O homem racional
Vinícius
(Pedro
de Camargo)
Reformador
(FEB) Abril 1941
O homem racional não pode viver sem religião,
disse Tolstoi.
O que entenderia o filósofo russo por homem
racional? Acaso, todos os homens não são
racionais?
Segundo o ponto de vista em que se coloca aquele
grande pensador, não é pela inteligência, nem pela vontade, nem pelo sentimento
que os homens se distinguem dos seres inferiores, chamados irracionais, por
isso que estes possuem aquelas faculdades.
A diferença entre a inteligência e o sentimento
dos homens e os dos animais procede do
grau evolutivo em que uns e outros se encontram. Aliás, esta circunstância
verifica-se também entre as raças e os indivíduos que compõem a humanidade.
Portanto, a racionalidade a que se reporta Tolstoi prende-se a certa
particularidade própria e inerente ao homem, e que não se encontra nos animais.
Que particularidade será essa? Não é preciso
dar muitos tratos à bola para descobri-Ia. Trata-se das cogitações que
preocupam o homem com relação ao futuro, à sua origem e a tudo o que se relaciona
com os acontecimentos que com ele se dão.
O homem pensa na morte e nas consequências
que sobre ele trará esse sucedimento inevitável
e certo. O homem alimenta aspirações que não podem consumar-se nesta existência
e que levam a pensar nos problemas do seu destino. A dor constitui, a seu
turno, objeto de sua preocupação. Em suma: o animal vive, o homem sabe que vive.
Levado por essas e outras considerações semelhantes,
o homem descobre em si mesmo, nas profundezas de sua alma imortal, uma certa
ligação com a fonte eterna da Vida e do amor: Deus!
Tal é, em síntese, a religião, ou, melhor,
o sentimento religioso em sua lídima e pura expressão.
Os animais, vivendo do presente e para o presente,
naturalmente não se interessam pelo dia de amanhã. Vivem a vida do momento, tal
qual ela se lhes apresenta. Não existe neles aspirações que se prendem ao
porvir. O "porquê da vida", as questões relativas ao destino, ao
"ser ou não ser", à dor e à morte são privativas do homem,
constituindo o roteiro que o conduzirá ao reino de Deus, após o conhecimento de
Sua justiça.
Eis aí a razão das sábias palavras do renomado
romancista russo: O homem racional não
pode viver sem religião. Isto é: o homem racional não pode prescindir de todas
as cogitações que digam respeito à sua origem e ao futuro que o espera. Do
contrário, resvalará para o terreno da irracionalidade!
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