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terça-feira, 24 de setembro de 2019

Invenções Teológicas



Invenções Teológicas
A Redação 
Reformador (FEB) Dezembro 1923

Em nossa época de livre exame, as igrejas não podem mais impedir a discussão sobre a sua dogmática suposta intangível, como fizeram outrora ligadas ao poder temporal.

Foi eliminado da legislação moderna o antigo crime de heresia pelo qual sofreram inenarráveis suplícios os primitivos cristãos, e, posteriormente, os adversários, reais ou presumidos, das seitas religiosas dominantes e intolerantes.

Os dogmas são submetidos à dissecção.

O ‘Reformador’; órgão doutrinário, tem versado o assunto, nesta e em outras colunas, calma e corretamente, sem preocupações de ordem pessoal.

Observamos as normas adotadas pela Federação Espírita Brasileira, mantidas e seguidas de modo indefectível durante mais de oito lustros, e procuramos cumprir, apesar da nossa insuficiência, as recomendações dos esclarecidos Guias Espirituais.

Sempre amorosos e dedicados, eles estão atentos às nossas fraquezas; conhecem a fundo, a fim de bem nos advertirem, as ideias e intenções, os planos e as manobras dos opositores, visível e invisíveis, ostensivos e oculto.

*

Ditas estas palavras à guisa de exórdio, vamos examinar um dos dogmas fundamentais das igrejas: a ressurreição da carne.

Quantos, na atualidade, pretendidos crentes ou devotos, o conhecem e admitem?

Inserto embora no credo, as confissões religiosas, apalpando o terreno, o evitam, quando se ocupam do ensino doutrinário.

Estão em plena cegueira.

Esse dogma, observa um pensador, permanece escondido, na sombra.

Confrade nosso, desprevenido, alheio à teologia, vem nos dizer: o espírito “ressurge” da carne. Sim; mas, conforme o dogma, é a carne - caro data verminibus - que ressurge para ser, de novo, unida ao espírito. Ressurgem, em outros termos, os próprios corpos materiais, destruídos no decurso dos anos, dos séculos e dos milênios.

No IV século, o concílio de Latrão prescreveu que “todos os homens, tanto os eleitos, como os réprobos, ressurgirão com os próprios corpos – “cum suis propiis corporibus resurgent.”

O dogma está formulado e imposto, sob pena de excomunhão, nestas palavras: “creio na ressurreição da carne - credo carnis resurrectionem”.

Os textos evangélicos, contraproducentemente invocados pelos dogmatistas, referem-se à sobrevivência da alma. Os espíritos ressurgem; os mortos vivem.

A ressurreição da carne é invenção do poder eclesiástico, interessado em manter, explorar e perpetuar as indústrias daí decorrentes, muito conhecidas dos leitores.

*

Em outras ocasiões temos nos ocupado do “materialismo religioso”, que tanto há concorrido para a incredulidade (1).

(1) Vide, entre outros, os números do ‘Reformador’ de 16 de setembro de 1916 e 1917.

            Bem ponderou Allan Kardec:

“O modo porque a religião tem estacionado, em antagonismo aos progressos da razão humana, sem saber conciliá-los com as crenças, degenerou em deísmo para uns, em cepticismo absoluto para outros, sem esquecermos o panteísmo, isto é, o homem fazendo-se deus ele próprio, a falta de um mais perfeito.” (2)

(2) O Céu e o Inferno (trad. de M. Quintão) ed. De 1917, pág. 73

Não pensamos, hoje, como os padres do IV século, fabricantes de dogmas religiosos, nem como os reformadores do século XVI. Progredimos.

Haviam imaginado um segundo fiat criador (o primeiro foi o do Genesis) para que reaparecessem, no vale de Josafá, miraculosamente organizados de novo, os corpos extintos.

Essa criação mitológica prende-se à suposta culpa de Eva e Adão, à lendária queda do primitivo casal humano.

As invenções e complicações da teologia acerca da ressurreição da carne desaparecem, em face da doutrina dos espíritos. São névoas dissipadas à luz do sol.
Os espíritos nos revelaram a existência, antes pressentida, do corpo fluídico, perispírito ou peripneuma, ora comprovada à evidencia por uma longa série de observações e Experiências.

A vida futura, praz-nos repetir, não é mais um enigma insolúvel, o mistério impenetrável.

Já podemos conhecer o destino das almas.

A sua preexistência, a sobrevivência, as encarnações sucessivas, as relações constantes entre os intitulados mortos e os intitulados vivos, em cumprimento de leis naturais, são, na época atual, verdades elementares, que podem e devem ser ensinadas às crianças como os movimentos da terra.

Estão de antemão vencidos, a exemplo de outros inimigos do progresso, aqueles que pretendem nos combater, sustentando fantasias teológicas.

            Vincit veritas (a verdade vence todas as coisas)

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