Vinícius
A vida verdadeira
Vinícius (Pedro de Camargo)
Reformador (FEB) Março 1952
Se
a vida começasse com os primeiros vagidos da criança e tivesse o seu desfecho
no derradeiro suspiro do moribundo, não passaria
de engenhoso engodo, habilmente concebido, para manter o homem, durante algum
tempo, sob a sensação enganadora de uma aparente realidade.
Suas
incontestáveis belezas e encantos, como também suas estupendas realizações e
conquistas, nada mais seriam, em síntese, senão mitos e quimeras conducentes
aos maiores desapontamentos e à mais cruel decepção.
Ciência,
filosofias, artes e expressões religiosas em seus aspectos mais excelentes;
coragem moral, renúncia e sacrifícios; dedicação, perseverança e fé; otimismo,
bom ânimo, aspirações puras e elevadas; idealismos transcendentes tendendo à
consumação do belo, do justo e do verdadeiro; enfim, surtos, arrancadas e
porfias amoráveis buscando unir e confraternizar a Humanidade, apenas representaria,
tudo isso, o bruxulear descompassado de uma chama que se extingue, lançando ao
vento seus postremos lampejos.
Se
assim realmente fosse a vida, não mereceria ser vivida. Melhor fora que jamais
existisse. Mas, felizmente para o homem, a realidade é bem outra: a vida, neste
orbe, é a manifestação do Espírito através da matéria devidamente organizada
para esse fim. A alma é imortal e, por isso, responsável. Veste-se do corpo ao
nascer, e dele se despe ao morrer. Seus esforços e suas lutas, seus
empreendimentos e suas aspirações são meios de aprendizagem mediante os quais
ela vai, em seu eterno presente, reparando o passado e conquistando o futuro.
Evolver
é o objeto da vida. Amar é a sua função. Vencer é o seu destino, gravitando
para a fonte de onde promana: Deus.
A
quimera e as ilusões procedem das falsas interpretações que têm da alma, da
maneira errônea de concebê-la, confundindo-a com o corpo que ela movimenta do
nascimento à morte.
Fantasias
e sonhos vãos resultam da falsa visão daqueles que concentram e delimitam as
operações da vida ao âmbito estreito deste planeta, ao cenário instável e
movediço da existência humana.
Semelhantes
conceitos e conclusões não procedem apenas do raciocínio, da lógica e do senso
comum; nem, ainda, de doutrinas e escolas fundadas e mantidas por autoridades
terrenas: são revelações e testemunhos trazidos à Terra por aqueles que já
transpuseram as suas fronteiras, penetrando o limiar do Além.
Não
se trata de dogma ou de ponto de fé imposto pelos credos de menor ou maior
projeção, mas das vozes autorizadas de nossos irmãos, daqueles que mourejaram conosco
e nos precederam na passagem deste para outro plano, onde continuam exercendo
suas atividades através dos atributos inerentes e inseparáveis do Espírito
imortal.
A
miragem que engana, fascina e desnorteia está aqui, neste cenário onde os
homens se acotovelam; está no fato de tomarem a transitoriedade da presente
existência como expressão absoluta da vida, quando representa tão somente uma
fase passageira, transcorrida no curto lapso de tempo que vai da encarnação à
consequente e natural desencarnação.
Se
o nascer fosse o começar, o morrer seria, realmente, o terminar.
Como,
porém, o Espírito preexiste à sua incorporação ou nascimento, segue- se, logicamente,
que após a desincorporação ou morte, ele continuará existindo. Se ele veio da
esfera espiritual ao nascer, é claro e óbvio que retornará, ao morrer, àquela
mesma esfera.
A
alma não é produto da concepção como o é o corpo. Este traz consigo os traços
de sua origem, como também as heranças físicas, boas
ou más, dos seus progenitores. A alma, porém, sede da inteligência, da vontade
e do sentimento, tem a sua gênese na fonte da vida eterna - Deus - ao quem, por
isso, o sábio Mestre da Galileia nos ensina a considerar como nosso Pai,
estabelecendo destarte, analogia entre o genitor do corpo e o genitor do
Espírito. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é
Espírito. A morte, portanto, na acepção de aniquilamento, é a grande ilusão dos
sentidos, que, presos à forma, experimentam a sensação do vácuo quando esta
forma desaparece.
O
nascimento pode, com justeza, ser comparado à personagem que entra no palco, em
devido tempo, a fim de representar o papel que lhe foi distribuído, o qual será,
mais ou menos importante, segundo a sua capacidade. O ator, após realizar a sua
parte, desaparece atrás dos bastidores, tal como sucede ao homem que, ultimando
sua tarefa no teatro terreno, oculta-se no plano espiritual, deixando de ser
notada a sua presença pelos que permanecem, ainda, no cenário das formas corpóreas.
Assim
como o artista prossegue em sua carreira, incumbindo-se de novas representações,
o Espírito continua reencarnando-se em outras existências, nesta ou em outras
ribaltas onde a vida se ostenta em seu curso de perene evolução.
A
vida, portanto, não é uma ilusão, uma quimera, um engodo. Ao contrário, é a
única realidade, a única evidência. Incontestável, porque Deus mesmo é a sua
manifestação no imensurável palco universal de sua infinita criação.
O
que precisamos é estudá-la para compreendê-la e senti-la: em sua verdade, tanto
em nós como em tudo que nos rodeia.
O
que precisamos é aprender a solucionar os seus problemas, vivendo-a como deve
ser vivida, com dignidade, honra e nobreza, considerando sua origem divina.
À
medida que a santificamos em nós, espiritualizando-a progressivamente, lhe
iremos sondando a natureza e sentindo a indestrutibilidade de sua estrutura
inconcebível e inacessível à relatividade da inteligência humana.
Não
basta, pois, viver. É preciso viver bem, penetrando a profundeza da vida. Eu
vim para terdes vida e vida em abundância, disse o Cristo. Viver, tudo vive.
Vive o minério, vive a planta, vive o animal, vive o homem. A vida vegetal é
mais complexa que a mineral. A vida animal sobrepuja a vida das árvores; e a
vida do homem sobrepõe-se a das à dos animais. As expressões que a vida assume são,
portanto, progressivas.
Acima
da vida humana, outras modalidades existem em escala sempre ascendente. Do homem
a Deus verifica-se uma distância infinitamente maior que aquela estabelecida
entre o verme e o Homem.
Tratemos,
pois, de galgar os degraus superiores da vida. Avancemos, subindo conscientemente
a sua escada luminosa, espiritualizando-nos, pois em tal importa a melhor e mais
eficiente de todas as formas religiosas conhecidas neste mundo, aquela ensinada
e exemplificada pelo Verbo Encarnado, quando disse: Eu sou o Caminho. a Verdade e a Vida; ninguém vai ao Pai senão por mim.
Sigamos,
então, desassombradamente, as pegadas d'Aquele que é o roteiro reluzente que
nos conduz à Vida Verdadeira.
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