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terça-feira, 31 de janeiro de 2012

01 / 03 A Escolha das Provações


01/03
  A Escolha das
 Provações
A Escolha das provações segundo os Fatos e a Lição dos Espíritos

por Almerindo Martins de Castro


inReformador’ (FEB) Abril-Maio- Junho 1970


            No tempo em que os livros escolares destinados à infância eram cheios de bons ensinamentos e conselhos instrutivos, li uma lição onde se contava que experiente e velha mosca, necessitando ausentar-se de casa, chamou a filhinha, ingênua e tenra, e assim lhe falou: “Minha filha, até que eu volte, não te afastes daqui; poderias correr graves perigos, sem que tivesses quem te acudisse. Sê obediente a esta ordem, minha filha, porque os conselhos das mães nos poupam de muitos sofrimentos e fatais enganos.

            Mas, tão logo a precavida mosca se ausentou, a mosquinha começou a rir-se, dizendo: “Meu Deus, quão rabugentas são as velhas e quanto gostam as mães de privar os filhos dos divertimentos e passeios! Ora, perigos! Então eu não sei voar? Sou alguma tola, que se deixa colher por qualquer?”

            E começou a voar. Como era esplêndido! Quantas coisas novas e belas!

            E foi voando, e foi voando, até chegar a um grande pátio, onde julgou ver linda nuvem, muito branca, movendo-se para o alto e sumindo-se em seguida. E pensou: Oh! uma nuvem, e eu que tinha tanta vontade de vê-Ias! E a rabugenta da mamãe, enganando-me, a dizer que as nuvens estão no céu e as moscas não podem subir tão alto para contemplá-Ias melhor! ...  Ah! velhas rabugentas! ...

            E voou mais rápido, para chegar depressa. Mas, não era nuvem, ou, antes, era uma nuvem de vapor, desprendendo-se de um tacho com água a ferver. E a mosquinha, que não conhecia o perigo e dele não aprendera ainda a defender-se, viu-se envolvida pelo vapor fervente, sufocada e desaparecida na voragem da morte.

            No derradeiro instante, reconhecendo o erro, seu pensamento correu célere em busca da mãe querida, à qual quisera então dizer: Oh! minha mãezinha, perdoa à tua ingrata e louca filha a dor que te causa. Insensata, porque não ouvi, porque desprezei os teus conselhos, mãe?

            Assim são aqueles que fecham os ouvidos aos ensinamentos do Evangelho. À semelhança do carinho materno, a Doutrina Espírita mostra aos orgulhosos e inexperientes entes humanos os perigos da existência que não se norteia pelo espírito e verdade das leis de Deus, apontando o da nuvem traiçoeira e mortífera, vapor que sufoca e queima e mata; apresentado os fatos espíritas de todos os dias, aos olhos da Humanidade inteira; indicando que é tempo de tomarmos os novos rumos que nos são traçados pelos Espíritos amigos, e de fugirmos aos inevitáveis sofrimentos que aguardam os incautos gozadores, insensíveis à palavra e às lições que nos vêm do Alto.

            Mas, à semelhança da vaidosa moscazinha, nós nos rimos ou duvidamos da verdade dos conselhos salvadores e, supondo-nos abarrotados de poderes que não temos, vamos voando cegamente ao encontro da morte. Somente depois que o Espírito se desprende da carne, a nossa visão se aclara e se volta, cheia de pena e remorso, para as verdadeiras realidades da vida espiritual, e para aqui nos volvemos suplicando por uma prece que nos atenue os sofrimentos no Espaço e nos permita obter mais rapidamente o resgate das nossas culpas.

            Cegos, três vezes cegos, que não nos convencemos, apesar das lições de todos os dias, de quanto é caro o preço pelo qual compramos os prazeres efêmeros da vaidade, do orgulho, da inveja, das vinganças, das iras castigadoras, da indiferença pelos males e agruras do nosso próximo, desse próximo que o Cristo mandou amássemos com o socorro da nossa caridade, do nosso pão, da nossa palavra amiga.

            Foi também num desses livros para a infância, que hoje não se escrevem mais, em nossa triste época, que li uma filosófica comparação de Benjamim Franklin.

            Tinha o grande homem menos de dois lustros de idade quando, transitando pela rua, encontrou certo rapaz soprando num assobio. Encantado com aquele insignificante canudinho que produzia sons, aos seus ouvidos - inexcedíveis em beleza e harmonia - ele, que nunca tivera um assobio, ficou maravilhado e desejoso de possuir o mirífico instrumento. Correu a casa e, pegando em todo o dinheiro que possuía, dádiva dos pais e padrinhos, comprou ao anônimo o assobio, voltando radiante, mais contente decerto do que o rapazinho que recebera talvez o víntuplo do valor do tal canudinho sonoro.

            Porém, que desilusão, quando mostrou e disse aos pais a compra que realizara! Fizeram-no compreender o absurdo exagero do preço e quantos outros lindos brinquedos, flautinhas e assobios podia ter adquirido com o dinheiro que entregara afoitamente! ...

            Daí em diante, por toda a sua vida de homem, sempre que encontrava uma vítima das enganosas aparências do mundo, um vencido pelos esbanjamentos, pelos vícios, pelas imprudências, pelas falsas galas que duram pouco e tanto custam - nada valendo, Benjamim Franklin dizia a si próprio, lembrando a inesquecível lição que recebera: Pobre irmão, pagaste bem caro o teu assobio!

            Assim somos, quando vamos descuidados pelos caminhos da vida.

            O primeiro prazer falaz, tosco e insignificante assobio, nos empolga e delícia e por ele entregamos todos os dinheiros, todos os tesouros recebidos de nossos pais, dos mestres, dos Guias. E só depois que a nossa desiludida sofreguidão compreende quantas coisas belas trocamos por uma que não valia nada, é que nos voltamos, chorosos e arrependidos, pedindo o remédio, às vezes impossível de encontrar, porque há coisas que, perdidas uma vez, não se podem readquirir nesta vida.

            À flor emurchecida podemos restituir o perfume artificial das essências fabricadas nos laboratórios; mas, o viço, a fragrância, a frescura da pétala, a aveludada cútis que a seiva do tronco empresta à flor, isso não se restitui, porque a vida em tudo vem de Deus e a Deus pertence dar, ou suprimir ...

            Talvez porque o Espiritismo não se propõe a fazer desses milagres, é que muita gente não o aceita. Exigem, por exemplo, que transforme - num dia - o bandido em santo, ou então querem maravilhas, pompas, palavras tétricas, castigos horríveis, poços de enxofre fervente, cadáveres que não se decomponham e a cujo contato desapareçam mazelas e feridas, loucuras e paralisias, verrugas e capenguices.

            O Espiritismo não faz milagres. A sua doutrina é o Evangelho, em espírito e verdade. Ser espírita é cumprir os dez mandamentos da lei de Deus; é seguir o Cristo pelos caminhos que traçou com as palavras do sermão da montanha; é ser humilde e bom, mansueto e caritativo, resignado na fé e ardoroso no trabalho, sincero, leal, amigo da família, tolerante com os erros alheios, meigo na palavra, honesto nas ações.

            Ser espírita é abominar os vícios e amar as virtudes.

            Sem condenar as crenças de ninguém, o Espiritismo afirma e quer demonstrar que o único caminho para Deus é o Evangelho. Fora do Evangelho, não há verdade, não há salvação.

            Na terra, não há deuses que salvem, não há santos, não há milagres.

            Deus é um só e está nas Alturas; santos são aqueles que cumprem a lei do Senhor; milagres são as manifestações dos Espíritos, revelando-nos a outra vida ao termo da qual está a luz inextinguível, iluminando as derradeiras moradas do Pai.              

            Aí estão as comunicações dos Espíritos. Eles nos dizem que, chegando ao Espaço e descortinando a verdade, medindo toda a extensão dos erros cometidos, o Espírito volta para resgatar - por vontade própria - os seus crimes e sofrer a depuração dos maus fluidos que lhe escurecem a alva pureza de que necessita, para remigiar mais alto e fruir as delícias dos outros mundos, onde se é mais perfeito, mais esclarecido e se está, por assim dizer, junto de Deus.

            Os que ainda não começaram esse trabalho de aperfeiçoamento, ou que ainda se acham mergulhados nas trevas da perturbação que se segue à desencarnação, quando o Espírito se liberta do corpo material - esses aqui vêm mostrar-nos, chorando ou blasfemando, a realidade da sobrevivência da alma, tranquila ou sofredora, conforme viveu, bem ou mal, dentro ou fora das leis divinas.

            Essa a principal razão dos fatos espíritas.

            As manifestações dos Espíritos não são espetáculos de proscênio, para que nos regalemos com acontecimentos sensacionais; não são exibições de prestidigitação, para provocar aplausos. São avisos para que cuidemos da nossa alma e nos façamos dignos das bênçãos de Deus, porque Deus nos deixa a escolha dos caminhos para chegarmos até Ele. Se os erramos, teremos de reconhecer o engano, ao chegarmos ao fim da enganosa estrada, e de recomeçar a viagem, sofrendo as fadigas do percurso, até trilharmos o chão bendito.

            Esta a verdade. Veja quem puder; acredite quem quiser.

            O Espiritismo diz apenas: Homem que vives engolfado nas coisas materiais, sem reparar que tens uma alma imortal, lembra-te de que és o operário da tua ventura ou da tua desgraça. Lembra-te de que, se fazes o mal a outrem, sofrerás na Terra a consequência desse mal: atenta, pois, em que, se encheres à tua consciência - que é o arquivo do Espírito - de iniquidades, sofrerás na outra vida as consequências dessas iniquidades.

            Porque duvidar? Porque tomar como fábulas, alucinações, truques, mentiras, os fatos abundantes, comprovados hoje até pelas placas das máquinas fotográficas?

            O Espiritismo não tem a prova material de alguns casos, é certo; mas, possui a palavra dos Espíritos, concordantes com as leis esboçadas em todos os ensinamentos dados posteriormente à vinda de Jesus-Cristo.

            Porque duvidar, por exemplo, de que Maria Antonieta, a rainha esposa de Luís XVI, de França, seja uma reencarnação de Salomé, a quem Herodes presenteou a cabeça decepada de João Batista?

            Quando a guilhotina da Revolução Francesa cortou a vida da rainha, não se estava cumprindo a lei de “quem com ferro fere, com ferro será ferido”?

            Não é perfeitamente lógico que a provação escolhida corresponde ao sofrimento humilhante, que é rolar de um trono para a ignomínia do cadafalso?

            E porque duvidar também de que essa mesma culpada, Maria Antonieta, é a meiga senhorita Smith, que o Dr. Flournoy, professor da Universidade de Genebra, estudou num livro e que a Sociedade Espírita Suíça aceita como sendo essa reencarnação?

            Não está de acordo com a lição dos Espíritos que as orgulhosas rainhas e princesas podem voltar à Terra, a fim de serem um dia burguesinhas encantadoras e amoráveis, para enlevo dos pais e consolo dos aflitos, a quem fizeram sofrer, e mais tarde socorrem com verdadeira e evangélica piedade?

            Não temos a lição, aqui mesmo, no Brasil, em Belém do Pará, da grande, da extraordinária médium Ana Prado, que morreu queimada, reencarnação de famoso inquisidor, que veio expiar corajosamente, abnegadamente sofrer esse terrível gênero de morte, que outrora fizera experimentar aos infelizes que, com o estigma de hereges, caíram nas garras do Tribunal da Santa Inquisição?

            Quem não sabe e não recorda o conhecido caso do menino indiano, de azulados olhos e loiro cabelo, totalmente diferente dos pais morenos, que, aos quatro anos de idade, disse ser a reencarnação do major inglês D. J. Welsh, que perecera afogado em março de 1904 e cuja vida anterior e moradia descreveu, apesar de nunca ter visto o local onde existira e morrera aquele oficial, na reencarnação precedente?

            Os fatos são muitos, tantos que se tornaram banais, tão banais que os homens já se acostumaram e não os aproveitam nos profundos e admiráveis ensinos que encerram.

            Hoje, vemos criaturas extraordinárias, que nos merecem apenas uma complacente homenagem. Se tivessem vivido assim em outras épocas, seriam outros tantos santinhos, de que vou falar, iguais aos que certas ingênuas pessoas adoram, às vezes sem saber mesmo quem foi em vida aquele homem ou aquela mulher, impingidos como ouro de fino quilate nas virtudes e no progresso espiritual. Muitas vezes, vencidos pela bondade e abnegação de alguém, dizemos: “Aquela criatura é uma santa!” Profunda verdade, que não sabemos aproveitar, seguindo o exemplo de tal criatura, superior, não raro, a muito santo de 4ª ordem, diante do qual nos vamos ajoelhar ...

            Porque é preciso não esquecer que todos temos conhecido, em nosso trato quotidiano, algumas figuras humanas que nunca possuíram um vício, sempre praticaram a caridade, sofreram resignadas, tiveram e seguiram a verdadeira fé, foram, em suma, legítimas santas, e não mereceram senão meia dúzia de palavras de elogio, enquanto o esquecimento não veio apagar a sua da nossa memória. Outras, cujo verdadeiro nome nem ao certo sabemos qual foi, vivem diante dos nossos olhos, cheias de mimos, velas e rezinhas, quando, em verdade, feita uma justa comparação, rigorosa, não merecem a centésima parte de um pequeníssimo encômio, pois convém não esquecer que muitos dos chamados santos que estão nos altares das igrejas, antes de principiarem a esmurrar os peitos contritos e a derreter as banhas fartas, foram feiticeiros, bêbedos, jogadores, assassinos e ladrões. Há, em verdade, entre os chamados santos, muitas e luminosas figuras projetando luz para o futuro, mostrando, em toda a plenitude, a verdade da lei da reencarnação e o valor das provações, quando o Espírito é bem assistido e não fracassa na luta do corpo material, reagindo contra os terríveis padeceres que o EU espiritual escolheu para seu progresso, para sua evolução.

            Existiram essas figuras luminosas; mas não foram santas.

            O Espiritismo as explica na simplicidade das provações, dentro da lei da reencarnação, do progresso espiritual.

            Só assim podem ser compreendidas essas personagens. De outro modo, pareceriam loucos, pois sofrer, por livre e espontâneo alvedrio, sem uma causa, sem um motivo, sem uma razão, seria admitir que as provações terrenas são quase um esporte para alguns que as querem passar, bastando, para outros que não estejam dispostos a tomar tanto trabalho, agarrar-se a uma religião e comprar através dela a salvação, com rezas de encomenda, cerimônias, etc. Além disso, só a vontade deliberada, trazida do Alto, pode explicar a fortaleza de ânimo para suportar os rudes golpes de certas amarguras, pois não há dentro da contingência humana poder de vontade que nos faça sofrer - por simples engano - sem uma razão espiritual, certas injustiças e agruras morais terríveis, que poderíamos evitar, pronunciando apenas o nome do verdadeiro culpado, ou dizendo quem somos.

            Porque então sofrem certas criaturas os maiores tormentos, resignadas, sem uma queixa, quase alegres e felizes, dando graças ao Senhor por tantos martírios e tantas desventuras?
           
            É que aquela foi a provação escolhida. E quando a criatura se faz digna da ajuda de um bom Guia, não lhe faltam forças para vencer; se assim não for, fracassará, como se vê, a cada passo, em todos os aspectos da vida.

            Eis alguns exemplos tirados dos livros da Igreja católica apostólica romana, referentes a criaturas chamadas santas.

            Que as pessoas de boa fé examinem a interpretação que lhes dá o Espiritismo e vejam, à luz de um raciocínio desapaixonado, sincero, como devem ser encarados os fatos, as causas, as consequências. Me ditem e vejam se foram santos ou Espíritos em provação.

            Santa Rosa de Lima, assim chamada por ser peruana, isto é, nascida em Lima, capital da República do Peru, veio ao mundo em 1586, tendo por pai Gaspar Flores. Seu nome de batismo foi Isabel; porém, devido ao encantador aspecto das faces, lembrando rosas, Rosa passou a ser chamada.

            Desde muito cedo, revelou a jovem o feitio do seu Espírito, voltado para as coisas de Deus, alheia às vaidades e aos aspectos fúteis da existência.

            À proporção que aumentava a sua peregrina beleza, mais lhe cresciam também a aversão às mundanices e o desejo de destruir em si própria os motivos de fracassar nas provações que escolhera. Assim, toda vez que necessitava sair à rua, esfregava o rosto com as folhas da pimenteira e não raro com a mesma pimenta, de modo que a intumescência corrosiva lhe desfigurasse a formosura. Era simples, piedosa e boa, sofrendo resignada maus tratos dos pais, que desejavam casá-Ia à viva força.

            Não havendo, naquela época, para onde voltar-se espiritualmente, dentro em breve foi encerrar-se no convento de São Domingos, em 1606, com bastante mágoa de seus pais, que, tendo ficado pobres, viam na beleza da filha o seu tesouro e sempre sonharam vê-Ia casada, rica e feliz, naquele lar onde mesmo solteira prestava valioso auxílio, cultivando a terra e cosendo, para ajudá-los.

            Mas a futura Santa Rosa assim não entendeu, principalmente porque Espíritos atrasados, talvez inimigos e vítimas dela em outras encarnações, a perseguiam tenazmente, fazendo-a sustentar lutas terríveis para não fracassar, principalmente quando os pais a castigavam por motivo de recusa ao casamento.

            Ingressando na vida estéril do convento, Rosa pouco ou quase nada pôde fazer em favor do próximo; mas, expiou bem duramente as culpas de outras vidas, pois o rigor dos sofrimentos que se impunha era de tal ordem, que misturava fel na comida.

            Aos trinta anos de idade, voltou ao Espaço.

            Quem teria sido, anteriormente, Isabel Flores, a Santa Rosa de Lima? Alguma jovem doidivana, causadora de males e crimes? Uma daquelas malvadas abadessas que mandavam envenenar ou esconder nos cárceres dos conventos as freiras que lhes faziam inveja, ou recusavam sujeitar-se aos agrados dos confessores privilegiados?

            Não sabemos dizê-Io . Que Deus a tenha conduzido já para a verdadeira mansão de onde nos possa auxiliar para nossa instrução e aperfeiçoamento. E; se ainda não terminou o resgate da dívida, que Deus a ajude a satisfazer a lei inexorável. Porque a lei é essa. Disse o Cristo que da prisão não sairíamos sem haver pago até o último ceitil (Mat. V, 26).

            Corremos muitas vezes o risco de ficar devendo milhares de ceitis, porque Espíritos atrasados e cegos (quiçá inimigos adquiridos em outras encarnações) tentam perturbar-nos, ou se aproveitam das oportunidades para nos causar males e retardar o nosso progresso espiritual.

            Na vida de Santo Antonino, arcebispo italiano, nascido em 1389, fundador da ”Congregação dos Homens Bons”, que parece ainda existir em Florença, há um caso típico.

            Antonino era médium vidente e audiente. Certa vez, quando ia para a sua catedral, em dia de festa solene, enxergou, sobre o teto de uma pequena casinha da rua de Santo Ambrósio, vários Espíritos de Luz. Diante de tão estranho contraste, entrou para ver quem vivia ali, capaz de atrair tais Espíritos. Deparou com uma pobre viúva, rodeada por três filhas, mal vestidas, descalças, que trabalhavam por necessidade, para fora, até nos dias de festa. Mais admirado ficou, verificando que mãe e filhas eram virtuosas, cheias de verdadeira fé, resignadas, quase contentes com a vida que tinham. Por isso, depois de exortá-Ias a prosseguirem no bom caminho que trilhavam, auxiliou-as com bastante dinheiro, a fim de que não mais sofressem tão duras necessidades.

            Porém, qual não foi o espanto de Santo Antonino quando, ao passar, tempos depois, pela casinha da viúva, divisou, não mais os Espíritos de Luz da visão anterior, mas Espíritos da Treva, verdadeiros obsessores. Penetrou no predíozinho. A transformação era completa. As jovens, outrora esfarrapadas e descalças, estavam garridamente cobertas de enfeites e falavam, não mais a linguagem humilde e harmoniosa da fé, mas a dos louvores aos divertimentos e folganças.

            Ante a perplexidade de Antonino, o seu Guia lhe deu a intuição de que não devemos SUPRIMIR as provações de ninguém, e sim apenas atenuá-Ias, tornando-as mais suaves, e ajudar as criaturas a vencê-Ias. Mas, Antonino, sem compreender toda a extensão da lei que rege as vidas sucessivas, ficou perplexo ainda, buscando atingir a incógnita daquele complexo problema.

            Servindo-se da sua faculdade de médium audiente, rogou ao Espírito protetor que lhe ensinasse a melhor perceber a lição recebida. E o Guia lhe revelou que, no caminho do aperfeiçoamento, vários são os meios de atingi-lo. Fê-lo saber que, ali mesmo, naquela cidade, havia um humilde operário ao qual estava reservada tanta glória no Espaço, quanto a ele, arcebispo, que procurava, por outros processos, servir também a Deus.

            E Santo Antonino procurou conhecer o operário.

            Era um remendão, alfaiate de escassos recursos, pois, inábil na sua arte, não auferia dela senão parcos proventos. Mesmo assim, reservava para si apenas o estritamente indispensável à alimentação e à vestimenta, que era sempre dos mais grosseiros tecidos e do mais módico preço. O resto distribuía-o em esmolas com os mais pobres. Quando não tinha trabalho, ia para um modesto hospital chamado de S. Paulo, ajudar, gratuitamente, no cuidado aos doentes. E mais ainda. Tinha em seu paupérrimo abrigo um leproso, a quem tratava com evangélica paciência, e bem evangélica, porque o lázaro, falhando na provação escolhida, era um revoltado contra a doença, e injuriava com impropérios o seu caridoso amigo e enfermeiro.

            Admirável lição esta, que nos integra nas verdades do Evangelho: os humildes serão os exaltados.

            João Batista nasceu no conforto do lar de um grande sacerdote, e foi apenas um precursor; Jesus tomou corpo deitado nas palhas de uma tosca manjedoura e era o Enviado de Deus!

            Bem haja o sofredor resignado, que sorri na dor, na desventura, cheio de força e de luzes espirituais, que lhe mostram as realidades das provações nas vidas sucessivas e o futuro que o aguarda; ditoso aquele que antes de suplicar o pão, que lhe mitigue a fome da carne, sabe esperar a paz da Alma, orando para que lhe venham as bênçãos, os auxílios, os fluidos benéficos dos nossos Guias do Espaço.

            Quem fora o obscuro alfaiate, que um Espírito-Guia declarou maior do que o arcebispo?

            Não se pode responder. Sabe-se apenas que do alfaiate nem o nome a História registou, enquanto que do arcebispo se fez um - santo - para os altares da Igreja de Roma.

            Estranho e curioso contraste, que vemos ainda, em nossos tempos!

            Os médiuns, quando pertencem à Igreja, são santos; quando professam o Espiritismo, são loucos, visionários, ou possuídos de Satanás ...

            Para Teresinha de Jesus, a freira, cânticos e louvores, altares e incenso, para Ana Prado, a médium, risotas e insultos, a sepultura e o esquecimento! ...

 Continua





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