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segunda-feira, 30 de maio de 2011

No Curso da Vida








No Curso Da Vida

© Exemplifique o bem desinteressado.
Os nossos atos demonstram a proximidade ou a distância em que vivemos da Lei Divina.
© Viva com alegria. 
O presente já faz parte de nossa vida imortal.
© Pondere cada atitude. 
Tanto é difícil saber fazer quanto saber não fazer.
© Evite o isolamento sistemático.
Somos peças integrantes do ambiente em que existimos.
© Entenda a função da posse efêmera. 
Nem a riqueza e nem a privação expressam virtude.
© Não fuja ao começo. 
A caridade corrige qualquer erro.
© Estude incansavelmente. 
Alcançar novos conhecimentos é formular novas indagações.
© Cultive confiança. 
Com temor não há progresso.
© Seja paciente na dor. 
Crise, muitas vezes, é o nome que aplicamos à transformação do mal em bem.
©Amolde-se aos padrões do Evangelho. 
Na essência, o mundo atual permanece quase o mesmo da época de Jesus.

André Luiz
Chico Xavier   “Ideal Espírita”



Ewerton Quadros




Ewerton Quadros - 1º Presidente da FEB

Paixão
 de
 Jesus

             O Espiritismo não nos abre o caminho da deserção do mundo. Se é justo evitar os abusos do século, não podemos chegar ao exagero de querer viver fora dele. Usufruamos a vida que Deus nos dá, respirando o ar das demais criaturas, nossas irmãs. Para seguir a própria consciência, podemos dispensar a virtude intocável que forja a santidade ilusória. Não sejamos sombras vivas, nem transformemos nossos lares em túmulos enfeitados por filigranas de adoração. Nossa fé não é campo fechado à espontaneidade. Encarnados e desencarnados precisamos ser prudentes, mas isso não significa devamos reprimir expansões sadias e não nos abracemos uns aos outros. A abstinência do mal não impõe restrições ao bem. Assim como a virtude jactanciosa é defeito quanto qualquer outro, a austeridade afetada é ilusão semelhante às demais. Não façamos da vida particular uma torre de marfim para encastelar os princípios superiores, ou estrado de exibição para entronizar o ponto de vista. A convicção espírita não é insensível ou impertinente. A inflexibilidade, no dever, não exige frieza de coração. Fujamos ao proselitismo fanatizante, mas, nem por isso, cultivemos nos outros a aversão por nossa fé. Se o papel de vítima é sempre melhor e o mais confortável, nem por isso, a título de representá-lo, podemos forçar a nossa existência, transformando em verdugos, à força, as criaturas que nos rodeiam. Não sejamos policiais do Evangelho, mas candidatemo-nos a servidores cristãos.

         Nem caridade vaidosa que agrave a aspereza do próximo, nem secura de coração que estiole a alegria de viver.

         Quem transpira gelo, dentro em breve caminhará em atmosfera glacial.

         A crença aferrolhada no orgulho desencadeia desastres tão grandes quanto aqueles criados pelo materialismo. Não sejamos companhias entediantes. Um sorriso de bondade não compromete a ninguém.  A fé espírita reside no justo meio-termo do bem e da virtude. Nem o silêncio perpétuo da meia-morte, que destrói a naturalidade, nem a fala medrosa da inibição a beirar o ridículo. Nem olhos baixos de santidade artificiosa, nem anseio inexperiente de se impor a todo preço. Nem cumplicidade no erro, na forma de vício; nem conivência com o mal, na forma de aparente elevação.

         Fé espírita é libertação espiritual. Não ensina a reserva calculada que anula a comunicabilidade, constrangendo os outros, nem recomenda a rigidez de hábitos que esteriliza a vida simples. Nem tristeza sistemática, nem entusiasmo pueril. Abstenhamo-nos da falsa idéia religiosa, suscetível de repetir os desvios de existências anteriores, nas quais vivemos em misticismo acabrunhante. Desfaçamos os tabus da superioridade mentirosa, na certeza de que existe igualmente o orgulho de parecer humilde.

        O Espiritismo nos oferece a verdadeira confiança, raciocinada e renovadora; eis porque o espírita não está condenado a atividade inexpressiva ou vegetante. Caridade é dinamismo do amor. Evangelho é alegria. Não é sistema de restringir as idéias ou tolher as manifestações, é vacinação contra o convencionalismo absorvente. Busquemos o povo - a verdadeira paixão de Jesus -, convivendo com ele, sentindo-lhe as dores, e servindo-o sem intenções secundárias, conforme o “amai-vos uns aos outros” - a senda maior de nossa emancipação.
Ewerton Quadros
por Waldo Vieira
em “O Espírito da Verdade”





domingo, 29 de maio de 2011

'O Prelúdio e a Chave'


O Prelúdio e a Chave
Hermínio C. Miranda

            Foi numa época, em que o pensamento revolvia obsessivamente em torno de suas angústias maiores, que o querido Frédéric Chopin compôs a peça que acabou conhecida popularmente como o Prelúdio da Gota D’Água (Nº 15, em ré bemol maior ), no qual, a nota é repetida numerosas vezes, como a batida melancólica de uma goteira sobre a lata vazia, lá fora, enquanto cai a chuva. O meu Prelúdio da Gota D’Água é o trabalho mediúnico, com o qual tenho convivido desde que, pela primeira vez, me sentei à mesa com outros companheiros. Gosto de falar sobre isso. O aprendizado começou há mais de três décadas e, ainda agora, na última segunda-feira, não identifiquei no processo sinal algum de que o curso tenha terminado e de que estaria eu, afinal, diplomado e doutorado, como aquele que sabe tudo de tudo. Acho até que não concluí nem o curso primário.
            O leitor pode até pensar que isto é uma hipócrita falsa modéstia. Não é. Já disse e escrevi alhures, que tenho aprendido mais com os chamados obsessores do que lhes tenho ensinado. Ensinar o quê? Que somos espíritos sobreviventes, reencarnantes, comunicantes, sujeitos ao código universal da severa lei de causa e efeito? Nem pensar. Eles é que têm lições a nos oferecer, recortadas do tecido vivo da sofrida experiência dos milênios. De que maneira doutriná-los se apenas sei, e muito mal, da minha presente existência?
            Vamos ao exemplo para documentar a filosofice. Acabáramos de atender a um desesperado e desesperançado companheiro, arcado sob o peso de desconforto consigo mesmo. Inteligência brilhante, ampla cultura filosófica, capacidade de liderança, muita experiência acumulada em vidas que se foram, mas, que, paradoxalmente, ainda estão nele como se fossem de ontem.
            Pela terceira vez vinha ao grupo, depois de uma pausa maior em que ficara literalmente perdido em meditações sem fim. Disseram-nos seus companheiros que ele ficara lá para um canto, imóvel, olhar fixo no vazio, sem ouvir ou falar, alheio a tudo, menos ao tumulto de seu mundo íntimo.
            Queixava-se de nós, arautos da dor, paladinos dela, porque só tínhamos a oferecer o sofrimento em troca de difíceis, impensáveis renúncias. Mais do que isso, éramos apologistas da dor, como que instigados por um prazer sádico de sofrer.
            Não é preciso dizer que o diálogo foi longo, difícil e veemente. O bravo companheiro parecia já vencido interiormente, mas ainda se debatia, ciente de que a alternativa àquela pseudo reação era a entrega total às incertezas da retificação, da reconstrução, na qual, mais de uma vez havia falhado, como tantos nós. Aos poucos, a história pessoal vai se revelando, discretamente, envergonhadamente. Tivera, sim, suas oportunidades. Tentara ser grande antes de estar amadurecido para a grandeza, mesmo porque quando o estivermos, não a desajaremos mais e nem saberemos que somos grandes. Se a gente acha que é grande é porque ainda está pequeno demais para perceber que não o é. Tentara também ser pastor de almas, uma espécie de Messias e, obviamente, fracassou. Pelo menos na dimensão espiritual, onde vivera até aquele momento, havia um arremedo de messianato: dirigia uma instituição, pregava, ensinava, filosofava e tinha até seus postos de influenciação implantados entre os encarnados, através de médiuns invigilantes. Lá ele trabalhava, era importante, respeitado, sentia-se útil, era livre e aperfeiçoava, a cada momento, a estrutura filosófica de que necessitava para justificar-se perante a consciência, que obrigara a calar-se. Em troca de tais ‘regalias’, que tínhamos a oferecer-lhe? Realmente, nada, senão a dura realidade da responsabilidade assumida e propositadamente esquecida.
            Sabia, contudo, que chegara ao fim da linha. Não tinha mais para onde recuar: estava de costas para o paredão imenso que ele próprio construíra com seus desatinos. O momento não era o de intensificar-lhe a angústia com acusações ou ameaças, mesmo porque, melhor do que nós, ele sabia das causas de toda aquela desesperadora aflição.  Semeara ventos, estava colhendo tempestade e os horizontes, tão longe quanto podia vislumbrar, prenunciavam novos temporais.
            A essa altura, já estávamos falando com o ser humano sofrido e, aparentemente, esquecido de todos. Não era mais o filósofo que tudo justifica e a tudo explica; queixava-se do frio, da solidão, do abandono, do desencanto. Oramos, enquanto ele ouvia em silêncio. Falamos da misericórdia infinita das leis divinas, que, na sua irretocável perfeição, estão programadas, desde sempre, para nos levar à destinação da paz, da harmonia e da felicidade em toda a sua luminosa plenitude. Se não nos despedimos como amigos queridos, pelo menos ele não nos via mais como inimigos, como agentes implacáveis da lei e precursores do sofrimento. Éramos pessoas humanas, como ele próprio, a caminho da mesma destinação final.
           Depois dele, veio ela. Os primeiros momentos foram de silêncio, dorido, como poucos temos testemunhado. Nem mais as lágrimas da outra vez; apenas a dor muda, irremediável, pelo menos naquele trágico instante, que, no entanto, parecia eterno.
            A história era tão singela, quanto dramática. Haviam sido companheiros de outras jornadas pela terra. Numa dessa vidas, um momento decisivo, uma daquelas encruzilhadas na qual a gente nunca sabe onde vai dar cada caminho que se oferece. Havia uma espécie de portal, por onde muitos peregrinos entravam. Os dois seguiam juntos. A um passo do limiar pararam e ela preferiu ficar. Não se sabe que razões teria para o gesto de tão graves conseqüências. Ela foi em frente.
            Sentia-se, agora, culpada. Talvez se houvesse insistido um pouco mais, se não aceitasse tão facilmente a recusa dele, as coisas seriam diferentes. Mas, é tudo tão irreversível na vida, meu Deus!
            Logo que pronunciada, a palavra como que se congela no tempo, tanto quanto o gesto, o grito, a ordem, a mentira, a violência. Parece que só o amor vai com a gente, o resto fica lá atrás, ao mesmo tempo que parece transportar-se magicamente, a fim de esperar por nós, lá na frente, no próximo ano, século ou milênio. Quem sabe?
            Sim, ela progredira pelos caminhos iluminados. Paradoxalmente, contudo, ficara, de certa forma, retida naquele passado, ou melhor, naquele outro ser. Não podia prosseguir a jornada, porque o amigo ficara para trás.             Tinham um projeto comum, que não se realizara. E então, contou uma pequena história, dentro da história maior. Mais ou menos assim:
            “-Sabe como é? É como se a gente tivesse um grande tesouro guardado num cofre, lá no futuro. Cada um segue seu caminho paralelo, mas de encontro marcado. E você chega na frente do outro, mas não pode apossar-se do tesouro porque o cofre precisa de duas chaves para ser aberto e você tem apenas a sua. É preciso buscar o companheiro, onde quer que ele esteja, porque a outra chave está com ele. Entendeu? E ele nem sabe mais quem você é: riscou você da memória, a fim de sofrer menos.
            Recebo, com humildade e emoção, o ensinamento da noite, enquanto a singela parábola das duas chaves fica a martelar na memória como o dramático prelúdio de Frédéric Chopin. 


Herodes!?!


Herodes

            Vários foram os reis sob este nome. Roberto Macedo, em “Vocabulário Histórico - Geográfico dos Romances de Emmanuel”  nos explica quem foi o quê, detalhadamente:

Herodes I (cognominado o Grande ou o Antigo) - Rei da Judéia por ocasião do nascimento de Jesus, a quem procurou eliminar. Pai de Herodes Antipas, um dos julgadores do Cristo.
Herodes Agripa I - Rei da Judéia, neto de Herodes, o Grande ou o Antigo. Pai de Berenice, a quem o general romano Tito pretendeu desposar, impedido de fazê-lo por motivos políticos.
Herodes Agripa II -  Rei da Judéia, contemporâneo da conquista de Jerusalém por Tito, general e futuro imperador romano (ano 70).
Herodes Antipas - Tetrarca da Galiléia e da Peréia. Filho de Herodes I, cognominado o Grande ou o Antigo, rei da Judéia. Casado com a filha de Aretes, rei da Arábia, contraiu novas núpcias ilegítimas com Herodíades, mulher de seu meio - irmão Herodes Filipe. Advertido por João Batista, prendeu-o na fortaleza de Maqueronte e mandou degolá-lo, por solicitação de Salomé, filha de Herodíades, industriada por esta. Perante Herodes Antipas compareceu Jesus para julgamento, como súdito da Galiléia, mas silenciou em presença do tetrarca, eloqüente defesa que acusava o juiz. Mais tarde exilado pelo imperador Calígula para Lugdunum (Lion, na França). Segundo historiadores, veio a morrer na Espanha, o que aliás não se deduz de Atos dos Apóstolos.”


O Homem que Venceu o Desejo





O homem que venceu o desejo



José Brígido
(Indalício Mendes)
Reformador (FEB)
Setembro 1949

            A pequena cidade de Yu-Pi, à margem direita do rio Liang, não apresentava progresso. Seus habitantes viviam de maneira primitiva e não sentiam entusiasmo pelas idéias novas que lhes chegavam do estrangeiro, através de notícias publicadas por uma gazeta local. Viviam mais do cultivo do arroz, indiferentes às dores alheias, procurando cada qual enfrentar as contingências da vida como melhor pudesse.

            Entre os habitantes de Yu-Pi havia um rapaz de nome Chuan -Choo, espírito vivaz, sonhador, que não se conformava com as diferenciações de classe, lamentando a sorte que o fizera nascer de família paupérrima. Invejava a situação abastada de Ling-Lu-Y, cujo filho, Mang-Poo, da mesma idade que Chuan-Choo, possuía lindo e forte cavalo branco e uma carruagem com enfeites de jade.

            Horas a fio, Chuan-Choo se punha a meditar na sua situação. Porque uns nascem ricos e poderosos, outros, pobres e desamparados? Porque a beleza e a força são atributos de certas indivíduos, enquanto a fealdade, o aleijão e a fraqueza representam a desgraça de outros? Bem que Chan-Choo sabia que uma das quatro verdades do budismo é está: “a vida é sofrimento”. Mas, perguntava, se a vida é sofrimento, porque Mang-Poo não sofre como eu? porque Mang-Poo tem tudo quanto quer e é feliz? E pôs-se a chorar, ante a impossibilidade de libertar-se do círculo de ferro que tal situação para ele representava.

            Foi a essa altura que o velho Tu-Li-Man-Pu apareceu e procurou consolá-lo. Tu-Li-Man-Pu era homem de grande sabedoria. Conhecia profundamente  a doutrina de Buda e os conceitos famosos de Confúcio, no Lun-Yu. Achava que a vida é uma ciência e por isso deve ser estudada em todos os seus pormenores e analisados com serenidade os diferentes aspectos em que se apresenta em face do homem.

                                   ***

            - Porque choras, Chuan-Choo? Porque deixaste aberta a porta do coração, para que por ela entrasse a desventura?

            - Tu-Li-Man-Pu, meu amigo: choro a minha desgraça. Quero viver uma vida feliz, como a de Mang-Poo, mas sinto que estou condenado à escravidão atual, porque assim viveram os meus antepassados...

            Durante alguns minutos, o velho e o moço trocaram idéias. Por fim, Tu-Li-Man-Pu conduziu Chuan-Choo à sua casa, dizendo-lhe:

            - Vês esta bola de cristal puríssimo? Pois bem. Vais concentrar toda a tua atenção sobre ela. Não pensarás em nada, a não ser no que possas ver dentro dessa esfera brilhante. Primeiro, verás o que se passa na intimidade das mais ricas e poderosas comunidades familiais de Pequim, depois de Nanquim e de todas as grandes cidades da China, onde vivem as famílias de maior tradição e fortuna.

            E assim foi feito. Chuan-Choo se horrorizava das cenas refletidas pela bola de cristal. O famoso mandarim Hi-Khuam, por exemplo, venerado pela sua bondade, era cruel carrasco da esposa. O imperador Fu-Fuam ocultava de seus súditos os sofrimentos físicos de que padecia. Sua vida era verdadeiro inferno. A doce Irui, filha de Fu-Fuan, tinha alucinações tremendas e, em tais ocasiões, feria seus servos e insultava seu pai.

            Chuan-Choo percorreu, em poucos instantes, a China inteira e visitou os homens mais poderosos de sua época. Não havia um só que não tivesse seu instante de amargura em cada dia. Então, Tu-Li-Man-Pu, aproximando-se mais um pouco do rapaz, acrescentou:

            Agora, irás conhecer a verdadeira vida de Ling-Lu-Y e de seu filho Mang-Poo...

          Imediatamente, a bola de cristal começou a reproduzir aspectos desconhecidos de ambos. Ling-Lu-Y era homem de mau gênio e Mang-Poo um viciado. As disputas entre os dois eram terríveis, pois o rapaz não respeitava a velhice do pai, nem este sabia colocar-se na posição devida em face do filho. Quando Mang-Poo saía, Ling-Lu-Y se embebedava com vinho de cerejas e cometia os maiores  desatinos.

             Tu-Li-Man-Pu pôs a destra sobre a cabeça de Chuan-Choo, até que este aparentasse tranqüilidade. Então, começou a falar-lhe:

            -Não te deixes iludir pela aparência, rapaz. Tua vida é trabalhosa e isenta de prazeres. Todavia, é melhor do que a daqueles que supunhas num paraíso. Bem dizia Buda que “a ignorância é a causa de todo mal”... Só nos atrai o desconhecido. O desejo é a origem de muitas dores. Lembraste-me uma das quatro verdades de Gautama Siddharta, mas, ao que suponho, esqueceste as outras três... Elas todas, juntas, podem levar-nos à felicidade relativa,  por mostrar-nos o caminho do Nirvana que, como sabes,  é a região sublimada em que não há nascimento, doença, sofrimento, velhice e morte.  Entretanto, só poderemos ganhar o direito de ingressar no Nirvana, se soubermos viver a nossa vida terrestre, revelando coragem, paciência, resignação e amor.

            Se “a vida é sofrimento”, “a causa do sofrimento é o desejo”. Só “o homem que se domina a si mesmo pode libertar-se da dor”. Aí estão três verdades, Chuan-Choo. Vejamos a quarta: “São estas as maneiras de livrar-se o homem do sofrimento: compreender, pensar, resolver, falar, agir e viver com justiça e tolerância”... Não há na face da Terra quem não sofra, quando ainda não aprendeu a jugular o desejo. Este, sim, é o monstro que a criatura traz dentro de si. É difícil contê-lo e educá-lo, mas quando se consegue tão nobre desiderato, a vida fica mais bela, a humanidade parece melhor e tudo na Natureza sorri para o conquistador do desejo...

            Chuan-Choo permanecia silencioso. As lágrimas haviam secado, porém ele sentia renascer dentro do peito a candura de sua meninice. Beijou as mãos enrugadas de Tu-Li-Man-Pu e saiu sem dizer palavra...

                                   ***

            No dia seguinte, quando o velho atravessou a estrada poeirenta, surpreendeu-se com o cantar alegre de Chuan-Choo, entregue à áspera faina da colheita de arroz... Ao avistar Tu-Li-Man-Pu, gritou-lhe, animado:

            - Aprendi muito, ontem! Mas, depois do que vi e ouvi, comecei vida nova. Seguirei o teu conselho, Tu-Li-Man-Pu!

                                   ***

            Os anos vieram demonstrar que ninguém era mais alegre e feliz, na pequena cidade de Yu-Pi, do que Chuan-Choo, discípulo do velho Tu-Li-Man-Pu, o mestre budista. E, ainda hoje, a juventude chinesa se extasia com os feitos de Chuan-Choo, profundo na explanação da Doutrina de Gautama, que ele assimilou mais pelo coração do que pelo cérebro. E quando se refere ao ambicioso rapaz de Yu-Pi, apenas menciona:

            “- O homem que venceu o desejo...”  

32 Trabalhos do Grupo Ismael


Guillon Ribeiro


32


SESSÃO DE 27 DE DESEMBRO DE 1939


Comunicação final, sonambúlica


                        As legiões de Espíritos que ocorrem às reuniões do Grupo. – Presença entre eles das velhas raposas matreiras. – Atitude que guardam. – São os que implantam a confusão nos colégios espíritas. – Evolução intelectual da humanidade e estagnação do seu progresso moral. – Densidade da atmosfera pelos sentimentos que se evolam dos corações. – Como se aproveitam os Espíritas do Senhor do conhecimento que têm das causas e efeitos desse estado de coisas. – Os prepostos do Consolador aguardam, nas fronteiras do mundo terreno, a palavra de ordem. – O que faz a rasoira que percorre o nosso mundo. –Relevância da obra a que se consagra a oficina de Ismael. – Prece à Virgem.


Médium: J. CELANI


            Paz, meus caros amigos e condiscípulos do Evangelho do Manso Cordeiro de Deus.
            Aqui, a este recinto onde se procura estudar o Livro da Vida, acorrem legiões de Espíritos de variadas categorias, ávidos de conhecimento que os habilite a compreender seu estado, a razão de ser das suas dores e sofrimentos e os meios que devem empregar para conseguirem livrar-se desses sofrimentos.
            Muitos outros, como meros assistentes, aproveitam das lições àqueles ministradas. Vêm igualmente as velhas raposas, matreiras, cheias de ardis, mas ficam à distancia, insuflando, manobrando na sombra, para a consecução de seus fins inconfessáveis. Cercadas de trevas, não podem sequer vislumbrar, em torno de vós, essa espécie de auréola que vos protege, formada pela luz que o Pastor projeta sobre as ovelhinhas que foram entregues pelo Pai.
            São esses os autores da confusão que muitas vezes se implanta nos colégios espíritas, para que o público note a incoerência reinante entre as palavras e as ações dos crentes.  Procuram, doutro lado, amortecer nestes os anseios por adquirir, nos ensinos da Nova Revelação, mais perfeito conhecimento do Criador e da Sua obra.
            Esses anseios, que brotam no coração dos homens, representam o trabalho invisível dos Espíritos do Senhor, na intimidade das consciências.
            Mas, Cristo disse: Eu não vim trazer a paz, e o fundamento dessa afirmação perdura, apenas da ampulheta do vosso tempo haver marcado a passagem de 20 séculos entre a missão do Mestre e os dias atuais.
            A humanidade, é certo, constituída pelas gerações que já viveram, evoluiu intelectualmente; porém, feneceu a simplicidade nos corações.
            Os tempos, meus caros companheiros, são terríveis. Pesam tanto sobre vós como sobre nós, porque a nossa  e a vossa obra se conjugam, se irmanam, têm a mesma origem e a mesma finalidade: a necessidade da reparação e do progresso. A atmosfera formada pelos sentimentos que se evolam dos corações é de tal modo densa e contrária à nossa tarefa, que por vezes penosíssimo se torna o nosso labor junto dos homens.
            Conhecendo as causas e os efeitos de tal estado de coisas, procuramos aproveitar a boa vontade, a passividade daqueles que no meio da tormenta ainda encontram a possibilidade de invocar a patrocínio do Altíssimo Pai.  E com esses realizamos a nossa obra, que deve ser sempre humilde, silenciosa, para que produzam resultados salutares nas almas carecidas de conforto, de esperança e caridade, porquanto a salvação do mundo está no Evangelho. Isto vós o repetis, nós o proclamamos e é verdade.
            Enquanto o homem não bater de si o egoísmo, o orgulho, a vaidade e todos os sentimentos contrários à caridade cristã, haverá sofrimento em maior ou menor escala.
            Para os grandes males, os grandes remédios; para os grandes crimes coletivos as grandes dores coletivas. Já Romualdo vos disse, numa das vossas últimas reuniões, que os propostos do Consolador aguardam, nas fronteiras do vosso mundo, a palavra de ordem. Assim é, de fato. A rasoira percorre o mundo, ceifando, separando, escolhendo os colaboradores que hão de verdadeiramente implantar na Terra um novo estado de coisas mais consentâneo com as promessas do Evangelho e o mérito das populações terrenas.
            A vossa obra é relevante, cheia de responsabilidades e muito mal compreendida, ás vezes, por crescido número de crentes, por aqueles que querem os grandes resultados, imediatos e palpáveis, sem compreenderem que as humanidades se entrelaçam a da Terra e a do Espaço. Do vosso preparo moral aproveitam os que, invisíveis, vos cercam e a extensão dos vossos sentimentos, hauridos na fonte confortadora, alimenta a força moral que vos fará respeitados entre as turbas que vos rodeiam.
            E basta por hoje.
            Nestes arroubos, produzidos pela beleza do ensino cristão, o nosso espírito olvida que, na vossa condição humana, outros deveres vos aguardem junto dos que vos são caros.
            Maria, doce e piedosa Mãe, como desvairam os condutores dos povos, como praticam a mentira, a falsidade, o egoísmo e o orgulho, pretendendo estar servindo aos que se lhes acham confiados. Só o teu sentimento poderá obter que o Pai amantíssimo use da sua clemência, do seu perdão, do seu amor para com tamanho desvairamento.
            Tem piedade das pobres criaturas que, empedernidas no crime, terão de ser relegados para as trevas exteriores. Toca-lhes os corações, para que compreendam e sintam que o Pai não determinou, não traçou fronteiras no Universo; que todos os homens precisam trabalhar unidos fraternalmente, compenetrados da responsabilidade toda que lhes cabe e que é a de levarem pelo seu labor, o planeta à sua evolução completa.
            E a estes, Senhora, que buscam a teu Filho, abençoa, dá forças e sutilezas de espírito, para que possam bem compreender e executar a tarefa que lhes cabe na Casa de Ismael.
            Tem misericórdia de todos nós e abriga-nos sob o teu manto pastor.
            Paz, meus caros amigos. – Bittencourt.




As 6 Almas


As Seis  Almas
adaptação  de  original de Leopoldo Machado
publicado no  Reformador (FEB) em  01.02.1937

            Seis almas, chegadas da Terra, foram conduzidas à presença do Supremo Juiz, cada qual julgando-se portadora de maiores credenciais, para a posse da Salvação. Credenciais decorrentes das religiões que professaram, porque foram seis religiosos de religiões diferentes, e daquelas mais professadas no mundo ocidental.
            - Quem és e de onde chegas? - Indagou o Supremo Juiz à primeira chamada a julgamento.
            - Sou judeu, Senhor, e venho da Europa. A maldade dos homens muito roubou aos judeus, inclusive nossa pátria. Por isso que nós, os judeus, fazemos de cada pátria alheia a nossa pátria. Roubou-nos, a maldade dos homens, mas não nos roubou a religião, a crença em vós, Senhor, tal nos ensinou Moisés. Fomos, no passado, o único povo monoteísta. E somos, no presente, aquele mais fiel às suas tradições. Nunca traí a lei de Moisés, sem desprezar, jamais, o Talmud, o Zohar.
            Nunca faltei às reuniões das sinagogas  e fui  sempre muito fiel  aos seus ritos.  Fora do Pentateuco, nunca procurei a Salvação de que falou face a face, o Senhor, a Moisés, no Sinai. Assim, contava e conto, por certo, obtê-la.
            - A Salvação, alma, não é privilégio de tal ou qual povo, de tal ou qual religião. A salvação se obtém pelo amor ao próximo, pela prática do bem, independente de castas, de crenças, de raças.
            - Perdoa, Senhor. Eu não sabia!...
           - É o que te vale, porque errar por ignorância não é errar. Volta à carne de novo e, na escola da vida, aprenderás a conquistar, por mérito próprio, a Salvação.
            - Obrigado, Senhor! Ah! Se eu soubesse...
                                   *
                - Eu, Senhor, sou cristão, católico. E o catolicismo é a verdade, a doutrina do teu filho; é a Igreja que Jesus fundou na fé de Pedro. A salvação, mereço-a, porque aprendi que ‘fora da Igreja não há salvação’.
                - Para que fosse completo o triunfo da Igreja, eu não medi sacrifícios, nem economizei forças. Espargi, como pude, a fé, achando justíssimo quanto se fez, ad majorem Dei gloriam, em nome da Igreja. Por isso, Senhor, que lamento o tal de Espiritismo, o tal de liberalismo, que se opõem à dominação da Igreja. E choro até, Senhor, o tempo da Idade Média, em que a Igreja triunfou e, no seu triunfo, soube esmagar a heresia com as Cruzadas, as guerras religiosas, a Inquisição, a Companhia de Jesus, a dominação absoluta do papado, do clero... Nunca faltei às missas, às novenas, às festas religiosas. Confessava e comungava amiúde. Tinha as minhas devoções e nunca dormi sem rezar meu terço. Sem uma oração, nunca despertei, Senhor. Tive, em minha casa, um oratório cheio de santos, aos quais adorava, acendendo-lhes velas e fazendo-lhes festas. E paguei sempre, generosamente, os sacramentos da Igreja! E concorri, sempre, com muito dinheiro para ela!
       - E amaste ao teu próximo como a ti mesmo?
       - Aos católicos, procurei amar, Senhor. E valeria a pena amar, porventura, a hereges, a infiéis: protestantes, judeus, espíritas e ateus?
       - Está nos Evangelhos e o disse Jesus, que divinizou a tua Igreja:  “Vai reconciliar-te primeiro com o teu inimigo, antes de fazeres a tua oferta ao Senhor. Ama aos teus inimigos”. Não há uma religião para a salvação. O céu será daquele que tenha sabido amar ao próximo como a si mesmo, independente de raças, de crenças, de castas...
      - Senhor, eu não sabia! Na minha crença pura e sincera, fiei-me no ensino dos padres! Pensava  que ninguém fora da Igreja Católica se salvaria. Eu contava, por isso, com a tua salvação. Perdoa, Senhor!
          - Tua ignorância ser-te-á um atenuante. Voltarás à Terra e, na escola da vida, aprenderás a servir a Deus, amando ao teu próximo...
                                   *
            - E tu, de onde vens?
            - Da Arábia, Senhor. Sou muçulmano, fidelíssimo servo de Maomé.
            - Bem te conheço a ti. Aprendeste que não há Deus senão o teu Deus e que Maomé é o profeta desse Deus.  Maomé, aquele que  desceu à Terra para a iluminação de teu povo. E se Deus o fez descer entre os árabes é que este povo é o escolhido de Deus. Assim crês ter aprendido no Alcorão. E se, para servir a teu Deus se fizesse necessário perseguir, destruir, matar, vós teríeis perseguido, destruído e matado.  Tanto mais sabendo que cada ato de perseguição, destruição e morte, seria entendido como um importante serviço ao Ismaelismo, que é a verdadeira religião de Maomé, que é a verdadeira religião, que é a tua religião. 
            Como te enganaste, alma! mal serve a Deus quem procura servi-Lo perseguindo, destruindo, matando. Serviste, quando muito, a lei morta da tua religião. Deus é amor e sabedoria. Só os sábios e os bons subirão a Deus, verão a Deus! Perdeste por teu culto, por tua fé, o teu tempo...
        - Perdão, Senhor, eu não sabia...
       - É o que te vale, alma,  visto como não há justiça na condenação de criminosos e errados por ignorância. Voltarás à carne, para a escola da vida...
                                   *
        - Eu sou reformista, protestante. Era católico fanático, enquanto não conhecia os Evangelhos. Devo, pois, a Lutero a minha iluminação. Por isso, sei que estou salvo. A salvação ganhei-a pela minha fé pois de graça sois salvos mediante a fé’  como está escrito  nas Escrituras. As Escrituras não mentem nem minha fé mentiu.
       - Mas, nas Escrituras, não se pode desprezar o espírito que vivifica pela letra que mata. E lê-se, também, nelas que, aquele que quiser ser o primeiro, se faça último pela modéstia, pela simplicidade; humilhe-se, perdoe; não se  exalte e nem julgue aos semelhantes...
        - Mas, Senhor...
        - “A cada um será dado de acordo  com as suas obras” lê-se, também, nas Escrituras em que tu, alma, cimentaste a tua fé. Se foi grande a tua fé, pequenas foram as tuas obras...
         - Mas, Paulo, Senhor, assegura a salvação pela fé, somente.
       - Sem embargo, assevera esse mesmo Paulo que, se tiver todos os outros dons e todas as virtudes e não se tiver a caridade, não se terá nada... E caridade sem obras...
        - Perdoa, Senhor, que eu não interpretasse deste modo a tua justiça!...
       - Volta de novo a Vida, a melhor escola para a prática das boas obras...
                                   *
           - Tu, quem és?
       - Um desiludido, Senhor. Não cria na existência do espírito. Não acreditava em nada. Era positivista. Meu Deus era Augusto Comte, cuja doutrina me deslumbrou. Entretanto, sei que sou espírito e aqui estou para ser julgado. Uma coisa, porém, posso assegurar-te: procurei, o mais que pude, ser útil à humanidade simbolizada na mulher de minha adoração. ‘Viver para outrem’ era a minha divisa, Senhor. Se errei por não admitir a imortalidade, não acreditar em Deus, grande foi a minha renúncia, nas obras de caridade que realizei. Não as realizei visando a conquista do Céu, como os demais religiosos na Terra. Realizei-as pelo prazer exclusivo de realizá-las, se ser útil aos meus semelhantes. Não teve sentido para mim o ‘quem dá aos pobres empresta a Deus’, das religiões, porque não acreditava em Deus. Acaso não vale mais, porventura, do que a caridade egoísta, que se vai fazendo por aí, em nome das religiões que é, para mim, uma arma banal de conquistar o céu com benefícios materiais?
    - Tens, de certo, razão. Onde não houve renúncia, onde não houve espontaneidade, onde não houve o sentimento de dar pelo prazer de dar somente, não houve, também, caridade. O prazer da recompensa só sente  quem praticou a caridade.
     Mas, houve orgulho na tua sabedoria, alma! Acreditaste demasiado na tua religião científica, obra dos homens. E, praticando-a, procuraste matar nos corações a centelha da fé, sem levar em conta que uma fé sincera é  alimento para o espírito, o cibo dos corações famintos de amor, de justiça, de bondade! Tirar a fé a um coração, sem substituí-la por fé maior, mais confortadora e profunda é grave crime. E a tua sabedoria, como nenhuma sabedoria humana, saberá explicar o Universo e Natureza sem a idéia de um ente supremo, seu criador!...
       - Ah! Senhor!...
       - A sabedoria orgulhosa é uma exaltação. E é da lei: os que se exaltam serão humilhados...
      - E as obras de caridade que realizei, Senhor?
     - Serão levadas em conta. Voltarás à carne, a melhor escola, para o aprendizado do espírito, em melhor ambiente, em meio espiritualizado, com possibilidades maiores, para que, com a mesma renúncia e maior humildade e sem materialismo, ajustares à tua ciência e às tuas obras de caridade, ao sentido espiritual da vida.
         - Obrigado, Senhor! Errei porque não sabia...
         - Por isso que a tua pena foi atenuada!
                                               *         
        - Professei, Senhor, o Espiritismo. Eu sou espírita. E, em nome de minha Doutrina, escalpelei os erros de muitas religiões, combati as mistificações do clero, fui um paladino da verdade. Pela pena e pela palavra, na tribuna, no livro e no jornal, fui um trabalhador extremado da Seara. Não espero ganhar o Céu, que não existe, bem o sei. Talvez faça juz a existência num planeta superior...
        - Se as tuas obras o permitirem. Tu sabes que a melhor religião...
      - É, Senhor, a que maior número de homens de bem produzir. Por isso que o Espiritismo não tem a pretensão de, só ele, salvar.
          - E pregaste estas verdades com absoluta renúncia e desprendimento?
         - Eu, Senhor... Confesso que, por vezes, as preguei por dever, não por abnegação; confesso que gostava do elogio dos confrades, das notícias laudatórias em torno de meu nome, dos jornais, sobre a minha ação doutrinária... Sacrificava, Senhor, ainda, este ou aquele serviço que podia prestar à Doutrina, por motivos fúteis: mau tempo, suposto cansaço, divertimentos sociais...
            - E praticaste com os teus semelhantes as leis de fraternidade?
       - Nem sempre, Senhor! Infelizmente, nem sempre! A divisa mesma do codificador  ‘Trabalho, solidariedade e tolerância’  - não a realizei na sua inteireza doutrinária. Podia, Senhor, trabalhar mais; ser mais solidário com os meus confrades para as obras de caridade espiritual e material, conforme as exigências da Doutrina. Podia tolerar mais. Tolerei mais, por vezes, aos irmãos de outros credos, do que do próprio Espiritismo. Houve uma questão, Senhor, - a questão do corpo de Jesus - que me levou a discordar desfraternalmente dos confrades, a hostilizá-los, na crença de que meu ponto de vista era o verdadeiro...
            - E, com quem está na Terra, a verdade absoluta?
           - Ensinou-me a Doutrina que com ninguém, que com Doutrina alguma; que todas as Doutrinas e todos os que as estudam, possuem, a seu tanto, fragmentos da verdade absoluta, que é Deus...
         - Logo, tua intolerância, tua falta de solidariedade e o teu labor incompleto... E fizeste o bem que pudeste?
         - Nem sempre, Senhor. Podia ter feito mais. Tive, - foi uma fraqueza minha - mais apego do que devia, ao dinheiro. Dava dez, quando podia e devia dar cem...
            - E a lei...
            - Bem o sabia, Senhor, que é “Fora da Caridade não há Salvação”.
            - E a lei é ‘a cada um segundo as suas obras’. Tu, alma, não podes alegar a teu favor a atenuante da ignorância. Tu sabias, tu conhecias a lei, tu ouviste muitas vezes as vozes do Alto, a conclamarem que ‘os espíritas são os cristãos modernos, a quem o Pai confiou a implantação do Cristianismo e a reforma da civilização e da humanidade.’ Ora, se tu não trabalhaste suficientemente; se não foste solidário e tolerante; se não viveste no mundo sem ser do mundo, como afirma o teu apego ao dinheiro; se tiveste vaidade na tua atuação doutrinária; se não colocaste a caridade acima de tudo...
            - Mas, Senhor...
        - “Mais será pedido a quem mais se houver dado.” É a lei. Dei-te alma, inteligência, forças físicas, recursos materiais, capacidade de ação. Porque não te aproveitaste de tanto, para o teu benefício? Erraste conscientemente. Voltarás à carne, a melhor escola para os espíritos rebeldes. Voltarás à carne, não na Terra, mas num mundo inferior à Terra, onde há mais choro e ranger de dentes e de onde não sairás sem que pagues até o último centil...
           - Senhor, piedade para os espíritas, como eu, e nas mesmas condições que eu! que pena eu tenho deles!
         - Eles tem o seu livre arbítrio e conhecem, ou devem conhecer, muito bem, a Doutrina. E tem, a par disso, os seus guias espirituais, e os seus amigos da Espiritualidade. Não podem, não devem, não lhes fica bem errar. Se errarem, porque suas responsabilidades são maiores, piores serão as conseqüências dos seus erros...
           
       Meditemos, irmãos em Jesus, e companheiros de Doutrina, na lição do apólogo. E procuremos, cristãmente, espiritamente, conscientemente, despertar as nossas melhores energias para a realização de quanto nos cabe às responsabilidades. E, demasiado grandes são elas, as nossas responsabilidades! Atentai bem que o Espiritismo, a par de seu aspecto religioso-cristão é, também, ciência e filosofia. E sem estudo é impossível aprender uma filosofia e uma ciência... Atentai mais que o Espiritismo é - diz-no-lo o exame sereno e racional de sua doutrina - o único ismo, capaz de integrar a humanidade naquilo que todos nós aspiramos, para que todos nós vivemos: a Felicidade! Atentai ainda que ‘os espíritas são - proclamam urbi et orbi - as vozes autorizadas da Espiritualidade - os cristãos modernos’. ‘É justo, portanto que a nossa fé, os nossos atos, as nossas convicções, o nosso testemunho se paralelem aos dos cristãos primitivos, aqueles mesmos que avançavam para os dentes das feras, com os olhos iluminados de luz estranha, cheios de fé os corações, as almas voltadas para o Divino Mestre! E esse testemunho, e essas convicções de fé e aquela iluminação, só te-la-emos com a leitura dos Evangelhos de Jesus, interpretados à luz do Espiritismo. Leitura compreendida e assimilada; o que só realizar podemos em ambientes harmônicos e fraternos. E lidos, compreendidos e assimilados que sejam os Evangelhos, imprescinde-se-nos que os sintamos. Carecemos sentir a Doutrina na sua inteireza espiritual, para a prática de seus ensinamentos, de vez que a Lei é ‘a cada um segundo as suas obras’. E só então seremos espíritas integrais, cristãos modernos, capazes da reforma humana.
            Deus é Sabedoria e é Bondade. E ‘somente os puros e sábios verão a Deus’.
            Amigos, irmãos, companheiros de estudo dos Evangelhos: queiramos ver a Deus! 






As 3 Marias


As Três Marias
 original de  Álvaro Sodré
publicado no  Reformador (FEB) em  06.1953

           
Uma vez, pela calada duma noite, 
sobre o escuro de sépia de uma nuvem disforme, 
três pequeninas estrelas se encontraram.
E as três estrelinhas, no silêncio da noite, ficaram a conversar:
“- Eu fui rainha, disse a primeira.
Possuí todas as riquezas da Terra.
Fui a soberana dum trono glorioso. 
Não consegui dominar um homem,
mas dominei um povo inteiro. 
É na Terra, sobre o meu túmulo, 
no interior da mais linda catedral, 
há uma ânfora que encerra os pergaminhos
com todas as honrarias que recebi na vida”.
E falou a segunda estrela:
“- Eu fui santa. 
Passei a vida em penitência e orações. 
Não amei nem fui amada. 
Guarda o meu túmulo o altar de uma capela.”
E disse a terceira:
“- Fui talvez a mais humilde.
 Fui mulher e fui mãe. 
E, na cova rasa de minha sepultura, 
há apenas uma cruz e uma Saudade.”
Desde essa noite, 
as três estrelas não se separaram mais. 
São as três Marias.

            ************

Vós outras que ides pelo mundo
vivendo a ventura da felicidade 
ou nos tropeços pelos infortúnios, 
erguei os olhos para os céus, 
para aquelas estrelas:
a que foi mulher e foi mãe é a menor, 
mas é a mais bela, 
e o seu brilho tem mais vida, 
a sua vida tem mais glória, 
a sua glória mais esplendor!...

            

08 Irmãos da Caminhada Terrestre


Irmãos da caminhada terrestre !
                                             

     Louvemos sempre 
o Mestre dos Mestres - Jesus ! 

Sim, irmãos, louvemos sem parar o filho de Deus, 
que tanto nos dá no viver diário! 
Tendo-o constantemente no coração, em nossa alma, 
seremos sempre amparados em tudo que nos acontece. 
Jesus é força, é luz, é poder. 
Somos, apenas, sementinhas que germinam e crescem através do amparo maior. 
Erramos muito. mas somos sempre levados a uma experiência mais acertada, 
que pouco a pouco, nos leva a uma maior perfeição.
 Tudo por que passamos é necessário ao nosso despertar 
para o mundo da espiritualidade maior. 
Sejamos humildes, compreensivos e, 
mesmo sofrendo decepções saibamos dizer antes de dormir
 - Obrigado, Pai, pelas bênçãos que me foram dadas no dia de hoje. 
Tudo se torna mais belo, mais verdadeiro, quando a fé se cultiva,
 torna nossos corações mais puros.    
Louvemos sempre o Senhor,                                         
  ‘RAMA’

  por Zilda de Carvalho   em 08/ 94
 C E  Jacques  Chulam  -  RJ, RJ.