Contradição
Irremovível
Redação
Reformador (FEB) Março 1973
Simeão, o homem justo e temente a
Deus, ao ver o menino que fora levado ao templo, tomou-o nos braços e desferiu
a advertência profética:
“Este menino vem para ser alvo da
contradição dos homens”... Assim foi. O Mestre, no desempenho de sua missão,
não fez senão criar situações que provocaram as mais desencontradas opiniões. O
que ele dizia chocava, e o que fazia escandalizava. Os judeus não poderiam compreender
uma criatura que se dizia portadora da salvação e que mandava pagar o tributo
ao invasor. Não fazia sentido a afirmativa daquele paranoico que investia
contra a tradição mais intocável, ao obrar milagres no “dia consagrado ao
Senhor” e dizer sandices como a de que o sábado é que foi feito para o homem
...
Os próprios companheiros de missão
apostolar não possuíam condições para entendê-lo integralmente. Ao deixar
perceber que aconteceriam coisas que contrariavam frontalmente todas as
expectativas humanas, a reação foi tão desabrida que Jesus se viu na
contingência de repreender a Pedro: “Afasta-te
de mim, Satanás!” As palavras do Messias criaram um clima de tal
inconformação que a debandada foi quase geral, a ponto de levá-lo a indagar dos
próprios companheiros por ele escolhidos: “E vós, não quereis também
retirar-vos?” O Cristo falava das coisas da Vida Eterna, enquanto os homens não
tinham ouvidos senão para as coisas da terra. E, mesmo quando falava destas,
não era compreendido: “Se não me credes quando vos falo das coisas terrenas,
como me crereis quando vos fale das coisas celestiais?”
Dobaram os séculos. Quase 1.900 anos
após, surge no mundo o Consolador que viria restaurar as coisas e dar sanção
complementar às lições do Cristo. No desempenho dessa missão, ele também teria
de chocar as criaturas com o que diz, escandaliza-as com o que propõe. Não
poderia fugir ao mesmo vaticínio: “Esta obra veio para ser alvo da contradição
dos homens”. E assim tem sido. O mundo, ou ignora o Espiritismo, ou crê que ele
veio (e não teria outra finalidade) tão somente para resolver os problemas da
vida transitória. Até mesmo os espíritas se tem deixado contagiar por essa ideia.
Por toda parte, se denota o afã de torná-lo instrumento de relevo no mundo. Parece
que os espíritas se estão deixando dominar pelo “gosto das coisas terrenas”, e
se desdobram em esforços, consciente ou inconscientemente, no sentido de
acomodarem os interesses exteriores e imediatos com os supremos fins do
espírito imortal. Mostram-se excessivamente preocupados com a posição do
Espiritismo no cenário do mundo, fazendo questão, por exemplo, de que ele
esteja presente nas solenidades de grande estilo programadas pelas autoridades
e instituições de projeção social.
Reivindicam, para ele, o estatuto de
igualdade com as chamadas “religiões oficiais”, ou com aquelas ditas “dominantes”,
ao feitio das exterioridades mundanas. Esquecem-se, simplesmente, de que ele
não tem “representantes”... Outros julgam que a Doutrina Espírita só se firmará
e afirmará no dia em que conseguir arrebanhar as criaturas aos magotes, a modo
de “rolo compressor”, como se o problema se restringisse a simples contatos
epidérmicos. Preocupam-se muito com suas expressões estatísticas e, por isso,
redobram esforços para que o Espiritismo “cresça e apareça”. E, então, adotam,
enfaticamente, os mais variados recursos da tecnologia moderna, para aumentar o
número de prosélitos. Querem a “produção em massa”...
A Doutrina, em sua essência, porém,
vive muito distante desses ruídos. Ela aí está para restaurar a singeleza e a
pureza dos ensinamentos evangélicos, e, para evitar qualquer reincidência nas
ilusões do mundo, assumiu a legenda: “Fora
da Caridade não há salvação”. E, a fim de evitar enganos, nada melhor que
recordar o conceito de Paulo sobre a caridade. ... O Espiritismo, na verdade,
ainda é alvo da contradição dos próprios espíritas. Chegará um momento, parece,
em que ele terá de indagar dos seus profitentes: “E vós, não quereis também retirar-vos?”
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