Invenções
Teológicas
A Redação
Reformador
(FEB) Dezembro 1923
Em nossa época de livre exame, as igrejas
não podem mais impedir a discussão sobre a sua dogmática suposta intangível, como
fizeram outrora ligadas ao poder temporal.
Foi eliminado da legislação moderna o
antigo crime de heresia pelo qual sofreram inenarráveis suplícios os primitivos
cristãos, e, posteriormente, os adversários, reais ou presumidos, das seitas
religiosas dominantes e intolerantes.
Os dogmas são submetidos à dissecção.
O ‘Reformador’; órgão doutrinário, tem
versado o assunto, nesta e em outras colunas, calma e corretamente, sem
preocupações de ordem pessoal.
Observamos as normas adotadas pela
Federação Espírita Brasileira, mantidas e seguidas de modo indefectível durante
mais de oito lustros, e procuramos cumprir, apesar da nossa insuficiência, as
recomendações dos esclarecidos Guias Espirituais.
Sempre amorosos e dedicados, eles estão
atentos às nossas fraquezas; conhecem a fundo, a fim de bem nos advertirem, as
ideias e intenções, os planos e as manobras dos opositores, visível e
invisíveis, ostensivos e oculto.
*
Ditas estas palavras à guisa de exórdio,
vamos examinar um dos dogmas fundamentais das igrejas: a ressurreição da carne.
Quantos, na atualidade, pretendidos crentes
ou devotos, o conhecem e admitem?
Inserto embora no credo, as confissões religiosas, apalpando o terreno, o evitam,
quando se ocupam do ensino doutrinário.
Estão em plena cegueira.
Esse dogma, observa um pensador, permanece
escondido, na sombra.
Confrade nosso, desprevenido, alheio à
teologia, vem nos dizer: o espírito “ressurge” da carne. Sim; mas, conforme o
dogma, é a carne - caro data verminibus
- que ressurge para ser, de novo, unida ao espírito. Ressurgem, em outros
termos, os próprios corpos materiais, destruídos no decurso dos anos, dos séculos
e dos milênios.
No IV século, o concílio de Latrão
prescreveu que “todos os homens, tanto os eleitos, como os réprobos, ressurgirão
com os próprios corpos – “cum suis propiis
corporibus resurgent.”
O dogma está formulado e imposto, sob pena
de excomunhão, nestas palavras: “creio na ressurreição da carne - credo carnis resurrectionem”.
Os textos evangélicos,
contraproducentemente invocados pelos dogmatistas, referem-se à sobrevivência
da alma. Os espíritos ressurgem; os mortos vivem.
A ressurreição da carne é invenção do poder
eclesiástico, interessado em manter, explorar e perpetuar as indústrias daí decorrentes,
muito conhecidas dos leitores.
*
Em outras ocasiões temos nos ocupado do “materialismo
religioso”, que tanto há concorrido para a incredulidade (1).
(1) Vide, entre outros, os números do
‘Reformador’ de 16 de setembro de 1916 e 1917.
Bem
ponderou Allan Kardec:
“O
modo porque a religião tem estacionado, em antagonismo aos progressos da razão
humana, sem saber conciliá-los com as crenças, degenerou em deísmo para uns, em cepticismo absoluto
para outros, sem esquecermos o panteísmo, isto é, o homem fazendo-se deus ele
próprio, a falta de um mais perfeito.” (2)
(2) O Céu e o Inferno (trad. de M. Quintão)
ed. De 1917, pág. 73
Não pensamos, hoje, como os padres do IV
século, fabricantes de dogmas religiosos, nem como os reformadores do século
XVI. Progredimos.
Haviam imaginado um segundo fiat criador (o primeiro foi o do Genesis) para que reaparecessem, no vale
de Josafá, miraculosamente organizados de novo, os corpos extintos.
Essa criação mitológica prende-se à suposta
culpa de Eva e Adão, à lendária queda do primitivo casal humano.
As invenções e complicações da teologia acerca
da ressurreição da carne desaparecem, em face da doutrina dos espíritos. São
névoas dissipadas à luz do sol.
Os
espíritos nos revelaram a existência, antes pressentida, do corpo fluídico,
perispírito ou peripneuma, ora comprovada à evidencia por uma longa série de
observações e Experiências.
A vida futura, praz-nos repetir, não é mais
um enigma insolúvel, o mistério impenetrável.
Já podemos conhecer o destino das almas.
A sua preexistência, a sobrevivência, as
encarnações sucessivas, as relações constantes entre os intitulados mortos e os
intitulados vivos, em cumprimento de leis naturais, são, na época atual,
verdades elementares, que podem e devem ser ensinadas às crianças como os
movimentos da terra.
Estão de antemão vencidos, a exemplo de
outros inimigos do progresso, aqueles que pretendem nos combater, sustentando fantasias
teológicas.
Vincit
veritas (a verdade vence todas as coisas)
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