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Reveste o mesmo cunho de
autenticidade o seguinte fato que, com os imediatos, extraímos da obra verdadeiramente
monumental de Alexander Aksakof, ‘ANIMISMO E ESPIRITISMO', opulento repositório
dos mais variados fenômenos e de inexpugnáveis raciocínios, pelo autor sub
intitulada ‘Ensaio de um exame crítico dos fenômenos mediúnicos, especialmente
em relação com as hipóteses da "força nervosa", da "alucinação
" e do "inconsciente", como resposta à obra do Dr. Ed. von
Hartmann, intitulada O ESPIRITISMO ", sendo assim uma vitoriosa refutação
das críticas formuladas, a propósito das manifestações espíritas, por esse
eminente pensador germânico.
O caso que em primeiro legar
escolhemos, é dos mais interessantes e característicos. Trata-se do romance THE
MYSTERY OF EDWIN DROOD, interrompido em 1870 pela morte de seu autor, o ilustre
romancista inglês Charles Dickens, e concluído dois anos mais tarde, na América
do Norte, pelo médium James, um rapaz de menos que medíiocre instrução, simples
mecânico que era.
"Quando se espalhou o boato - diz
Aksakof (1) - de que o romance de Dickens ia ser terminado por tão extraordinário
e inusitado processo, o SPRINGFIELD DAILY UNION enviou um de seus
collaboradores a Brattleborough (Vermont) , onde residia o mÉdium, a fim de se
informar, no próprio local, de todas as particularidades desse estranho
empreendimento literário."
(1) Ver ANIMISME ET SPIRITISME (edição
francesa) , págs. 326 e seguintes.
Resumamos, entretanto, os
pormenores.
Convidado por uns amigos a tomar
parte numa sessão espírita, James, que não tomava a sério tais fenômenos,
considerando-os mero embuste, foi surpreendido com a revelação de que ele
proprio era médium. Voltando no dia seguinte, caiu espontaneamente em trance e, tomando um lápis, traçou um
ditado dirigido a um dos assistentes pelo espírito de um filho deste, cuja
existência ignorava inteiramente.
Em fins de outubro de 1872 escreveu
James uma comunicação a ele próprio dirigida, assinada com o nome de Charles
Dickens, que lhe pedia uma sessão especial para 15 de novembro, o que foi
feito, recebendo então um longo ditado daquele espírito, que lhe dizia haver
durante muito tempo procurado um médium, com cujo concurso pudesse concluir o
seu romance interrompido, e convidava James a se encarregar dessa tarefa, à
qual consagraria o tempo disponível de suas ocupações habituais.
Aceito o convite, foi o primeiro
ditado transmitido na véspera do Natal, a que Dickens votava particular veneração,
repetindo-se esse trabalho por sete meses consecutivos, de modo que em julho de
1873 James havia redigido mil e duzentas laudas de manuscrito, representando um
volume in-8º de 400 páginas.
O processo era dos mais simples: preparados
dois lápis, bem aparados, e uma grande quantidade de papel cortado em meias
folhas, James recolhido ao quarto e sentado à mesa, tendo diante de si aqueles
materiais, esperava tranquilamente -"tranquilidade relativa, diz o aludido
colaborador do SPRINGFIELD DAILY UNION , porque, apesar de haverem os fenômenos
perdido o cunho de novidade e se ter a eles habituado, o médium confessa que se
não podia subtrair a um certo sentimento de medo, durante tais sessões."
Ao fim de alguns minutos de espera,
ia perdendo gradualmente a noção das coisas e, nesse estado de trance, escrevia durante meia hora ou
uma hora, tendo uma vez chegado a escrever durante hora e meia, sempre sem se
lembrar, ao tornar a si, de outra coisa a não ser da visão de Dickens, que se
sentava ao seu lado e apoiava a cabeça nas mãos, como imerso em profundo recolhimento,
tendo na fisionomia uma expressão grave e algum tanto melancólica. Não proferia uma só
palavra; apenas lançava algumas vezes ao
médium um olhar sugestivo e penetrante.
As sessões se efetuavam ora ás 6
horas da manhã, ora ás 7 1/2 da tarde, prolongando-se neste caso além das 8 1/2,
no escuro, portanto - como acontecia no inverno - sem que tal circunstância
prejudicasse a nitidez da escrita; e quando o ditado estava concluído, Dickens
apoiava a mão pesada e fria sobre a do médium, para lho indicar, o que o fazia
despertar do trance, permanecendo,
porém, algum tempo com as mãos como pregadas à mesa por uma força que se lhe
afigurava magnética.
As folhas escritas, esparsas pelo
chão, não estavam numeradas e James tinha que as pôr em ordem, guiando-se pela
continuidade do sentido.
Ao começo, o médium escrevia apenas
três vezes por semana e não mais que três ou quatro paginas de cada vez; a
seguir, porém, as sessões se tornaram bi quotidianas e ele escrevia afinal dez
a doze paginas: e até mesmo vinte. A letra tinha alguma semelhança com a de
Dickens. No princípio do ditado era bela, elegante, quase feminina; mas, à
medida que prosseguia o trabalho, ia aumentando de dimensão, a tal ponto que
nas últimas páginas era cinco vezes maior que no começo. Algumas folhas
principiavam por sinais estenográficos, de que o médium não possuía o menor
conhecimento, e a escrita era tão rápida que dificilmente se podia decifrar.
Assim foi concluída a segunda parte
do célebre romance, a cerca de cujo mérito, depois de relatar as circunstâncias
que pessoalmente verificara e que acabamos de resumir, o correspondente do
SPRINGFJELD DAILY UNION emitiu as seguintes apreciações:
"Achamo-nos aqui em presença de um
grupo de personagens, cada um dos quais apresenta sinais característicos
próprios, devendo os papeis de todos esses personagens ser sustentados até ao
fim, o que constitui um trabalho considerável para quem jamais em sua vida
escrevera três paginas sobre qualquer assunto ; ficamos, portanto,
surpreendido, ao verificar, desde o primeiro capítulo, uma semelhança completa
com a parte editada do romance. A narrativa
é reatada precisamente no lugar em que a morte do autor a deixara interrompida,
e isso com uma concordância tão perfeita que o mais experimentado crítico, que
ignorasse o lugar da interrupção, não seria capaz de dizer em que momento
cessara Dickens de escrever por sua própria mão.
"Cada um dos personagens do Iivro
continua a ser tão vivo, tão típico, tão bem sustentado na segunda como na
primeira parte. Não é tudo ainda. Aparecem novos personagens (Dickens tinha o
costume de introduzir novos atores até nas ultimas cenas de suas obras), os quais
não são absolutamente duplicações dos heróis da primeira parte; não são
manequins, mas caracteres apreendidos ao vivo, são verdadeiras criações. Criações
de quem? ...”
O corresponde continua:
"Eis algumas particularidades de
incontestável interesse. Examinando o manuscrito, notei que a palavra traveller (viajante) estava sempre
escrita com ‘l’ dobrado (ll), como se usa na Inglaterra, ao passo que entre
nós, na América, não se escreve geralmente senão com um ‘l’ só.
"A palavra coal (carvão) está sempre escrita coals, com um ‘s’, como se faz na Inglaterra. É também interessante
notar, no emprego das letras maiúsculas, as mesmas particularidades que nos
manuscritos de Dickens se observam, como, por exemplo, quando ele designa o Sr.
Grewgious como an angular man (um
homem anguloso). Notável é também o conhecimento topográfico de Londres, de que
dá prova o misterioso autor em numerosas passagens do livro. Há igualmente muitas
construções de frases usadas na Inglaterra, mas desconhecidas na América.
Cumpre mencionar ainda a súbita mudança do tempo passado em presente, sobretudo
em uma animada narrativa, transição muito frequente em Dickens, principalmente
em seus últimos romances. Essas particularidades e outras ainda que poderiam ser
citadas são de mínima importância; mas é com semelhantes bagatelas que se teria
feito malograr qualquer tentativa de fraude."
E o correspondente assim termina o.
seu artigo:
"Cheguei a Brattleborough com a
convicção de que essa obra póstuma não seria mais que uma bolha de sabão,
facílima de estourar. Após dois dias de atento exame, regressei e, devo
confessa-lo, achava-me indeciso. Neguei ao princípio - como qualquer o faria,
depois de o examinar - que esse manuscrito houvesse sido traçado pela mão do
jovem médium; ele me afirmou nunca ler lido o primeiro volume -
particularidade, a meu ver, insignificante, plenamente convencido como estou de
que ele não era capaz de escrever uma única página do segundo volume. Não vai
ofensa nisso; porque não há muitas pessoas em condições de reatar uma obra
inacabada de Dickens!
"Vejo-me, por conseguinte,
colocado nesta alternativa: ou um homem de gênio qualquer empregou o médium
como instrumento para apresentar ao publico uma obra extraordinária, de um modo
igualmente extraordinário, ou esse livro, como o pretende seu invisível autor,
foi efetivamente ditado. pelo próprio Dickens.
"A primeira suposição não é
menos maravilhosa que a segunda. Se existe em Vermont um homem, desconhecido
até agora, capaz de escrever como Dickens, não tem certamente motivo algum de
recorrer a subterfugio semelhante. Se, por outro lado, é o próprio Dickens
"que fala, estando embora morto," para que surpresas nos devemos
preparar?"
Ao bom senso - observaremos por nossa
parte -- cabe decidir da alternativa.
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