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terça-feira, 24 de setembro de 2019

A moeda perdida



A Moeda Perdida - Parábola                  

 15,8  “- Ou qual é a mulher que, tendo 10 dracmas e perdendo uma delas, não acende a lâmpada, varre a sala e a busca diligentemente, até encontrá-la. 
15,9 E, tendo-a encontrado, reúne as amigas e vizinhas, dizendo: Regozijai-vos comigo, achei a dracma que tinha perdido. 
15,10 Digo-vos que haverá muito júbilo entre os anjos de Deus por um só    pecador que se arrependa”
  
         Para Lc (15,8-10) -A Moeda Perdida - leiamos  A. Sayão, em “Elucidações Evangélicas”(Ed. FEB):

            “O mesmo é o pensamento que ditou as parábolas da ovelha desgarrada (Mateus 18,10-14 - Uma Ovelha em Cem) e a da dracma perdida. Visam ao mesmo fim os ensinamentos que derivam de ambas. Apenas, a da dracma objetiva, de modo especial, os pobres a quem Jesus se dirigia. Ele viera em socorro dos que fraquejam, ou que, apavorados com os obstáculos do caminho, retrocedem. O pai de família cuida com ternura do filho doente e o coração se lhe alvorota de ventura quando o vê restabelecido.

            Foi o que fez o Filho bem amado do Pai durante a sua missão terrena. Era o que fazia, antes que descesse a desempenhar essa missão, desde que o homem surgiu no planeta, o que continuou a fazer, depois do desempenho daquela missão, e faz ainda agora, por intermédio dos Espíritos do Senhor, que sempre trabalharam e trabalham pelo progresso da nossa Humanidade. Todos os seus cuidados se hão sempre concentrado e concentram nas suas ovelhas; exerce, porém, maior vigilância sobre as que sofrem e as que um mau pastor deixou se perdessem. Ele as procura e, quando a sua voz amorosa chega a ecoar no coração daquela que se perdera, oh! então, o bom pastor corre para essa que respondeu ao seu chamamento e, tomando-a nos braços, a reconduz ao aprisco, para que não mais se aparte do rebanho.

            Quanto ao símile da moeda perdida e achada, perfeitamente se justifica que Jesus se haja servido dele, desde que atentemos em que suas palavras eram dirigidas aos pobres, para os quais a mais insignificante quantia tem grande importância, pelas dificuldades com que logram ganha-la. Nada mais natural, portanto, do que a figurada alegoria da mulher, ao encontrar a dracma cujo desaparecimento representaria talvez a perda de uma parte do trabalho exaustivo a que se entrega o marido, para dar sustento a uma porção de míseros filhinhos. Assim, o sentimento da mulher, na parábola, sentimento que é desta o mecanismo, tem o maior interesse, porque visa tornar compreensível à classe pobre que tudo o que estiver perdido, do ponto de vista espiritual, deve ser buscado com ardor igual ao que a anima a procurar uma moeda de pequeno valor e deve causar, quando encontrado, alegria idêntica à que produz o achar-se a moeda que se perdera. Daí decorre que o arrependimento por havermos desprezado as virtudes e, conseguintemente, por termos alimentado os vícios que as substituíram, constitui o meio e o caminho de tornarmos a encontrar o que se perdera e fará que nos sirvamos do que havíamos perdido e de novo achamos, para alimentar nossa alma, a fim de que progrida moral e intelectualmente. Quão grande não será  a alegria que, assim fazendo, proporcionaremos aos nossos protetores, aos nossos guias, aos Espíritos do Senhor, anjos de Deus, na frase do nosso Divino Mestre, Jesus Cristo!


Invenções Teológicas



Invenções Teológicas
A Redação 
Reformador (FEB) Dezembro 1923

Em nossa época de livre exame, as igrejas não podem mais impedir a discussão sobre a sua dogmática suposta intangível, como fizeram outrora ligadas ao poder temporal.

Foi eliminado da legislação moderna o antigo crime de heresia pelo qual sofreram inenarráveis suplícios os primitivos cristãos, e, posteriormente, os adversários, reais ou presumidos, das seitas religiosas dominantes e intolerantes.

Os dogmas são submetidos à dissecção.

O ‘Reformador’; órgão doutrinário, tem versado o assunto, nesta e em outras colunas, calma e corretamente, sem preocupações de ordem pessoal.

Observamos as normas adotadas pela Federação Espírita Brasileira, mantidas e seguidas de modo indefectível durante mais de oito lustros, e procuramos cumprir, apesar da nossa insuficiência, as recomendações dos esclarecidos Guias Espirituais.

Sempre amorosos e dedicados, eles estão atentos às nossas fraquezas; conhecem a fundo, a fim de bem nos advertirem, as ideias e intenções, os planos e as manobras dos opositores, visível e invisíveis, ostensivos e oculto.

*

Ditas estas palavras à guisa de exórdio, vamos examinar um dos dogmas fundamentais das igrejas: a ressurreição da carne.

Quantos, na atualidade, pretendidos crentes ou devotos, o conhecem e admitem?

Inserto embora no credo, as confissões religiosas, apalpando o terreno, o evitam, quando se ocupam do ensino doutrinário.

Estão em plena cegueira.

Esse dogma, observa um pensador, permanece escondido, na sombra.

Confrade nosso, desprevenido, alheio à teologia, vem nos dizer: o espírito “ressurge” da carne. Sim; mas, conforme o dogma, é a carne - caro data verminibus - que ressurge para ser, de novo, unida ao espírito. Ressurgem, em outros termos, os próprios corpos materiais, destruídos no decurso dos anos, dos séculos e dos milênios.

No IV século, o concílio de Latrão prescreveu que “todos os homens, tanto os eleitos, como os réprobos, ressurgirão com os próprios corpos – “cum suis propiis corporibus resurgent.”

O dogma está formulado e imposto, sob pena de excomunhão, nestas palavras: “creio na ressurreição da carne - credo carnis resurrectionem”.

Os textos evangélicos, contraproducentemente invocados pelos dogmatistas, referem-se à sobrevivência da alma. Os espíritos ressurgem; os mortos vivem.

A ressurreição da carne é invenção do poder eclesiástico, interessado em manter, explorar e perpetuar as indústrias daí decorrentes, muito conhecidas dos leitores.

*

Em outras ocasiões temos nos ocupado do “materialismo religioso”, que tanto há concorrido para a incredulidade (1).

(1) Vide, entre outros, os números do ‘Reformador’ de 16 de setembro de 1916 e 1917.

            Bem ponderou Allan Kardec:

“O modo porque a religião tem estacionado, em antagonismo aos progressos da razão humana, sem saber conciliá-los com as crenças, degenerou em deísmo para uns, em cepticismo absoluto para outros, sem esquecermos o panteísmo, isto é, o homem fazendo-se deus ele próprio, a falta de um mais perfeito.” (2)

(2) O Céu e o Inferno (trad. de M. Quintão) ed. De 1917, pág. 73

Não pensamos, hoje, como os padres do IV século, fabricantes de dogmas religiosos, nem como os reformadores do século XVI. Progredimos.

Haviam imaginado um segundo fiat criador (o primeiro foi o do Genesis) para que reaparecessem, no vale de Josafá, miraculosamente organizados de novo, os corpos extintos.

Essa criação mitológica prende-se à suposta culpa de Eva e Adão, à lendária queda do primitivo casal humano.

As invenções e complicações da teologia acerca da ressurreição da carne desaparecem, em face da doutrina dos espíritos. São névoas dissipadas à luz do sol.
Os espíritos nos revelaram a existência, antes pressentida, do corpo fluídico, perispírito ou peripneuma, ora comprovada à evidencia por uma longa série de observações e Experiências.

A vida futura, praz-nos repetir, não é mais um enigma insolúvel, o mistério impenetrável.

Já podemos conhecer o destino das almas.

A sua preexistência, a sobrevivência, as encarnações sucessivas, as relações constantes entre os intitulados mortos e os intitulados vivos, em cumprimento de leis naturais, são, na época atual, verdades elementares, que podem e devem ser ensinadas às crianças como os movimentos da terra.

Estão de antemão vencidos, a exemplo de outros inimigos do progresso, aqueles que pretendem nos combater, sustentando fantasias teológicas.

            Vincit veritas (a verdade vence todas as coisas)

Croniqueta - 5



Croniqueta – 5
Manuel Quintão
Reformador (FEB) Julho 1923

São os livros, como os amigos: há-os bons, leais, verdadeiros, benéficos; e
há-os maus, insidiosos, intrujões e perigosos.

Se, porém, aos maus amigos é licito e, por vezes, fácil eximir-nos esquecendo-os e perdoando-os, aos maus livros nem é fácil esquecer nem é licito perdoar, atento que nos deixam n'alma, após forçada intimidade, resíduos de visco e amaritudes de fel.

Dos falsos amigos poderemos esquivar-nos no primeiro contato de arrepio; dos livros falsos, nem sempre porque vamos no afã de melhor julga-los, ou ainda por dever de os julgar, confiados na sua passividade muda, ao extremo de lhes haurir o vírus todo ao dobrar da última página.

*

            E foi o que nos sucedeu ainda agora com “O Retorno”; pretensa novela espiritista de uma Sra. Carmen de Burgos, traduzida do castelhano por uma outra senhora portuguesa - Maria de Lima --e lançada pela Lusitânia Editora
Ltda. de Lisboa.

Do ponto de vista literário, não cabe dizer aqui.

O que nos interessa é o ponto de vista doutrinário em que se colocou porventura ou desventura, a autora, para nos dar uma obra de falso quilate, a
menos que fosse seu intuito lançar ao público despercebido do assunto e ao proselitismo bisonho a tarrafa (rede) tão só da rotulagem, para colimar (acertar) na essência a propaganda negativa.

*

De fato, essa novela que, pelo título sugestivo e com iluminuras na capa, se inculca baseada em fatos reais, não passa, no âmago, de um heteróclito (extravagante) acervo de incongruências e absurdos, de inverdades e fantasias, transparentes, certo, aos olhos do crente consciencioso e senhor da tese, mas de molde a intimidar os simples e ignorantes do que seja o verdadeiro Espiritismo.

Para corroborar o asserto, bastaria transcrever aqui, o conceito com que a
ingenuidade ou a má fé preconcebida da novelista remata a sua obra, pondo na
boca de Barnabé estas palavras:

“... Que lhe importava que o conhecimento do nosso destino fosse o mais necessário, se o estudo da vida de tal modo lhe tirava o prazer de viver? Sobretudo - pensava - não me acercarei mais da morte! Há nela um contágio, uma enfermidade, uma virulência perigosa...”

Nós, por nossa parte, não sabíamos nem jamais sentimos que a investigação do nosso destino pelo Espiritismo roubasse às criaturas o prazer da vida. Ao menos os nobres, que não os bastardos. Mas, também, quem mandou a ilustre escritora meter-se com aquela gente e com semelhantes processos?

*

Sejamos justos, porém: a escritora, que tentou uma novela espiritista, é
lógica em suas conclusões, pois vimos que ela, com o seu Espiritismo de “AIfama” (asilo), enlouqueceu e matou diversos dos seus personagens.

Matou-os, sim, até de modo inusitado e pitoresco, qual aquele pobre engenheiro, o Afonso Nunez, mordido na nuca por um efialta (pesadelo) ciumento (pág. 65).

Nem se ria o leitor, pois há coisas nesse livro ainda mais interessantes como, por exemplo, aquele bom médico Pereira, que acaba, coitadinho, ensandecido, por haver matado uma alma!!!

(Ainda bem que as três exclamações não são nossas, mas da própria autora.)

Há, ainda, espíritos que predizem a sorte grande, outros que amam o médium Dora, ciumenta, carnal, ferozmente. (Pág. 163)

Em sessões improvisadas a mesas de um Balneário, sobre a lousa de um túmulo ou ainda naquela alfurja (pocilga) avinhada e sórdida do bairro da “Alfama” que é como quem diz a “Favela” de Lisboa, não viriam, não poderiam vir espíritos elevados, espíritos de luz, desses que estruturam e norteiam a Revelação Espírita para a sua finalidade cristiana e superior.

Era, pois, natural que redundasse tudo em uma choldra. (algo imprestável)

Mas, daí, talvez, a autora nem se precate da existência de tais espíritos.

Se lá em Portugal a prática do Espiritismo se pode inferir pelo que insinua
e predica “O Retorno”, é caso de dar pêsames aos nossos caros irmãos portugueses, que até agora, não colheram da Árvore da Ciência do Bem o seu lídimo, dourado e apetitoso fruto.

Fiamos, porém, que assim não seja e o dizemos com tanto maior segurança quando vemos que, a respeito do nosso país, as citações são de uma infidelidade e de uma infelicidade flagrantes.

Assim é que no Rio de Janeiro “existia uma casa em que ninguém entrava
em ser recebido a bofetadas e o governo enviou várias vezes soldados, que foram vencidos e desarmados pelos espíritos.”

E, porque, nem os próprios bombeiros conseguissem lá entrar – “foi preciso largar-lhe fogo, ardeu, sem que se visse ali ninguém”.

Desta patranha (narração mentirosa) a escritora não assume a paternidade e põe-na à boca de um uruguaio.

Ainda bem...

*

A ignorância e má vontade sobre o nosso país são portas de manifesto, aliás, em todo o livro: assim é que, analisando a sociedade internacional do Balneário do Estoril, há lá uma brasileira “que perseguia um engenheiro belga com ternura, a todos causando riso.”

*

Dora, aquela médium de aspasiana (Aspásia - sofista grega nascida na cidade de Mileto), a mesma que “flirta” (flerta) com os desencarnados e lhes aguça os instintos caninos, supõe, ou antes afirma que “espíritos sofrem porque anseiam por estar neste mundo”. Mal comparando, é como quem diz que os homens, todos os homens, sofrem por estar fora da Penitenciária ou do Hospital.

Entretanto, que diz a Revelação?

- Que os espíritos só reencarnam neste nosso mundo impelidos pela necessidade de reparação, tocados de arrependimento, o que não deve ser, em regra, coisa muito agradável.

De outra feita, Barnabé nota que “todos os espiritistas são pálidos, secos, distraídos, com um ar de quem está de passagem neste mundo”.

E aquela pobre rapariga noiva, que se matou no dia em que o pândego do noivo já falecido lhe afirmou não voltaria a manifestar-se? (Pág. 226.)

Por outro lado, naquelas sessões da “Alfama”, “enlouquecia muita gente”.

Mas o melhor, o que toca as raias do inédito é aquela de que os espíritos (sic) dos gatos, cães e outros animais “também encarnam e há quem assegure que, quando o fazem num ser humano, são idiotas nas primeiras encarnações”.
(Pag.79.)

Finalmente, o que nos faz suspeitar da identidade deste livro é aquele remate do último capítulo – “Campo dos Mortos”.

Aliás, a sua autora, se fosse crente, sincera, orientada e catequista, não se
deixaria empolgar pela dramaticidade do ambiente, dando-nos uma página de mera, de pura ficção, com chocalhares de fêmures e tíbias “e uma caveira a rolar
como se houvesse dentro um rato...

Poderia, simplesmente, bater a chapa e apresentar aos seus inadvertidos leitores o possível retrato do malgrado engenheiro Afonso Nunez, para que o estonteado, fútil e libidinoso Barnabé levasse a Madri a prova definitiva e real da sobrevivência da alma.

Isso era fácil, racional, lógico e teria a vantagem de atenuar os atentados cometidos contra o verdadeiro espírito doutrinário em que a sua autora pretendeu antes justificar uma obra materialista com rótulo de Espiritismo.

Ana Prado



Anna Prado
Editorial
Reformador (FEB) Maio 1923

Foi, e não podia deixar de ser, com dolorosa surpresa que, no seio da família espírita, repercutiu a notícia da súbita desencarnação ocorrida a 23 de Abril último, dessa distintíssima irmã nossa, a notável médium que, na capital do Pará, servia, desde alguns anos, de instrumento aos mais admiráveis fenômenos espíritas de ordem física já observados em nosso país.

Ocasional acidente, cortando o fio de uma existência cheia já e que prometia cada vez mais fecunda tornar-se de obras proveitosas, abriu num lar ditoso grande vácuo, com o lhe arrebatar o anjo tutelar que a animava e felicitava sob a forma de esposa virtuosíssima e de extremosa mãe.

Nada mais fora preciso para que, ao recebermos a inesperada nova, a nossa alma, irmanada como nunca a do nosso confrade Eurípedes Prado, se sentisse invadida pela amargura que lhe afoga o coração. E o dever se nos antolhou imprescritível de lhe darmos nestas linhas o testemunho da nossa fraternal solidariedade na pungente prova a que, de um momento para outro, se viu submetido o seu espírito, repentinamente privado do eficiente auxilio que lhe prestava, no galgar das árduas etapas da trajetória terrena, aquele outro espírito que se lhe associara para juntos fazerem-na.

Cumprido esse dever e exprimindo aqui os nossos ardentes votos de paz e felicidade espiritual ao trabalhador que regressou à vida livre do espaço, a receber o prêmio da sua operosidade e aparelhar-se das forças e da luz necessárias a maiores empreendimentos, e que de lá saberá lenir as feridas da saudade nos corações amigos que deixou na terra, mais não acrescentamos, pois que fazemos nosso o que o prezado companheiro M. Quintão, páginas atrás, diz na sua “Croniqueta”, traduzindo com verdade o nosso pensar e o nosso sentir coletivo.

Por isso mesmo, também nos eximimos de falar do desaparecimento da médium que era Dna. Anna Prado. “Das próprias pedras pode Deus fazer que nasçam filhos a Abraão”, escreveu ele, com felicidade, por fecho do seu artigo.
Invocando essa sentença do divino Mestre, lembrou-nos oportunamente, a insensatez das nossas lamentações, em face da sabedoria infinita e do poder absoluto de Deus, a cuja vontade omnipotente e onisciente, expressa nas suas leis perfeitas, não escapa sequer o mais mínimo fio dos nossos cabelos.


Croniqueta - II



Croniqueta - II
Manuel Quintão
Reformador (FEB) Maio 1923

Vitimada por acidente fortuito, cujos detalhes ignoramos, desencarnou, em Belém do Pará, Dna. Anna Prado, a excelente médium dotada de poderosas faculdades, que, de cinco anos a esta parte vinha revolucionando o pacato meio provinciano do extremo norte e provocando - a nosso ver, logicamente - tão valiosas conversões quão apaixonadas controvérsias.

Os que combatem, iracundos e tendenciosos, os fatos espíritas e as teorias deles decorrentes, poderiam edificar-se com proveito, buscando conhecer o desenvolvimento mediúnico da Sra. Prado, desde os planos rasos e imprecisos dos primeiros sintomas, às culminâncias das materializações tangíveis e definidas, no exposto por seu marido, com singela naturalidade, em “Trabalho dos Mortos”, o magnífico livro do distinto confrade Dr. Nogueira de Faria.

Eles veriam, então, que, católica por educação e timorata por índole, só a
contragosto e por condescendência do marido, carinhosa e devotada esposa, veio ela a ser um dos melhores instrumentos à propagação da verdade espírita pelo fato, não só em nosso país, onde seu nome se tornou conhecido e acatado, como no estrangeiro, onde revistas de valor científico qual a “Revue Metapsychique”, do Dr. Geley, se ocuparam da sua personalidade e dos seus trabalhos mediúnicos.

Com tais precedentes e predicados de educação, considerando-se a produção mediúnica da Sra. Prado, é fácil concluir que o fenômeno espírita independe da vontade dos homens e, por conseguinte, de cânones científicos ou religiosos, mais ou menos oficializados, para aflorar oportuna e providencialmente, onde quer que o suscite a evolução da humanidade.

Não somos nós quem o diz, é a História que o registra: é a sombra de Samuel pela pitonisa do Endor, é o festim de Baltazar, são a Bíblia, o Evangelho, os anais da própria igreja católica, ao clarão sinistro das fogueiras medievais.

O povo não pensa, não lê, não medita. A grande massa ignora, simplesmente.

*

Modesta e boa, recatada e simples, esposa dedicada e mãe amantíssima, dotada, enfim, desses requisitos que fazem da mulher a Rainha do Lar, a dispensadora única da felicidade única e sadia, no volutabro (monte de imundícies) da Terra, Dna. Anna Prado deveria estar imune da suspeita, da calúnia, da protervia (petulância) sectarista, se nos detratores energúmenos da crença espírita falasse mais alto o pudor da consciência do que os interesses contingentes mal feridos - tesouros que a traça roi, no conceito lapidar do Cristo. 

Natural, portanto, a campanha desabrida e refece (sem valor) que lhe moveram na imprensa os adversários de todos os tempos e feitios, inquinando (sujando-se) de fraudulentas as suas provas.

A verdade, porém, tem o seu império absoluto no substractum das consciências, ainda as mais rebeldes e tenebrosas.

Se umas calam, por conveniência, falam outras por necessidade incoercível e assim, pouco a pouco, hoje uma, amanhã outra, se vão avolumando as vozes dos Epaminondas, que honram a espécie, de todos os tempos e para todas as nobres causas da humanidade.

Lá, no Pará, uma plêiade de espíritos de escol, criaturas de valor social e moral, lida hoje na guarda da causa espirita, que é a da regeneração substancial do homem, graças aos memoráveis trabalhos da Sra. Prado.

E não só no Pará como em outros centros do Brasil, intelectuais de valor, médicos, jornalistas, magistrados conservam - quiçá como fruto pendente de sazão - impressões realistas dos fenômenos a que assistiram entre comovidos e maravilhados.

Para citar dois nomes:

O venerando Dr. Lauro Sodré, que disse: “São, a meu ver, forças ainda desconhecidas; mas o que repilo, pelos meus sentimentos de justiça, é a ideia de fraudes.

E o Dr. João Coelho, também ex-governador do Estado, que afirmou “ter tido a impressão de reconhecer os traços fisionômicos do espírito cuja mão apertou, fisionomia em nada semelhante à de qualquer dos presentes.” (1)
              (1)  “Trabalho dos Mortos” – pág. 9

De fato, só quem não assistiu às sessões da família Prado poderá agasalhar essa pecha – a fraude.  

Ao justo, critério doutrinário visando, que são, que representam os médiuns?

Espíritos devedores que, fraudando a Verdade em anteriores encarnações, escolheram a prova, em regra difícil e dolorosa, de ser, dessa mesma Verdade, expoentes vivos, a seu tempo e meio, conforme as vistas da Providência Divina.

Felizes dos que, sem esmorecimentos nem revolta, vão até o fim, impassíveis e superiores a todas as gritas e rumores do maelstrom (grande turbilhão de água) da vida.

Dna. Anna Prado é, para nós, do número desses, e eis porque o seu espírito, hoje liberto, receberá os votos de reconhecimento e de paz de encarnados e desencarnados, de quantos, em suma, graças às suas faculdades, puderam, do nível em que se encontravam, na terra ou no espaço, vislumbrar mais amplos e róseos horizontes de luz.

À distinta família Prado, neste registo, deixamos o testemunho de fraternidade e comunhão espiritual, certos de que os éstos (calores) humaníssimos do coração, neste caso, não sobrepujaram as consolações da fé na sobrevivência do missionário espírito, em marcha ascendente para mais gloriosos destinos.

E a tantos dos nossos confrades que deploram o desaparecimento do médium precioso, diremos apenas: - Deus tem poder para fazer das pedras filhos de Abraão.

sexta-feira, 20 de setembro de 2019

A Ceia





 A Ceia

 26,17 No primeiro dia dos Ázimos, os discípulos aproximaram-se de Jesus e perguntaram-Lhe: -Onde queres que preparemos a ceia pascal? 
26,18  Respondeu-lhes Jesus : “ -Ide à cidade, à casa de um certo homem, e dizei-lhe: O Mestre manda dizer-te: Meu tempo está próximo. É em tua casa que celebrarei a páscoa com meus discípulos.” 
26,19  Os discípulos fizeram o que Jesus tinha ordenado e prepararam a Páscoa. 
26,20  Ao declinar da tarde, pôs-se Jesus à mesa com os doze discípulos. 
26,21  Durante a ceia, disse: “ -Em verdade vos digo, um de vós Me há de trair.” 
26,22  Com profunda aflição, cada um começou a perguntar: - Porventura sou eu, Senhor? 
26,23  Respondeu Ele: “ -Aquele que põe comigo a mão no prato, é esse que vai Me trair!” 
26,24  O Filho  vai partir. Como, a respeito Dele está escrito nas escrituras  "mas infeliz daquele pelo qual o Filho será traído! Para ele, seria melhor nunca ter nascido!” 
26,25  Então, Judas, que estava planejando a traição, perguntou, por sua vez: Será que sou eu, Senhor? “ -Isso mesmo”, respondeu Jesus. 
26,26  Enquanto comiam, Jesus tomou um pão, deu graças a Deus, partiu-o e deu-o aos discípulos, dizendo: “Tomem e comam, isto é o meu corpo!” 
26,27  Tomou o cálice e, tendo dado graças o deu aos seus discípulos, dizendo:                " - Bebam dele todos...
26,28  pois este é o meu sangue, o sangue da nova aliança que é derramado por muitos homens em remissão dos pecados. 
26,29  Digo-vos: Doravante não beberei mais deste fruto da vinha até o dia  em que beberei de novo convosco no reino de meu Pai.”
       

         Para Mt (26,22) -Porventura sou eu, Senhor?, encontramos em “Palavras de Vida Eterna” (Ed. CEC 1986), de Emmanuel por Chico Xavier, o que se segue:

        “Diante da palavra do Mestre, reportando-se ao espírito de leviandade e defecção que o cercava, os discípulos perguntaram afoitos:
            -Porventura sou eu, Senhor?
            E, quase todos nós, analisando o gesto de Judas, incriminamo-lo em pensamento.
            Por que teria tido a coragem de vender o Divino Amigo por trinta moedas?
        Entretanto, bastará um exame mais profundo em nós mesmos, a fim de que vejamos nossa própria negação à frente do Cristo.
          Judas teria cedido à paixão política dominante, enganado pelas insinuações de grupos famintos de libertação do jugo romano... Teria imaginado que Jesus, no Sinédrio, avocaria a posição de emancipador da sua terra e da sua gente, exibindo incontestável triunfo humano...
            E, apenas depois da desilusão dolorosa e terrível, teria assimilado toda a verdade!...
            Mas nós?
          Em quantas existências e situações tê-lo-emos vendido no altar do próprio coração, ao preço mesquinho de nosso desvairamento individual?
            Nos prélios da vaidade e do orgulho...
            Nas exigências do prazer egoísta...
            Na tirania da opinião...
            Na crueldade confessa...
            Na caça da fortuna material...
            Na rebeldia destruidora...
            No aviltamento de nosso próprio trabalho...
           Na edificação íntima do Reino de Deus, meditemos nossos erros conscientes ou não, definindo nossas responsabilidades e débitos para com a vida, para com a Natureza e para com os semelhantes e, em todos os assuntos que se refiram à deserção perante o Cristo, teremos bastante força para desculpar as faltas do próximo, perguntando, com sinceridade, no âmago do coração:

            - Porventura existirá alguém mais ingrato para contigo do que eu, Senhor? ”

                                                              
                  






Croniqueta - 4



Croniqueta – 4
Manuel Quintão
Reformador (FEB) Junho 1923

O vespertino “A Vanguarda” iniciou em suas colunas uma enquete interessante sobre o que pensam do Espiritismo os nossos intelectuais e homens de letras.

A ideia não é nova: Jules Bois, o romancista francês, teve-a em 1903, quando publicou L'au-delà et les forces inconnues, um repositório opulento de opiniões de vultos notáveis da literatura francesa, entre os quais Lemaitre, Sully Prudhome, P. Bourget, François Copée, etc.

Neste particular, poderíamos aplicar à iniciativa do simpático diário carioca de fronte rubra, as palavras de Salomão: nil novi sub sole,(nada de novo sob o sol) guardadas, naturalmente, as distâncias de tempo e de meio.

E dos opinantes ... também.

Não temos acompanhado regularmente os veredicta, dos nossos Protágoras e Picos de La Mirandolo" por mais de uma razão, inclusive a de que a nós nos interessaria muito mais, se possível, a opinião dos Espíritos sobre eles, os opinantes, e sobre nós mesmo, Coisas de maluco, de espírita, dirão. Seja, mas, contudo, nossas, genuinamente nossas e lealmente confessadas. Depois, diz o rifão: “cada louco com sua mania,”

Entretanto, por uma que outra referência de segunda ou terceira mão, tirando a média das opiniões glosadas, parece poder concluir-se que os juízes mais desfavoráveis são justamente os que se revelam mais ignorantes do assunto, trazendo à tela da publicidade, com a responsabilidade dos seus nomes mais ou menos ilustres e ilustrativos, em estilo mais ou menos lustroso, por sentenças preconcebidas e perfunctórias, a prova de uma insensatez que raia pelo ridículo.

Assim, criaturas outras, que estudam e cultivam a Doutrina por décadas, têm visto estampados nas colunas d “A Vanguarda” conceitos e deduções de um ineditismo delicioso, de fazer rir as pedras, se elas, as pedras, fossem inteligentes e capazes de conceder entrevistas aos jornais.

Aquela de um gravebundo (muito grave) Galeno, a porejar ciência infusa pelo cristal dos óculos, de que o Espiritismo nega Deus porque Kardec diz que Deus é imaterial e só a matéria existe (para ele), é profundamente típica e sugere logo este silogismo: o doutor usa óculos de grau, é míope não vê longe; em se lhe tirando os olhos, deixa de existir para todo mundo o que ele, o pobre míope, não veja a um palmo adiante do seu, dele nariz: logo, o que existe, realmente, são os óculos do doutor, não a visão de mais alguém.

A gente lê uma opinião dessas, pasma e fica a pedir que o ilustre homem de ciência e de... óculos nos venha dizer o que é matéria em si; mas o homem tinga-se (embranquece-se) na companhia dos notáveis e ninguém lhe pode lobrigar outras notabilidades além dessa de roncar grosso, pelas colunas dos jornais.

Mas, agora nos lembramos: este é o mesmo homem que afirmou alhures a ignorância de Kardec em fisiologia!

*

Sobre a influência da doutrina na produção literária, a enquetes da “Vanguarda” tem sido de uma justeza flagrante. Nós não temos literatos  espiritistas, nem os poderíamos ter, na acepção rigorosa do termo.

Não é que a doutrina não faculte ao investigador inteligente um filão de ideias do mais fino quilate.

Para prova do asserto basta lembrar os romances: Casa Assombrada e Pérola Negra de Max (Dr. Bezerra de Menezes) e ainda recentemente as novelas mediúnicas de Zilda Gama, isto para não falar de obras estrangeiras, a começar nas do conde de Rochester para terminar na série atualíssima do Dr. Lucien Graux – Reincarné, Hanté e Initié.  

No gênero didático, filosófico ou meramente doutrinário, a nossa bibliografia é menos precisa: temos autores científicos quais o visconde de Saboia, o dr. Pinheiro Guedes, Alberto Seabra; e, no campo especulativo da filosofia doutrinal, as obras do Dr. Bezerra de Menezes e ainda ultimamente a “Doutrina e Prática do Espiritismo”, de Leopoldo Cirne.

Desta obra profundamente honesta e superiormente traçada, não nos consta se tenham ocupado os indigetas (uma comunidade na Espanha) da nossa critica. Além destas, outras produções literárias e científicas, monografias e memórias, estudos e teses peculiares existem publicados, de feição a provar que o Espiritismo percute nas camadas cultas da sociedade patrícia, muito mais do que a certa gente possa prefigurar-se. Na poesia, podemos apontar um Bittencourt Sampaio com a “Divina Epopéia” e ainda, há pouco vimos emigrar das fileiras ativas um jovem poeta já consagrado - o saudoso Amaral Ornellas. De Fernando de Alencar, o médico prematuramente desencarnado, quando mais floreava nas colunas desta Revista, quem se lembraria?

Mas, admitido não tenhamos, a rigor, literatos espíritas, não quer isso dizer que não haja entre os prosélitos uma cultura capaz de floração literária. A razão seria, então, a mesma pela qual não temos romancistas católicos, poetas protestantes, filósofos positivistas, caracteristicamente escolásticos ou ortodoxos.

Não temos mesmo - e esta é a melhor das revelações colhidas na messe da “Vanguarda” - literatos que se afastem dos moldes franceses com encenações de “vaudeville”, visando mais o sucesso pelo escândalo do que a moralidade do meio, no culto superior da Arte pela Arte.

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Mas, dado que assim não fosse? Haveria a consignar que, ainda neste quesito, há uma completa inversão dos fins imediatos da Revelação Espírita, na sua essência.

Porque, de fato, o que dela decorre é que lhe não cabe fazer homens mais doutos nem mais sábios, porém melhores e menos infelizes.

Daí germinar e proliferar maiormente nas camadas ditas inferiores, nas
classes humildes e desamparadas, entre os que gemem, sofrem e flutuam entre
a dúvida d'alma e a miséria do corpo, sem o arrimo de uma crença na incude (bigorna) da vida e sem a miragem da posse de bens materiais, ou, ainda, de uma cultura intelectual presunçosa, enfatuada e logicamente egoísta, por isso que vazia de finalidade superior.

Ora, que o Espiritismo tem alcançado esse objetivo é um fato com justiça e sem favor assinalado por um dos opinantes da “A Vanguarda” -o Dr. Mauricio
de Lacerda, quando disse que ele, o Espiritismo, produzida na consciência humana uma revolução maior que a produzida pelo Cristianismo, a seu tempo.

Pois é o que veremos. Não que o Espiritismo valha mais que o Cristianismo, mas porque ele é - O Cristianismo integral - reivindicado por essa consciência humana em vinte séculos de mistificações, praticadas em nome d' Aquele que o revelou como padrão definitivo de progresso e concórdia universal.