Prática
do Espiritismo
Aurélio
A. Valente
Processo
das manifestações
Admitindo-se para o
Espiritismo o tríplice conceito de Filosofia, Ciência e Religião, devemos esclarecer
cada um de per si. Ocupemo-nos agora do Espiritismo como ciência.
Espiritismo-Ciência ou Ciência-Espírita é o estudo coordenado e metódico de
tudo quanto concerne ao Psiquismo: acurada análise e classificação dos
fenômenos, princípios, formação moral, espiritual e intelectual dos médiuns, diversidade
e graus de suas faculdades, vida de relação social, organização de grupos de
trabalho e pesquisas, escolha dos componentes dos mesmos, locais de instalação,
por final, investigação meticulosa das condições propícias ou desfavoráveis
para se processarem os fenômenos relacionados ao intercâmbio entre a Humanidade
visível e invisível, ou seja, como dizemos vulgarmente, de encarnados e desencarnados.
Em virtude dessas
circunstâncias, os chamados trabalhos práticos ou sessões mediúnicas, que são investigações
científicas; qualquer que seja a sua finalidade, não podem e não devem ser
presididas por confrades inexperientes e sem preparo.
O presidente deverá
ser um homem ou uma mulher de elevada moral, bom preparo geral, conhecedor do
Novo Testamento, que tenha boa cultura espírita, isto é um abalizado estudo das
obras de Allan Kardec, Léon Denis, André Luiz e de outros autores, consideradas
subsidiárias, pelos esclarecimentos particularizados de determinados assuntos, como
por exemplo o livro No País das Sombras,
de E. D'Esperance, que muito elucida os que se dedicam às sessões de
materializações. Todos esses dotes e predicados deverão ser completados por valiosa
experiência da vida.
Essas credenciais são
imprescindíveis ao Presidente, por constituírem elementos de garantia para orientar-se
com método e ordem e obter resultados proveitosos.
Em uma sessão
espírita verificam-se fenômenos de animismo, auto sugestão, hipnotismo e
outros, além dos denominados propriamente de espíritas; manifestam-se Espíritos
de todas as categorias, graves e zombeteiros, sábios e ignorantes, sérios e mistificadores,
felizes e sofredores. Por tudo quanto escrevemos, conclui-se que o presidente
deverá ter capacidade para distinguir e classificar os fenômenos e discernir a
verdade do erro, a sinceridade da impostura, a mistificação do médium ou do
Espírito e dialogar com proveito com todos os comunicantes do Além.
Léon Denis, no seu
livro, No Invisível (obra indispensável
aos que dirigem sessões, mas, pouco estudado e até desconhecido por muitos
confrades), escreveu o seguinte no capítulo - Formação e direção de grupos:
"Nenhum Grupo sem ser submetido a uma certa disciplina
pode funcionar. Esta se impõe não somente aos experimentadores como também aos Espíritos.
O diretor do Grupo deve ser um homem de dupla enfibratura, assistido por um
Espírito-guia que estabelecerá a ordem no meio oculto, como ele próprio a
manterá no meio terrestre e humano.
Essas duas direções devem mutuamente completar-se, inspirar-se num
pensamento igualmente elevado, unir-se na prossecução de um objetivo comum.”
Os médiuns, por sua
vez, devem estudar, e muito, a fim de que os Espíritos sintam facilidade para sintonizar
as recíprocas vibrações e encontrar nos seus instrumentos os subsídios
indispensáveis para suas comunicações. Camilo Castelo Branco (Do País da Luz livro II, pág. 93, 4ª
edição da FEB), ao transmitir pelo médium Fernando de Lacerda uma mensagem a propósito da crítica feita por alguns literatos plenos de
dúvidas sobre as suas mensagens, confortou-o, esclarecendo-o com as seguintes palavras:
"Se o teu cérebro estivesse
riquíssimo de termos e de conhecimentos, larga, proficiente e pacientemente
armazenados, eu teria melhor propósito de tudo dizer com o modo próprio com que
o fazia com o material integralmente meu, como o tipógrafo terá mais facilidade
de variar de tipo, consoante
a riqueza e variedade dos caixotins de que dispuser.”
O Espírito de Verdade
em uma de suas mensagens insertas n’O Evangelho segundo o Espiritismo também
recomendou o estudo quando sentenciou "Espíritas:
amai-vos, este o primeiro ensinamento, instruí-vos, este o segundo."
Paulo de Tarso foi o
apóstolo que mais contribuiu para a difusão do Cristianismo, foi o primeiro a
compreender a universalidade da Doutrina de Jesus. A razão é bem simples, era o
mais instruído, o mais erudito entre todos.
Temos encontrado, em
nossa longa peregrinação pelas inúmeras cidades do nosso País, um descaso absoluto
pelo estudo, tanto por parte dos presidentes, como dos médiuns e componentes
dos Grupos. A fé e a mediunidade, por mais poderosas que sejam, são
insuficientes para trabalhos completos e proveitosos.
A falta de
competência dos presidentes constitui a causa principal da frustração de muitos
médiuns, por originar estacionamento e até atrofia de suas faculdades. Os
Grupos permanecem durante anos consecutivos sem progresso, improdutivos. As curas,
conforto, consolações, orientação, quase não se registam.
Sem as cautelas
necessárias ficam os médiuns, isoladamente ou em conjunto, e todos os componentes
dos Grupos sob a ameaça de malogro de resultados perigosos, como a subjugação,
a obsessão, a fascinação. As mistificações são acolhidas como verdades, o
animismo e a auto sugestão imperam.
Se a prática do
Espiritismo bem orientada é uma fonte inesgotável de consolações inefáveis e indeléveis,
apresenta também terríveis perigos para os descuidados e inexperientes.
Os médiuns devem ser
esclarecidos suficientemente sobre o processo das manifestações a fim de bem
cumprirem o seu mandato.
Léon Denis, no livro No Invisível, trata deste assunto:
"As leis da comunicação espírita”. "Sabemos
que a mediunidade, no maior número de suas aplicações, é a propriedade que têm
alguns dentre nós de se exteriorizar em graus diversos, de se desprender do
envoltório carnal e imprimir mais amplitude a suas vibrações psíquicas. Por seu
lado, o Espírito libertado pela morte se impregna de matéria sutil e atenua
suas radiações próprias a fim de entrar em uníssono com o médium.”
"Aqui se fazem necessários uns algarismos explicativos. Admitamos,
a exemplo de alguns sábios, que sejam de 1.000 por segundo as vibrações normais
do cérebro humano. No estado de "transe" ou de desprendimento, o invólucro
fluídico do médium vibra com maior intensidade, e suas radiações atingem a
cifra de 1.500 por segundo. Se o Espírito, livre no espaço, vibra à razão de 2.OOO
no mesmo lapso de tempo, ser-lhe-á possível, por uma materialização parcial,
baixar esse número a 1.500. Os dois organismos vibram então simpaticamente; podem
estabelecer relações, e o ditado do Espírito será percebido e transmitido em
transe mediúnico."
"É essa harmonização das ondas
vibratórias que imprime às vezes ao fenômeno das incorporações tamanha precisão
e nitidez."
André Luiz, no livro Missionários da Luz, escreveu por
intermédio de Francisco Cândido Xavíer, o devotado servidor da Causa, o
seguinte: "E, dirigindo-se para um
rapaz que se mantinha em profunda concentração, cercado de auxiliares de nosso plano,
explicou, atencioso: - Temos seis comunicantes prováveis, mas, na, presente
reunião, apenas compareceu um médium em condições de atender. Desde já,
portanto, somos obrigados a considerar que o grupo de aprendizes e obreiros
terrestres, somente receberá o que se relacione com o interesse coletivo. Não
há possibilidade para qualquer serviço extraordinário."
Considerando estas
elucidações, não podemos compreender a singular ocorrência que temos constatado
na maioria dos Grupos que visitamos. A um certo momento, sob a ordem do
presidente, todos os médiuns recebem, no mesmo instante, os seus Guias ou
Espíritos não identificados, passam as mãos pelas próprias cabeças, em gestos
cadenciados, sacodem-se com mais ou menos intensidade, e dizem repetidas vezes:
"Graças a Deus, boa noite, aqui
estou para prestar a minha colaboração" ou "A paz do Senhor esteja nesta casa, boa noite, vim
auxiliar o meu médium" e várias outras, algumas das quais são incompreensíveis.
Como podem todos os
médiuns receber ao mesmo tempo? Há médiuns que permanecem anos consecutivos sem
qualquer progresso, sem qualquer desenvolvimento. São os médiuns que Allan
Kardec classificou de improdutivos.
É o caso de
indagarmos: Nas manifestações simultâneas haverá animismo? auto sugestão? ou será
falta de orientação dos presidentes? Julgamos ser tempo de os presidentes
meditarem sobre o processo das manifestações para tirarem melhor proveito de
seus esforços.
Reformador
(FEB) Março 1964
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