Os grandes homens
Ismael Gomes Braga
Reformador (FEB) Março 1942
Os grandes homens são incompreendidos pelos
seus coevos (semelhantes) e passam despercebidos, ou são combatidos como nocivos.
Todos os profetas de Israel foram acusados
e perseguidos como falsos profetas. João Batista foi encarcerado e decapitado.
N.S. Jesus Cristo foi acusado e condenado ao suplício da cruz, os apóstolos
foram perseguidos, Sócrates foi combatido e condenado à morte.
Allan Kardec ainda é compreendido somente
por pequenas minorias religiosas é só no mundo latino. Há pouco um amigo
pediu-me lhe arranjasse as obras em língua inglesa. Escrevi a amigos na
Inglaterra e fiquei sabendo com surpresa que as obras do Mestre não forma
reimpressas em língua inglesa. Só existiu uma antiga edição há muito esgotada e
só percorrendo os armazéns de livros velhos de Londres se consegue obter ou outro
livro do Mestre. E, note-se que o Espiritismo na Inglaterra está divulgadíssimo;
no entanto, apenas os livros elementares, de experimentação, podem obter-se.
Allan Kardec ainda é desconhecido do grande público, mesmo na França. Só os
iniciados em Espiritismo o estudam. Só os séculos vindouros, virão a
compreender Kardec e aproveitar-lhe a obra. É grande demais ainda para o nosso
século.
Zamenhof, desencarnado já há 25 anos, só é
conhecido por um número insignificante de esperantistas. O grosso da humanidade
nada sabe a seu respeito. Ele realizou a obra em que havia trabalhado durante
anos, sem resultado, nomes gloriosos como Descartes, Comenius, Leibnitz. É um
gênio infinitamente maior do que esses luminares do pensamento humano., mas
ainda demasiado novo para ser compreendido, mesmo pelos intelectuais da nossa
época. Seu tempo ainda não chegou.
Devemos duvidar muito da grandeza dos
grandes homens que arrastam multidões. Quase sempre, são simples agitadores de
massas, interpretes das paixões inferiores, vaidosos, incapazes de fazer obra
proveitosa. As obras realmente grandes e destinadas a grande futuro são
silenciosas, não entusiasmam às multidões, porque não se afinam com seus ideais
de limitados horizontes, de triunfos rápidos. Os processos de triunfos rápidos.
Os processos de conquistar popularidade são contrários aos de servir ao povo,
por mais paradoxal que isso pareça. O verdadeiro servidor não alimenta as
paixões, a vaidade, os anseios inferiores das massas humanas e por isso não se
torna popular. Sua obra não é compreendida senão muito mais tarde, quando a
evolução se realiza e novas aspirações surgem.
Cumpramos, pois, serenamente os nossos
deveres, sem nos preocuparmos com a aprovação ou reprovação dos nossos
contemporâneos, porque nisso estaremos em harmonia com os grandes homens, por
menores que sejamos.
Não nos preocupem os ataques, plebiscitos e
coisas semelhantes, nem os louvores e apoio dos amigos. Só nos preocupe o
cumprimento fiel do dever em toda a integridade da consciência. Só a ela
teremos que prestar tremendas contas. Ela será o juiz implacável que irá conosco
por toda parte. Os amigos nos abandonam nas horas amargas, os inimigos já nos
abandonaram; mas, a consciência não nos deixa nunca. Só com ela precisamos
estar bem em todos os tempos e, se os arreganhos de fanáticos nos afastarem do
caminho reto, não nos perdoará ela a covardia. Não nos impressionem os gritos
da multidão sempre disposta a atacar e apedrejar. Sabemos que é muito mais fácil
guia-la para o mal, do que para o bem; mas, sabemos igualmente que os seus juízos
são mutáveis como o vento de suas paixões e nada valem.
Os fanáticos têm uma grande qualidade: são
quentes, não são mornos. Desenvolvem energias
e, quando passam a fazer o bem, são os mais fervorosos, capazes de todos os sacrifícios.
Desejamos muito que não haja mornos, que haja quentes e frios; não importa
porém, muito que estejam a nosso favor ou contra nós, que nos lancem louvores
ou insultos. De qualquer sorte, ter-lhe-emos os braços sempre abertos, como
filhos de Deus que são, como nossos irmãos e companheiros de jornada, que nos
estão sempre ajudando em nosso aperfeiçoamento, mais ainda quando nos
perseguem, do que quando nos aplaudem.
Ainda nisso temos o exemplo dos
grandes homens a nos guiar. Ruy Barbosa disse que os inimigos sempre lhe foram
mais úteis do que os amigos e só àqueles devia seus melhores triunfos; logo,
ele abençoava os inimigos. Sócrates agradeceu aos juízes que o condenaram à
morte porque sabia que a morte é coisa muito boa.
Zamenhof lamentava quando um crítico o elogiava, dizendo que muito mais
proveitoso seria indicar-lhe os defeitos a corrigir, do que lhe dar a ilusão de
perfeição inexistente.
Bem vindos sejam, pois, os inimigos
da obra que estamos penosa e tropegamente realizando. Suas setas, por mais
venenosas que sejam, unicamente poderão ferir as nossas misérias e por abaixo
os nossos erros, nunca a parte boa da obra, porque essa não é e não pode ser
demolida por nossos semelhantes.
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