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domingo, 27 de agosto de 2017

Homenagens


Homenagens
Orvile Derby A. Dutra
Reformador (FEB) Janeiro 1941

 Desde sempre, a humanidade, por demonstrar sua gratidão, presta homenagens às criaturas, vivas ou mortas, que ela considera heroicas, altruísticas, abnegadas, eminentes pelo saber ou pela virtude.
É uma tradição que, passando de geração em geração, chegou até nós, continuando tais homenagens a ser tributadas quase diariamente.
Não somos radicalmente contrários a que também nós, os espíritas, rendamos homenagem aos que se distinguiram como trabalhadores no campo do Espiritismo. Precisamos, porém, ter muito em vista o modo por que as prestemos. Esse ponto reclama o máximo cuidado.
Gozando da felicidade de conhecer e professar a Doutrina do Cristo, a quem procuramos seguir pela prática do Evangelho segundo o espírito que vivifica e não segundo a letra que mata, esforçando-nos por espiritualizar tudo o que esteja ao nossa alcance, para que em tudo o espírito exerça predomínio sobre a matéria, devemos evitar, no máximo possível, as homenagens de cunho puramente terreno e material.
Muitas vezes, conhecendo de perto o esforço, o devotamente, a abnegação, o altruísmo, a renúncia, mesmo o espírito de sacrifício com que um irmão nosso há trabalhado, ou trabalha em prol da doutrina e, quiçá, a bem de seu próximo, sentimo-nos impelidos a dar-lhe um testemunho do nosso reconhecimento à maneira por que se consagrou à realização do ideal que a mesma doutrina consubstancia, mediante a exemplificação dos ensinamentos do nosso divino Mestre Jesus.
É natural que isso aconteça e não há como fugir a esse impulso de nossa alma, por quanto o reconhecimento, a gratidão são virtudes que devemos cultivar e demonstrar, sempre que for oportuno. Cumpre, no entanto, o façamos de modo todo espiritual, elevado, pois que as homenagens que dediquemos a um Espírito que, por exemplo, foi bondoso, dócil, caridoso e puro, ele só as poderá acolher de boamente, como um tributo de gratidão, se, além de sincero, esse tributo for puro, o que só acontecerá se se revestir de pura espiritualidade, sem o que quer que lhe imprima cunho de mundanismo, ou de simples exterioridade, capaz de gerar a suspeita de corresponder apenas à vaidade dos respectivos promotores.
É ainda comum darem-se a agremiações espíritas e a instituições de caridade nomes de pessoas que se impuseram pelo seu proceder e pelas suas obras a essa distinção. Já devíamos estar mais adiantados; mas, até certo ponto, essa maneira de agir se justifica, porque, mediante a exaltação do nome, se defere justa honra aos merecimentos daquele que o usou entre nós. Em se tratando, porém, de pessoa ainda viva, nenhum cabimento tem semelhante prática, nem de nenhuma forma pode justificar-se.
Vamos mais longe. Não nos parece justificável, absolutamente, que, numa agremiação espírita ou instituição de caridade, haja, no salão onde os crentes se reúnem tão só para cuidar de coisas exclusivamente espirituais, para orar, para estudar e meditar o Evangelho, ou para explanar os ensinamentos do Espiritismo; onde, pois, o ambiente material deve exprimir a máxima singeleza, a maior humildade, haja mais do que aquilo que seja estritamente indispensável à sua finalidade, como mesa, cadeiras ou bancos, estantes com livros, por serem estes veículos de instrução, elementos, portanto, de evolução e progresso.
As paredes, essas devem apresentar-se nuas, limpas, despidas de quaisquer ornatos, bem como de quadros, retratos e dizeres. Uma vez que os que ali vão levam apenas o intuito de entrar no conhecimento da Verdade, não se pode prescindir dessa singeleza, por isso mesmo que a Verdade, quando o é, de fato, sempre se mostra balda de ornamentos quaisquer.
Pode-se, de algum modo, aquilatar do progresso espiritual dos dirigentes e componentes de um núcleo de crentes, até mesmo de uma religião, pelo aspecto do recinto onde celebram suas reuniões. Quanto mais enfeitado, cheio de retratos ou imagens, de estatuetas e adornos se mostre esse recinto, tanto, mais longe da verdade e do Evangelho se revelam os seus frequentadores, pois que só os que ainda não puderam penetrar-se do espírito dos ensinos evangélicos procuram suprir-lhe a falta com exterioridades e coisas materiais.

Cumpre-nos, portanto, a nós espiritistas, envidar de continuo os maiores esforços por nos espiritualizarmos, dado que somente quando nos acharmos espiritualizados em tudo é que nos demonstraremos aptos para a compreensão e a prática do Evangelho, em o qual nada há que não seja essencialmente espiritual. É só assim poderemos ter a consciência de estarmos a caminho da perfeição.

Na Luz do Evangelho


Na Luz do Evangelho
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Março 1954

Empobreçamo-nos de vaidade e de orgulho, de ambição e de egoísmo e, certamente, a vaidade nos impelirá aos planos mais altos da vida.

Exigências e Ilusões são adensamento de névoas em torno de nossa visão espiritual.

Jesus, no ensinamento evangélico não exaltava a indigência de educação; salientava a triste condição das almas que amontoam, ao redor dos próprios passos, ouro e títulos convencionais, no exclusivo propósito de dominação, entre os homens, acabando emparedadas em pergaminhos e moedas, à maneira de cadáveres em mausoléus de alto preço.

É justo usar os patrimônios de inteligência e reconforto que o mundo oferece à solução dos problemas evolutivos, mas é indispensável saber distribuir, com espontâneo amor, as facilidades que a Terra coloca em nossas mãos, a fim de que a fé não brilhe debalde em nossa rota.

O Senhor, ao surgir na Manjedoura, estava pobre de bens materiais mas sumamente rico de luz. Mais tarde, no madeiro infamante, encontrava-se pobre de garantias humanas, mas infinitamente rico de vida superior.

Empobreçamo-nos de exclusivismo e enriqueçamo-nos de fraternidade! Empobreçamo-nos de repouso indébito e enriqueçamo-nos de serviço edificante! Atendendo a semelhante programa de sintonia com o Alto, atingiremos, em breve tempo, os louros da Glória Eterna.


Na Ascenção


Na Ascenção
Rodrigues de Abreu
por Chico Xavier
Reformador (FEB) Março 1954

Poderás, em verdade
Exercer facilmente
O nobre auxílio aos outros.

Não te custa sorrir
Para os filhos da dor
Que choram desolados  
Quando brilha a alegria
No caminho em que avanças.

Não te pesa entregar
A quem sofre com fome
Quanto te sobra à mesa
Na graça da abastança.

Não te pesa o consolo
Quando a calma te ajuda,
Nem te fere amparar
A quem geme na sombra
Quando há sol em teu peito,
Sob as bênçãos do céu...

Mas o auxílio a ti mesmo
Nas chagas da amargura,
Pelo santo remédio
Da humildade e da paz,
É sempre o sacrifício
E a renúncia em ação.

Se desejas, portanto,
Redimir a ti próprio,
Se procuras na vida
O socorro a ti mesmo,
Aprende a caminhar
Sob a cruz do dever,
Aceitando na dor
O bálsamo divino...

Se pretendes subir
Ao calvário da glória.
Procurando com Cristo
A eterna redenção,
Recebe em cada golpe
Da jornada terrestre
O generoso impulso
Da vida que te eleva
Dos abismos da treva

Aos píncaros da luz. 

Desprendimento


Desprendimento
Emmanuel por Chico Xavier
 Reformador (FEB) Janeiro 1940

Fácil é desprender-se alguém da moeda que sobra, em favor do vizinho necessitado, mas é muito difícil projetar, a benefício dos outros, o sorriso de estímulo e o abraço da fraternidade que ajuda efetivamente.

Fácil é dar, de acordo com a nossa vontade e modo de ver ou sentir, mas é sempre difícil auxiliar o companheiro de jornada humana segundo os projetos e aspirações que ele nos apresenta.

Fácil é desligar o coração de objetos e bens, no enriquecimento de quantos sejam simpáticos aos nossos caprichos individuais mas é muito difícil ceder em favor daqueles que não nos acompanham as opiniões.

Fácil é transmitir o que não nos custou esforço algum, entretanto, é difícil espalhar o que supomos conquista nossa.

Fácil é sacrificarmo-nos pela melhoria dos nossos amigos e familiares, no entanto, é sempre difícil a renunciação em auxílio dos que não oram pela cartilha de nossas devoções pessoais.

Fácil é libertar a palavra que ensina, mas é muito difícil desenvolver a ação que realiza.

Incontestavelmente, grande amor à Humanidade demonstra o aprendiz do Evangelho que distribui o pão e o remédio, o socorro e o ensinamento, a esmola e o auxílio, nas linhas materiais da vida; contudo, enquanto não aprendermos a dar de nosso suor, do nosso ponto de vista, do nosso concurso individual, do nosso sangue, do nosso tempo e do nosso coração, em favor de todos, não ingressaremos, realmente, no grande Templo da Humanidade, onde receberemos, edificados e felizes, o título de companheiros e discípulos de Jesus, nosso Mestre e Senhor.


Liberdade Religiosa


Liberdade Religiosa
Cristiano Agarido (Ismael Gomes Braga)
Reformador (FEB) Janeiro 1940

Em discurso, cuja súmula apareceu no "Jornal do Brasil" de 17 de setembro p. passado, o cardeal Cerejeira (cardeal em Portugal / 1888-1977) declarou textualmente o seguinte:

“A concepção totalitária do Estado e a ação católica são antagonistas. O totalitarismo e a vida cristã são incompatíveis".

Esse Príncipe da Igreja reconhece uma verdade fundamental que nem sempre tem sido respeitada pela Igreja, cuja tendência é as mais vezes para implantar um totalitarismo religioso tão pouco admissível como o totalitarismo político. Não só a ação católica, como toda a vida religiosa, filosófica, cultural, científica dos povos reclama inteira liberdade para se desenvolver.

Uma ciência oficial obrigatória, um sistema econômico totalitário, uma concepção social indiscutível, em suma, todas as limitações à liberdade de pensamento e discussão formam barreiras ao progresso e, por isso mesmo, conduzem os povos à morte.

A liberdade é tão necessária à vida espiritual, quanto o ar à vida animal. Sem a liberdade de crítica, nenhum aperfeiçoamento seria possível, haveria a estagnação e a morte.

O enorme progresso do Espiritismo é devido precisamente, em grande parte, à completa liberdade de crítica existente contra ele. Pela crítica, mesmo quando injusta e exagerada, se processa o aperfeiçoamento e se faz a propaganda ainda que Indireta.

Os adversários - por vezes tão irritantes e injustos! - são os melhores colaboradores de todas as grandes ideias, enquanto que os amigos não raro fazem maior mal do que se poderia imaginar.

O totalitarismo, a que se refere o cardeal Cerejeira degenera fatalmente numa concepção materialista da vida e vai parar no “determinismo econômico" e no "materialismo histórico" do marxismo, tenha embora no seu início um ponto de partida diametralmente oposto ao do comunismo. Reduzindo o homem a uma peça numerada da máquina econômica, toda a sua capacidade superior de colaborar no bem geral fica suprimida, precisamente pela ilusão de torná-la mais útil a esse mesmo bem comum.

Estamos, pois, com o cardeal Cerejeira até ao ponto em que a sua Igreja começa a praticar um totalitarismo tão detestável como qualquer outro...        

A liberdade de ação da Igreja precisa ser amplamente assegurada até ao limite onde começa a liberdade, não menos respeitável de qualquer outra concepção filosófica ou religiosa, isto é, a mais plena liberdade de propaganda pela tribuna, pela imprensa, pelo rádio, pela reunião, mas nunca a liberdade de entrar na legislação destinada à coletividade em que se achem outras correntes, ainda que mínimas, de pensamento. Graças a Deus, esta liberdade tem sido respeitada no Brasil e em quase toda a América, dando em resultado serem os deste continente os países mais pacíficos e felizes do planeta.

Como "Coração do Mundo e Pátria do Evangelho", o Brasil tem amor e tolerância até para com os seus adversários de hoje, que serão seus amigos de amanhã. 


O Subconsciente do materialismo e do Espiritismo


O subconsciente do materialismo e do Espiritismo
Leopoldo Machado
Reformador (FEB) Janeiro 1940

No vão esforço de explicar fenômenos espíritas, inteligentes, vemos alguns sábios materialistas lançar mão de coisas bonitas, incompreensíveis e xaroposas, à que dão os nomes de consciente, inconsciente, subconsciente...

Que é o que vale e significa tudo isto? Procuremos onde estão aí a lógica, o bom senso.

Segundo eles, o consciente se manifesta na criatura em estado normal. Nem por isso deixa de ser mais obtuso, nem menos inteligente do que o inconsciente, ou o subconsciente, que só se manifesta no indivíduo em estado de êxtase ou transe. Temos, então, um inconsciente que, a julgar pelo número de fatos assombrosos dele oriundos, seria até de molde a merecer a láurea de SUPERCONSCIENTE!

É, entretanto, à subconsciência e à inconsciência que sábios e cientistas da matéria se agarram, a fim de, sem saberem o que isso é, explicarem fatos psíquicos que, fora das concepções espirituais confirmadoras da existência do Espírito, da sobrevivência da alma, ficam sem explicação. Dado mesmo, existam o inconsciente e o subconsciente do materialismo, estamos com Ernesto Bozzano, em que bastariam, para provar a sobrevivência do espírito humano, sem que haja necessidade de recorrer-se às manifestações mediúnicas. E damos razão a Alberto Seabra, quando afirma, através de substanciosa análise, que "0 inconsciente fisiológico é uma região cheia de trevas em que se debate a fisiologia moderna, sem uma fresta de interpretação racional". Pois é dessas trevas espessas que a ciência materialista pensa retirar explicações lógicas para os fatos mediúnicos, para os fenômenos concretos e científicos do Espiritismo! Assim pensando, ei-la pespegando, sem provas, concepções e teorias em que, nem ela própria, - a ciência materialista - e seus sábios, tomam pé! Limitam-se - continua dizendo Alberto Seabra -  a registrar os fatos "em grande número e impossibilitados de os compreender, nada mais fazem do que batizá-los com alguns nomes gregos. E, como lhes dão tais nomes e como por hábito nos familiarizamos com esses nomes, fica-nos a ilusão de os ter compreendido".

É bem isto, não há negar, o que se verifica por aí afora.

Vejamos, porém, em que base assenta o subconsciente materialista, criação de filósofos, a que se agarraram, posteriormente, cientistas da matéria, gente que era de presumir-se mais objetiva. Sua origem moderna deve-se a Robert Hartmann, filósofo alemão, que o contrapõe à vontade, de Schopenhauer. Leva Hartmann tão alto o seu inconsciente, que lhe atribui a origem do mundo! Coube, porém, a Fred Meyers estuda-lo, ajustando-o às ciências psíquicas, sob a denominação de consciência subliminal, e os estudos desse sábio abriram caminho à Metapsíquica. Caiu, porém, o subconsciente no goto dos psicólogos, dos fisiologistas e foi uma beleza! Hesnard, no seu L’lnconscient, escreve, definindo: "O inconsciente não é divindade, nem mistério; não explica nem a síntese da vida, nem o surto vital." Contudo, tenta-se com ele explicar coisas ainda mais complicadas! Prossegue, todavia, o escritor: "Não é uma consciência degradada ou aberrante, nem o que existe fora da consciência. É a argamassa psíquica que tende para o consciente, a qualidade primitiva de uma multidão de fatos psíquicos reunidos pelos métodos objetivos.” 

Compreendeste, leitor amigo? Parece-nos que não, pois não se compreende o incompreensível. Vamos, porém, adiante, A psicologia patológica apresenta o inconsciente como detentor de maiores possibilidades para a espiritualidade humana. Aqui está uma coisa que se aproxima suavemente do espiritualismo puro! É o inconsciente que o Sr. Freud e a sua psicanálise dão como repositório do caráter são e doente. Lógico, dizemos a nosso turno, de vez que tudo se grava no períspirito que se nos afigura a verdadeira inconsciência ou subconsciência, como por aí a vemos. Coué atribui à imaginação a responsabilidade do inconsciente. Assim, os poetas e romancistas, os músicos e romancistas, os grandes artistas em suma, são obras do Inconsciente. Daí talvez, porque se deva, - segundo aconselham Freud, Charcot, Bernheim, Breuler, Liebault e tantos outros - cultivar mais o inconciente do que o consciente.... e essa cultura implica, a par da formação de artistas e gênios, a elevação do Espírito e do Coração, de acordo! Grasset divide as funções psíquicas em duas ordens: a superior, consciente, é voluntária; a inferior, inconsciente, é automática, subordinada esta àquela. Mas, o que se vê por aí são fatos do subconsciente se apresentarem mais extraordinários do que os do consciente. Superiores, consequentemente, à consciência. A auto sugestão de Coué estabelece a consciência em nós de dois indivíduos distintos um do outro, ambos inteligentes: um consciente, o outro inconsciente. Pois não existem em nós Espírito e Perispírito? Não será, no fundo, a mesma coisa, com diferentes nomes? Vai mais longe o criador da "Escola de Nancy": diz que "o inconsciente possui uma memória maravilhosa e impecável, capaz de registrar, à nossa revelia, os mínimos acontecimentos". De que não é capaz, na verdade, o poder retentivo do Perispírito, em que se gravam, como numa placa fotográfica, as impressões todas de nossa vida? No fundo, como se vê, a mesma coisa! 

O Dr. Austregésilo declara que “a alma, em sua formação, conserva, pelas condições hereditárias, sobretudo atávicas, o grande acervo ou registro que resume, habitualmente, o inconsciente". Não é esta a função do Perispírito, através das reencarnações do Espírito? Substituam-se os termos hereditariedade e atavismo por existências já vividas pelo Espírito e dá certo. Dando, ainda, o psiquiatra patrício "o consciente e o inconsciente como sendo as forças espirituais por excelência" do Espírito, conclui que a saúde do Espírito se estabelece pela educação do subconsciente, etc. Nenhuma educação se consegue, é claro, as pressas. Pensamos que, desde que o nosso esforço se orienta para a nossa perfeição espiritual, estamos pagando, velhas contas do passado, conseguintemente, "educando o nosso subconsciente". É tão verdade isto, que dois doentes da mesma doença, assistidos pelo mesmo médico, tratados pela mesma terapêutica e medicamentos, um pode ficar bom e o outro não. Porque? Apenas porque um se livrou da moléstia, por já haver pago alguns ceitis de sua dívida passada, senão a dívida toda, e o outro, não...

Gustavo Geley, que foi quem mais se preocupou, depois de Myers, com o problema do Inconsciente e do subconsciente, tanto que escreveu uma bela Obra, De L'Inconscient au Conscient, após demonstrar que os fatos da psicologia clássica são incapazes de explicar as transformações bruscas das criaturas e seus sentidos e instintos subconscientes, chega à compreensão da impossibilidade de um paralelismo entre as capacidades orgânicas e o Inconsciente Supranormal, que é, por assim dizer, o subconsciente de Myers. Não encontra, o notável diretor do "Instituto de Metapsíquica Internacional", nenhuma correspondência, em lei fisiológica alguma, para o Consciente e o Subconsciente dos materialistas. Donde se vê que a Subconsciência não provém, é lógico, de neurônios, de células nervosas, mas de alguma coisa que escapa à análise dos laboratórios químicos e físicos, ao escalpelo dos cirurgiões.

A despeito desses consciente e subconsciente impressionarem, de época recente a esta parte, observadores e cientistas, sua existência se vem manifestando de mais longe. Sócrates dispunha de um inconsciente de fôlego: a sua alma racional, afirmação de Plutarco. O Oráculo de Trofônius dizia que era uma alma assim, diferente das almas comuns, a que acompanhava Sócrates. Porfiro, da escola de Platão, estudando os transes subconscientes dos pitões e profetas (médiuns, para nós) uma teoria que parece da autoria dos Grasset, dos Charcot, dos Austregesilo: "a causa que produz o êxtase poderia ser muito bem uma afecção mental ou uma loucura patológica, produzidas por uma superexcitação psíquica semelhante à das vigílias prolongadas ou dos excitantes farmacêuticos. Quanto ao Espírito de que se fala, suponho se trate apenas duma parte da alma humana.” Ainda aqui, o Perispírito, que é parte da alma humana, porque é o seu corpo espiritual! De contra peso, temos a certeza de que as drogas farmacêuticas podem gerar loucuras patológicas!


Coisas que ignoramos, em estado normal, maravilhas do subconsciente, podem manifestar-se à revelia de nossa consciência, de que se nos gravam no Perispírito, conhecidas e apreendidas pelo Espírito em vidas pretéritas; senão inspiradas ou transmitidas por seres invisíveis que nos circundam a cada passo e de que, segundo Zoroastro, anda cheio o ambiente em que vivemos; que compõem, para Flammarion, o verdadeiro mundo, visto como o mundo das coisas visíveis é o mundo das aparências. São essas coisas que, para nós, constituem as maravilhas do inconsciente e do Subconsciente, subconsciente e inconsciente para os quais se criam nomes bonitos, como Consciência Subliminal, Criptopsíquica, Criptomnesia (Richet), Telestesia (Myers), Metagnomia (Osty). Tudo isso são, mais ou menos, variantes da mesma coisa, coisa que, para nós, só se explica bem dentro da lei reencarnacionista, aceitando-se, consequentemente, a existência do Espirito e do Perispírito; concebendo-se o Espírito como a verdadeira entidade a agitar, no homem somático, os nervos, que lhe sacodem os sentidos, vibrando-lhe no instinto e na consciência; que, em suma, lhe constitui a essência da vida. Aliás, é o que os maiores cultores do psiquismo -científico e experimental, com Crookes, Wallace, Flammarion, Lombroso, Bozzano e tantos mais, vêm demonstrando por ‘a’ mais ‘b’, através de provas inconcusas. É o que verificará e aprenderá qualquer inteligência capaz de indagar, raciocinando, através de estudos e experiências.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

Sessões 'particulares'

Sessões ‘particulares”
Orvile Derby A. Dutra
Reformador (FEB) Fevereiro 1942

Dado que a doutrina espírita por ser a própria doutrina cristã, concede inteira liberdade aos seus adeptos, não tem ela hierarquia, nem ritos, nem dogmas.

Pela mesma razão, nenhum núcleo espírita que se preze de bem orientado impõe obrigação alguma a seus sócios e frequentadores, nada lhes exige com referência à doutrina, contando apenas com os esforços e a boa vontade e todos, de modo que, educando-se a si mesmos espontaneamente, trabalhem com denodo, levando seu apostolado tão alto, que chegue a abnegação. Oferece tudo   o que lhe está ao alcance, na convicção de que, cumprindo o Evangelho, tudo o mais virá de acréscimo e por misericórdia.

Os núcleos espíritas são de modo geral, bem orientados, têm à sua responsabilidade definida perante as leis do país e, ainda mais, perante as leis divinas, oficinas, que são, de trabalho constante, produzem sempre efeitos benéficos, quer na parte espiritual, quer a parte material. Seus guias, reconhecendo-lhes as responsabilidades, estão sempre vigilantes sobre labores, contribuindo poderosamente para que progridam. Neles, os estudos se fazem sempre luz dos Evangelhos, oferecendo, além do amparo do Alto, a vantagem de ser feitos em conjunto o que dá melhores resultados, do que estudos feitos isoladamente, sem o necessário ambiente espiritual. Dando de graça tudo o que de graça recebem, suas sessões se realizam à hora certa, porque, sendo uma coletividade de trabalhadores esforçados, quando falta o que costumeiramente dirige os trabalhos, outros, à altura de substitui-lo, acorrem, sem constrangimento e, colocando-se sob o mesmo amparo, colhem os mesmos resultados. Nos seus recintos só se trata de coisas de elevada moral, só interessando aquilo que pode beneficiar a outrem. Tanto assim que, dentro dessas instituições espíritas e do meio em que convivem os seus frequentadores a que saem e nascem essas obras de assistência social, espalhadas por todos os recantos do nosso grande Brasil, como frutos valiosos dos ensinamentos do Evangelho do Mestre Jesus.
           
Além disso, é dentro dos meios espíritas que se vem operando lenta, porém seguramente, transformação radical do homem velho em homem novo, a do materialista em espiritualista, bem como a reedificação de lares desmoronados, a conversão de muitas criaturas em benefício próprio e de outros.
           
Ao contrário, os que, por conveniência individual, isoladamente estudam e praticam a doutrina, não podem contar com tudo aquilo que oferecem os Centros e o êxito de suas sessões chamadas íntimas ou particulares, fica à mercê de múltiplas vicissitudes.  

Acreditamos que os que assim praticam fazem-no de boa fé, ou por ignorância e, também, que os Espíritos que se comunicam nesses meios são bem intencionados; acreditamos, ainda, que, a princípio, tais trabalhos produzem boas consequências porém, dada a familiaridade do meio e o não terem as pessoas que os frequentam conhecimento seguro da doutrina e fugirem outros, por conveniência e vergonha, de ir aos núcleos mais frequentados, logo surgem as perguntas pouco discretas, as consultas sobre questões materiais e assuntos de interesse secundário, que não de caridade e espiritualidade, perguntas que, atendendo às conveniências dos que as formulam e não da doutrina, nem dos Espíritos, versando quase sempre sobre coisas fúteis e banais, de engrandecimento pessoal, acabam todos desviando-se bom caminho.

Sendo raro que tenham horário certo para se iniciarem e encerrarem essas sessões, conquanto possa acontecer que as frequentem médiuns com bons serviços à Doutrina, portadores de apreciáveis dons mediúnicos e excelentes intenções, os guias, verificando pouco a pouco a inutilidade de seus esforços, se vão afastando e os Espíritos zombeteiros os vão substituindo dando comunicações que, aceitas sem análise, conduzem a um final desastroso, a um desfecho lamentável. A obsessão muitas vezes se apodera dos componentes e as consequências são tão dolorosas, que muito nos alongaríamos, se aqui houvéramos de apreciá-las.

É exato que os que revelam tais tendências demonstram precário conhecimento. da Doutrina codificada por Allan Kardec e, por isso, nada influem nas já densas fileiras formadas pelos núcleos espíritas, pois sabemos que a cada um é dado segundo suas obras. Entretanto, necessário se faz atraí-los e esclarece-los, para que, cada vez mais e mais depressa, todas as ovelhas formem um só rebanho, em torno do cajado do Pastor divino.


Cinzas do meu cinzeiro...


Cinzas do meu cinzeiro...
Manoel Quintão
Reformador (FEB) Fevereiro 1942

"Eu sabia que o Bindo havia adquirido o velho hotel Biela e lá prosperava, em Ponta Grossa - a justamente denominada Princesa dos Campos.

O Bindo era a flor do exército imenso de "garçons" do meu conhecimento, por força de longas e repetidas viagens. Encontráramo-nos pela primeira vez nos idos do século das luzes, ao apagar destas, lá por 1895, no "Grande Hotel" de João do Couto, em Curitiba. Quando, pois, 20 anos mais tarde, precisamente em 1915, acorria ao Congresso EspÍrita do Paraná, como delegado da Federação EspÍrita Brasilera, outro que o Bindo não houvera de ser meu hospedeiro. A viagem por via-férrea, partindo de
S. Paulo, não oferecia perspectivas novas, por isso que a conhecia até ltapetininga, em território paulista, e até Castro do lado paranaense. O trecho intercorrente, havia de ser vencido à noite. Deixei a cidade de Tibiriça às 17 horas e quando, no dia seguinte, ao lusco-fusco da noite, atingia Ponta Grossa, chovia a cântaros. Na plataforma da Estação, certo devido ao temporal grosso, a balbúrdia era enorme. Nem um rosto conhecido! Precipitando-me de roldão para um carro de praça, gritei ao cocheiro encharcado:

- Ainda existe o hotel Biela? Sim, existia; e logo num chouto (andadura sacudida, com passos pequenos, incômoda para o cavaleiro) fustigava a parelha, para deixar-me na portada do casarão prestes reconhecido. Mas... (causa esquisita e indefinível!) ao transpor-lhe os umbrais, tive um frisson de mau pressagio. Ambiente pesado, de câmara funerária, nada obstante a iluminação farta jorrante do interior. Não tardou muito, porém, o meu enleio. A minha frente, um vulto feminino em traje de rigoroso luto, interrogava:
- É o Sr. Quintão? E a um aceno confirmativo:

- Sabia que o esperavam e já o conhecia de nome, porque o Bindo sempre me falava no senhor...

- Mas... onde está o Bindo?

- Pois o senhor não sabe? - meu marido foi há pouco tempo assassinado aqui mesmo neste salão de jantar, e, veja o senhor: - assinado pelo cunhado, meu irmão!

Dos olhos negros, profundos, porejavam duas lágrimas. Eu não sei o que lhe disse, nem mesmo se algo disse. Lembro-me, porém, de coisa assim como seja tudo por amor de Deus ...

- Mas o senhor vai jantar e vou mandar preparar-lhe o aposento, que será o que ocupei com o Bindo, até o dia fatal. Se é que os mortos vivem, como creio, meu marido há de regozijar-se com esta homenagem. É o melhor quarto da casa, está perfeitamente montado e apenas precisa de ligeira limpeza, porque nunca mais lá entrei depois da tragédia.

- Não, Exma., absolutamente não... Compreendo e agradeço a gentileza honrosa, mas prefiro um quarto daqueles da galeria lateral, com janelas altas que dão para a ladeira, onde pernoitei há vinte anos. Além do mais, não posso dormir em ambientes fechados e os quartos frontais, ao nível da rua não facultam a ventilação.

- Entretanto, na galeria só dispomos hoje de um quarto e esse não me atrevo a oferecer-lho ...

- Mas, por quê? Olhe que é questão de três ou quatro dias e "cometa" traquejado dorme até em travesseiro de pedra.

Constrangida, aquiesceu, e mal assentei à mesa para jantar, chegaram de tropel os confrades da burlada recepção. Andaram-me na pista a conjeturar impedimentos de última hora, até que descobriram que ali estava e não podia deixar de ser... eu mesmo. E foi um alegrão, dessa alegria sã de almas afeiçoadas a Jesus. Dentre elas, muitos partiram já para o reino da Verdade e da saudade; mas o Lins de Vasconcelos e o Sousa Morais ainda aqui estão para dizer o que foi esse conclave fraternista, primeiro quiçá de quantos lhe sucederam em nossa Pátria, e cuja documentação se encontra nas páginas desta revista, nºs. 3 e 4 de fevereiro de 1916. Mas, não é para falar do Congresso que sopro aqui esta larada (cinzas da lareira) e sim para fixar fenômenos psíquicos, suscetíveis de ponderação e aclaramento.

*

Assim que, ao regressar por deshoras (intempestivamente) ao hoter (?), após a sessão recepcional ao Delegado da Federação Espirita Brasileira, senti-me febril, exausto e, não obstante, insone. Doía-me a garganta, a chuva miudinha e frígida peneirava lá fora no silêncio da noite e eu ouvia cantar o galo, sem pregar olho.

O leito parecia de brasas. Alta madrugada, entrei a madornar (ficar meio dormindo e meio acordado) em sobressalto. Visões estapafúrdias, com ciclones autósitos (monstro capaz de vida extrauterina)  independente em taranteIas (dança popular italiana) bizarras. Ao deixar o leito, manhã alta, tinha os olhos injetados, ardentes; dorida a garganta, e estava completamente afônico.

Meu Deus! nem falar, nem comer; nem voz, nem noz... Era o castigo! Jejum e oração, quand même (de qualquer forma). Os confrades estavam desolados e eu mais do que eles. Nem, passes, nem gargarejos, nem poções dificilmente deglutidas, lograram melhoras.

Nesse dia, véspera de Natal, devido ao mau tempo, o Congresso reuniu-se no teatro "Renascença" e lá ouvi, com a impassibilidade de bonzo, (membro de qualquer ordem religiosa) relatadas por Lins de Vasconcelos, as teses que me cumpria desdobrar perante o Cenáculo.

- Vamos ver amanhã - diziam os confrades solícitos. Mas a segunda noite do Hotel Biela foi mais dantesca do que a primeira. Ao pandemônio onírico (dos sonhos) -visual juntou-se o auditivo, com ruídos insólitos e gemidos abafados. Eu tudo atribuía a um estado patológico: fadiga da viagem, mudança de clima, algum distúrbio alimentar. E pois que se baldavam todos os recursos terapêuticos, um só restava; contramarchar. Não assistiria ao encerramento do Congresso, não reveria a saudosa Curitiba, das alturas do "Batel", como tanto me prouvera. Estava resolvido. No dia de Natal, quando, à tarde, na gare da estação me despedia do bloco fraterno e generoso, Hugo Reis, o saudoso e cintilante jornalista do "Diário dos Campos", tomou-me de parte e disse a sério:.

              - Ouve Quintão e não te rias... Foi um desastre a tua hospedagem no "Biela"; eu quis retirar-te dali à tempo, mas fiquei receoso de provocar suscetibilidades. Aquilo é uma casa malsinada. O Bindo, o teu amigo, foi o último número da tragédia que ali se vem desenrolando. " Dize: que quarto ocupaste?

            - Número tal.

- Justamente o fatídico, onde já se verificaram dois ou três suicídios. Pensa no caso e dá-me notícias.

A sineta tilintava em sinal de partida e dentro em pouco, comovido, da plataforma do último vagão, eu via desaparecerem na curva da linha os lenços adejantes, quais asas brancas em caprichosos remígios (movimento das asas).

E o grande caso é que, apesar da noite úmida e dos solavancos e agruras da viagem, adormeci corno um justo, para só despertar muito aquém de Sorocaba. E ao tomar pé na Paulicéia, sentia-me são como um pero e voraz como um Vitélio (foi imperador romano).

*

Mais tarde, traduzindo Souvenirs de Ia folie, de Antoinette Bourdin, lá encontrei registrada a teoria dos chichés astrais (pintinhos astrais?) e Flammarion, em La mort et son mystère, consigna o episódio impressionante, que facultou a descoberta de um crime, graças a um sonho premonitório. Mas hoje, como ao tempo em que isso se deu, há 26 anos, eu não discuto teorias e só registro fatos quando respigo no meu borralho. (lugar aquecido e confortável.)

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Oração da Migalha

Oração
da Migalha

Senhor,
            Quando alguém estiver em oração, referindo-se à caridade, faze que esse alguém me recorde, para que eu consiga igualmente ajudar em teu nome.
            Quantas criaturas me fitam, indiferentes, e quantas me abandonam por lixo imprestável!...
            Dizem que sou moeda insignificante, sem utilidade para ninguém; contudo, desejo transformar-me na gota de remédio para a criança doente. Atiram-me à distância, quando surjo na forma de pedaço de pão que sobra à mesa; no entanto, aspiro  fazer, ainda, a alegria dos que choram de fome. Muita gente considera que sou trapo velho para o esfregão, mas anseio agasalhar os que atravessam a noite, de pele ao vento... Outros alegam que sou resto de prato para a calha do esgoto, mas, encontrando mãos fraternas que me auxiliem, posso converter-me na sopa generosa, para alimento e consolo dos que jazem sozinhos, no catre do infortúnio, refletindo na morte.
            Afirmam que sou apenas migalha e, por isso, me desprezam... Talvez não saibam que, certa vez, quando quiseste falar em amor, narraste a história da dracma perdida e, reportando-te ao reino de Deus, tomaste uma semente de mostarda por base de teus ensinos.
            Faze, Senhor, que os homens me aproveitem nas obras do bem eterno!... E, para que me compreendam a capacidade de trabalhar, dize-lhes que, um dia, estivemos juntos, em Jerusalém, no templo de Salomão, entre a riqueza dos poderosos e as jóias faiscantes do santuário, e conta-lhes que me viste e me abençoaste, nos dedos mirrados de pobre viúva, na feição de um vintém.
                        Meimei
 por Chico Xavier

Reformador (FEB)   pág. 89  em  Abril de 1961

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Estudos Bíblicos


Estudos Bíblicos
Almerindo Martins de Castro
Reformador (FEB) Janeiro 1940

Tema:  Renascimento e Reencarnação

Disse Jesus a Nicodemos: "Em verdade te digo que, se alguém não nascer de novo não pode ver o reino de Deus." Perguntou Nicodemos: "Como pode um homem nascer, sendo velho? Pode, porventura, entrar novamente no ventre de sua mãe?" Respondeu Jesus; "Em verdade te digo que, se alguém não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne; o que é nascido do Espírito é Espirito. Não te maravilhes de eu te dizer: É-vos necessário nascer de novo. O Espirito sopra onde quer e ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai: assim é todo aquele que é nascido do Espírito." - Como pode ser isso? perguntou Nicodemos, Respondeu Jesus: "Tu és mestre em Israel e não entendes estas coisas?" (João, III, 1-10.)

A estranheza de Jesus estava em que Nicodemos não devia ignorar o sentido das palavras de que Ele, o Cristo, usava. Segundo as crenças transmitidas nas Escrituras Sagradas, sabia-se que o Espírito (sopro divino dado às criaturas) era imortal, imperecível. Não era, pois, natural que Nicodemos, grande entre os Fariseus, se admirasse de poder um Espírito voltar à Terra, nascendo de novo por um corpo-carne, Visto que este constitui o veículo do Espírito, como está demonstrado em João I, 14, onde se diz: "O verbo se fez CARNE (tomou a forma corpórea) e habitou entre nós." Segundo também essas crenças e conhecimentos, que vinham de tempos imemoriais, quatro eram os elementos que dominavam no mundo e resumiam as fontes da vida e das transformações de todas as coisas vivas: ÁGUA, TERRA, FOGO e AR. '

A ÁGUA, por essas noções, era o princípio gerador de todos os seres, fonte originária dos corpos vivos. Tal se encontra na Gênese (I, 1, 2, 6, 7, 20 e 21): "No princípio criou Deus o céu e a terra e o espírito de Deus era levado sobre AS ÁGUAS. E disse Deus: Faça-se o firmamento e dividiu as águas que estavam por baixo do firmamento das que estavam por cima do firmamento. Disse também Deus: Produzam AS ÁGUAS répteis de alma vivente e aves que voem sobre a terra. Criou Deus os grandes peixes e todos os animais que têm vida e movimento, os quais FORAM: PRODUZIDOS PELAS ÁGUAS, cada um segundo suas espécies."

Por isso, Jesus disse que era preciso nascer de novo da ÁGUA e do Espírito, considerando a água como o elemento gerador de todo corpo "que tem vida e movimento", e do Espírito (porque este não pode vir das ÁGUAS, mas de Deus, CUJO ESPÍRITO PAIRA SOBRE AS AGUAS), o que tudo significa, em resumo que o ESPIRITO (oriundo de Deus e Fonte Suprema) nasce de novo - tomando DAS ÁGUAS um corpo que tem vida e movimento.

E esse foi o ensinamento que Jesus transmitiu aos Apóstolos e estes pregaram sem restrições, como se vê da 1ª Epístola de João, cap. V, onde está afirmado que o Cristo "veio com ÁGUA e com o sangue; não com a água tão somente, senão com a água e com o sangue. E o ESPÍRITO é que dá testemunho de que o Cristo é a verdade."

Sabendo-se que o SANGUE era o símbolo da Vida animal, o ensinamento se completa nesse mesmo trecho, quando o Apóstolo diz, no vers. 8: "Três são os que dão testemunho na Terra: o ESPÍRITO e a ÁGUA e o SANGUE; e estes três SÃO UMA MESMA COISA."

E quem nos confirma que esse ensinamento foi dado a todos os Apóstolos, isto é, que SANGUE é símbolo ou sinônimo de VIDA, é aquela passagem de Atos (XVIII, 26): Deus de um sangue fez todo o gênero humano."

Muitos outros ensinamentos complementares confirmam e ilustram essa doutrina, pela qual o Mestre quis esboçar a finalidade do Espírito no caminho da perfeição.

Diz a 1ª Epístola aos Coríntios, VI, 19: "Acaso não sabeis que os vossos corpos são templo do Espírito Santo QUE HABITA EM VÓS, o qual tendes por VO-LO HAVER DADO DEUS e que não sois mais de vós mesmos?"

E, para que não houvesse dúvida, explica no cap. XV, 39 a 49, que não se deve confundir a forma corpórea terrestre, com a forma do Espírito, porque "corpos há celestes e corpos terrestres". O Espírito é semeado em corpo corruptível, mas ressurge em corpo incorruptível, pois, "se há corpo animal, também o há espiritual"; Deus fez primeiro o animal e depois o espiritual.

Que concluir de tais ensinamentos? Que os Espíritos, desconhecedores ou adversos da Verdade, que está no Evangelho do Cristo, precisam voltar á Terra. Porque? Porque a lei que será aplicada a todas as criaturas, diz assim: A cada um se paga segundo as suas obras (Mat., XVI, 27).

Mas, os Espíritos não têm, pelas religiões, apenas a salvação eterna ou a condenação eterna? Não, porque Jesus disse estas palavras (João, VIII, 58): "Em verdade, em verdade vos digo, que se alguém guardar a minha palavra, não verá a morte eternamente."

Como explicar que, guardando a palavra do Cristo, a criatura não tem - morte eterna e sim transitória? Será por estar ensinado que Deus não quer o perecimento do pecador, mas o seu arrependimento e a sua salvação, em qualquer tempo?

Já no Velho Testamento havia esta promessa de Deus, em favor do pecaminoso (Jó, XXXIII, 23-24): "Se houver algum anjo (Espírito) , um entre milhares, que fale a seu favor, e instrua o homem no seu dever, se compadecerá dele e dirá: Livra-o, para que não desça à corrução; eu achei por lhe fazer graça." E como podiam os anjos (Espíritos puros) descer até as criaturas, uma vez que as religiões isolam o Céu da Terra?

A explicação de que Deus fala às criaturas (de certo por intermédio desses anjos) está nesse mesmo capitulo, vers. 15 – 16: "Por sonho de visão noturna, quando cai sono sobre os homens, e estão dormindo no seu leito; então abre os ouvidos dos homens e, admoestando-os, lhes adverte o que devem fazer."

Mas, os anjos terão a sua ação limitada à vida terrena da criatura, ou Deus consente que protejam o pecador e por ele peçam, mesmo depois que o Espírito deixa o corpo carnal? Quem poderá fazer a restrição, uma vez que tal limite não está nas Sagradas Escrituras? É certo que a Escritura diz (Hebr. IX, 27 - 28; X, 26 - 27): "Assim como está decretado que o homem morra só uma vez, seguindo-se o juízo - assim só passa pelo horror do sofrimento o que pecou voluntariamente, depois de haver conhecido a verdade."

Esta morte é a do pecado, a morte espiritual. O que peca morre espiritualmente, porque decai da condição em que foi criado, contrai culpa e, por isso, fica sujeito à reparação, diante da lei do Juízo Supremo, conforme disse o Cristo, figuradamente, em Mat., V, 25 - 26: "Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele, para que não aconteça que o adversário te entregue ao juízo e o juízo te entregue ao oficial e te encerrem na prisão. Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás dali, enquanto não pagares o ultimo ceitil."

Deus não cria Espíritos culpados; nós é que adquirimos um inimigo e nos tornamos adversários - no caminho a percorrer - da Lei fraudada, o que nos conduz à prisão do pecado, onde há sofrimento para o Espírito, "fogo e ranger de dentes". E vamos a essa prisão pelo esquecimento da Palavra de Deus, ensinada desde Moisés. Mas, mesmo no cárcere do sofrimento, a nossa vida prossegue e os Espíritos se avistam e recebem ensinamentos, conhecem em plenitude suas culpas, aprendem a necessidade de reparar os crimes praticados contra a Lei de Deus, percebem a diferença entre os que já sofreram e os que vivem esquecidos dos Mandamentos, mergulhados no egoísmo dos prazeres materiais - o que está comprovado na parábola do rico e do lázaro (Lucas, XIV, 19 - 31 .) O rico, sepultado no Hades (lugar inferior), viu a Lázaro e Abraão e ouviu a voz deste, apesar da distância, o que significa que os Espíritos se falam do "céu para o inferno", e Deus o permite.

E porque Jesus não podia ter dito apenas uma fantasia ou uma calva mentira, aí se compreende que os Espíritos culpados não podem passar - diretamente - da região dos pecaminosos para as moradas superiores, sem pagar o último ceitil das suas dívidas de culpa, enquanto não conhecerem, aceitarem e cumprirem o Evangelho, por isso que o Cristo é o Caminho, a Verdade e a Vida.

Os que não aceitam a doutrina, nem a praticam, são iguais aos que não ouviram a palavra de Moisés: a esses não adianta que os Espíritos lhes falem, porque - a Salvação não vem por acreditar na pessoa do Cristo, mas por praticar a doutrina, seguir-lhe os exemplos da vida que viveu -- para nosso modelo e legado.

            "Aquele que fizer a vontade de Deus (cumprir a Lei)" esse é minha irmã, minha mãe, meu irmão", disse Jesus (Mat. XII, 50).

Assim é que foi ensinado nestas passagens do Novo Testamento: "Morreu o Cristo por nós; pois, muito mais agora que somos justificados pelo sangue (Rom. V, 9); "o sangue do Cristo limpará a nossa consciência das obras da morte (Hebr. IX, 14). Nesses trechos e, mais, na 1ª Epístola de João (I, 7) onde se dia: "o Sangue de Jesus Cristo purifica de todo pecado" - a expressão Sangue do Cristo significa sua obediência até à morte; elucidação adotada por eminentes exegetas.

Aí está, pois, o fundamento da Lei da Salvação, pela perfeição da vida, dentro dessa Lei exemplificada e vivida por Jesus.

E se a criatura só lhe for possível conhecer o Evangelho, a Lei, nas derradeiras horas, sem tempo para reconciliar-se - enquanto no caminho - ficará por isso fora do caminho de que falava Jesus? "

Como reencetar o caminho, em busca da verdade, para conquistar verdadeira vida? Voltando ao - caminho; nascendo de NOVO da ÁGUA e do ESPÍRITO.

É o que decorre dos ensinamentos bíblicos sobre a reencarnação.