Diatribes à Casa de Ismael
Luciano dos Anjos
Reformador (FEB) Maio 1963
Embora decorridos já muitos anos,
ainda lembramos quando nosso primeiro artigo assinado era publicado com
singular destaque na grande imprensa do País, ao tempo em que ensaiávamos os
primeiros e mais incertos passos no jornalismo profissional. Recebemos, com
surpresa, três ou quatro cartas (nunca supuséramos serem os leitores tão atentos
ao que escrevemos) das quais apenas uma nos transmitia congratulações pelo
trabalho elaborado. As demais espumejavam de indignação contra os alvitres que
esposávamos. Em nossas primícias jornalísticas, ainda epitetado como simples
"foca", (neófito,
em gíria de imprensa), ingênuo de sentimentos, não apenas ficamos lívido com a
reação daqueles leitores mal-ensinados, mas sobretudo nos deixámos dominar por
inusitada revolta íntima. Não podíamos aceitar que dois ou três analfabetos (as
cartas atestavam essa qualidade) pudessem ter tido o ousio de nos contraditar.
Afinal, não demonstravam conhecer uma nesga do assunto em tela, mas, em
contrapartida, vituperavam a gramática e afrontavam a lógica do mais simples
raciocínio. Como, pois, aturá-los, um minuto que fosse?! Resoluto, sentamos à
máquina e começamos a redigir-lhes, para cada qual, resposta à altura do que
mereciam. Já lá íamos pela segunda lauda datilografada quando o secretário da
Redação por qualquer motivo nos veio ter à mesa e inteirou-se do que fazíamos.
Sorriu, então. Pousou-nos a destra sobre o ombro, que longe estava ainda de
denotar cansaço do peso dos anos, e comentou do alto da sua experiência e da
sua tarimba:
-
Meu caro, se você for nesse andar, estará perdido, senão louco. Não haverá
colunas que cheguem para publicar somente as respostas que você tiver de dar a
seus leitores...
Resfriamos. Paramos de dedilhar a
máquina e fomos juntos até o bar em frente, onde mantivemos longa e saborosa
conversa, durante a qual aprendemos lições inesquecíveis. A rotina do homem que
escreve para jornal era um pouco diferente do que supúnhamos. O leitor é a
figura mais heterogênea que existe. Os assuntos todos contêm aspectos
abscônditos que mal imaginamos. A técnica redacional varia de propósito para
propósito. Cada coisa tem o seu segredo; cada segredo a sua oportunidade.
Aprendemos muita novidade importante, mas acima de tudo decoramos esse grande
ensinamento, que o tempo e a experiência, dali por diante, transformaram em
ponto basilar da nossa vida de
profissional de imprensa: nem todos os leitores merecem resposta... É preciso
revelar muita sensatez, muita segurança, muita precisão e muita significação
para que a réplica de um leitor seja treplicada. Nem por isso, entretanto, esse
comportamento do jornalista deve ser caracterizado como algum desprezo pelos
seus leitores.
Mas, somente a longa prática, a
carreira vivida muitos anos é capaz de emprestar-nos a fleuma indispensável
ante as cartas e os telefonemas que nos chegam do público, alguns tamanhamente insultuosos
que os lá de fora não sabem como um "dromedário" (o jornalista
tarimbeiro) consegue conter; a exaltação. De fato, vamos aos poucos cumulando tal
frieza diante não apenas dessas cartas, mas também de todos os demais fatos
diários (as notícias rolam a cada minuto, com toda a sua dramaticidade dentro
das redações de jornal), que até nos confundem os sentimentos. E, não raro,
acham estranho que não nos lancemos à rua, lado a lado com o povo, quando
alguma crise vira manchete. Todavia, ao contrário do que julgam, a isso podemos
chamar antes ponderação, do que frieza inconsequente ou indiferença doentia. Em
linguagem doutrinária, talvez coubesse o termo humildade.
Perdoem-nos os leitores de
"Reformador" essa longa prolusão, através da qual, já agora
escorçando, queremos apenas dizer-lhes que nossa consideração é por todos a
mais profunda e respeitosa, mas não somos mais capazes de alterar nosso sorriso
nem mesmo ante as cartas que vez por outra nos chegam à mão, repassadas de
insultos, doestos e estultícias maiores. Somente a crítica elevada, a censura
construtiva, o comentário sincero ou a dúvida honesta hão de merecer-nos maior
atenção; nunca o histerismo impróprio dos que, certamente, gostariam antes de
ter seus nomes transmudados em letra de forma, do que refutar alguma ideia
contrária. Nossa constante, pois, tem sido o silêncio. Até mesmo por um dever
de consciência religiosa, para não tisnar a Doutrina que pregamos.
Agora, entretanto, o panorama é bem
outro. Resolvemos afinal escrever este artigo tendo em vista o comportamento,
não epistolar, mas pessoal, dum honrado e dedicado companheiro de ideais
espíritas. E companheiro integrado na Doutrina, estudioso dela,
cioso dos seus compromissos com ela. É em consideração ao seu trabalho já
realizado, à sua honestidade de propósitos sempre revelada, que nos abalançamos
a dirigir-lhe estas palavras, porque certos de que nossa resposta, por
coincidência, senão por extensão, servirá a muitos outros intransigentes
adversários da Federação Espírita Brasileira e da conduta desta venerável
instituição, mercê da assistência dos mais elevados Espíritos de luz.
Acusam-nos de seguir cegamente a
Federação, a lembrar-nos de que também os padres seguem o Papa dentro do mesmo
espírito de submissão e subserviência. Acusam-nos de fazer um tabu de tudo
quanto a Federação diz. Acusam-nos de trabalhar apenas na seara da Federação.
Desminta-se, antes que tudo, aquela
primeira afirmativa, para depois explicarmos porque seguimos a FEB e finalmente
negar que colaboremos apenas na seara da Casa Máter, embora evidentemente lhe
dediquemos maior atenção, dada a nossa posição de
membro do seu Conselho Superior. Seria preciso um desconhecimento integral da
Doutrina que professamos, para enceguecer-nos por alguma coisa. Não somos
espírita por acaso, por tradição ou por comodismo. Alguns dos que nos acusam -
perdoem-nos a imodéstia - talvez não tenham estudado tanto a Terceira Revelação
quanto o fizemos, por amor à Verdade, Só lhe aceitamos os postulados depois de
examinar com nímio cuidado tudo o que se continha nas pregações das demais
religiões do mundo. Não nos escasseou ânimo sequer para o estudo das principais
doutrinas do passado, nas quais fomos buscar, em cada qual, a sua parcela de
autenticidade e de sentido vero. Fomos conhecer as ideias de
Trismegisto, no Egito, e de Akhnaton, seu reformador. Lemos sobre o Código de
Hammurabi, origem da religião assírío-babilônica e no qual já se fala de Deus
assistido pelos "santos". Saboreamos os "Cânticos órficos",
de Orfeu, e os "Versos Dourados" de Pitágoras, bases da religião
grega, inicialmente tão séria, mas infelizmente deturpada pelo povo, que acabou
divinizando as estátuas de seus santos e seus deuses. Estudamos as "Leis
de Numa Pompílio", onde pudemos sentir todas as coordenadas da religião
dós romanos. Não deixamos escapar o "Vedas:', o "Upanichade", o
"Maabarata", o "Ramaiana", o "Darmas" e o
"Purunas", do hinduísmo pré-histórico. Estudamos o Judaísmo,
especialmente através do "Tora" ou "Pentateuco". O
"Avesta" nos ensinou a filosofia de Zoroastro ou Zaratustra, com
a célebre figura do diabo e o princípio do Mal. O "Damapada" nos
mostrou as luzes do budismo, de Sidarta Gautama ou Saquia Muni. De Lao-Tse, o
"Tao-Tse-King" revelou-nos a doutrina da não-resistência contida no
taoísmo. O "Shi-King", o "Shu-,King", o
"Yi-King", o "Li-Ki" e o "Ch'un Ch'iu", do
confucionismo, nos falaram duma doutrina de profunda sabedoria. O sintoísmo
trouxe-nos ao conhecimento a crença dos japoneses nos seus antepassados
e a concepção do seu deus masculino-feminino. De Maomé tivemos oportunidade de
conhecer o "Alcorão", e de Nanak, reformador do hinduísmo, conhecemos
com satisfação o "Granth", donde se esparge o ensino maravilhoso da
eficácia da oração e da meditação, embora, estranhamente, pregasse também a
violência. A doutrina de Bah explicada
por Bahá'u'Ilah, empolgou-nos sobremodo, principalmente quando prega a unidade
e tolerância de todas as religiões do mundo. Mas estudamos também a religião
dos mórmons (Igreja de Jesus-Cristo dos Santos dos últimos Dias), revelada pelo
Espírito de Moroni, filho de Mórmon, a José Smith, em Ontário, nos Estados
Unidos. As obras básicas do gandismo, o "Neethi-Darma" e as
"Cartas ao Ashram", esclareceram-nos sobre a poderosa reforma cristã
introduzida no hinduísmo por Moandas Gandhi, o mahatma, em pleno século XX.
Fomos conhecer ainda todos os detalhes históricos do chamado cristianismo
ortodoxo, que ainda hoje domina quase inteiramente o Oriente Médio, não nos
esquecendo de estudar com acuidade e mais vagar o catolicismo de São Jerônimo,
Santo Agostinho, São Tomás de Aquino e do Concílio de Trento. Aprendemos a
história da Reforma, de Lutero e Calvino, a Umbanda afro-brasileira, o
Cristianismo puro de Jesus Cristo e por fim o puro Espiritismo de Allan Kardec.
Pesando e sopesando todos os
conceitos e ensinamentos contidos em todos esses valiosos estudos a que
procedemos, acabamos por compreender que só o Espiritismo era bastante para
esclarecer completamente todos os problemas que nos atribulam o espírito
sequioso de conhecimento. Só o Espiritismo responde com exação e carradas de
bom senso às
perguntas do homem sobre as mais complexas e abstrusas questões filosóficas.
Por tudo isso, quando um leitor como
aquele de Niterói, irritadiço, nos acusa de provável "egresso do
catolicismo", sem dúvida comete equívoco alvar. Aliás, invectivadores
desse jaez são às vezes os que menos conhecem a doutrina católica e julgam
mesmo que ela se reduz à crença em Adão e Eva, no Céu e Inferno, em Satanás, na
missa ou no Juízo Final. "Vis-à-vis" com um seminarista inteligente haveriam
por certo de se surpreender com muita
coisa que ignoram. O Espiritismo é sobejamente profícuo em teses e proposições
altamente racionais de forma a desnudar todas as incongruências e aberrações
lógicas do Catolicismo; mas este não é confutável tão só com o juízo pueril
daqueles que, em vez de se lançarem a essa empreitada dialética, deveriam antes
estudar um pouco mais a sua própria religião. No grupamento de que fazemos
parte - o "Grupo Espírita Léon Denis" - tivemos ensejo
de enfrentar, todos nós, em épocas distintas, três Espíritos terríveis: um
professor de sociologia, católico, desencarnado no início deste século; um
bispo, arguto e erudito; e um antigo inquisidor português. A defesa que essas
entidades fizeram da doutrina católica - especialmente o professor - foi
impressionantemente séria. Exceto o último, com o qual perdemos o contato, os
dois primeiros graças a Deus chegaram a ser tocados pela Verdade que
lhes procuramos oferecer em troca de suas ideias dogmáticas e sobremodo
formais. O Catolicismo, na sua essência, é prenhe de impropriedades e
postulados chocantes, mas é mister estudá-lo bastante para combatê-lo com
proveito. Não basta proclamar-se espírita e acusar os outros de "egresso
do catolicismo" para que esta doutrina seja contraditada ou aquela
comprovada.
Outro leitor, cheio de animadversão,
vem-nos ensinar que, ao contrário da nossa opinião expendida em determinado
artigo, Allan Kardec conhecia muito bem as materializações. E copia trechos
enormes de "A Gênese" para atestar o que diz. Ora, que poderíamos
responder a esse moço, senão que ele pensa que sabe, mas não sabe nada? As
experiências de materializações começaram apenas em 1870, com Wíllíam Crookes,
e Kardec desencarnou em 1869. Disséramos precisamente isso, que o Codificador
recebera ensinamentos sobre o assunto e os inserira na sua obra, sem entretanto
ter tido a oportunidade
de testar experimentalmente essas lições teóricas, aprendidas dos Espíritos.
Outro mais, cuida de nos recomendar
a leitura de alguns escritos contrários ao corpo fluídico de Jesus,
prometendo-nos mesmo enviar alguns trechos para nosso aprendizado. Que lhe
poderíamos, também, responder? Que já havíamos lido todos aqueles disparates,
dilatados pela má fé e o ódio gratuito? Um desses escritos, embora publicado a
bem da verdade, se celebrizou pela confusão que o autor fez entre João Batista
e João Evangelista. A certa altura, a fim de negar-lhe o caráter de revelação,
critica a mudança do título da obra de Roustaing, ignorando que Allan Kardec
também mudou o título do seu "Evangelho segundo o Espiritismo". À página
95 diz que Maria era um Espírito puríssimo, mas admite irreverentemente que ela
tenha ficado grávida de outro homem que não José. Considera a
teoria do corpo fluídico um dogma e dogmáticos os seus defensores, sem se
lembrar de que os nossos irmãos anglo-saxônios também consideram um dogma a
teoria da reencarnação de Allan Kardec, aliás, por este mesmo assim
considerada. Em suma, um chorrilho de incongruências que só comprometem o autor
e nos suscita a lembrança daquela sentença de André Luiz contida em "Vozes
do Grande Além": "A lâmina de
nossa reprovação volta-se, invariàvelmente, contra nós, expondo-nos as próprias
deficiências" (pág. 109, 1ª ed.).
Outro livro, recomendado pelo nosso
caro leitor é aquele que, nas suas conclusões finais, sugere uma sessão durante
a qual se evocariam os Espíritos de Allan Kardec e J. B. Roustaing para dirimir
a dúvida sobre o corpo de Jesus! Se tivéssemos oportunidade, pediríamos a esse
escrevinhadeiro que aproveitasse para indagar também sobre a cura do câncer
ou até mesmo o bilhete que vai dar amanhã na loteria... Ismael Gomes Braga,
nosso brilhante confrade, diria mais tarde, sobre esse trabalho, que ao autor
"faltou a serenidade construtiva"...
De São Paulo, outro missivista nos
vem dizer que o livro "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho"
foi adulterado da segunda edição em diante, na parte que diz respeito ao
consenso de Humberto de Campos ao papel de Roustaing como organizador do trabalho
de fé do Espiritismo. A primeira edição do referido livro está à disposição do
leitor na biblioteca da Federação (possivelmente em muitas outras, inclusive de
São Paulo), para que pessoalmente
verifique a calúnia assacada.
E assim, uma série de cartas de todos
os coloridos, de todos os diapasões. Quanto à Federação Espírita Brasileira,
seguimos seu programa - e com absoluta fidelidade - porque nada temos
racionalmente que lhe criticar. Essa história de chamar-lhe Papado já está
sobremodo desgastada. Os que assim procedem mostram completa ignorância dos
seus métodos e do mecanismo interno que lhe imprime a marcha ascensional. Sua
diretoria é eleita
anualmente por um conselho de trinta e sete membros que, quando bem queira,
pode alijá-la, se assim o desejar. Todos os anos é lido pelo presidente um
relatório das atividades. Este, pode ser interpelado sempre, sobre qualquer
assunto. Os livros editados pela entidade só o são depois de examinados por uma
comissão especial. A Federação não
obriga ninguém a coisa alguma. Ela se preocupa tão somente com a divulgação da
Doutrina Espírita. Não faz política, não faz conchavos, não faz exibições, não
faz histerismos. Os que a atacam, fazem-no simplesmente porque ela não lhes
encampa os pontos de vista pessoais. Quem são afinal os intransigentes? A
Federação, que segue rigorosamente um programa estatutário aprovado em
assembleia geral, ou os que de fora gostariam que ela lhes apoiasse o programa
individual de cada um? Diariamente chegam à FEB dezenas de cartas com sugestões,
críticas, novas ideias, etc. Se a sua diretoria fosse atender a todos esses missivistas
- dentre os quais, não esqueçamos nunca, proliferam os obsidiados -, sua missão
seria um fracasso. Por isso a Casa de Ismael não tem de seguir ninguém
particularmente, senão o seu próprio programa de trabalho. E este é traçado
pelo Alto, não pelos seus dirigentes, pelos seus conselheiros ou pelos seus
associados. Muito menos pelos seus adversários. A esse propósito, leiamos o que
nos diz Humberto de Campos em "Crônicas de Além-Túmulo", à pág. 119,
6ª ed.: "A obra da Federação Espírita Brasileira
é a expressão do pensamento imaterial dos seus diretores do plano invisível,
indene de qualquer influenciação da personalidade dos homens." "O roteiro de sua marcha é conhecido e
analisado no mundo das verdades do Espírito e a sua orientação nasce da fonte
das realidades superiores e eternas, não obstante todas as incompreensões e
todos os debates."
É sempre oportuno esclarecer um
aspecto sobremaneira mal interpretado pelos eternos detratores da Instituição.
Fingem não compreender como possa o Alto nortear os trabalhos da FEB sem que se
negue o ensinamento espírita de que cabe aos homens sua parcela de trabalho
aqui na Terra. Ora, o que promana do Alto é apenas o programa, tanto quanto
aconteceu com a própria codificação da Doutrina Espírita. Os homens
encarregados de cumpri-lo, estes serão sempre livres para vencer ou fracassar
na sua missão. Mas não podem se surpreender, caso fracassem, se "inexplicavelmente"
forem afastados da seara para a qual não se mostraram à altura. Isto porque, os
homens podem falhar, mas o programa - que é do Alto - não pode falhar nunca. Se
Kardec falhasse, outro se encarregaria da
Codificação. Se os dirigentes da FEB falharem, outros os substituirão. Não
ocorrendo isso, é porque tudo vai muito bem, com o beneplácito do Alto. E não
precisa ser muito inteligente para descobrir, pelo trabalho já realizado, que
tudo vai de fato muito ao gosto do Cristo.
Aos que alegam ser pequena a ajuda
material que a FEB oferece, apesar de sempre crescente, devemos lembrar que os
tempos são outros e os critérios de serviço devem também ser renovados.
Atualmente, por ser muito mais
importante e fundamental do que qualquer outra tarefa, a FEB vem-se dedicando
com mais empenho àquele compromisso que, de todos, há de ser sempre o mais
altanado. O livro espírita, a sua impressão, a sua divulgação e a sua
distribuição pelo Brasil inteiro, e mesmo pelo mundo afora, levando a todos os
rincões os ensinamentos
do Evangelho e da Terceira Revelação, vale mais, muito mais do que qualquer
esmola dada a um necessitado da carne. Releiamos, a propósito, o que Irmão X
nos ditava através de "Reformador" de Abril de 1957, pág. 74:
"Celebrando, pois, o primeiro
centenário de "O Livro dos Espíritos", reverenciamos a memória de
Allan Kardec, saudando igualmente a Federação Espírita Brasileira que, em três
quartos de século do Espiritismo Codificado, vem construindo no silêncio e no
trabalho de sua obra impessoal, sob a égide dos Mensageiros da Vida Superior, o
santuário moral do Livro Espírita, dentro da dignidade doutrinária, clareando
consciências e inspirando corações para o serviço do Cristo, como roteiro de
caridade, fonte de esperança e celeiro de luz."
A assistência material é nobre, não
há que duvidar, mas, sozinha, não desperta ninguém para os labores da própria
redenção. O livro, este sim, atinge diretamente o Espírito, modificando-o,
iluminando-o, aprimorando-o. Camilo Castelo Branco afirmou com
muita sabedoria e muita gratidão: "Nos
livros aprendi a fugir ao mal sem o experimentar." E Eça de Queirós
completou: "Só um livro é capaz de
fazer a eternidade dum povo." No mais - convém repetir com assiduidade
- o Espiritismo não veio senão para redimir o homem, transformá-lo, remoçá-lo e
salvá-lo para Deus. Essa tarefa só é factível através do aprendizado, da
aculturação, cuja base é o livro, sempre o livro. Os que criticam a FEB fazem
questão de ignorar esse essencial mister a que a quase secular instituição se
tem dedicado com todo o denodo. Ao mesmo tempo, deslembram, esses impenitentes,
que não foram capazes até hoje de escrever meia dúzia de linhas sequer em
benefício da propagação
da Doutrina. E se, em raríssimas oportunidades o fazem, não esquecem nunca de
cobrar, direta ou indiretamente, os direitos autorais... Só aprenderam a
criticar destrutivamente; nunca construíram nada. Vale, para eles, a assertiva
do tribuno popular francês Camilo Desmoulins: "Não há gente mais disposta a criticar os que fazem alguma coisa, do que os
que não fazem nada."
Contudo, de todas as assacadilhas
contra a FEB, a mais virulenta é sempre relativa à sua posição de propagadora
da obra de J. B. Roustaing. E nós também vamos pegando algumas sobras por nos
colocarmos nessa mesma linha, em razão do que até "irmã vicentina" já
nos chamaram, nas colunas de certo periódico. Tivemos ocasião de escrever
modesto artigo catalogando todos os espíritas de renome, encarnados e
desencarnados, que advogavam a tese do corpo fluídico de Jesus. Foi o bastante
para que caíssemos na desgraça de alguns confrades menos ponderados. Mas, que
querem eles, afinal? Que lhes sigamos os passos e nos afastemos do pensamento
de Ewerton Quadros, Bezerra de Menezes,
Guillon Ribeiro, Manuel Quintão, Bittencourt Sampaio, Leopoldo Cirne, Manuel
Spindola, Antônio Lima, Ismael Gomes Braga, Newton Boechat, Indalício Mendes,
Antônio Luiz Saião, Humberto de Campos, Emmanuel e tantos outros? Ou, então,
que fiquemos com aquela história do Cristo Cósmico, Período Lunar, Período
Solar, Espírito Planetário, etc? Ou gostariam ainda que aceitássemos o
Cristo-Deus? Aproveitamos o instante para lembrar àquele leitor que deitou
sobre nós tantos conhecimentos a respeito do corpo de Jesus, acusando-nos de
falsear o verdadeiro sentido do item 277 de "O Consolador", que
poderíamos ser ainda mais objetivos na nossa argumentação, se em vez daquela
citação transcrevêssemos a resposta de nº 243, onde se pode ler: "Todas as entidades espirituais encarnadas no orbe
terrestre são Espíritos que se resgatam ou aprendem nas experiências humanas,
após as quedas do passado, com exceção de Jesus-Cristo, fundamento de toda a
verdade neste mundo, cuja evolução se verificou em linha reta para Deus e em
cujas mãos angélicas repousa o governo espiritual do Planeta, desde os seus
primórdios.”
Parece-nos que aqui não há dúvida.
Emmanuel foi categórico na afirmativa de que Jesus nunca encarnou. Sobre a
célebre mensagem recebida no início do presente século, no Grupo "Vinha do
Senhor", nesta cidade, e inculcada como sendo de J. B. Roustaing,
penitenciando-se, este, de haver aceito a teoria do corpo fluídico de Jesus,
recomendamos nosso
leitor a procurar saber que fim levou aquela agremiação, seus dirigentes, seus
frequentadores e o médium que recebeu a mensagem, Aqui, infelizmente, já não
temos mais espaço para contar com minúcias a história.
Restaria perguntar, a esses
detratores todos, por onde anda sua vontade de aprender, a qual não lhes
ensejou até hoje a leitura de determinadas obras do Além através de médiuns de
grande envergadura moral, como por exemplo Chico Xavier. Compulsemos, de
passagem, o livro "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho",
transmitido por Humberto de Campos, nas suas páginas 199/200 da 2ª edição:
"A realidade é que, considerada às
vezes como excessivamente conservadora, pela inquietação do século, a
respeitável e antiga Instituição é, até hoje, a depositária e diretora de todas
as atividades evangélicas da Pátria do Cruzeiro." "As forças das sombras alimentam, muitas
vezes, o personalismo e a vaidade dos homens, mesmo daqueles que se encontram
reunidos nas tarefas mais sagradas; mas a direção suprema do trabalho do
Evangelho se processa no Alto e a Federação Espírita Brasileira, dentro da sua
organização baseada nos ensinamentos do Mestre, está sempre segura do seu labor
junto das almas e dos corações, cultivando os mais belos frutos de
espiritualidade na seara de Jesus, consciente da sua responsabilidade e da sua
elevada missão.”
Na verdade, podemos sentir, sem
esforço, que o Alto não se afasta de orientar a FEB, inspirando os seus
dirigentes na sua conduta terrena. Os fatos aí estão para demonstrá-lo e só um
cego não os vê. Enquanto as demais organizações nascidas e alimentadas do ódio
à FEB vão desaparecendo paulatinamente, a Casa de Ismael permanece intangível,
altaneira, vencendo os anos e as vicissitudes todas. Os periódicos que lhe dão
combate têm sua trajetória interrompida, sendo de se notar a recente extinção
duma característica publicação que, de todas, quiçá primasse pelo mais longo
afastamento da doutrina espírita-cristã, tal o seu habitual linguajar
irreverente e pretensioso. Entre seus articulistas um se
destacava, comicamente, pela sua constante posição "do contra". Era
contra a FEB, contra Roustaing, contra Emmanuel, contra André Luiz, contra
Chico Xavier, contra Waldo Vieira, contra Humberto de Campos, contra nós,
contra tudo, contra todos. Quem sabe até contra ele mesmo ... ? Quanto aos
livros de oposição à FEB, dormem nas prateleiras de livrarias, ou rolam pelos
sebos e nunca mais são reimpressos. As tribunas escasseiam para aqueles que não
têm sabido fazer dela um verdadeiro recurso de pregação do amor e da verdade,
mas que seriam os primeiros a abrandar a língua se a FEB lhes destinasse uma
coluna no "Reformador" ou cinco minutos no seu salão de conferências.
Não desejam mais do que exibir-se e, faltos de autocrítica, pregar suas teorias
preconcebidas. Em "Obras Póstumas",
pág . 319, 11ª ed., Allan Kardec quis por certo aludir a esses, quando
escreveu: "Não faltarão intrigantes,
pseudo-espíritas, que queiram elevar-se por orgulho, ambição ou cupidez;
outros, que estadeiem pretensas revelações com o auxílio das quais procurem
salientar-se e fascinar as imaginações por demais crédulas."
Sim. Seguimos a FEB, porque seu
programa é o que nos agrada, pautado que está rigorosamente na própria Doutrina
Espírita. Nenhum reparo temos a fazer ao seu trabalho e à sua conduta. Os
ideais que ali vigem são os que abraçamos, os serviços que ela empreita são os
que nos satisfazem. Nunca nos impuseram coisa alguma e muito antes de lhe
pertencermos ao Conselho Superior, já dela éramos beneficiário, não apenas
materialmente (ali recebemos inestimável assistência espiritual, através de
passes magnéticos) mas, acima de tudo, doutrinária e evolutivamente, com as
lições que aprendemos emanadas das obras que há mais de meio século vem
divulgando. Lemos muito sobre Espiritismo. E de tudo o que lemos, ficou-nos a
autoridade, mínima que seja, para escolher sem cegueira nem paixão: estamos com
a FEB. Aos que quiserem conhecer melhor os argumentos esfarrapados dos que a
combatem, recomendamos os capítulos IX, X, XI e XII do livro "Elos Doutrinários", do nosso
erudito confrade Ismael Gomes Braga. Vale a pena ler.
Nossos leitores que continuem a escrever-nos,
pois suas críticas hão de agradar-nos sempre. Pedimos apenas que o façam em
termos evangélicos, sem facciosismos, sem ódios, sem o desejo de aluir coisa
alguma. Quanto ao companheiro que nos obrigou a esse longo artigo, nosso
convite sincero para que venha conhecer melhor a obra da Federação Espírita
Brasileira, principalmente seu trabalho de divulgação do livro espírita, em
muitos dos quais, estamos certos, foi beber os conhecimentos que hoje o fazem
um espírita honesto e senhor de cabedal respeitável. O Papado, que ele andou
adivinhando na direção da FEB, não existe na realidade. Por outro lado, esta
não pode nem deve descuidar-se um minuto sequer, para que a Instituição não
acabe caindo em mãos menos dignas. Essa cautela, de resto, quem a aconselha é o
próprio Allan Kardec, quando diz em "Obras Póstumas": "É também de prever que, sob falsas
aparências, indivíduos haja que tentem apoderar-se do leme, com a ideia
preconcebida de fazerem soçobrar o navio, desviando-o da sua rota. O
navio não soçobrará, mas poderia sofrer prejudiciais atrasos que se devem
evitar"
(pág. 219, 11ª ed.).
Deixem-nos por fim, o companheiro e
todos os leitores nossos, lembrar-lhes que bastaria a conquista do selo
comemorativo do centenário de "O Livro dos Espíritos", conseguido
duramente pela FEB, para credenciá-la - em especial a sua atual diretoria -
junto ao coração dos espíritas de todo o mundo. E, ao seguir pela avenida
Passos, que nosso companheiro se detenha um instante em frente à Casa de
Ismael, se nela não quiser entrar, para sentir pessoalmente, ao passar por ela,
que de fato os homens passam e a FEB fica, eterna e imortal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário