suas inquietações, seus aborrecimentos, e o mais certo é que as ditas expressões sejam o reflexo dos pesares daquele mesmo que as profere.

            Se um companheiro, amigo ou vizinho passa por nós sem nos enxergar, ou então nos cumprimenta sem a cordialidade de outras vezes, nada de ficarmos imaginando coisas, na pressuposição de que esteja a nos fazer “pouco caso”. Quem sabe lá o que lhe vai pelo íntimo? Que drama pode ele estar vivendo nesse momento?

            Mesmo quando alguém nos trate com aspereza ou desconsideração, não nos é lícito pensar que nos vote ódio ou tenha pretendido humilhar-nos. O mais natural é que esteja sofrendo do fígado, de uma constipação intestinal, ou que seus negócios não lhe corram bem, e dai seus “desabafos” coléricos ou sua falta de cortesia.

            Se devemos ter vigilância com nossos pensamentos, maior disciplina ainda temos que impor aos nossos lábios, a fim de que não nos afeiçoemos à compadrice, ao mexerico.

            “Vede o que faz essa iniquidade, lemos algures. Principia por um mau pensamento, o que já de si é um crime, visto que em todos e em tudo existe o bem, assim como em todos e em tudo se encontra o mal. Nós podemos, por meio do nosso pensamento, intensificar esse mesmo bem ou mal e, deste modo, estarmos facilitando ou dificultando a evolução.

            Se estiverdes a pensar no mal que porventura possa haver noutra pessoa, três coisas estareis fazendo ao mesmo tempo:

             1º - Encheis o vosso ambiente de um pensamento malévolo, em vez de um pensamento bondoso, o que provocará o aumento da tristeza já existente no mundo.

            2º - Se nessa pessoa acontecer existir o mal que julgais, este ficará desta maneira intensificado e aumentado, tornando assim o vosso irmão pior, em vez de o melhorardes. Muitas vezes sucede mesmo que tal mal não existe nele, mas antes na vossa imaginação. Neste caso, o vosso mau pensamento irá tentá-lo para o mal, porque, se ele não for ainda uma criatura perfeita, podeis toma-la aquilo que pensastes a seu respeito.

            3º - Encheis, assim, a vossa mente de maus pensamentos em vez de a encherdes de bons

comprometendo o vosso próprio desenvolvimento. Para os que têm o dom de ver, vos convertereis em um ser de feio aspecto e lastimável, em lugar de um ser belo e digno de amor.” 

            Atentos a esse precioso ensinamento, se ouvirmos contar um episódio desabonador a respeito de uma pessoa qualquer, não o passemos adiante, nem mesmo aos nossos familiares. Isso pode não ser exato, e, ainda que o seja, não temos o direito de propalar faltas alheias que também estamos sujeitos a cometer.

            “Falar” e “orar” têm significação idêntica, embora apenas este segundo termo seja empregado, modernamente, no sentido de rezar ou dirigir-se a Deus.

            Todas as nossas palavras, quer se dirijam a nós mesmos, quando falamos sozinhos, a nosso próximo ou a Deus, constituem uma oração e, como tal, sempre produzem um efeito e uma consequência.

            Qualquer que seja o meio ou a circunstância em que nos encontremos, guardemo-nos, pois, de proferir palavras ociosas ou de categoria inferior, tomando por norma só falar o que seja verdadeiro, agradável e animador, a fim de que os elementos psíquicos exteriorizados pelo nosso verbo criador ajam beneficamente sobre nós e os que nos rodeiam.

            Se aquilo que temos vontade de dizer não satisfizer a esses três requisitos, calemo-nos! O silêncio, então, será menos nocivo que nossa manifestação.

            Sabemos quanto é difícil o controle de nossos pensamentos e o domínio desse musculozinho rebelde, que é nossa língua, mas, se quisermos realmente trilhar o caminho da perfeição, não há como esquivar-nos a esse aprendizado.


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