Dupla
interpretação
Túlio Tupinambá (Indalício Mendes)
Reformador (FEB) Fevereiro 1963
Ninguém põe em dúvida o alcance da Cruzada do Rosário em Família, que
procura restabelecer entre os católicos a prece coletiva da família nos lares,
objetivo há muitos decênios de rotina entre os espíritas. A gravidade do
momento no mundo recomenda que os homens se entreguem um pouco mais a seus
deveres espirituais, se pretendem mesmo desvencilhar-se das peias da dor e da
preocupação esterilizante. O que o Espiritismo prega, nas tribunas de seus
centros e na intimidade do lar de seus profitentes (quem professa uma
religião), testemunha o
acerto e a clarividência da sua orientação.
Faz muitos anos, o lar espírita é
uma casa de oração elevada e de plena comunhão com o mundo invisível. Estuda-se
o Evangelho segundo o Espiritismo, analisa-se a moral espírita, altamente
instrutiva e educativa, busca-se diuturnamente dar a cada criatura humana um
rumo compatível com as suas obrigações e necessidades espirituais. Tudo isto sem
alarde, sem sectarismo, sem arroubos dogmáticos.
Os espíritas realizam seu trabalho
sem temerem concorrência de quem quer que seja, porque a sua religião, que é a
Religião, tem uma meta a alcançar, em relação a cada indivíduo, em relação a
cada família, em relação à Humanidade em geral. A solidez da Doutrina Espírita
reside justamente na clareza e na lógica da sua estrutura, na beleza e na
objetividade dos seus ensinamentos morais. “O Espiritismo é de ordem divina,
pois que se assenta nas próprias leis da Natureza e estai certos de que tudo o
que é de ordem divina tem grande e útil objetivo - disse o Espírito de Fénelon,
numa comunicação citada por Allan Kardec.
Em vez de perder tempo em manifestações públicas
tendentes a impressionar por suas proporções, o Espiritismo faz o seu trabalho
de recuperação de uns, de desenvolvimento moral de outros, orientando, amparando;
levantando os que caem, consolando os falidos e conduzindo-os, paciente e
persistentemente, à própria redenção, mostrando-lhes que a vida não acaba com a
morte, mas, pelo contrário, continua no plano invisível, onde também se
trabalha incessantemente pela salvação de cada individualidade, com a simples
exposição da verdade singela constante da sua Doutrina.
Essa verdade está em todas as religiões, embora nem
sempre estas a aceitem e propaguem sem restrições dogmáticas. Está nesse caso o
papel importante que os Espíritos exercem na vida humana e a ação
extraordinária que desempenham no plano invisível. As condições em que se
encontra o mundo, depois de tantos séculos de ascendência de um cristianismo
desfigurado, pois não se identifica com o Cristianismo do Cristo, as condições
do mundo - repetimos - evidenciam a
falência da orientação religiosa que se fez a si mesmo monopolizadora da
herança cristã. Porque, compreendamos, o que faliu não foi o Cristianismo, mas
aqueles que se fizeram depositários de Jesus, desnaturando a verdadeira doutrina
do Galileu.
Os que ainda não leram “O
Cristianismo do Cristo e o dos seus vigários”, do Padre Alta, obra
magistral editada pela Editora da Federação Espírita Brasileira, devem fazê-lo.
Não para adquirirem sentimentos desfraternos para com outros credos religiosos,
pois isto seria inadmissível a um espírita real, mas para terem conhecimento
seguro das razões pelas quaís grande parte da Humanidade se tornou céptica ou
ateísta. Outros, para guardarem aparências, são externamente religiosos, mas
intimamente não o são. Frequentam templos como uma satisfação à sociedade de
que fazem parte, mas não sentem a religião a que dizem pertencer. Porquê?
Simplesmente porque essa religião se afastou do seu caminho, da rota traçada
pela palavra e pelos exemplos do Cristo.
Quando uma religião chega ao ponto
de se prender mais às coisas materiais do que às do espírito, quando
condescende com a política, abandonando a simplicidade de Jesus para se abismar
na pompa, permitindo que seus sacerdotes nem sempre desprezem as seduções do
mundo pelas asperezas de uma vida legitimamente cristã - quando uma religião
chega a esse ponto, não mais pode influir nos destinos da Humanidade.
Leiam “O Cristianismo do Cristo e o dos
seus vigários”, em tradução de Guillon Ribeiro. Não é obra de combate,
mas obra erudita, de esclarecimento profundo, de análise minuciosa, de
excepcional valor e indispensável a quantos queiram adquirir conhecimentos
imprescindíveis a uma boa cultura.
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