A Criança
e a Escola
por Guerra Junqueiro
Reformador
(FEB) Janeiro 1920
Eu sinto uma tristeza imensa quando vejo
as grades de uma cadeia ou as portas de uma escola má.
Dois cárceres. Um é corolário do outro: a ignorância produz o
crime, a má escola produz a cadeia.
Os povos têm um coração: é a escola.
Escola boa, boa saúde.
Matusalém estuda o alfabeto. Se não
fosse triste, seria ridículo.
Trabalhemos. Alongar a escola é
diminuir o cárcere. Quereis garantir o direito, a paz, a civilização? Prendei o espírito na jaula da
Verdade.
Quereis suprimir o cárcere? Metei
dentro a escola.
À noite iluminam-se as ruas por
causa dos ladrões.
Quereis segurança? Acendei os espíritos
e apagai os candeeiros.
Menos enxovias (cárceres) mais argumentos!
É para as almas delicadas um quadro doloroso
ver as crianças durante seis horas na escola, sentadas, imbecis.
A criança, cujo organismo físico e
moral requer imperiosamente a agitação cujo sangue é áspero, vivaz, inquieto, petulante;
a criança que é toda feita de alegria viva, de movimento rápido, de vibrações aladas,
não pode estar um dia inteiro estupidamente constrangida numa posição bestial e
monástica.
Pobres flores! Dobram-lhe as espinhas
sobre um livro árido, seco, abstrato, amolecem-nas
com o repouso forçado, e quando sonolentas e cansadas, levantam a vista do livro,
que não entendem, para espreitarem pela janela uma nesga do céu, encontram diante
de seu olhar humedecido o terno, o olhar dogmático de um professor pedante.
Vamos! Deixai que corram as crianças!
Saturai-as de luz. Equilibrai-lhes o
sistema nervoso. Dai-lhes força, movimento, harmonia e liberdade.
Uma criança é uma avezinha.
Quereis modelar a escola?
Não copieis o claustro, imitai o
ninho.
É por isso que as crianças quando
saem da aula tem uma alegria vibrante, radiosa, alucinada; gritam, soltam, trepam
as árvores, roubam os ninhos, apedrejam os cães, correm, desaparecem, voam como
pássaro que fugiu da gaiola.
Voam, sim, a alegria tem asas. É a natureza
que protesta.
A natureza! Palavra santa.
É o berço do mundo. Fora dela não há
ciência nem religião.
Quando o homem a desprezou fez-se a
noite da história- a idade média.
A luz tornou-se penumbra, o
pensamento sonho.
Foi o eclipse da alma, entre ela e
Deus levantou-se o terror, fechou-se o espírito e abriu-se o claustro!
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