O Desastre
Faziam aquela viagem buscando paz,
renovação interior, após o cansaço das tarefas acumuladas.
Desde que se consorciaram, era a
primeira vez que fruiriam as bênçãos de merecidas férias.
Filantropos, cooperavam ativamente
nos empreendimentos assistenciais da comunidade onde viviam.
O automóvel corria, célere, e as horas passavam agradáveis.
Subitamente ele parou o veículo e
recuou.
Pareceu-lhe ver, tombado no
precipício, um carro novo. O instinto fê-lo saltar precípite e correr na direção
do desastre. A esposa o seguiu.
Olhando, cuidadoso, percebeu um jovem
entre os ferros contorcidos, ainda com vida. Não
titubeou. Empenhou esforços e resgatou o corpo, que transportou para o seu
próprio automóvel.
O moço parecia em coma.
Quase noite, como estivesse próximo
a populosa cidade, para lá rumou e dirigiu-se ao
hospital que lhe indicara um transeunte ...
Enfermeira, por favor, traga uma
maca. - Adentrou-se, solicitando, desesperado. - É um acidentado ...
- Parente seu?
- Não.
- Tem Instituto?
- Ora, não pude examinar. Parece-me
que não tem documentação.
- Por que o senhor mão chamou a
polícia?
- Não houve tempo.
- O senhor se responsabiliza pelas despesas?
- Claro que mão. Estou em trânsito. Isto
é uma emergência.
- Então, não podemos aceitar o
paciente.
- Por Deus!
- Ordens do diretor ... Todavia, se
ele mandar...
- E onde está?
- Foi ao cinema ...
Conduzindo o acidentado e guiado por
informações, localizou a casa de diversões e o médico foi chamado. Informado da ocorrência, o
esculápio arrematou:
- Lamento muito, mas não posso fazer
nada. Não recebemos indigentes e não somos "mensageiros
da caridade".
- Mas, doutor, o rapaz está à morte.
- Problema do senhor, Por que o não
deixou na estrada, avisando a Polícia Rodoviária?
- É o cúmulo!
- Em todo o caso, tente conseguir do
Prefeito uma autorização, mediante a qual se responsabiliza
pelas despesas.
Novas buscas, demoradas, por fim
coroadas de êxito. O chefe do Executivo local, após ouvir
a narração do lamentável desastre, cedeu uma autorização.
Novamente foi buscado o médico, enquanto
o casal e o paciente aguardavam à porta
do hospital. À sua chegada foi trazida a maca para remoção.
Quando o corpo estava sendo
transportado, no corredor, o médico olhou de soslaio e
deu um grito. Era seu filho, de 16 anos, que saíra de carro sem sua permissão.
Pânico no nosocômio.
- Emergência! - alguém gritou.
Tarde demais. O jovem estava morto.
Passaram-se 3 horas, desde que o
casal percorria a cidade, tentando interná-lo na Casa
de Saúde do genitor ...
*
A mãe notificada, enlouqueceu, e o
pai, que, exigia rigorosa documentação para não perder
dinheiro, cerrou as portas do hospital, depois de perder o filho.
O casal generoso, porém, ao retornar
à sua cidade e reuniu amigos e, sob a emoção da tragédia,
deu início a uma Associação de socorro gratuito a acidentados, mediante convênio
com as entidades especializadas da sua comunidade, objetivando atender casos
que tais, de imediato, enquanto se tomem outras providências.
*
Desastre maior, cada dia, é o esfriamento
dos sentimentos e o arder das paixões.
Tu,
que conheces Jesus, reflete e age.
Ignotus
por Divaldo
Franco
Página psicografada em
29/6/73, em Salvador, BA.
in Reformador (FEB) em Jan 1974
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