A
Igreja de amanhã
Redação
Reformador
(FEB) Janeiro 1920
Há cerca de dois mil anos baixou à
Terra, morada das mais obscuras da casa do seu e nosso Pai – O Cristo, Senhor
nosso e Redentor definitivo da Humanidade, de todos e para todos os tempos.
Baixou, não na metrópole da civilização
daquela época--a majestosa e opulenta Roma dos Senadores, dos Césares e de mil
e um deuses, mas na rústica Judeia oprimida e quase ignota (desconhecida), dos povos avassalados,
o mais desprezível e miserável, no conceito da orgulhosa cidadania de então.
E como se para lição não bastara a
exiguidade daquele cenáculo, em vez de Palácio
e púrpuras o escuso desvão de um estábulo, um monte de palhas, o seio de Maria
e nada mais! E era o Messias de Deus, que de si mesmo vinha dar ao mundo o testemunho de Deus!
Quem o diria? Plebeu, errante, obscuro,
EIe, o esperado Rei vingador do povo eleito e, no entanto escravizado, viveu e
desapareceu entre os humildes!
Quem o compreenderia? Nem mesmo os
seus discípulos, antes que os iluminasse o Espírito Santo, isto é, antes que lhes
fosse outorgado o dom das mediunidades, a vidência, a audição, a penetração das
coisas divinas, bem acima das vulgaridades e convenções terrenas.
Rudes e simples pescadores improvisados
Apóstolos, foram eles, Pedro à testa, pelo mundo com o só tesouro da sua Fé
instituir a Igreja da Vida, ou seja a comunhão de crentes nas promessas de
Jesus.
De como catequisaram, a história no-lo
diz: reuniam-se em qualquer parte, operavam curas, expeliam demônios (espíritos
maus) e ao vivo contavam a vida e os feitos do Mestre Divino, ressuscitado. A
tradição oral se fixava, assim, na maioria dos prosélitos, sofrendo na forma a
influência do meio e dos costumes, mas, em todo caso, mantendo-se íntegra no fundo.
Não havia templos nem imagens, hierarquias nem sacramentos, nem exegeses metafísicas.
Os mais austeros e virtuosos eram sagrados chefes (episcopi) e dirigiam os trabalhos da comunidade, que se resumiam na
oração de momento, na palavra dos inspirados, - médiuns intuitivos ou sonambúlicos,
e na partilha do pão como símbolo de fraternidade. Depois, com o correr dos
tempos, a política humana se foi insinuando no proselitismo incipiente e já quatro
séculos depois do Calvário o concilio de Nicéia sob a pressão de Constantino
(imperador pagão cem vezes criminoso e herético) (1) decretou a consubstancialidade
do Filho, aliás por minoria ridícula de prelados. (2)
(1)
Batizado in extremis por Eusébio, bispo excomungado, fazia devorar por feras os
seus prisioneiros de guerra e mandou assassinar a mulher, o filho e o cunhado.
(2)
Votaram o símbolo apenas 300 de 2.000 prelados, sendo que a maioria capitulou
sob a
pressão do grande imperador.
E foi, a seguir, toda uma efervescência
de Templos e Basílicas, qual mais rica e poderosa, disputando ascendentes e primazias
em sutilezas dialéticas e com orações servilíssimas com o paganismo idólatra e sensualista.
O Cristo marmorificou-se,
petrificou- se, entrou de aparecer às vistas da massa inconsciente e fanatizada,
mas desertou dos corações.
E o que era comunhão de almas,
vibrações de amor, iluminação do alto, transformou-se em reunião de corpos e mistificação
de sentidos.
E os Evangelhos edificantes na sua singeleza,
sublimes no seu simbolismo quando manuseados com aquele amor que engendra a
iluminação interior - os Evangelhos foram substituídos pelos autores escolásticos,
pelos catecismos tendenciosos, ao sabor das conveniências do momento.
A figura do Deus, a igreja dos humildes
deixou de ser evangélica para ser romana, para ser dos Césares que não d'O
Cristo, da terra que não do céu
O resultado dessa inversão ou antes
subversão do meios e fins, constitui todo um acervo de lutas sangrentas
disputas vergonhosas, que não culminaram na Inquisição porque perduram em nossos
dias, para a vergonha nossa.
A tática hoje, porém, é outra: não
se queimam Joanas d' Are, não se apunhalam Collignys, mas sitia-se a presa imbele
(fraca), estreita-se lhe o
círculo das natividades sãs, reduzem-nas à fome, se tanto for preciso.
Nem para outra coisa se fez a
política das veneras (medalhas) e títulos, da
diplomacia e dos
tesouros que a traça rói...
Mas, quanta ilusão! Ilusão, sim, para
não dizer maldade, impenitência, erro confesso...
Confesso porque é o próprio chefe da
igreja de Roma que nos diz de público, falando agora à sua Corte Eclesiástica,
pelo Natal, (1) que a humanidade
está no ostracismo de Deus!
(1)
Telegrama de Roma nos jornais.
Grande e dolorosa verdade, que
atesta a cavilação (trama) ou a impotência do
catolicismo, na sua faina secular de patrona de consciências.
Porque, de duas uma: ou a igreja católica
não tem sabido, ou não tem podido cumprir a sua missão. No primeiro caso, ela
deve emendar a mão, reconciliar-se com aquele espírito cristão, que produziu mártires
e santos; no segundo ela deve abdicar de suas presunções e deixar a outrem o
zelo da Arca Santa.
Nós, porém, não acreditamos que o faça
em caso algum e o resultado será que um dia se encontrará isolada em si mesma,
morta das próprias ambições.
E a razão de assim conjecturarmos é
simples: é que, enquanto ela se aferra a sua suserania (poder de decidir), rebelde a toda a
ideia de evolução e progresso, as gerações que despontarem o fazem apercebidas a
voltar-lhe costas, na perquisição (investigação escrupulosa) da Igreja do Cristo,
em anseios de amor e desejos de verdade incoercíveis.
E a Igreja do Cristo voltará aos
tempos áureos do apostolado inicial, não mais suscetível, pensamos, de
degenerescência, porque os tempos são outros e a razão humana trabalhada e
amadurecida por vinte séculos de reencarnações, aparelhada se encontra para não
alienar a comunhão dos Espíritos, que vem em nome do Senhor realizar as suas
promessas.
Assim saibamos nós outros, os primeiros
chamados desta hora de transição imprescritível,
manter intacto o precioso legado do Espírito-Santo.
Porque tudo mais, sabemo-lo, será
dado de acréscimo.
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