Morrer melhorando ...
Hermes Jurema
Reformador (FEB) Abril 1925
Quantos partem assim, calmos, cheios de
fé, mesmo felizes! pensava eu ainda há pouco, ao contemplar o corpo inerte e
frio de um que se fora deste vale de lágrimas, onde estivera mergulhado
sessenta e seis anos.
E recordei-me: então, num momento, das longas
horas de vigília que essa pobre criatura passar sobre o leito, onde lhe falei
pela primei a vez em dois meses apenas.
Tinha ele, a esse tempo e nos dias que
se findaram, esperanças de curar-se, de volver ao rude labor quotidiano que lhe
proporcionava o sustento dos filhos, alguns ainda bem crianças?
Penso que não.
Cada noite que morria, cada dia que
voltava lhe devoravam, sem piedade, as carnes do corpo emagrecido ... E ele bem
o percebia!
No entretanto, quando eu me acercava do
seu leito e lhe perguntava como se sentia, a resposta não se fazia esperar:
- Hoje, estou melhor...
- Não sente dores, nem qualquer outra
coisa que o mortifique?
- Não; sinto-me bem... Somente aqui dói
um pouco .. , mas dói menos agora...
E indicava o ponto onde residia todo o mal,
tão grave que o havia de levar
dentro de alguns dias deste mundo de
expiações!
Porque, então, aquela calma, aquela
resignação? Para poupar desgostos à esposa e aos filho que o cercavam?
Sem dúvida, o amor à família leva
muitos enfermos se mostrarem confiantes numa cura impossível, dizendo-se
melhores, malgrado os progressos da moléstia que os consome; mas não é só isso
que os faz assim proceder:- é também a
certeza da melhora que se opera, apesar mesmo da morte infalível que se
aproxima!
Não mentem, nem se enganam. Com o olhar
voltado já para mundo dos Espíritos, compreendendo que não está longe o
instante de tornarem para a verdadeira vida, dispõem-se a tirar desta existência
passageira os últimos proventos para “acumularem tesouros no Céu”. Assim,
praticam sublime caridade aos entes caros o participarem dos seus sofrimentos e
aceitam com resignação as dores que lhes lapidam a alma sedenta de progresso. Depois,
partem calmos e geralmente deixam consolados os parentes queridos.
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Quando da última visita, não o
encontrei já, mas o seu corpo apenas, entre círios; lembrei-me, então, de na
véspera ter-me ele repetido calmamente:
- Estou melhor... somente o corpo muito
fraco...
Não mentia, nem se enganava: essa
melhora que se acentuava sem cessar era do Espírito, que não do corpo; a calma
– filha da certeza de em breve ser lançado nos braços de velhos e bons amigos.
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