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Fenômenos
de Materialização
por Manoel Quintão
Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
1942
Se
do Egito passarmos a Grécia dos oráculos, teremos com Pitágoras a sanção de um
princípio universal, que entretêm a harmonia da eternidade da alma e da
pluralidade das existências, como para provar que em todos os graus da escala
ontológica, da planta mais ínfima até o homem, o principio da vida é idêntico.
Para
dar uma ideia da identificação da Religião com a Ciência, digo com a Medicina,
no passado, basta lembrar os Templos de Esculápio, o
Deus da Medicina, todos mais ou menos célebres e celebrados pelas curas que
neles se produziam.
De
um desses Templos, o de Égea, na Silícia e que subsistia ainda no 4º século,
fala um doutor da Igreja - Orígenes - nos seguintes termos:
‘‘Estava sempre cheio de gregos e de bárbaros,
que atestavam ter visto o deus, não aparente mas realmente, assinalando sua
presença por meio de curas e oráculos."
Uma
prova, a mais, de que o pretensioso, autoritário e dogmático catolicismo
contemporâneo não passa de paganismo adulterado e disfarçado, é que, nas
sacristias dos seus templos, se ostentam os mesmos quadros, votos, relíquias,
pernas de cera, tranças de cabelo, etc., que se colgavam aos vestíbulos dos
templos pagãos.
Orígenes
conta-nos, ainda, ter sido o templo de Égea arrasado por Constantino, a
pretexto de que ali se adorava o demônio...
*
Entra
em cena o Sr. Diabo - outro arremedo do Masdeísmo - o ‘Arimahan’ dos Persas, esse Sr. Diabo que haveria de encher a Noite
Medieval, longa de nove séculos, com a sua figura macabra, e que ainda hoje
figura de proa e "banca" o comandante na desarvorada galera da
beatice raiventa, ou simplesmente ingênua e lastimável!
Mas,
antes dele e das suas incursões pelos conventos, provocando exorcismos inanes e
aspersões solenes, responsos e esconjuros com imposições de mãos, que se
poderiam considerar legítimas fórmulas de Magnetismo para efeitos do
Sonambulismo, lancemos um rápido olhar à grandiosa Roma, à esplendida retorta
em que se caldeavam todos os sonhos, todas as ideias do mundo avassalado ao gládio
de suas indômitas legiões.
Aí,
não só a Medicina dos templos existia, senão que os próprios imperadores curavam
pelo tato.
Roma
foi o viveiro das sibilas e dos augures... E que foram umas e outros, à luz dos conhecimentos que hoje possuímos, senão legítimos
médiuns?
E
não sabemos que o prestígio desses augures era de tal monta que sustentava e
anulava as assembleias do povo, as decisões de seus representantes?
Os
imperadores curavam, disse: para não falar de Marco Aurélio e também para não
alongar esta palestra, citaremos resumida uma narrativa de Tácito, referente às
curas de um cego e de um paralítico, operadas pelo imperador Vespasiano.
"O
cego procurou Vespasiano em Alexandria, dizendo-se aconselhado por Sérapis, e concitava o imperador a umedecer-lhe a face, nada
mais nada menos que com saliva. O paralítico, esse, conjurava o imperador
apenas a pisar-lhe o braço atrofiado.
"O
imperador, a princípio, riu-se muito. Tantas, porém, foram as rogativas, que ordenou aos médiuns examinassem e decidissem se
havia possibilidade de êxito. Os médicos discutiram (cá para nós, eles discutem
sempre) e responderam, afinal, que convinha experimentar."
Pois
o cego viu e o paralítico sarou!
Dion
Cassius, autor de uma História Romana (fins do século lI), também conta que o
imperador Adriano, quando na Panônia, curou um cego por meio de passes.
Quanto
aos médicos propriamente ditos, Asclepíades, Celso e Galiano, prescreveram
contatos e fricções.
De
magnetizadores; bastaria citar o célebre Apolônio de Thiana e Simão o mágico.
Do
primeiro, diz Filóstrato que ressuscitou uma jovem a caminho do cemitério.
E
os doutores da Igreja?
S.
Justino, Arnobio, S. Jerônímo, Santo Agostinho, todos eles admitiam a realidade
das curas, mas, já se vê, atribuindo-as à malícia do Diabo.
Com
o advento do Diabo, levaram o diabo as práticas livres do Magnetismo curador,
da medicina religiosa, nas quais reconhecemos hoje simples modalidades desse
mediunismo que, como lei universal, graduado à evolução da nossa humanidade, é
dela apanágio inalienável de todos e para todos os tempos.
Mas,
rechaçado então, perseguido, asfixiado de morte pela Teocracia Católica -
desnaturada filha do Cristianismo, este sim, em seus primórdios considerado a
consagração legitima daqueles mesmos princípios em sua mais alta finalidade e
aplicação - o mediunismo deslocou-se, de um lado, com esse caráter de ciência
experimental, para os Árabes e, de outro, para os conventos.
Na
massa ignara e barbaresca, ele passou a chamar-se o "sabbat" a
necromancia, a feitiçaria.
Os
médiuns, os sensitivos foram perseguidos a ferro e fogo, queimados vivos como
Joana d'Arc, até que Gassendi pudesse provar que muitas dessas vítimas não
passavam de pobres enfermos.
Foi
nessa época sinistra dos sambenitos, dos potros e dos autos-de-fé
inquisitoriais, foi nesse período de agonias candentes, que o Sr. Diabo barafustou
pelos conventos e deu à crônica religiosa todo um acervo de páginas burlescas,
como esta que passamos a ler.
"As
principais comunidades religiosas atingi das de possessão
foram as de Cambrai (1491); Kinstorp um pouco depois; as do convento de Nazaré,
em Colônia (1554), as das Ursulinas de Loudun (1632-1639) e as de Louvières
."
Tratando
destas últimas, diz Pierart em suas "Memórias sôbre os fatos de Louvières:
"As
alucinações principiaram logo: Uma freira ouve bater à porta, abre-a e se encontra
face a face de uma aparição que se diz antiga irmã do convento, reclamando
preces a fim de abandonar o purgatório. Advertida por uma sensação íntima, a
alucinada reconhece o Diabo e o repele. Outra vê, de repente, na cela, um anjo
que lhe fala tão pornograficamente, que a obriga a fugir clamando:
"miserável embusteiro, que a virtude de Jesus Cristo te confunda".
Depois,
os fenômenos se intensificaram da maneira mais bizarra. As irmãs incólumes de invasão do Diabo viram o coro em polvorosa, tudo
pelos ares. E daí, do coro, a sarabanda generalizou-se por todo o convento:
eram panelas derrubadas, móveis que voavam, etc. Por vezes as pobres freiras
eram arrojadas ao solo, mantidas em posições e atitudes inconcebíveis, por
contrárias à natureza, enquanto mãos invisíveis lhes amarravam as sandálias e
rosários à ponta dos véus. Por outro lado, brilhavam luzes, apagavam-se luzes,
estrondos terríveis explodiam das chaminés, enquanto vozes másculas
apostrofavam dentro dos dormitórios.
Uma
freira foi várias vezes arrebatada aos ares, para longe do mosteiro; outra foi
precipitada no pátio, de onde a foram erguer deitando sangue pela boca; outra
recebeu de mão invisível tremenda bofetada, ouvida pelas companheiras; ainda
outra, forçada a provar um fragmento de patena (lâmina de
metal um pouco convexa, sobre que se coloca a hóstia na missa), teve a língua em pústulas durante três dias, qual se houvesse provado
ferro-em-brasa... Em compensação, uma outra freira curou-se instantaneamente de
pústulas e verrugas causadas por picadas de urtigas e contusões. Uma freira, tomada por um
Espirito, que dava o nome de Acarão, elevou-se a três pés do solo, a fim de
espatifar o resplendor de ouro do "Santíssimo Sacramento" e, quando o
Bispo d'Evreux tentou impedi-lo, foi também
ele derrubado ao solo. Um outro
Espírito, que acudia ao nome de Dagão, fê-la ainda melhor: assanhando-se contra
a pobre Irmã Maria do Espírito Santo, meteu-lhe a cabeça e as mãos no fogo, sem
queima-la, e, de outra feita, levou-a ao cimo de um muro alto de 10 pés,
projetando-a de cabeça para baixo, sem lhe causar dano algum!
Um
dia em que o Rev. Padre, ao falar ao Diabo, se entusiasmava fora do comum e dizia não passar ele - o Diabo, de uma mosca comparado às
virtudes divinas, uma das assistentes, Madalena Bavent, jovem de beleza
admirável, não se conteve e gritou: pois bem, nós veremos qualquer dia quem é
que não passa de uma mosca! E nada menos de cinco religiosas começaram a sentir
terríveis convulsões.
Este
fato - diz o cronista - foi qual raio de luz para as imaginações crédulas da
confraria, que, acreditando no Diabo, queriam a todo o transe
encontrar-lhe um preposto.
Foi
então lembrada uma circunstância na qual a bela irmã Madalena pedira socorro,
queixando- se que o Diabo lhe batia e rojava ao assoalho dá cela.
Daí,
a conclusão; ela se havia votado ao Diabo, o Diabo tinha sobre ela um poder
absoluto e fizera dela instrumento daquelas cenas que desolavam o convento.
Pois
bem: a repercussão destes fatos foi tão grande, que a Regente do Reino, Ana d'Áustria,
houve de nomear uma comissão de sindicância, comissão essa que deu o seu laudo
positivo, atestando a realidade das ocorrências ...
Meus
Senhores: que belíssima lição de mediunismo! Os famigerados candomblés não as
teriam melhores nem mais cambiantes!
Perdoai-me,
entretanto, a estirada citação, pois eu queria apenas chegar a este benemérito ilogismo
(falta de lógica):
E
dizer-se que nós, os espiritistas, temos hoje e sempre pela frente estes dois
adversários: O médico e o... Padre!!!
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