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terça-feira, 3 de janeiro de 2012

01 'Doutrina e Prática do Espiritismo'


PRELIMINAR

            Este livro, que representa o fruto de dezenove anos de aprendizado espírita, pretende ser também uma particularizada afirmação de fé.

            Momentaneamente eclipsado pelas audaciosas negações do materialismo científico, reassume em nossos dias o Espiritualismo, sob várias modalidades, o prestigio que havia perdido nas inteligências, constituindo salutar e oportuna reação contra os desmoralizadores efeitos daquela aberração negativista. É' como um polo magnético, de irresistível atração para quantos, ansiosos de ideal, se não resignam a cerrar obstinadamente o entendimento à ilimitada pesquisa da Verdade.

            Entre as modalidades atuais do Espiritismo nenhuma, todavia, em nossa opinião, reúne mais satisfatórios requisitos, não apenas como especulação filosófica, mas para realizar a obra de regeneração moral e de reorganização social, que se elabora para o mundo, que o Espiritismo.
  
            Contemporâneo, por assim dizer, de todas as idades por sua fenomenologia, há pouco mais de meio século é que ele surgiu no domínio do pensamento como doutrina sistematizada. E desde então, graças à experimentalidade objetiva de suas demonstrações e à índole racionalista de seus  ensinamentos, a que as eternas e consoladoras verdades do Evangelho servem de magnífico remate, não cessou de, por toda parte, aliciar prosélitos, ao mesmo tempo que já apresenta os contornos de uma vasta organização associativa .

            Mas o Espiritismo, quer no ponto de vista doutrinário, quer no da aplicação de seus métodos de iniciação, como de sua ação social e pratica - aspectos que necessariamente se integram como desdobramentos de uma ideia fundamental - só preencherá os fins que lhe estão superiormente assinalados, sob a condição de não permanecer- estacionado.  Livre racionalista e evolutivo por natureza, "tendo dito a primeira palavra, mas não pretendendo jamais dizer a última", no lapidar conceito, daquele que foi o seu clarividente codificador, o primeiro, imprescritível dever dos que o professam é estudar.

            Com esta expressão não pretendemos designar unicamente a leitura das obras, consideradas propriamente clássicas, fundamentais do Espiritismo e, para os seus vulgarizadores, a repetição mais ou menos desenvolvida ou literal das sínteses doutrinárias que ali se acham enfeixadas. Falamos da meditação, pelo sentido íntimo, das transcendentes verdades codificadas por Allan Kardec. Mais ainda: no paralelismo, que se pode num bom e verdadeiro sentido denominar concorrência vital, em que com o Espiritismo se vêm apresentando as outras doutrinas espiritualistas , a que acabamos de nos referir, entendemos que os espíritas, se querem conservar, sempre mais opulento; o precioso depósito que lhes é confiado, como um perpétuo convite às inteligências mais esclarecidas e exigentes, não podem se desinteressar do exame das demais doutrinas, sendo por isso uma das medidas aconselháveis aos círculos de iniciação e propaganda a adoção do estudo comparativo das religiões. 

            Tanto quanto nos tem sido possível ajuizar da observação dos fatos, o Espiritismo se encontra presentemente numa situação comparável à do Cristianismo em contato com a escola filosófica de Alexandria, de que resultou aquele magnífico florescimento da teologia cristã dos primeiros séculos, a breve trecho, contudo, mutilada em suas mais adiantadas  afirmações pela intolerância exclusivista dos posteriores depositários do divino legado.

            Sem duvida o Espiritismo tem na própria incessante revelação dos espíritos um veículo de perpétuo rejuvenescimento e evolução. Mas, sem desprezar essa preciosa fonte, peculiar a sua mesma índole, há toda vantagem, para ele, no que se refere a sua conservação e desenvolvimento, não somente em incorporar ao seu patrimônio as novas descobertas que, pelo futuro adiante, lhe tragam as pesquisas da ciência, como em assinalar das doutrinas espiritualistas, que ao seu lado começam a vicejar, os princípios e ensinamentos que um estudo aprofundado e oportunas comprovações demonstrem verdadeiros. E tão convencido estamos dessa necessidade que, sem pretender arvorarmos em profeta, ousamos, todavia, formular esta alternativa: ou os espíritas estudiosos, principalmente aqueles que têm assumido os encargos de propaganda e direção, entram nessa via larga de um prudente e judicioso ecletismo, velando por que se não imobilize a doutrina, sobrepujada por outras que se lhe pretendem avantajar no descortino filosófico, e nesse caso lhe hão de  assegurar uma irradiação cada vez mais ampla nas inteligências, oferecendo-Ihes o máximo que poderiam aspirar na esfera do conhecimento; ou, enclausurando-se num infecundo exclusivismo, arriscam-se a ver desertar de suas fileiras apreciáveis elementos de colaboração, com que necessita contar o Espiritismo para o aperfeiçoamento de seus métodos, sob pena de ser abandonado ao puro domínio do empirismo e da superstição.

            Porque, na concorrência vital, a que aludimos, há de forçosamente prevalecer a lei de economia biológica, expressa no fenômeno da sobrevivência dos mais aptos. Assimilar, ou ser assimilado e desaparecer - é o dilema irrefragável .

            Ora, uma das características do nosso tempo, aspiração que ao demais lateja no íntimo de quantos buscam servir o magno ideal da paz e da fraternidade universal, é a tendência para a unificação. E seria deplorável que uma doutrina como a espírita, que, pela amplitude e tolerância de suas afirmações, como por seu cunho universalista, apresenta excelsas condições para essa obra de unificação no terreno religioso, viesse a falir, por Inadvertência de seus depositários, à missão que tais eminentes caracteres Ihe assignam.

            Livre, com efeito, de tradições obsoletas, avesso a todo formalismo, não hostilizando nenhuma crença, a todas não obstante se propõe trazer um elemento de espiritualização, isto é, de adiantamento e de progresso, concorrendo para emancipar os homens das obscurecedoras limitações de toda exterioridade ou esoterismo e oferecendo-lhes em troca as provas, documentalmente objetivas, da sobrevivência, com todo o seu cortejo de ensinamentos e consolações.

            Esse domínio experimental, entretanto, não é isento de obscuridades e perigos, constituindo mesmo o que Allan Kardec, fundado na observação e experiência adquirida, considerava o escolho do Espiritismo. Para os neutralizar, só um caminho se oferece aos pesquisadores conscienciosos: o aperfeiçoamento dos  métodos de investigação, duplicado da observância de regras iniciáticas, tendentes a elevar e esclarecer a moral dos praticantes.

            Uma permanência de quatorze anos consecutivos na presidência da Federação Espírita Brasileira  nos permitiu, de um lado, adquirir alguns conhecimentos nesse domínio, graças principalmente à iluminadora assistência do Alto, que nunca cessou de nos favorecer, e do outro aquilatar, com aproximada justeza pelo menos, quais os moldes mais convenientes. a adotar, no que se refere ao programa e organização das associações espíritas .

            Abordando, por isso, na primeira parte deste livro uma síntese doutrinária, com os desenvolvimentos pela nossa incapacidade permitidos, mas procurando fazer obra de propaganda, isto é, traçando um plano expositivo em que da apreciação dos fatos mais elementares procuramos sucessivamente remontar aos mais complexos problemas, com eles nos esforçando por familiarizar a mente dos não iniciados na doutrina, foi sobretudo na segunda parte, relativa à prática do Espiritismo, que buscamos por a modesta experiência, ali adquirida, ao serviço dos adeptos.

            Escritos nos anos mais tormentosos talvez de nossa vida, em meio de embaraços e sofrimentos de múltipla natureza, ressente-se de inevitáveis imperfeições, porventura graves, que sirva aquela circunstancia para atenuar. Tal como, todavia, o entregamos à publicidade, ao mesmo tempo que um convite ao estudo - subsidio que representa em tal sentido - é o testemunho de um duplo e altruístico desejo: ser útil aos nossos semelhantes e servir à Causa, a que devemos a maior fortuna que poderíamos, no mundo, ambicionar.







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