Vamos
apanhar sol
(Conto
de educação doutrinária, dedicado aos professores de moral evangélica.)
por Leopoldo Machado
Reformador
(FEB) Novembro 1942
Era um casal de hiperbóreos. (termo usado para indicar qualquer um que viva
em clima frio.)
Nascidos e criados nas regiões
polares, quase aos noventa graus, só conheciam do sol os mortiços raios
oblíquos, que, três meses ao ano, lhe chegavam palidamente como claridade quase
ao lusco-fusco das zonas tropicais. Acostumados a noites de seis meses e
a crepúsculos de mais de mês não encontravam alegria e vida senão na penumbra,
na sombra, nas trevas. Até sua visualidade se adaptara de tal modo à treva, que
só viam bem às escuras: que uma claridade mais forte lhes fazia grande mal.
*
Necessidade de outros meios de subsistência
os arrasta a outra região mais bem aquinhoada de sol. Subiram a habitar a zona
temperada. Mas, continuaram como inimigos do sol, foragidos da claridade. Como
seus meios de vida eram em casa mesmo, nunca saiam à rua, quando havia sol. Só
ao crepúsculo e à noite, supriam suas necessidades de fora do
lar...
*
Nasce-lhes um filho.
A criança se cria de acordo com a
vida no seu clima, na sua região. Gostava do ar livre, da vida ao sol. Tinha,
por isso mesmo, saúde e fortaleza. Boa cor e muita disposição. Foi cedo para a
escola. Inteligência precoce, assimilava com facilidade o que ouvia e lia.
*
Um dia, o inspetor escolar fez uma
prédica muito oportuna e clara aos alunos de sua escola, ao ar livre, todos
apanhando sol, sobre a necessidade de viver sob mais luz solar, ao ar livre.
Era uma necessidade apanhar mais sol, viver mais ao sol, que é a maior fonte de
vida, de alegria, de saúde, de energia...
*
- Papai, vamos apanhar sol, que dá
muita energia e saúde à gente, muita alegria e vida. É preciso apanhar sol, que o homem ensinou,
na escola, a gente. E pediu a gente que dissesse isto a nossos pais. Assim, a
mamãe e o papai devem tirar um tempinho atoa para apanhar sol, que faz bem. Só
depois que eu ouvi o homem falar na escola, é que compreendi porque o papai e a
mamãe não têm sangue, são tristes, vivem doentes, sem cor...
Os pais se justificaram, alegando
apego aos velhos costumes, à vida na terra onde nasceram e viveram muitos anos,
e aos hábitos da infância.
- Qual o que! - retorquia a criança.
- Tudo isto é erro. O papai vivia assim, a mamãe e o papai ainda vivem assim,
porque nem conhecem o sol direito; porque nunca apanharam um bocado bom de sol!
Vamos apanhar sol, uma vezinha só, comigo, que o papai e a mamãe vão gostar. E
nunca mais deixarão de querer ver o sol, de apanhar sol garanto.
À insistência do filho, certa manhã,
fresca e luminosa, saíram. Meio receosos, mas saíram, o sol, bem no alto, era
uma linda rosa de luz, iluminando, suavemente, a Terra. Era na primavera. As árvores
se arreavam de flores. O ambiente, perfumado, convidava à alegria e estimulava
para a vida. A criança, na frente, pulava e cantava de alegria. Os pais, diante
da felicidade do filho - e do espetáculo que lhes era, até aquele momento,
desconhecido e estranho, modificaram seus conceitos sobre a vida que, até ali
viveram. E contemplaram o sol. E apanharam sol. E passaram a apanhar e a querer
ver, a miúde, o sol, a maior fonte de energia, de saúde, de alegria. E
confessaram sua gratidão ao filho, dizendo-lhe que, se não fosse ele, ainda
continuariam amigos das trevas, da sombra, da penumbra.
Realidade
e aplicação do Conto
O professor de aulas de Evangelho
nos centros espíritas lerá o conto aos alunos, concluindo-o, a dizer-lhes:
- Eu e vossos pais somos bem,
comparados convosco, como os hiperbóreos do conto. Quando nascemos, e na nossa
infância, só existia o gelo polar de uma religião fria, sem claridades racionais,
e sem o sol da verdade pura. E vivemos assim, embaraçados nas sombras espessas
de seus dogmas, dentro da noite escura de seus ensinamentos irracionais. Os
raios cio Cristianismo puro até nós chegaram lusco-fuscamente, porque
deturpados por aparatosas encenações e formalidades, porque através de ritualismos
e práticas de impressionar, somente, os sentidos materiais.
Chegamos até ao tempo da 3ª
Revelação, que é o Espiritismo, como aquele casal de hiperbóreos chegou à zona
temperada. E continuamos indiferentes ao sol da verdade do Espiritismo, tocados
da mesma penumbra, e sombra, e trevas da religião polar, que prega a adoração a
um Cristo morto, crucificado. Continuamos sem compreender que devemos servir ao
Cristo vivo, descrucificado, que deseja ser amado e compreendido sem mistérios
e sem milagres, sem dogmas e sem encenações.
Quanto a mim, fui chamado a ver e
contemplar o sol do Espiritismo. Atendi ao convite e aqui estou a falar-vos dos
raios deste sol, da alegria, saúde espiritual e energias que este sol
transfunde com tanta claridade, que até as crianças e os jovens como vós
compreendem-no admiravelmente, perfeitamente.
E vossos pais? Todos vêm a esta
casa, apanhar sol aqui? Porque estudar, compreender, sentir e praticar o
Espiritismo de verdade é apanhar o melhor sol espiritual! Não? Nem todos vêm?
Pois bem: que cada um de vós imite o filhinho daquele casal de hiperbóreos,
contando a seu papai, a sua mamãe a história que ouviu aqui, a insistir com
ambos que venham até cá, nos dias de sessões de estudo, ouvir o que aqui se
ensina, meditando o que ouvir e comparando-o com o que lhes foi ensinado,
quando eram, como
vós, crianças. Que cada um de vós convide, nos dias de sessões de doutrina,
seus pais para virem apanhar um pouco deste sol que vós já estais sentindo bem.
Fazei isto, e ficai certos que vossos papais, acabarão, como os papais do
menino do conto, agradecidos a vós e bendizendo o sol, que passarão a apanhar
aqui, nos dias de sessões. Fazei isto, que dareis a melhor prova de amor filial,
que será concorrer para a felicidade de vossos pais, por conhecerem
a verdade, que é prova de gratidão para com vossos papais, aos quais tudo
deveis, para com a Doutrina que os está, já de pequeninos, orientando na vida.
Convidai, pois, vossos papais a ver
o sol, a apanhar sol convosco, nesta casa onde se aprende a servir o Cristo
vivo, descrucificado.
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