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sábado, 27 de março de 2021

Similia similibus curantur


 Trechos do artigo sob título

“Similia similibus curantur”

por Vinícius (Pedro de Camargo)        Reformador (FEB) 1º Julho 1937

 

            ...o papado que, a seu turno, alimenta ideias imperialistas, pretendendo exercer, como exerce em certos países de governos fracos, a ditadura espiritual, intervindo, para consecução dos seus desígnios, de modo direto e indireto, em todos os ramos de atividades, políticas, sociais e educacionais, dos povos em cujo seio se aninha...

             ...Dentre as lamentações do papa, destacamos o tópico abaixo transcrito, que vale pela condenação do mesmo papado:

             “Ainda que um homem reúna em si todo o saber, todo o poder e toda a potência material desta Terra, não pode lançar fundamento diverso do que foi lançado, que é Jesus Cristo. (1ª Cor., 3-11)

            Aquele, portanto, que, por sacrílega negação da diversidade essencial que existe entre Deus e o homem, entre o Filho de Deus e os filhos dos homens ousasse colocar ao lado de Cristo, ou pior ainda, sobre ele e contra ele, um simples mortal e fosse esse o maior de todos os tempos, saiba que mais não é senão um profeta de quimeras, ao qual se aplicam com exatidão apavorante as palavras da Escritura: Aquele que habita nos céus zombará deles,” (Salmos 2, 4.)

             Ora, qual é o homem que, neste mundo pretende colocar-se ao nível de Deus, avocando, sacrilegamente, a si atributos divinos, inclusive a infalibilidade, senão o próprio papa?

.............

            O papa, como é público e notório, é o homem que se diviniza a si mesmo, deixando-se adorar pelos seus semelhantes, distribuindo bênçãos e estendendo os pés para serem osculados.

            Ele próprio, portanto, é o falso profeta que ousa colocar-se ao lado do Cristo e, pior ainda, sobre ele e contra ele, sendo um simples mortal, sujeito às paixões e aos achaques inerentes à carne humana.              

            Saiba, portanto, o Santo Padre que a si próprio se aplicam com exatidão apavoradora as palavras da Escritura: Aquele que habita os céus zombará deles, isto é, dos profetas de quimeras.


quinta-feira, 25 de março de 2021

Bilhetes

 

Bilhetes

por G. Mirim (Antônio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Agosto 1946

             Francisco Cândido Xavier recebeu mediunicamente de André Luiz, o esclarecido médico em viagem de instrução pelo Espaço, mais um livro: “Obreiros da Vida Eterna”. Como os outros três, anteriormente publicados, é esse, não há dúvida, uma obra de incontestável mérito, quer pelos ensinamentos e quer pela erudição do Autor, que, todos sabemos, não é o nosso Chico, nem poderia sê-lo.

            Quando apareceu "Parnaso", não faltaram à ribalta os eternos adversários da Verdade, bufoncando (trazendo) os seus fracos, instáveis e incôngruos argumentos. Depois, com a publicação dos romances de Emmanuel, novamente tentaram voltar ao tablado, mas ficaram nos primeiros ensaios dos seus frágeis arrazoados. Em seguida, ao surgirem as edições de “Emmanuel” e de o “O Consolador”, emudeceram todos e eclipsaram-se definitivamente com o aparecimento de "Missionários da Luz", obra que ocasionou admiração em todos os nossos meios médicos e culturais.

            Neste último livro – “Obreiros da Vida Eterna” - o plano analisado e estereotipado pelo Autor, com a sua supervisão, é bem diferente dos anteriormente descritos. Estamos mais terra-a-terra, “crostalmente”, diria o escritor. Entre os inúmeros obreiros da vida eterna que passam à nossa frente, depara-se nos o velho e inolvidável presidente da Federação, o grande Bezerra de Menezes.

            Há cenas comoventes, emocionantes. Ora é um pai, Fábio, a se despedir dos filhos no momento do decesso; ora uma viúva que coloca mentalmente o Cristo na direção do lar orfanado; ora, enfim, a comoventíssima narrativa da despedida de um exposto, Joãozinho, de sua querida protetora. Ao lado de ensinamentos valiosos para a coletividade em geral, há trechos dedicados à teoria de Freud, à Psiquiatria terrena e a outros assuntos correlatos.

            Diante das obras do Chico, nós, os espíritas, que conhecemos todo o movimento mundial do Espiritismo, ficamos perplexos. Sim, porque até hoje jamais apareceu na Terra um médium que se lhe aproximasse pela quantidade e qualidade das produções. Um, apenas, poderia ser-lhe comparado: Andrew Jackson Davis, mas, ainda, assim, sem as características que distinguem o nosso Chico.

            É preciso que não nos esqueçamos de que este médium jamais se concentrou com o fim premeditado de receber um livro. Os Espíritos é que se aproveitam da ocasião em que ele se encontra em recolhimento e prece para lhe ditarem a obra que têm em mira enviar ao Planeta, aliás, antecipadamente determinando que os originais deverão ser entregues a certa editora, completamente de graça, o que realmente sempre se verificou.

            Não podemos prever quando os Espíritos nos deixarão de enviar essas obras instrutivas; não nos é possível sequer compreender a missão que ao mundo trouxe o médium humilde de Pedra Leopoldo. Sabemos, porém, e isso porque sentimos, que ensinamentos admiráveis nos têm sido transmitidos através dessa mediunidade ímpar, dessa literatura única.


quarta-feira, 24 de março de 2021

Bilhetes

 

Bilhetes

por G. Mirim (Antônio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Setembro 1946

 

            Num dos Concílios da Igreja, como os homens não pudessem compreender o Cristo, porquanto não achavam explicação possível, na época, para os “milagres” por ele realizados, decretaram como dogma que o Enviado era o próprio Deus, então dividido em três pessoas, tal como os deuses de antigas religiões.

            Com Buda, os fatos se passaram mais ou menos de forma semelhante. É a tendência natural dos homens. Entretanto, todos nos rimos da ingenuidade dos índios, por se terem curvado ao deus-Caramuru.

            Assim têm sempre procedido os homens, apesar de os iniciadores dos movimentos religiosos deixarem bem claramente explicado que eles não eram deuses, mas criaturas falíveis como nós o somos.

            Dessa maneira, com tais interpretações, a Humanidade se tem dividido ou conservado em verdadeiro estado de fanatismo religioso, estacionando o que veio para ser evolutivo. Swedenborg aí está, trancado nos livros que deixou, formando uma seita à parte.

            Também o Espiritismo já se vai também caminhando para esse estacionamento. Kardec foi muito grande e, daí, por não o compreenderem, aliás, por não assimilarem a Doutrina que ele recebeu através de médiuns, codificando-a, já existe uma tendência para as subdivisões, e, por conseguinte, para o enfraquecimento do meio e consequente vantagem para o sacerdotismo semi oficializado de outras igrejas.

            É necessário, portanto, que não confundamos a pessoa de Kardec com a obra por ele recebida do Alto. Não ponhamos em plano igual as obras que lhe foram ditadas e os trabalhos outros de sua própria pena. Nas primeiras estão as leis; nas segundas, as opiniões pessoais de um homem que, apesar da sua alta e ímpar posição no meio espírita, não pode ser considerado em igualdade com os Espíritos que lhe transmitiram aquelas leis, e tanto é justo esse nosso raciocínio, que ele próprio, agindo com a precaução dos sábios, em várias ocasiões repetiu essa mesma afirmativa de que estava sujeito a erros e, por isso mesmo, muitas vezes não afirmava, mas apresentava apenas hipóteses.

            Tenhamos por Allan Kardec o respeito e o amor de que se fez merecedor, mas não nos subdividamos por caprichos ou por vaidades exibicionistas que existam dentro de nós. Esforcemo-nos, antes, por reunir todos os meios espíritas conseguindo convencer, até mesmo os anglo-saxônicos, de que “O Livro dos Espíritos” é a ligação de todos nós.

            Se continuarmos como vamos, entregando-se cada um ao primeiro inimigo invisível que se lhe apresente, em breve teremos centenas de pequenos agrupamentos: os que só aceitam os fenômenos; os que repelem a reencarnação; os que rejeitam a teoria de Darwin; os que não toleram preces; os que não admitem a evocação de Espíritos, etc. etc., cada um com a sua denominação especial.

            Como vemos, todos aqueles que trabalham pela subdivisão da Doutrina e que procuram combater e criticar, sem construir, são criaturas que se vêm prestando para a obra dos inimigos invisíveis.

            Paulo foi considerado como o maior dos pregadores e o verdadeiro propagador do Cristianismo, porque procurou reunir todas as correntes, indo até mesmo à procura dos gentios, classe desprezível para os fanáticos do Judaísmo, então dominante, e para os que receberam, no berço, a educação dessa poderosa organização político-religiosa dos primeiros tempos.

            Dividir, criticar, condenar, acusar não é obra digna de um espírita, porque, a Doutrina nos ensina a trabalhar para a união, para a tolerância, para o amor;

            Trabalhemos, pois, pela união e nunca para a desunião.


terça-feira, 23 de março de 2021

Ouçamos atentos

 

Ouçamos atentos

Emmanuel por Chico Xavier   Reformador (FEB) Julho 1946

             “Buscai primeiro o Reino de Deus e sua justiça." - Jesus, (Mateus, 6:33).

             Apesar de todos os esclarecimentos do Evangelho, os discípulos encontram dificuldade para ajustar convenientemente a bússola do coração.

            Recorre-se à fé, na sede de paz espiritual, no anseio de luz, na pesquisa da solução aos problemas graves do destino; todavia, antes de tudo, o aprendiz costuma procurar a realização dos próprios caprichos; o predomínio das opiniões que lhe são peculiares; a subordinação de outrem aos seus pontos de vista; a submissão dos demais à força de que é portador; a consideração alheia ao seu modo de ser; a imposição de sua autoridade personalíssima; os caminhos mais agradáveis; as comodidades preciosas do dia que passa; as respostas favoráveis aos seus intentos e as satisfações do imediatismo vulgar.

            Raros aceitam as condições do discipulado. Recusam, em geral, o título de aprendizes do Divino Mestre. Querem ser favoritos de Deus.

            Conhecemos, no entanto, a natureza humana, da qual ainda somos partícipes, não obstante a posição de Espíritos desencarnados. E sabemos que a vida burilará todas as criaturas nas águas pesadas da experiência.

            Lutaremos, sofreremos e aprenderemos, nas variadas esferas de luta evolutiva e redentora.

            Considerando, porém, a extensão das bênçãos que nos felicitam as estradas, acreditamos seria útil à nossa felicidade e equilíbrio ouvir, atentos, as palavras do Senhor: - "Buscai primeiro o Reino de Deus e sua justiça".


segunda-feira, 22 de março de 2021

Bilhetes

 

Bilhetes

por G. Mirim (Antônio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Julho 1946

             A Federação é dirigida por uns velhos retrógrados. Aquilo não anda. Nada produz. Não tem iniciativa.”

             Essas são as frases que vimos ouvindo há sessenta anos, através da mediunidade, da afinidade que certos confrades apresentam, involuntariamente, sem o perceberem, com os adversários do Espiritismo, que, do Além, sopram discórdias, acusações, desânimos.

            Note-se, ainda, que esses “aparelhos transmissores” das vozes adversárias do Além, dispostos sempre a idealizarem planos “grandiosos” para que outros os executem, jamais cooperam em qualquer esforço construtivo. O prazer desses confrades é menosprezar o trabalho alheio e ocasionar o afastamento daqueles que se iniciam e que lhes desconhecem os processos de orientação demolidora. Trabalhar, não é com eles. Querem ditar normas e serem considerados como líderes, patriarcas e salvadores. E, quando convidados para o esforço comum e anônimo, dão de ombros, com a superioridade orgulhosa que lhes é inspirada pelos seus afins do Espaço.

            Ainda agora, quando a Federação, que nada possuía em seus cofres por tudo distribuir com os necessitados, apresentou a ideia da difusão ampla dos nossos livros, expondo o plano durante doze meses pelo seu órgão de publicidade, vimos que entre os nomes dos que se apresentaram, oferecendo recursos para a obra comum, não se encontrava um só, um único desses eternos acusadores: Dar dinheiro, não lhes convém. Julgam-se, mesmo, credores pelo muito que oferecem: a honra de nos acusarem e de se preocuparem conosco. Quando trabalham, geralmente não o fazem como nós outros. Exigem compensações monetárias, cargos rendosos ou posições de destaque. De graça, quando muito, oferecem a sua “inigualável” competência oratória, onde mais falam em si mesmos, que na obra comum.

            Felizmente, porém, os meios espíritas nacionais já vão conhecendo esses “abnegados” e reconhecendo que à Federação devemos todos nós o desenvolvimento que o Espiritismo tomou no Brasil, ao ponto de sermos atualmente exportadores de livros espíritas para todo o mundo, levando as luzes da Terceira Revelação aos mais variados meios sociais.

             Tudo que o Espiritismo tem conquistado no Brasil é obra reflexa da Federação. Desde o número sempre crescente de adeptos, até as obras grandiosas que se apresentam pelo País inteiro, desde as grandes Federações e Uniões Espiritas até o mais pequenino Centro, em todos os setores encontraremos sempre o serviço anônimo da Casa Máter, trabalho sem foguetórios e bandas de música, mas edificante, porque estimula sem retirar do obreiro a glória do que ele realiza.

            Se não fora a estabilidade doutrinária e diretiva da Casa de Ismael, a sua orientação segura, tolerância e reflexão, certamente que o Espiritismo brasileiro não teria conseguido essa supremacia mundial, essa posição de destaque, essa uniformidade, esse desenvolvimento que todos reconhecemos.

            Que Deus se apiede desses companheiros, e que nos continue oferecendo, a nós, discípulos de Ismael, a graça de servirmos como executores do plano que os Espíritos Superiores traçaram para o “Coração do Mundo”, para a “Pátria do Evangelho”.


Opinião valiosa

 

Opinião valiosa

Reformador (FEB) Junho 1946

             Opinião de Orígenes, autor de 'Princípios' conforme resumo feito pelo Abade Bérault-Bercastel:

            “Segundo Orígenes, doutor da Igreja, a desigualdade das criaturas humanas não representa senão o efeito do seu próprio merecimento, porque todas as almas foram criadas simples, livres, ingênuas inocentes por sua própria ignorância, e todas, também por isso, absolutamente iguais. O maior número incorreu em pecado e na conformidade de suas faltas, foram elas encerradas e corpos mais ou menos grosseiros, expressamente criados para lhes servir de prisão.

            Daí os procedimentos diversos da família humana. Por mais grave, porém, que seja a queda, jamais acarreta para o espírito culpado a retrocessão à condição de bruto; apenas o obriga a recomeçar novas existências, quer neste, quer em outros mundos, até que, exausto de sofrer, se submeta à lei do progresso e se modifique para melhor. Todos os Espíritos estão sujeitos a passar do bem ao mal e do mal ao bem. Os sofrimentos impostos pelo bom Deus são apenas medicinais, e “os próprios demônios” cessarão um dia de ser os inimigos do bem e o objeto dos rigores do Eterno.”

                          (‘História da Igreja’, pelo Abade Bérault-Bercastel).


sábado, 20 de março de 2021

Bilhetes

 

Bilhetes

por G. Mirim (Antônio Wantuil)

Reformador (FEB) Junho 1946

             Era uma quarta-feira de cinzas. A cidade estava deserta. Noite alta. Cansado de me ver preso em casa durante os três longos dias de barulho e confusão, que me atordoaram os ouvidos, sai a esmo, sem rumo certo, disposto a deliciar-me num banco de jardim, onde me refizesse o intelecto perturbado pela bulha carnavalesca dessa catolicíssima cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro.

            Saltando do bonde que tomara, sem mesmo lhe ter visto a placa, eis que me encontrei num grande jardim, situado à frente do internato do Colégio Pedro II. Sentei-me. Silêncio profundo em torno, somente interrompido de hora em hora pelo rolar dos bondes que passavam.

            Contemplava com saudades o antigo edifício outrora frequentado pelo magnânimo imperador, sentindo que espectros entravam no casarão e dele saíam, lembrando-me os bons tempos em que ali se abrigaram as esperanças de inesquecíveis amigos que se foram, quando, ao meu lado, percebi que alguém silenciosamente se colocara.

            Depois, como me voltasse para o estranho, surpreso de sua companhia, ele, compreendendo-me a atitude e como que lendo o meu pensamento, convidou-me amavelmente para darmos uma volta, à procura de sossego para o espírito conturbado. 

            À proporção que caminhávamos, o velho me expunha os seus conhecimentos filosóficos a respeito da vida. As árvores lhe falavam, e com ele palestravam, mais ou menos nestes termos:

            - "Sou o encanto do jardim, Todos me admiram a elegância. As crianças me olham respeitosas, vendo-me o porte ereto e a altura que se dirige à amplidão dos céus. Sou a princesa do jardim. Ninguém vem ou passa por aqui, sem contemplar-me a beleza. Ainda ontem, ao meu pé, os homens se reuniram em festa, ao som dos seus pandeiros, em louca e bacântica (orgíaca) alegria."

            Caminhamos um pouco mais e chegamos a uma copada mangueira de seus dez anos. Tristes como nos achávamos, dirigiu-lhe meu companheiro a sua saudação mental, ao que ela correspondeu com essas palavras:

            “- Agradeço-te, meu amigo, a visita que te não esqueces de fazer-me e súplice, agora, é o meu agradecimento porque me apresentas um novo companheiro de existência sofredora, um trabalhador, como eu, que também padece a ingratidão dos homens.”

            E dirigindo-se a mim, continuou:

            “- Aqui viveria abandonada, meu novo amigo, se a proteção divina não me apresentasse os quadros do futuro que me animam a prosseguir no meu trabalho silencioso de penetrar fundo pela terra, durante meses e meses, sozinha e esquecida, à cata dos elementos que me auxiliam a oferecer às criaturas humanas os frutos adocicados pelo meu amor à Humanidade. Nessa época, porém, só à noite tenho sossego e paro de chorar, substituindo as dores que me feriram, pelas reflexões que me vêm do Alto. Durante o dia, quando me veem, as crianças me atiram pedras, magoando os galhos e as folhas que me fornecem o ar, até que, acertando nos frutos que lhes reservei, abandonam-nos no chão, de onde são levados à carroça do lixeiro que passa. Porque não os deixam para os passarinhos? Porque me ferem assim?"

            A voz da velha mangueira se entrecortava de soluços. Os sons já se lhe articulavam com dificuldade, o quadro era comovente. Meu companheiro, porém, falou à angustiada mangueira:

            - Irmã, o Cristo também deu frutos e recebeu pedradas. Sua vida foi como a tua. Séculos e séculos trabalhou para que pudesse vivificar os mortos que se encontravam nas sinagogas, e, mais sofredor do que tu, minha irmã, os homens lhe destruíram o próprio ser visível e tangível. É por isso, talvez, que até hoje ouvimos a advertência: Ninguém atira pedras em árvores que não dão frutos.

            Assim falou o velho. E enquanto lhe ouvia a voz, a árvore se calava, resignada, e eu, de fronte curvada, ao peso dos meus remorsos, em prece me dirigia aos Céus.

            Parou a voz do companheiro. Olhei ao derredor. Ninguém estava ao meu lado. O velho desaparecera e a madrugada raiava. Voltava o barulho e a confusão. A cidade despertava para a morte de todos os dias, para a ambição, para o egoísmo, para a maldade de sempre.


Efeitos da primeira queda

 

Efeitos da primeira queda

por Marcílio Gonzaga     Reformador (FEB) Maio 1946

             Dois anos depois de sua desencarnação, o Padre Lacordaire fez um sermão profético que infelizmente se está cumprindo. Disse o grande pregador, em mensagem espírita publicada por Allan Kardec em “O Evangelho segundo o Espiritismo”:

             "Vimos preparar os caminhos para que as profecias se cumpram. Quando o Senhor vos der uma manifestação mais retumbante de sua clemência, que o enviado celeste já vos encontre formando uma grande família, - que os vossos corações, mansos e humildes, sejam dignos de ouvir a palavra divina que Ele vos vem trazer; que ao eleito somente se depare em seu caminho as palmas que aí tenhais deposto, volvendo ao bem, à caridade, à fraternidade. Então, o vosso mundo se tornará o paraíso terrestre. Mas, se permanecerdes insensíveis à voz dos Espíritos enviados para depurar e renovar a vossa sociedade civilizada, rica de ciências, mas, no entanto, tão pobre de bons sentimentos, ah! então, não vos restará senão chorar e gemer pela vossa sorte.”

             Realmente permaneceram insensíveis à voz dos Espíritos todos os povos da velha Europa e, precisamente oitenta anos depois dessa profecia de Lacordaire, todo o Velho Mundo se achava envolto nas trevas e ouvindo o ranger de dentes de verdadeiro inferno. Era o 1943, com os maiores horrores a que a Humanidade já assistiu. E só Deus sabe quando serão lá ouvidos os Mensageiros do céu, ou até quando o progresso tenha que ser impulsionado pelas mais penosas calamidades sociais.

            Com o imenso trabalho realizado pelos Espíritos superiores por ocasião da missão de Allan Kardec, toda a França poderia ter-se transformado e continuar liderando uma nova civilização; mas não foi o que se deu: o Espiritismo regenerador transformou-se pela vaidade humana em simples ciência experimental, cheia de dúvidas e negações, polêmicas e lutas... Finalmente vieram as grandes dores fazer a sua obra e esta continua ... Mas virá nova onda de misericórdia divina em tempo oportuno e então, já trabalhados pela dor, os homens terão ouvidos de ouvir e olhos de ver.

            A substituição do Espiritismo evangélico pela orgulhosa metapsíquica foi a primeira queda do homem ao receber a Nova Revelação e, em seu enfatuado orgulho, pretender transformar a Revelação em simples ciência experimental para satisfação da curiosidade de um intelectualismo estéril.

            A obra imensa de um grande Missionário foi desdenhosamente abandonada na pátria de Joana d'Arc, sem mesmo se cogitar de sua alta significação moral e social. Até a palavra Espiritismo pareceu, à comunidade francesa, indigna de pronunciar-se, e tratou-se, ali, de cunhar novos vocábulos mais “científicos” ou pelo menos mais pretensiosos.

            Mas Deus não abandona seus filhos, Virá, em tempo oportuno, nova chuva de bênçãos, nova ocasião de se aprenderem as mesmas verdades que foram reveladas de 1857 a 1869.

            Acha-se hoje conosco no Brasil a grande responsabilidade que em 1870 pertencia aos nossos irmãos franceses. Teremos a mesma desdita de repelir a misericórdia divina e nos enveredarmos pelo processo horrível das dores coletivas? Esperamos que não; o Espiritismo, no Brasil, conserva seu caráter essencialmente evangélico e já produz alguns frutos de amor ao próximo.

            O “cientificismo” estéril não encontrou ambiente entre nós. Várias vezes anunciaram os Espíritos superiores que o Espiritismo cristão desenvolverá sua missão futura partindo do Brasil e o desenvolvimento que vai tomando em nosso país o Esperanto, entre os espíritas, confirma aquelas previsões, pois que o Brasil só poderá cumprir grande missão mundial depois que estiver em pleno funcionamento uma língua neutra internacional, pois que o nosso idioma nacional dispõe de possibilidades de projeção internacional como o francês no século 19.

            Oremos e vigiemos para que possamos restituir à França o patrimônio imenso que lhe devemos. Por mercê de Deus, já estamos remetendo aos esperantistas franceses as primeiras páginas de Kardec impressas em Esperanto, “O Livro dos Espíritos” será lido em muitas cidades francesas por pessoas que nada sabem de Espiritismo, além do que dizem os adversários da doutrina. Tais pessoas terão a surpresa de notar que o Espiritismo não é nada do que dizem seus inimigos, porém a mais sublime Doutrina que o homem já possuiu. Não tenhamos ilusão de êxitos rápidos. Muitos esperantistas continuarão indiferentes ao nosso trabalho ou o hostilizarão. O tempo tem de fazer a sua obra para realizar-se a esperança do Padre Lacordaire: “formar a Humanidade uma grande família”. Os dois instrumentos necessários são o Espiritismo e o Esperanto, o pensamento e a linguagem.

 Do blog: Da publicação deste artigo no ‘Reformador’ até esta data passaram-se 74 anos. Caberia - sem dúvida - uma atualização. Assim sendo, colocamos este espaço disponível para quem possa atualizar – a nós e aos leitores deste blog - sobre o movimento espírita na França nos dias de hoje, quadro que desconhecemos integralmente. 


sexta-feira, 19 de março de 2021

Bilhetes

 

Bilhetes 

G. Mirim (Antonio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Maio 1946

 

            Várias vezes repete Kardec que a Doutrina é progressiva e até mesmo reformável em alguns dos seus pontos. Na introdução de “A Gênese”, o Codificador chega a afirmar que algumas das teorias, por ele apresentadas naquela obra, são pessoais e hipotéticas. Assim, não vemos razão para que alguns confrades se apeguem a certo e determinado ponto e nele estacionem, emperrem, qual acontece com os sacerdotes das velhas religiões que continuam fanaticamente a pregar a existência do inferno e toda a série de incongruências que dessas velhas teorias resultam.            

            Ser Kardecista ou Kardeciano não é ficar estacionado, porque o Missionário de Lyon não recomendou o estacionamento, mas a evolução progressiva, de acordo com as revelações que nos fossem oferecendo os Espíritos.

            Muitas e muitas passagens evangélicas, incompreensíveis nos primeiros tempos do Espiritismo, são hoje facilmente explicadas pelos novos ensinamentos que vêm sendo transmitidos aos homens da Terra. Examinemos algumas.

            Na impossibilidade de os primeiros espíritas explicarem a multiplicação dos pães, realizada publicamente por Jesus, várias opiniões se formaram, entre as quais, a de que não houve a multiplicação, mas apenas a saciação da fome através da eloquência das palavras do Senhor. Mas os nossos confrades, de então, se esqueceram de que todos os evangelistas escreveram que sobraram doze cestos cheios de pães, logo, não se poderá negar que houve em realidade a multiplicação material.

            Contra essa teoria da não multiplicação dos pães, os Espíritos nos elucidam que não só ela se deu realmente, como também nos explicam a maneira por que foi feita, e, corroborando as suas asserções, passaram a produzir fenômenos semelhantes, em menor grau de intensidade mas demonstrativos, formando flores e objetos outros, em plenas sessões de efeitos físicos.

            Como lendas ou alegorias foram explicadas inúmeras passagens evangélicas, como por exemplo: Jesus e Pedro andando sobre as águas, o desaparecimento do corpo do Messias, e muitas e muitas outras.

            Continuando, porém, na sua obra de esclarecimento, os Espíritos passaram a apresentar-nos novos fenômenos em nossas sessões de estudo, e, dessa forma, com a levitação, os próprios médiuns se mantêm no ar, sem qualquer ponto de apoio, notando-se, mesmo, que este ponto de apoio, se assim podemos dizer, é até menor, porque a densidade do ar é inferior à da água.

            Mesmo não admitindo as instruções que os Espíritos deram a Roustaing - classificado por Humberto de Campos como o organizador do trabalho da fé - instruções em que todos esses pontos foram esclarecidos, não é justo, nos dias atuais, após os conhecimentos recebidos no correr dos anos, continuemos solidários com os sacerdotes do judaísmo, admitindo que o corpo do Senhor tenha sido roubado pelos discípulos, visto que, isso admitindo, destruímos todo o Evangelho e apresentamos os apóstolos do Cristianismo como criadores de uma mentira. Com a possibilidade já documentada de que os Espíritos podem desintegrar a matéria e transportá-la, mesmo que não admitíssemos o corpo fluídico, teoria que realmente não pode ser assimilada por todos, mais bem explicado ficaria o fenômeno pela desintegração do corpo do Mestre, que pela suposição do roubo praticado pelos discípulos, como as antigas teorias e hipóteses deixavam veladamente transparecer.

            Só por esses exemplos, e eles se multiplicariam às centenas, se de espaço dispuséssemos, vemos que os meios espíritas devem, pelo estudo e pela observação, tomar conhecimento das novas revelações que têm vindo e continuarão a vir, pois; do contrário, acompanharemos os nossos irmãos de outras religiões, irmãos que estacionaram no fanatismo e nele se conservam.

            Os Espíritos deram ao iluminado Missionário de Lyon o que deveria constituir a base do Espiritismo, e, portanto, uns e outro não se cansam de repetir que a revelação é progressiva e confirmada pelos fenômenos.

            Aí têm os nossos amigos três fatos explicados pelos fenômenos de desintegração da matéria, de transporte e de levitação. Procuremos estudar, observar e raciocinar e tudo mais nos virá de acréscimo, facilitando-nos o entendimento e clareando-nos a inteligência para que todas as palavras e passagens evangélicas se nos tornem compreensíveis, assimiláveis e edificantes.


Saibamos cooperar

 

Saibamos cooperar

Emmanuel por Chico Xavier       Reformador (FEB) Maio 1947

           “Porque sem mim, nada podeis fazer." – Jesus em João, 15:5

             O divino poder do Cristo permanece batente em todas as criaturas. Todos os homens receberam-lhe sagrados dons, ainda que muitos se mantenham afastados da mística religiosa.

            Referimo-nos aqui, porém, aos cultivadores da fé que iniciam o esforço laborioso e longo da descoberta dos valores sublimes que vibram em si mesmos.

            Grande parte suspira por espetaculares demonstrações de Jesus em seus caminhos e companheiros incontáveis acreditem em apenas cooperam com o Senhor os que se encontram no ministério da palavra, no altar ou na tribuna de variadas confissões religiosas.  

            Urge, entretanto, retificar esse erro interpretativo.

            O Senhor está conosco em todas as posições da vida. Nada poderíamos realizar sem o influxo de sua vontade soberana.  

            Diz-nos o Mestre com segurança: “eu sou as videiras, vós as varas”. Como produzir alguma coisa sem a seiva essencial?

            Efetivamente, os aprendizes arguciosos poderão objetar que, nesse critério, também encontraremos os que praticam o mal, alicerçados nas mesmas bases.  Respondendo, consideraremos somente que semelhantes infelizes enxertam cactos infernais na Videira Divina, por conta própria, pagando elevado peço, perante o Governo do Universo.

            Reportamo-nos aos companheiros tímidos e vacilantes, embora bem intencionados, para concluir que, em todas as tarefas humanas podemos sentir a presença do Senhor, santificando o trabalho que nos foi cometido. Por isso, não podemos olvidar a lição evangélica de que seria abençoado qualquer esforço no bem, ainda que fosse apenas o de ministrar um copo de água pura em Seu Nome.  

            O Mestre não se encontra tão somente no serviço daqueles que ensinam a Revelação Divina, através da palavra acadêmica, instrutiva ou consoladora. Acompanha os que administram os bens do mundo e os que obedecem as ordenanças do caminho, concorrendo na edificação do futuro melhor, nas organizações materiais e espirituais. Permanece no lado dos que revolvem o chão do planeta, cooperando na estruturação da Terra Aperfeiçoada, como inspira aos missionários da inteligência na evolução dos direitos humanos.

            Saibamos cooperar, desse modo, nos círculos de serviço a que fomos chamados ao concurso cristão.

            Faze tanto bem, quanto esteja em tuas possibilidades, à obra parcial confiada às tuas mãos.

            Por hoje, talvez te enganes, supondo servir às autoridades terrestres; no entanto, chegará o minuto revelador, no qual reconhecerás que permaneces a serviço do Senhor. Une-te, pois, ao Divino Artífice, em espírito e verdade, porque o problema fundamental de nossa paz é justamente o de saber se vivemos n'Ele tanto quanto Ele vive em nós.


Para salvar os filhos

 


Para salvar os filhos   

A Redação   Reformador (FEB) Março 1946

             “O Dr. John Mason Neale conta que um homem que acabava de perder a mulher fora convidado a ir com seus filhinhos passar algum tempo na roça, em casa de um amigo. Era uma casa vasta e no seu pavimento inferior havia corredores compridos e sombrios, onde as crianças se compraziam a brincar e a correr. Um dia, entretanto, subiram muito sérios ao primeiro andar, junto dos parentes a quem dois deles explicaram que, ao se acharem a correr num dos corredores, a mãe lhes aparecera, dizendo-lhes que não fossem para diante e voltassem para trás, tendo desaparecido depois de lhes dar esta ordem. Buscas foram feitas e verificou-se que, se as crianças se tivessem adiantado um pouco mais neste corredor, teriam caído num poço aberto. A mãe, por conseguinte, salvara-os de uma morte certa.

            Este exemplo prova, escreve Leadbeater, que a mãe havia conservado “mesmo no plano astral” o hábito de velar por seus filhos com solicitude e que, como tem acontecido em diversos casos, seu desejo intenso de protegê-las contra o perigo iminente em que estavam, dera-lhe o poder de se tornar visível para eles e de se fazer ouvir ou, por outra, teve o poder de sugerir-lhes a ideia de que a viam e ouviam. É também possível, acrescenta ele, que o auxílio tenha sido trazido por outra entidade aparentando a forma familiar da mãe, para não assustar as crianças mas a hipótese mais simples e com certeza mais provável é que esta intervenção foi devida ao amor materno sempre vigilante e persistente, mesmo depois de ter passado através das portas da sepultura”.

            (Extr. do livro “l'Autre Coté de la Mort”, de Leadbeater, pág , 221).


quinta-feira, 18 de março de 2021

Que fazeis de mais?

 

Que fazeis de mais?   

Emmanuel por Chico Xavier   Reformador (FEB) Julho 1946

             “Que fazeis de mais?" – Jesus. (Mateus 5:47)

             Iniciados na luz da Revelação Nova, os espiritistas cristãos possuem patrimônios de entendimento muito acima da compreensão normal dos homens encarnados.

            Em verdade, sabem que a vida prossegue vitoriosa além da morte; que se encontram na escola temporária da Terra, em favor da iluminação espiritual que lhes é necessária; que o corpo carnal é simples vestimenta a desgastar-se cada dia; que os trabalhos e desgostos do mundo são recursos educativos; que a dor é o estímulo às mais altas realizações; que a nossa colheita futura se verificará, de acordo com a sementeira de agora; que a luz do Senhor clarear-nos-á os caminhos, sempre que estivermos a serviço do bem; que toda oportunidade de trabalho no presente é uma bênção dos Poderes Divinos; que ninguém se acha na Crosta do Planeta em excursão de prazeres fáceis e sim em missão de aperfeiçoamento; que a justiça não é uma ilusão e que a verdade surpreenderá toda a gente; que a existência na esfera física é abençoada oficina de trabalho, resgate e redenção e que os atos, palavras e pensamentos da criatura produzirão sempre os frutos que lhes dizem respeito, no campo infinito da vida.

            Efetivamente, sabemos tudo isso.

            Em face, pois, de tantos conhecimentos e informações dos planos mais altos, a beneficiarem nossos círculos felizes de trabalho espiritual, é justo ouçamos a interrogação do Divino Mestre:

            - Que fazeis mais que os outros?


Mensagem de Emmanuel

 

Mensagem de Emmanuel

Reformador (FEB) Junho 1946

             Ter paz em Cristo não é ter paz no mundo. É encontrar o tesouro eterno, no testemunho eterno e no suor de cada dia. Não é fugir ao serviço, é aceitá-lo seja onde for, como e quando determine a Vontade daquele que prossegue em ação redentora, junto de todos nós.

            Muitos homens sempre buscaram a tranquilidade dos cadáveres; mas o discípulo fiel sabe que tem esforços e tarefas, em todos os dias da existência. Atingindo semelhante zona de compreensão, o aprendiz conhece o segredo da paz em Cristo, com o máximo de lutas na Terra. Para ele, continuam batalhas, atritos, trabalhos e testemunhos no planeta; entretanto, nenhuma situação lhe modifica a serenidade interior, porque alcançou o luminoso caminho, experimentando a tranquilidade em Jesus.


terça-feira, 16 de março de 2021

Suas leituras

 "Os 100 livros que você deve ler antes de morrer..."



             Em visita à livrarias cariocas, Aron, um espírita, observou que livros com títulos semelhantes ao do acima existem aos montes. Uns referem-se a lugares no mundo que o leitor deveria conhecer antes de morrer. Outros sugerem sofisticados restaurantes em todo canto da Terra.  Existem também aqueles que sugerem os filmes que deveriam ser vistos. Sempre antes de morrer... 

             Aron, um espírita, na certeza que você vai morrer um dia, sugere que você liste os 100 livros espíritas que você deveria ler antes de morrer. Você vai se surpreender com o resultado! Rapidamente, chegará à conclusão que a grande maioria dos livros ditos espíritas não tem nenhuma importância para sua formação moral, filosófica ou mediúnica. Inclusive muitos daqueles colocados à venda no seu centro espírita...

             Leia Kardec para entender Jesus!

                    Nota: Este texto foi publicado neste blog à cerca de 12 anos atrás...

Bilhetes

 


Bilhetes 

G. Mirim (Antonio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Abril 1946

             Graças aos abnegados companheiros que fundaram a Federação Espírita Brasileira e lhe traçaram os planos, o Brasil é o país que mais obras espíritas tem publicado e o único onde são encontradas à venda todas as obras de Allan Kardec. Enquanto pelo resto do mundo não se consegue, senão dificilmente e por acaso, uma coleção das obras do Codificador, por se encontrarem de há muito esgotadas, no Brasil essas obras jamais faltaram e já se providencia para que sejam publicadas em Esperanto e, se possível, em outras línguas. Este esforço foi iniciado com a publicação de ‘O Livro dos Espíritos’ e ‘A Prece’, em Esperanto, em edições de luxo, tendo sido remetidos centenas de exemplares para todos os países do mundo, numa demonstração clara e evidente de que a Federação é, no momento, a única sociedade espírita do planeta que se dedica a esse trabalho de divulgação das obras do Codificador, ainda mesmo sabendo, como no caso, de que nenhum proveito material poderá auferir com essas publicações de preço elevadíssimo.

            Em nossa Pátria, os próprios cegos podem ler as obras do Missionário, porque elas são encontradas na Biblioteca Pública da Federação, copiadas em Braille. A nossa Federação é, ainda, a única associação espírita do mundo que distribui gratuitamente as obras de Kardec com os necessitados.

            Quando supúnhamos que a Federação estava satisfeita com a sua obra, inegavelmente única em todo o orbe, e que agora só lhe competia o trabalho de manter os serviços já existentes, eis que surge a ideia de “ampliação das Oficinas” e, então, um plano grandioso se nos desdobra à frente, mostrando-nos o que nos compete realizar para que o trabalho de evangelização não estacione, mas que se amplie e possa atingir a todos os setores do país e se estenda até ao estrangeiro.

            Como espíritas, os que estamos na Terra enclausurados na carne, devemos pesar a nossa responsabilidade e oferecer o nosso auxílio material à obra que os espíritos elevados desejam conseguir, a fim de que amanhã possamos ser contados entre aqueles que souberam compreender a finalidade da nossa vinda ao planeta.

            Não podemos deixar aos diretores da Federação toda a responsabilidade da execução do plano. A obra não é deles, não lhes pertence. É nossa, da coletividade humana. Desta, pelo lado material; da coletividade invisível, pelo espiritual. Se essa coletividade invisível trabalha incessantemente, inspirando-nos, dirigindo-nos, aconselhando-nos e auxiliando-nos na obra, a nossa, a coletividade humana, não pode cruzar os braços e esperar que outros executem todo o trabalho.

            Se a nossa Federação realizou o plano de Kardec, difundindo livros e mais livros, colocando o Brasil como editor de mais de metade das obras espíritas, publicadas em todo o globo, não podemos, nós, os homens da atual geração, deixar que a obra paralise, cumprindo-nos, sim, fazer progredir sempre o que nos legaram os nossos companheiros que hoje, no Espaço, depositam em nós as suas esperanças.

            Não nos preocupemos com a crítica improdutiva ou com os acusadores de todas as épocas. Há sessenta anos vêm eles trabalhando na sua crítica demolidora, daqui e do Além, e, no entanto, não nos apontaram ainda uma única sociedade espírita, de qualquer país, que tenha realizado obra que se aproxime da conseguida pela nossa Federação. Os frutos aí estão. A árvore vem alimentando espiritualmente gerações e gerações, até mesmo os que lhe atiram pedras. Não se irrita, não deixa de produzir, não para no seu trabalho contínuo, mas antes agradece o estímulo das pedradas, porque, sem elas, os bons trabalhadores se lhe deitariam à sombra, deixando-a fenecer à falta do adubo da fé, da dedicação, do amor cristão.

            Trabalhemos e oremos pelos que ficam à margem da estrada, criticando ou injuriando os que passam curvados sob o peso de suas obras. Mais cedo ou mais tarde, também eles entrarão no bom caminho.


domingo, 14 de março de 2021

Bilhetes

 

Antonio Wantuil

Bilhetes 

G. Mirim (Antonio Wantuil de Freitas)

Reformador (FEB) Março 1946

             Apesar da enorme diferença existente entre metempsicose e reencarnação, os nossos antagonistas não se cansam de repetir que admitimos a primeira, quando bem sabem que só aceitamos a segunda. Quase diríamos que agem de má fé, de caso pensado, esperançosos de que da confusão lhes resulte algum proveito.

            Não há mais, porém, meios e processos que evitem o desenvolvimento, a difusão do Espiritismo. O bicho papão - o demônio - já não faz tremer sequer as beatas das sacristias e as crianças de hoje já não acreditam naquele colaborador precioso de que tanto usaram e abusaram os teólogos. Também já não produz qualquer efeito a velha ameaça de que o Espiritismo ocasiona a loucura, visto que essa enfermidade deu ultimamente para preferir as criaturas que frequentam as igrejas e até mesmo freiras e padres vêm sendo vítimas dessa loucura, da qual, nós, os espíritas, conhecemos a causa.

            Não lhes restando mais qualquer arma, mesmo porque todas lhes têm voltado em ricochete procuram, então, novos meios de lançar o confusionismo e nos apresentam como adeptos da metempsicose.

            No entanto, se não fora o interesse material desses nossos antagonistas, receosos de verem sair-lhes das mãos a riqueza que acumularam e o domínio que ainda exercem sobre a massa ignorante, e sobre uma outra classe que sempre viveu ao lado dos materialmente mais fortes, certamente eles confessariam a verdade e diriam como Santo Agostinho (pág . 28, tomo I de ‘Confissões’):

             "Não teria minha infância atual sucedido a uma outra idade antes dela extinta?... Antes mesmo desse tempo, teria eu estado em algum lugar? Seria alguém?”

             É possível que ainda exista a dúvida nos padres menos cultos porque seus cérebros pequenos e inteligências curtas não lhes permitiriam ir além do que lhes ensinaram no seminário, porém, na classe intelectual do clero, e essa é a que domina, não há sequer a dúvida manifestada então pelo grande Padre da Igreja, há certeza absoluta da realidade das existências múltiplas e progressivas.

            Antes mesmo de existir o Espiritismo codificado, na época em que os gênios eram excomungados ou levados às torturas, Mazzini escreveu, no seu livro Dal Concilio a Dio. trechos como este:

             “Cremos numa série indefinida de reencarnações da alma, de vida em vida, de mundo em mundo, constituindo um progresso em relação à vida precedente. Podemos recomeçar o estádio percorrido quando merecemos passar a um grau superior; mas, não  podemos retrogradar nem perecer espiritualmente.”

             Inúmeras seriam as citações que poderíamos apresentar, desde Homero até os homens mais cultos da atualidade, pertencentes ou não ao clero, que afirmaram ou deixaram transparecer a sua crença na reencarnação.

            Inúteis, porém, seriam essas transcrições. Inúteis porque eles as conhecem tão bem ou melhor do que nós, e inúteis, ainda, porque eles não desejam senão criar e alimentar a confusão de que se têm servido até aqui.

            Há um limite, porém. E esse limite parece-nos já estar muito próximo. Assim como os

poderosíssimos sacerdotes do Sinédrio perderam aquele domínio que exerciam, também já se aproxima a época da queda dessa outra classe sacerdotal, que vive a atirar-nos as maiores afrontas e a criar-nos uma série de empecilhos para que nos seja cerceado o direito de seguir a Jesus-Cristo, não pela letra que matou a fé inata dos povos, mas pelo espírito dos seus ensinos, pela humildade dos seus exemplos, pelas lições que nos deixou no Calvário.

            Os tempos são chegados.