Contra a
religião romana
– Em prol do Espiritismo
por Fernando de Alencar Reformador (FEB) Agosto
1908
Uma das mais
clamorosas injustiças que me revoltam o ânimo, aliás atreito ao perdão - incontestavelmente uma das mais
sublimes manifestações da Caridade – é, por sem dúvida a guerra desenfreada que
ao Espiritismo – essa ressurreição da primitiva religião cristã – move o caduco
e trôpego Papismo, que, não mais podendo entenebrecer com a sinistra nuvem de
suas roupetas a consciência do Mundo, faz explodir, contra os adversários, em
injúrias, desacatos e calúnias, o seu furor já hoje felizmente de todo inócuo, fornecendo
destarte à humanidade a prova mais inconcussa e peremptória de que o seu credo,
bem longe de ser inspirado nos puros ditames que se desfolharam dos fragrantes
lábios do formoso Nazareno, é a antítese perfeita do Cristianismo.
E nem há mister de aturado exame para chegar a tal
conclusão.
Porque todo esse ódio contra o Espiritismo, cuja moral é
a mesma de Jesus?
Porque semelhante aversão a um credo que preconiza o
amor, o perdão, o auxílio mútuo entre todos os homens, sem distinção de raça e
de crenças?
Porque esse rancor, essa insaciável sede de vingança contra
uma doutrina toda de paz, de concórdia, de amor e caridade?
Pois não é certo que a caridade é a suprema lei moral? Não
é verdade que ela, no conceito de Paulo, é mesmo superior às suas duas irmãs – Fé
e Esperança?
Não é intuitivo que somente fora da caridade é que não
pode haver salvação?
E o que fazeis quotidianamente, senhores ministros do romanismo, vós que, em atitude de
combate contra o verdadeiro Cristianismo, vos enfileirais como lúgubre
regimento, em cuja bandeira negra como as sotainas que envergais, se lê em
caracteres rubros como o sangue a inscrição tão audaciosa e presumida quão inverossímil
e paradoxal: Fora de meu seio não há salvação?
Se Jesus foi o exemplo vivo e palpitante da cordura e
mansidão, porque vós, que vos alardeais seus discípulos, não poupais as mais veementes
censuras, as mais furiosas imprecações contra todos aqueles que procuram erguer
um óbice, uma forte muralha à invasão dos vossos irracionais ensinamentos, das
ameaças de suplícios fantásticos com que assolais os vergéis das almas, onde pompeiam
as variegadas e fragrantes flores da esperança e do amor?
O que colimais, ainda hodiernamente, com a difusão do
extravagante e irracional ensino de um deus vingativo e terrível, da criação assombrosamente
medonha de um pai sem compaixão e sem amor, condenando cruelmente os seus pobres
filhos a inimagináveis castigos eternos? Pois ao invés de um verdadeiro pai,
não é certamente esse vosso Deus um lídimo filicida?
Não, absolutamente não acredito que atilados, como geralmente
sois, tenhais uma tão monstruosa concepção da Infinita Misericórdia, do Infinito
Amor, da Infinita Bondade que é esse Deus, para cuja revelação, dos abismos de
luz em que flutua, baixou ao nosso miserável planeta o divino Missionário, cuja
passagem na Terra foi como um sulco de luz em meio à noite cerrada e profunda
da ignorância e miséria humanas!
Não, no estudo relativo do adiantamento mundial, não mais
podeis crer, nem tão pouco fazer crer, na existência do Deus terrível que
apareceu a Moisés entre relâmpagos e trovões aterrorizadores!
Não: haveis de convir que o Deus de bondade e amor a quem
Jesus implorou, no suplício da cruz, o perdão para seus nefandos inimigos, é
que é o verdadeiro Deus, cheio de complacência e magnanimidade, de amor e equidade,
suavizando o castigo com a esperança e o rigor da justiça com a doçura da misericórdia.
Não, não podeis fazer do Pai supremo tão aviltante conceito.
A Infinita Bondade exclui a infinita perversidade, que
outro nome não cabe no ao pai vingativo e cruel, cuja criação fantástica a vossa
imaginação fanática e o vosso torpe mercantilismo têm implantado no cérebro dos
ingênuos e incautos.
O vosso ódio contra nós outros, adeptos do Espiritismo, tem
origem tão somente nos vossos interesses gananciosos, que fere de morte a nossa
excelente doutrina, que não nos cansamos em repeti-lo, nada mais é do que a ressurreição
do Cristianismo primitivo, que preconiza a caridade em todas as suas mais amplas
e variadas modalidades; e vós, senhores do romanismo, sois a personificação da
intolerância, do egoísmo e do orgulho!
A doutrina de Jesus é toda amor; a vossa é toda ódio, ódio
insaciável, terrível, contra todos aqueles, cujas ideias lesam os vossos sórdidos
interesses !.. Ódio voraz, tigrino, que nem o túmulo reprime, ódio que se farta
nos próprios cadáveres!
Sim, ódio, que outra coisa não exprime a repulsa da inumação
em vossos cemitérios dos infelizes suicidas e dos de todos aqueles que não
comungaram convosco!
Se é certo que Jesus nos ensinou com a palavra e o
exemplo, a amarmos os nossos inimigos, porque dardejais do púlpito o despeito, o
ódio, a fúria contra nós outros, cujo crime único se resume em não acreditar na
existência do vosso deus iracundo e feroz, de um deus que se apraz em ver a
combustão de corpos vivos em meio as flamas crepitantes das piras
inquisitoriais, e ter eternamente diante dos olhos o pavoroso espetáculo de espíritos
contorcendo-se em terríveis dores infinitas, náufragos num oceano sem margens
de não sei que inimagináveis labaredas abrasando seres imateriais!
Qual o vosso alvo, procurando arraigar no coração da humanidade
tão tóxicas, terríveis e nocivas ideias que, aliás, faço justiça à notória sagacidade
que vos caracteriza, não medram em vossas almas?
A verdade é que procurais difundir o terror no coração da
ignorância fanática, com o fim exclusivo de vos locupletares.
Nada
mais sois do que a revivescência dos antigos fariseus, que, a pretexto de
longas orações, extorquiam as viúvas, aos órfãos e aos cegos de inteligência o
pecúlio obtido a custa de sacrifícios e trabalhos!
Abaixo a religião papal!
Transformem-se todos os mosteiros, onde a ociosidade e a hipocrisia,
enroladas em suas negras samarras, se banqueteiam hilares com uma prodigalidade
nababesca; sim, transformem-se os conventos em asilos, em hospitais, para todos
os deserdados da fortuna, para todos os nossos irmãos que não possuem um teto,
nem pão, nem lenitivo para seus padecimentos, nem livro para suas
inteligências!
Sejam fundidos os ídolos de ouro, com que se adornam os pagodes
católicos, em moedas que saciem a pobreza faminta e velem a nudez da
mendicidade decrépita e da orfandade desamparada!
Em nome da civilização, em nome da Caridade, desapareçam
da face da Terra os mosteiros essas sombrias casernas em que vegeta o negro exército
do obscurantismo, e surjam, por toda a parte, em substituição a eles, estabelecimentos
de beneficência e de instrução, em que os apóstolos do Bem ensinem aos pobres
espíritos encarnados a vereda que os deve conduzir ao paraíso sidéreo (sideral),
ao éden divino!
Senhores do
romanismo, já é tempo de dardes algum repouso aos vossos estômagos edazes (vorazes) e, e abrirdes
os vossos corações, mergulhados nas trevas dos preconceitos, do erro e do
egoísmo, aos fulgores da aurora do moderno Cristianismo, que surge atrás da
negra penedia do Vaticano, iluminando todas as consciências e embalsamando de
esperanças todos os corações crentes na bondade Infinita do Pai supremo!
Quereis em realidade ser úteis nos vossos irmãos? Quereis
ser verdadeiramente caridosos, verdadeiramente cristãos?
Para isso é indispensável não odiardes. Jesus foi a
personificação do amor.
Amai!
Não vocifereis do púlpito imprecações contra quem quer
que seja.
Se os nossos irmãos pecam, fazem, por isso mesmo, jus à
vossa compaixão.
Jesus foi a humildade.
Vós sois o orgulho.
Jesus, com as suas próprias mãos, enxugou os pés aos seus
discípulos.
O vosso pontífice, repimpado na cadeira gestatória, é,
passado em triunfo sobre as espáduas de homens cônscios desse servilismo
execrando, mas que a ele passivamente se submetem, impulsionados tão somente
pela paixão ignóbil da cobiça desenfreada, do interesse inconfessável, do ganho
cômodo e ilícito!
Digamo-lo bem alto, e que o nosso brado repercuta por toda
a parte, mormente pelos remotos sertões, em cujas serranias esvoaçam sinistramente
os corvos de sotaina, farejando a podridão do fanatismo e da ignorância:
- O catolicismo de
Roma, orgulhoso e feroz, ganancioso e mau, não é, de certo, a religião do
humilde e pacífico, do magnânimo e dadivoso Nazareno, que, durante sua passagem
sobre a Terra, só teve uma indignação, uma revolta justíssima e sagrada: foi quando
com o azorrague expeliu do templo os seus profanadores, os nefandos dos
mercadores, reproduzidos hoje nos negociantes das verônicas (imagem de Cristo pintada sobre tecidos) e escapulários, de missas e litanias! (ladainhas)
Não, senhores sectários
do romanismo, vós não sois os continuadores dos bons e simples apóstolos do
Cristo!
A vossa doutrina é
mais do que dissimil (dessemelhante) da de Jesus. E!a é diametralmente oposta à revelação cristã.
Muitas inteligências cultas que haviam, imprevidentemente,
posto as
suas luzes ao serviço letífero
do papismo, já têm vindo, impelidas por um dever de consciência, confessar, a
luz meridiana da imprensa, que renegaram para sempre os paradoxos católicos, que
somente a carência do livre exame os tinha feito adotar.
Não mais atravanqueis a estrada do porvir: ou haveis de vos
dispersar, e, espavoridos à luz vivificante da ciência e aos ruídos dos céleres
passos da humanidade marchando resolutamente para o éden do Amor e da Verdade, ou
haveis de ser fatalmente esmagados sob os pés do Progresso em sua carreira
vertiginosa para Deus !..
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